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Pesquisas e Práticas Psicossociais

versão On-line ISSN 1809-8908

Pesqui. prát. psicossociais vol.13 no.2 São João del-Rei abr./jun. 2018

 

 

Concepções de familiares sobre um centro de atenção psicossocial

 

Conceptions of family on a psychosocial care center

 

Concepciones de familiares sobre un centro atención psicosocial

 

 

Salizza Duarte MotaI; Renata Fabiana PegoraroII

IPsicóloga pela PUC Goiás. E-mail: saliza14@hotmail.com
IIDoutora em Psicologia pela USP-RP. E-mail: rfpegoraro@yahoo.com.br

 

 


RESUMO

Este trabalho buscou identificar as concepções de familiares de usuários de um Centro de Atenção Psicossocial sobre o atendimento prestado. Participaram deste estudo 15 familiares, com idade média de 53 anos, sendo 11 mulheres e quatro homens. Foi utilizado um roteiro de entrevista semiestruturado que investigou a trajetória do usuário por serviços psiquiátricos, a avaliação do familiar sobre as atividades oferecidas no Caps, pontos positivos e barreiras na provisão de cuidado pela equipe. Foi realizada análise de conteúdo das entrevistas e as categorias emergentes foram: diferença entre Caps e demais serviços, participação da família no Caps, melhora do usuário após tratamento no Caps, sobrecarga familiar e sugestões para o aprimoramento do serviço. Os entrevistados, em grande maioria mulheres, destacaram o papel da equipe como promotora da melhora do usuário, sem deixar de compreender que há barreiras a serem vencidas, como o espaço físico e a inexistência de leitos de retaguarda.

Palavras-chave: Centro de atenção psicossocial. Saúde mental. Membros da família.


ABSTRACT

This study aimed to identify the evaluation of relatives of users of a Psychosocial Care Center for the care provided. The study included 15 families with an average age of 53 years, 11 women and four men. A Semi-Structured Interview Guide was used to investigate the user's path by psychiatric services, the family's assessment of the activities offered at Caps, strengths and barriers in the provision of care by the staff. Was conducted content analysis of the interviews and the emerging categories were: difference between Caps and other services, family participation in Caps, user improvement after treatment in Caps, family burden and suggestions for improving the service. Respondents, mainly women, highlighted the role of the team as promoting the improvement of the user, while understanding that there are barriers to overcome, such as the physical space and the lack of spare beds.

Keywords: Psychosocial care center. Mental health. Family members.


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo identificar la evaluación de los familiares de usuarios de un Centro de Atención Psicosocial de la atención recibida. El estudio incluyó a 15 familias con una edad promedio de 53 años, 11 mujeres y cuatro hombres. Una entrevista semiestructurada Guía se utilizó para investigar la ruta del usuario por los servicios psiquiátricos, la evaluación de las actividades que se ofrecen en Caps, fortalezas y barreras en la prestación de atención por parte del personal de la familia. Se llevó a cabo el análisis de contenido de las entrevistas y las categorías emergentes fueron: diferencia entre mayúsculas y otros servicios, la participación familiar en el Caps, la mejora de usuario después del tratamiento en el Caps, la carga familiar y sugerencias para mejorar el servicio. Los entrevistados eran principalmente mujeres e destacaron el papel del equipo como la promoción de la mejora del usuario, mientras que la comprensión de que hay barreras que superar, como el espacio físico y la falta de camas de repuesto.

Palabras clave: Centro de atención psicosocial. Salud mental. Membros de la familia.


 

 

Introdução

Este artigo aborda a compreensão de familiares de pessoas em sofrimento psíquico a respeito do Centro de Atenção Psicossocial (Caps). Segundo Tenório (2002), em seu início, os Caps podiam ser definidos basicamente como serviços de atendimento-dia, nos quais o paciente passava o dia e à noite voltava para casa. Seu surgimento ocorreu em 1989, na cidade de São Paulo, com a inauguração do Caps Luis da Rocha Cerqueira. Neste momento, ao fim da década de 1980, surgiram diversos equipamentos de cuidado em saúde mental, como tentativas de se consolidarem como dispositivos eficazes na diminuição de internações e na mudança do modelo assistencial, tais como os Núcleos e Centros de Atenção Psicossocial (respectivamente Naps e Caps). Esses dois serviços foram criados oficialmente com a Portaria GM nº 224/1992. A partir dos anos 2000, a designação Naps é excluída da legislação, a qual passa a utilizar apenas a expressão Caps. A Portaria nº 336/GM, de 19 de fevereiro de 2002, define os Caps como "unidades que contam com uma população adscrita definida pelo nível local e que oferecem atendimento de cuidados intermediários entre o regime ambulatorial e a internação hospitalar, em um ou dois turnos de quatro horas, por equipe multiprofissional" (Ministério da Saúde, 2004, p. 12).

A partir de 2011, com a publicação da Portaria nº 3.088/2011 (Ministério da Saúde, 2011) pelo Ministério da Saúde, os Caps passam a integrar a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde. Esse documento delineia três modalidades de Caps: 1. Caps I, seja para pessoas com transtornos mentais graves e persistentes, seja para pessoas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, que podem funcionar em cidades com população superior a 20.000 habitantes; 2. Caps II, para a mesma população que o Caps I, mas em funcionamento em municípios com mais de 70 mil habitantes; 3. Caps III, para pessoas com transtornos mentais graves e persistentes que necessitam de cuidados contínuos, com funcionamento 24 horas por dia, mesmo aos fins de semana, e para cidades com mais de 200 mil habitantes. Cabe ressaltar que ainda existem os Caps Ad, para usuários de álcool e drogas e instalados em municípios com população superior a 70 mil habitantes (Caps ad II) ou mais de 200 mil (Caps ad III) e o Capsi, destinado ao cuidado de crianças e adolescentes com transtornos graves e persistentes ou em situação de uso de álcool e/ou drogas, para municípios com mais de 150 mil habitantes.

Em 1998 existiam 148 Caps distribuídos pelo país. Em 2014 estavam registradas 2.209 unidades (Ministério da Saúde, 2015), sendo que apenas três estados brasileiros não tinham um Caps 24h (RO, ES e MT) e outros três, da região Norte, ainda não haviam habilitado Capsi (AC, RR e TO). Com a ampliação do número de Caps e de outros equipamentos de cuidado, como os Serviços Residenciais Terapêuticos, e a expansão da Estratégia de Saúde da Família, o cuidado no território ganha ênfase, em detrimento de práticas segregatórias. Desse modo, com a perspectiva da desospitalização e da desinstitucionalização no campo da saúde mental, tornou-se de grande relevância o estudo da relação familiar-usuário, já que o crescimento da oferta de serviços extra-hospitalares implica em colocar a família não mais apenas como informante da condição do usuário, mas como cuidadora da pessoa em sofrimento psíquico. As famílias de usuários de serviços de saúde mental, muitas vezes, tiveram que abrir mão de sua própria existência para voltar toda sua atenção ao cuidado daquele que precisa inteiramente de dedicação, paciência e responsabilidade, tal qual destaca Rosa (2001).

A literatura especializada aponta que a família passou a ocupar um papel de destaque no que se refere ao cuidado da pessoa em sofrimento psíquico (Rosa, 2011, 2005; Pegoraro & Caldana, 2009, 2006; Pereira & Pereira Junior, 2003; Santin & Klafke, 2011). Especialmente no início do quadro de sofrimento psíquico, a família é a responsável pela busca de cuidado formal nos equipamentos de saúde e, para tal, deve dispor de recursos emocionais, temporais e econômicos para exercer essa tarefa (Rosa, 2005). Delgado (2014) destaca que identificar a existência de um problema com um familiar, mas não compreender de que se trata, mobiliza a família em busca de explicações sobre a origem da doença e por tratamento. Soma-se a essa necessidade de obter explicação sentimentos como angústia, impotência e tristeza. Cabe às equipes identificar as necessidades das famílias, esclarecer suas dúvidas e integrá-las ao plano de cuidados personalizado do usuário, isto é, ao Projeto Terapêutico Singular (Rosa, 2005; Rodovalho & Pegoraro, 2016).

Para Firmo e Jorge (2015), o cuidado ao usuário do Caps não implica em técnicas por parte das famílias, mas de criação de vínculo entre o cuidador e o usuário, para a corresponsabilização que se dá pela implicação da dupla em busca de bem-estar. Segundo esses autores, nas famílias as relações de poder, se observadas, podem revelar tutela e libertação, em tensionamento no cuidado diário à pessoa em sofrimento psíquico. Essa tutela se pode perceber na pesquisa de Constantinidis e Andrade (2015), quando os autores apontam para a função de proteção exercida pela família com a pessoa que é atendida no Caps. A atenção para que a pessoa não saia desacompanhada de casa e a necessidade de impor respeito imprimem nas famílias a função de proteção de seus membros, mas encontram-se "a serviço de defesa contra a dor e sofrimento que a loucura traz ao abalar o suposto equilíbrio da família e convidá-la a novos modos de existência" (Constantinidis & Andrade, 2015, p. 338).

Delgado (2014) aponta que frequentar esse serviço é percebido, por familiares, como um benefício que leva à diminuição das crises que causaram anteriormente a internação psiquiátrica do usuário. Por outro lado, também pode ser observada a necessidade de apoio emocional pelos familiares cuidadores em função da sobrecarga. Considerando o papel da família na busca por cuidados em saúde mental quando há identificação de problemas com o usuário, a necessidade de inserção da família na construção do Projeto Terapêutico Singular, a percepção do papel do Caps na diminuição das internações e a necessidade de apoio ao cuidador, o presente trabalho teve por objetivo identificar as concepções de familiares de usuários de um Caps II do Centro-Oeste do Brasil sobre o atendimento prestado por esse serviço.

 

Método

Esta pesquisa foi desenvolvida a partir da perspectiva qualitativa e tem caráter descritivo.

 

Participantes

Os participantes do estudo foram familiares de usuários de um Caps II localizado na região Centro-Oeste do Brasil. Os critérios de inclusão utilizados foram: a) ter disponibilidade para fornecer entrevista gravada em áudio; b) ser familiar de usuário em tratamento no Caps há seis meses pelo menos no momento da entrevista, o que pode permitir mais oportunidades para se familiarizar com a rotina do serviço. Foi critério de exclusão o familiar ser também usuário do Caps.

O Caps II funcionava há cerca de dez anos prestando atendimento a portadores de transtorno mental grave a maiores de 18 anos. Sua equipe era composta por cerca de 50 profissionais, incluindo corpo administrativo, técnicos de enfermagem e profissionais de nível superior. Esses profissionais dividiam-se em quatro Miniequipes de Referência e um Grupo de Acolhimento para novos usuários para o atendimento mensal de cerca de 400 usuários (Ministério da Saúde, 2004). O serviço funcionava de 2ª a 6ª feira entre 8 e 19 horas e o acolhimento a novos usuários seguia o modelo de "Porta aberta", ou seja, atendia-se à demanda espontânea. As atividades oferecidas envolviam consulta médica, grupos psicoterápicos, reunião de família, visitas domiciliares, atividades físicas, atividades artesanais, grupos de música, oficinas de desenho, pintura e grupos informativos.

 

Instrumento

Foi utilizado um roteiro de entrevista para familiares com questões sobre a caracterização do entrevistado (sexo, idade, parentesco com o usuário, profissão, renda, entre outros), frequência ao Caps para participação em atividades, efetividade do serviço de acordo com o quadro psiquiátrico do usuário e sugestões para o melhor funcionamento do Caps.

 

Procedimentos de coleta e análise de dados

O presente estudo, de natureza descritiva, foi desenvolvido a partir da perspectiva qualitativa. Após uma reunião no serviço de saúde para discutir a proposta, passou-se à fase de coleta de dados. Foram convidados para participar os familiares que estiveram no Caps entre os meses de maio e junho de 2012. Após o aceite, o familiar foi convidado a ler e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em uma sala reservada do serviço de saúde e a entrevista foi gravada em áudio. O número de participantes não foi determinado a priori, uma vez que essa definição depende da qualidade das informações colhidas em cada depoimento, assim como da profundidade e do grau de recorrência e divergência dessas informações (Duarte, 2002). De acordo com Duarte (2002, p. 144), em estudos qualitativos, à medida que as entrevistas são feitas, o entrevistador deve levantar e organizar "as informações relativas ao objeto da investigação e, dependendo do volume e da qualidade delas, o material de análise pode tornar-se mais consistente e denso". Portanto, coleta e análise são processos simultâneos nessa perspectiva, e quando categorias de análise, temas e padrões sobre a temática pesquisada podem ser identificados pelos pesquisadores, atinge-se certo grau de repetição, chamado de "ponto de saturação" (Duarte, 2002). Neste momento, a etapa caracterizada como trabalho de campo está finalizada. Neste estudo, o ponto de saturação foi atingido com 15 entrevistas.

Após a transcrição integral de todas as entrevistas, o material foi lido na íntegra e em seguida procedeu-se à leitura atenta de cada entrevista, de forma a se identificar os temas presentes em cada uma delas, seguindo-se as etapas estabelecidas por Bardin (1977) para análise de conteúdo temática, a saber: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados - a inferência e a interpretação. A pré-análise é uma etapa de organização dos dados, em que ocorre a leitura flutuante das transcrições para identificação dos primeiros indicadores da análise. A etapa de exploração do material refere-se ao início das unidades de registro com características comuns para a classificação e categorização. Por fim, na última etapa, definidas as categorias temáticas, é construído o diálogo com a literatura consultada.

 

Aspectos éticos

Este projeto encontra-se inserido em um plano de trabalho (que também investigou a percepção sobre o Caps a partir da óptica de usuários e equipe) aprovado por um Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos (Parecer CEP/SGC nº 1.840/2011). Foi respeitada a Declaração de Helsinki na elaboração do protocolo de pesquisa e condução do estudo. Todos os familiares entrevistados receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em duas vias, sendo uma entregue ao entrevistado e a outra permanecendo com o pesquisador. O termo garante o sigilo com relação à identidade dos entrevistados e o livre direito de escolher participar ou não do estudo. No presente artigo, os entrevistados foram denominados como E1, E2 até E15, de acordo com a ordem de realização das entrevistas, de forma a preservar a identidade dos participantes. Ao fim da análise de dados, foi agendada uma data para a devolutiva ao serviço de saúde, realizada com toda a equipe do Caps, com posterior discussão sobre o material analisado.

 

Resultados e discussão

Caracterização de entrevistados, diagnósticos dos usuários e trajetória por serviços de saúde mental

A idade média dos entrevistados foi de 53 anos. Conforme pode ser observado no Quadro 1, a maior parte dos familiares tinha entre 53 e 68 anos. Dos 15 entrevistados, a maior parte (F=11) é composta por mulheres, tendo como ocupação as atividades do lar; algumas eram costureiras, diaristas ou aposentadas. Entre os homens (F=4), apenas um encontrava-se trabalhando (como comerciante) e os demais eram aposentados. Quanto ao estado civil, duas pessoas eram divorciadas; duas, viúvas; três, solteiras; e oito, casadas. Com relação à religião, 11 entrevistados eram evangélicos; três, católicos; e um, espírita. Quanto ao parentesco, seis entrevistadas eram mães de usuários do Caps; duas eram irmãs; dois, pais; dois, maridos; duas, filhas; e uma única era esposa.

O Quadro 2 apresenta os diagnósticos psiquiátricos (segundo CID - 10) dos usuários: oito usuários com diagnósticos de Esquizofrenia (F20), três com diagnósticos de Transtorno Afetivo Bipolar (F31) e dois diagnósticos compatíveis com transtornos mentais decorrentes de lesão e disfunção cerebral e de doença física.

A Tabela 3 apresenta os dados referentes à trajetória desses usuários pelos serviços de saúde mental. Segundo os familiares entrevistados, nove usuários já haviam sido internados em hospitais ou clínicas psiquiátricas e três já haviam feito tratamento anterior em um Caps diferente daquele em que a coleta ocorreu.

Estudos pesquisados (Pereira & Pereira Júnior 2003; Santin & Klafke, 2011; Pegoraro & Caldana, 2006; Rosa, 2011; Batista, Bandeira, Quaglia, Oliveira & Albuquerque, 2013) apontaram um perfil sociodemográfico de familiares semelhante ao registrado na presente pesquisa, isto é, a grande maioria do sexo feminino e já em idade avançada. Essa presença dominante do sexo feminino ocupando o papel de cuidador corrobora uma representação social historicamente construída da mulher como aquela responsável pelo provimento do cuidado e ainda aquela que sempre está presente para ajudar nos momento de necessidade (Rosa, 2011). Com relação ao gênero, Batista et al. (2013) estudaram cuidadores dos gêneros masculino e feminino e identificaram que as mulheres investigadas eram, em sua maioria, casadas, responsáveis por usuários do sexo masculino e com diagnóstico de esquizofrenia, como no presente estudo.

No presente trabalho, a presença feminina no cuidado foi observada como sendo, muitas vezes, solitária, tal como na literatura (Kantorski, Jardim, Delpino, Lima, Schwartz & Heck, 2012), uma vez que algumas entrevistadas eram solteiras, divorciadas e/ou viúvas que cuidavam em tempo integral de seu familiar. Essa forma de cuidado aponta para uma necessidade de esses familiares abandonarem o emprego para se dedicarem por completo ao usuário ou ainda não exercerem atividades remuneradas externas ao lar, fato que pode ser comprovado pelos dados do Quadro 1, que aponta a grande maioria dos entrevistados sendo aposentados ou com algum tipo de trabalho possível de ser realizado no próprio domicílio (costureira, por exemplo). Foi também observada, em algumas entrevistas, a inconformidade diante dessa necessidade de deixar o trabalho para cuidar do familiar em sofrimento psíquico.

No que se refere ao grau de parentesco desses familiares, nota-se que a grande maioria era formada por pais, filhos e cônjuges, como identificado em estudo de Kantorski et al. (2012). Esses autores apontaram que os familiares se sentem responsáveis não só pelas atitudes e pela saúde do usuário, mas também com a obrigação de protegê-los.

 

Análise de entrevistas

A análise das entrevistas transcritas permitiu a formação das seguintes categorias: 1. Diferença entre Caps e clínicas psiquiátricas: oferta de atividades, menos medicação e acolhimento às famílias; 2. Atividades desenvolvidas paras as famílias no Caps; 3. Melhora do usuário após tratamento no Caps; 4. Sobrecarga familiar; 5. Necessidade de aprimoramento do Caps. A seguir as categorias serão descritas.

 

Diferenças entre Caps e clínicas psiquiátricas: oferta de atividades, menos medicação e acolhimento às famílias

Dentre os 15 entrevistados, 10 apontaram diferenças entre o Caps e outros serviços em que ocorre a internação psiquiátrica, como hospitais e/ou clínicas. A primeira diferença diz respeito ao uso excessivo de medicação, apontado como excessivo nas experiências em que os familiares, durante o período das visitas, acompanharam os usuários internados: "Quando era internado, eles só faziam dar remédio controlado para ele ficar toda vida meio doido, tapado. Aí melhora um pouquinho e manda embora [no Caps] melhorou muito" (E2). Outra entrevistada apontou que no momento da alta o usuário encontrava-se ainda excessivamente medicado. "[No hospital o] Psiquiatra vai lá [consultar], [o usuário] toma remédio e tudo, faz o tratamento, vem, vem meio dopado e tudo, melhora um pouco" (E14).

A atenção hospitalar, portanto, quase se resume à prescrição e administração de medicamentos. Além disso, existe o isolamento do usuário do mundo exterior, com contato restrito ao horário de visita.

Na clínica a pessoa fica presa, né, parece que lá ele [filho] ficou 26 dias fechado. Não podia sair. A gente ia só fim de semana visitar ele e tinha aquela hora certa. Chegava, a única coisa que ele falava era reclamar: quero ir embora! Falava que lá era lugar de doido e ele não estava doido. (E3)

Em contraponto, destaca-se como segundo ponto a liberdade existente no Caps, que permite o livre trânsito do usuário e a inserção em diferentes atividades. "O Caps é educativo. Educa a pessoa, a pessoa vai tendo mais comunicação com o povo, vai tendo mais conhecimento, vai tendo mais liberdade" (E14).

Os entrevistados também perceberam o Caps como um serviço que tem uma equipe maior e mais cuidadosa do que as equipes de serviços de internação conhecidas pelos entrevistados. Esse cuidado se traduz pela capacidade de oferecer diferentes atividades diariamente, tais como rodas de conversa, acolhimento, atendimento em grupos e não apenas medicação.

Porque aqui tem atividade para eles [usuários]. Tem o acolhimento, e aí vai. Lá é só internar e medicamento, e ali eles ficavam lá, presos lá, sem ter direito, né? Aqui, não. Aqui tem o grupo. Eles estão cantando, fazendo atividade, tem mais liberdade. Isso aí que tem de melhor [no Caps]. (E6)

Olha, eu não posso reclamar, não. Ela tem vindo internada. Nos dois hospitais psiquiátricos o atendimento é muito bom, mas no meu ver a diferença é que aqui, aqui assim, é mais equipado em termos de pessoas... Eles ficam mais em cima, eles tem mais cuidado. Inclusive essas reuniões, rodas de conversa, essas terapias que tem aqui lá não tem, lá e mais só medicamento, né? Então tem essa diferença. (E4)

Além disso, o serviço também acolhe as famílias. "De diferente que eu vejo é porque, assim, aqui [Caps] você tem um tratamento no dia a dia, e acolhedor à família também, e nas clínicas [psiquiátricas] tem só no período que está a pessoa internada. Passou esse período, acabou" (E10).

Também na literatura, muitos familiares fazem um contraponto entre o Caps e as experiências de internação, pois nesta perde-se o direito à liberdade e à tão almejada autonomia (Mello & Furegato, 2008). A internação é então vista quase sempre de maneira negativa, que se tenta evitar ao máximo, e guarda relação com o modelo manicomial. Como destaca Amarante (2017), a privação de liberdade e a necessidade de vigilância são marcas do hospital psiquiátrico. Ainda que a internação psiquiátrica tenha se dado a partir da Lei nº 10.216 (Amarante, 2017), que proíbe internações de longo prazo, as famílias percebem esse recurso pela lógica manicomial.

 

Atividades desenvolvidas para as famílias no Caps

Com relação à participação da família no Caps, esta se dá especialmente pelo espaço das reuniões de família. Eles ressaltaram também a importância da reunião de família no tratamento como uma forma de auxílio em como lidar com o usuário em determinados momentos.

[...] porque cada pessoa tem a sua opinião, a sua sugestão. Ali [reunião de família] é muito bom, porque a gente vê que nesses momentos, nessas horas, talvez a doente é a gente. A gente que tem que saber lidar com eles, tem que tá no lugar deles. Porque eles... para eles tá tudo normal. Agora nós é quem sentimos aquilo, sabe? O [filho] pode quebrar alguma coisa aqui, uma cadeira, tudo para ele é normal, mas eu é quem vou sentir aquilo, então a doente sou eu, eu tenho que tratar de mim para tratar dele também, para conviver com ele. (E14)

Além da possibilidade de receber orientações sobre como lidar com o usuário e compartilhar sentimentos com outros familiares nas reuniões de família, o caráter descontraído e festivo de alguns encontros é um momento de lazer "[...] as reuniões são bem aproveitáveis, principalmente as festinhas, né, então eu acho que tudo faz parte, eu achei ótimo" (E13).

Por outro lado, alguns familiares ressaltaram nunca ter participado ou ter ido, apenas algumas vezes, às atividades do Caps devido à falta de tempo, em virtude do trabalho ou mesmo de atividades de cuidado para com o usuário. "Reunião de família eu já participei e não tem como eu estar aqui, porque eu trabalho em casa também, né? Porque ele não trabalha, não tem nenhuma renda" (E9).

As reuniões de família foram reativadas no Caps em meados de março de 2012. Essas reuniões tinham como objetivo oferecer um espaço de escuta e fala aos familiares em relação às suas angustias e sua exaustão no exercício do cuidado diário, ou seja, tinham como objetivo cuidar do cuidador. Esse apoio oferecido aos familiares ocorria por meio das reuniões de família, na própria consulta médica ou nas visitas domiciliares, foi algo apontado como estratégia de atendimento no Caps por diversos autores (Pegoraro, 2009; Santin & Klafke, 2011; Rosa, 2005; Camatta & Schneider, 2009; Mello & Furegato, 2008; Duarte & Kantorski, 2011). Segundo Firmo e Jorge (2015), os grupos de família possibilitam não só receber orientação com relação a atividades do cotidiano, mas também sobre sua participação no universo social, como denominam os autores. Desse modo, essa atividade contribui para o processo de reabilitação psicossocial dos usuários, ao potencializar a construção de vínculos e a reinserção social. Em nosso estudo, as reuniões de família, segundo os entrevistados, tem a principal função de orientação e apoio emocional, no entanto, deve ser destacado que o Caps é um serviço de passagem, e dar suporte para a participação nesse universo social (Firmo & Jorge, 2015) é uma ação de extrema importância.

 

Melhora do usuário após tratamento no Caps

Em relação a esta categoria, pode-se perceber claramente que todos os entrevistados apontaram algum tipo de melhora após o tratamento iniciado no Caps, tais como o convívio do dia a dia e nas relações interpessoais, sendo percebida não só pelo entrevistado, mas também por outros familiares.

Melhorou muito, muito mesmo. Até para nós, assim, em casa no contexto com ela. Porque ela era, assim, muito arredia, sabe? Mal educada, mas coisa assim que vem de casa e devido ao problema dela... então aqui melhorou muito mesmo, até meus irmãos os outros que moram aqui notaram. (E1)

Outra mudança percebida pelos entrevistados se refere à menor impulsividade e menor agressividade do usuário.

Ela está mais calma, está mais tranquila. Antigamente falava as coisas com ela, ela não escutava, não dava ouvido. Agora não. Agora quando ela quer fazer uma coisa mesmo, que ela coloca na cabeça, ela tem que fazer, agora eu converso com ela. E já amenizou bastante, assim aquela euforia dela: "eu vou fazer e pronto"! (E8)

Melhorou, porque já teve muitas conversas com ele [usuário]. Até os remédios mesmo. E ele melhorou bastante, porque ele já foi muito agressivo, brigava muito e gostava de pegar faca, bater na porta. Hoje ele não faz isso mais. Às vezes ele fica nervoso, mas daí com 10 minutos, ele já consegue se controlar, e já passa já. Não fica mais igual era antes. (E9)

Outras mudanças apresentadas pelos usuários foram apontadas por esses familiares, tais como a melhora nas relações interpessoais, uma diminuição da agressividade e impulsividade, aspectos esses que também são apresentados por outros autores (Camatta & Schneider, 2009; Mello & Furegato, 2008; Rosa, 2011).

Além de maior possibilidade de diálogo com o usuário, um familiar também apontou que houve melhora por o usuário não ter sido mais internado. "Mudou bastante, não precisou mais ser internado" (E6).

O trabalho prestado pela equipe do serviço é percebido de maneira positiva pelos familiares, pois se sentem acolhidos em seus sofrimentos, nas suas angústias e, dessa maneira, eles percebem que não existe uma atenção focada unicamente no cuidado do usuário, mas também em toda a família. Portanto, percebe-se que o cuidado ao familiar cuidador é de fundamental importância na manutenção de um quadro estável (Rosa, 2005; Duarte & Kantorsky, 2011). Assim sendo, a literatura (Ferreira, Sampaio, Souza, Oliveira & Gomes, 2017; Willrich, Kantorski, Chiavagatti, Cortes & Antonacci, 2013) aponta que a equipe do Caps deve trabalhar no sentido de sempre tentar promover essa inserção da família no tratamento do usuário, criando um vínculo satisfatório que promova uma melhora do usuário.

 

Sobrecarga familiar

Esta categoria apresenta algumas falas dos familiares referentes à sobrecarga que o cuidado prestado ao usuário representa em suas vidas. No papel de cuidadores, esses familiares declararam experimentar muitas vezes uma grande sobrecarga, seja ela de ordem emocional/psicológica, prática, seja financeira, como apontam inúmeros estudos (Rosa, 2011; Pegoraro & Caldana, 2006; Pereira & Pereira Júnior, 2003; Santin & Klafke, 2011; Nolasco, Bandeira, Oliveira & Vidal, 2014; Bandeira, Tostes, Santos, Lima & Oliveira, 2014; Eloia, Oliveira, Eloia, Lomeo & Parente, 2014).

Com relação à sobrecarga prática, o cansaço e o desgaste relativo à saúde do cuidador pela responsabilidade diurna e noturna pode, segundo os entrevistados, levar ao adoecimento. "Sobrecarregado, a gente adoece. Eu mesmo tive esse problema" (E1). "Eu tô cansada, assustada, eu queria assim umas férias, mas eu vou abandona meus filhos, vou embora? [...] porque eu sou plantão 24h"(E2). Apesar do cansaço, o familiar entende que não pode abandonar seu papel, que também passa pela parte de higiene e alimentar. "[...] porque ele [usuário] depende de mim 24 horas. Então, é roupa, é comida, é para toma banho, para tudo ele depende de mim" (E9).

Ser "plantão 24 h", expressão utilizada por uma entrevistada, sugere a necessidade de estar sempre alerta no cuidado e acaba gerando uma sobrecarga de ordem prática, em vigilância em tempo integral, principalmente nos momentos de crise. Rosa (2011) destaca que o familiar cuidador, em muitos momentos, precisa estar em prontidão 24 horas por dia.

Como afirma Rosa (2011, p. 286), "prover cuidados em determinados períodos, ou para certos cuidadores, é estar de prontidão 24 horas para o PTM", e esse tipo relato ficou bastante claro na fala da seguinte entrevistada: "Porque eu sou plantão 24h." (E2). O que pode ser percebido, segundo a literatura (Pegoraro & Caldana, 2006; Bandeira et al., 2014), na dependência física estabelecida entre cuidador e usuário em determinados momentos, tais como administração de medicação, cuidado da higiene corporal, acompanhamento em consultas médicas, diálogo para conter agitação do usuário, evitar tentativas de fuga ou suicídio.

Além desse estado de alerta, o adoecimento de uma pessoa da família pode gerar gastos muitas vezes não esperados por toda a família, o que se soma à falta de renda por parte dos usuários do Caps, podendo implicar em sobrecarga financeira. "Eu trabalho em casa também, porque ele [usuário] não trabalha, não tem nenhuma renda. Está na justiça para ver se consegue aposentar, então lá em casa é só eu que trabalho, então trabalho em casa" (E9). Neste estudo, a pessoa em sofrimento psíquico em tratamento no Caps, muitas vezes, encontrava-se fora do mercado de trabalho, o que implicava na necessidade de que a família pudesse prover os aspectos financeiros, além de afastar-se do trabalho para realizar o cuidado, em alguns casos, ou diminuir a carga horária semanal, em outros, implicando em sobrecarga financeira.

A sobrecarga no cuidado no momento das entrevistas leva o familiar entrevistado a vislumbrar o futuro e preocupar-se com ele. Uma vez que muitos já são pessoas mais velhas, mães em sua maioria, que não sabem o que acontecerá com o usuário após sua morte, o que acaba por causar muita angústia. "[...] Mas a gente preocupa, preocupa o dia que eu for embora, né? Como que ele fica? Já procurei um lugar assim, pra ele ficar, pra eu deixar ele lá pra ele desacostumar de mim, mas não é fácil, né?" (E5). A preocupação com o futuro, somada à percepção de que não há ajuda para o cuidado do usuário no presente, indicam sobrecarga psicológica/emocional.

É só eu, eu num tenho marido, num tenho irmão, num tenho outro filho que ajude ele, [...] isso aí que eu tô me sentindo triste, ai à noite eu sinto assim uma tristeza, o coração assim, um aperto, falta de ar parece que eu vou morrer naquela hora, porque num tem quem acudir. Eu tenho só Deus comigo, aí eu faço minhas orações pra me dar forças. (E2)

A idade avançada de muitos entrevistados apresenta outro ponto importante, ainda, referente à sobrecarga, muitas vezes decorrente de uma vida dedicada ao cuidado de um familiar. Essa angústia, fruto das incertezas que cercam o futuro do familiar, é experimentada por muitos entrevistados, pois eles, como responsáveis únicos pelo cuidado, na maioria das vezes, com o passar dos anos tornam-se cada vez mais conscientes de sua própria finitude e as preocupações tornam-se então inevitáveis. Segundo Pegoraro e Caldana (2006), os cuidadores encontram-se muitas vezes com a saúde debilitada, mas ainda sim são chamados a prestar esse cuidado, uma vez que se não o fizer não há quem o faça. Em nosso estudo, foi possível perceber na fala de muitos entrevistados, principalmente na fala de mães de usuários, o desgaste da saúde física. Para Rosa (2011), os familiares renunciam, muitas vezes, ao cuidado com a sua própria saúde em prol de uma possível melhora no quadro do usuário. Além disso, há a percepção de que o cuidado seja exclusivamente de responsabilidade por ser mãe, como uma tarefa obrigatória e imutável, que cabe apenas a ela até o fim da vida.

Esse é um tema abordado de maneira pontual por algumas mães responsáveis pelo cuidado, isto é, quem cuidará do filho(a) quando ela não estiver mais por aqui. Esse fato é gerador de grande angústia entre os familiares, o que acaba por culminar no surgimento de uma sobrecarga psicológica/emocional (Pegoraro & Caldana, 2006; Rosa, 2011; Cardoso, Vieira, Ricci & Mazza, 2012; Filho, Souza, Parente & Martins, 2010; Nolasco et al., 2014; Bandeira et al., 2014; Eloia et al., 2014). Some-se a isso a rede de apoio de pequeno porte ou por vezes inexistente, que implica em mais sobrecarga, gerando angústia, dor e tristeza por não ter ninguém com quem contar na provisão de cuidados. Embora a sobrecarga advinda do cuidado solitário seja uma queixa de muitas mães, elas, ao reivindicar a participação de outros familiares nesse cuidado, têm dificuldade em dividir esse encargo com alguém que possa auxiliá-la.

 

Aprimoramento do Caps

Surgiram ao longo das entrevistas sugestões referentes à mudança deste Caps, que é do tipo II, para Caps III, isto é, uma transformação que surge como mais um recurso que o serviço poderia oferecer no sentido de proporcionar uma atenção integral àquele usuário, evitando uma possível internação psiquiátrica. "No Caps é o seguinte, se tivesse um Caps como eles estavam com plano de fazer, como nós vimos na reunião de família, eles falaram isso, um Caps 24h, isso seria uma coisa muito boa" (E7).

Por outro lado, em um dos depoimentos, foi possível perceber que noção de hospitalidade noturna não foi apreendida pelo familiar, pois a vantagem de um Caps III seria internar o usuário por um breve período.

Ter aquele lado assim do Caps pegar, chegar assim ao ponto da pessoa não querer internação e o Caps fazer a internação por ver que o paciente tá precisando da internação [...]. É, poderia ser aqui [a internação]. Interna ele, vamos supor, assim, dois dias em observação para ver se ou encaminhá-lo até a clínica mesmo. (E10)

É importante ressaltar que para a criação de um Caps III, serviços que funcionam 24 horas diariamente, inclusive em fins de semana e feriados (Ministério da Saúde, 2004), é necessário que haja uma população acima de 200.000 mil habitantes, condição essa que o município em que o Caps se localizava possuía no momento da coleta, segundo o Censo 2010 realizado pelo IBGE (2010). Tendo em vista que a necessidade de que um dos Caps do município se transformasse em tipo III foi debatida em assembleia, conforme cartazes que estavam no serviço durante a coleta de dados, é possível destacar que ter informações sobre a política de saúde mental é importante para os familiares, mas, por outro lado, o destaque do Caps 24 horas para a possibilidade de internar usuários para observação pode guardar relação com a rede de apoio pouco expressiva dos cuidadores e a sobrecarga experienciada.

Outros entrevistados apontaram a questão de a estrutura física ser um pouco aquém do necessário devido à grande demanda de usuários.

[...] a área física, talvez um pouquinho resumida pelo número de pessoas que frequentam. Também não sei exatamente quantas pessoas, mas o que a gente vê andando por aí é bastante, então talvez a estrutura física um pouco acanhada, mas eu acredito que tá no caminho certo, tá 100% aqui. (E13)

No estudo de Mello e Furegato (2008), familiares também apontaram a inadequação do espaço físico do Caps em relação à sua demanda. Essa colocação remete ao conceito de ambiência, definido como "tratamento dado ao espaço físico, entendido como espaço social, profissional e de relações interpessoais que deve proporcionar atenção acolhedora, humana e resolutiva, considerando elementos que atuam como catalisadores da inter-relação homem × espaço" (Ministério da Saúde, 2004, p. 5). Portanto, a fala dos cuidadores a respeito do espaço do Caps aponta que há ajustes necessários no local onde o serviço está instalado e que poderiam aumentar a qualidade do atendimento.

As categorias aqui descritas revelam familiares que valorizam o serviço de atenção psicossocial, encontram-se sobrecarregados na tarefa diária de cuidar, tem uma visão crítica sobre o excesso de medicação administrado durante internações dos usuários em clínicas e hospitais, e percebem que as múltiplas atividades oferecidas pelo Caps o diferenciam de serviços de internação.

 

Considerações finais

Ao fim deste estudo, pôde-se concluir que os objetivos inicialmente propostos foram atingidos, isto é, identificar as concepções dos familiares de usuários de um Caps II sobre o atendimento prestado por esse serviço. Os entrevistados reconhecem como positivo o tratamento realizado no Caps e percebem a diferença entre esse serviço substitutivo e o modelo tradicional manicomial, destacando o papel da equipe como promotora da melhora do usuário, sem deixar de compreender que há barreiras a serem vencidas, como o espaço físico e a inexistência de leitos de retaguarda (Caps III). É importante destacar a presença marcante de mulheres no cuidado informal em saúde mental, responsabilizando-se pelos usuários em momentos de crise e no seu dia a dia, o que implica na construção de formas de apoio às próprias cuidadoras para promoção de sua saúde mental.

Trata-se de um estudo realizado em um único Caps, o que certamente é um dos limites da pesquisa. Outro limite a ser destacado é que apenas familiares que estavam no serviço foram convidados para participar da pesquisa. Sugere-se, dessa forma, aos pesquisadores da área, a realização de estudos com familiares que não costumam ir ao Caps para compreender o que pensam sobre a forma de cuidado oferecido, bem como entender suas necessidades e motivos que os afastam ou não permitem maior aproximação com o Caps.

Por fim, destacamos que a família não é usuária do serviço, mas está diretamente ligada a ele e à sua equipe, por ser fundamental para promover a melhora da pessoa em situação de sofrimento psíquico grave ao fornecer-lhe suporte. Além disso, a família transita pelo serviço em diferentes situações, como no acompanhamento nas consultas médicas ou reuniões de família, e a sua percepção sobre o funcionamento do Caps deve ser alvo de reflexão, bem como dado que pode auxiliar no aprimoramento das políticas de saúde mental.

 

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Recebido em 26/05/2016
Aprovado em 09/04/2018

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