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Pesquisas e Práticas Psicossociais
versão On-line ISSN 1809-8908
Pesqui. prát. psicossociais vol.14 no.2 São João del-Rei abr./jun. 2019
Grupos psicoeducativos com familiares dos usuários de um Centro de Atenção Psicossocial
Psychoeducational groups with family of users of a Psychosocial Care Center
Grupos psicoeducativos con familiares de usuarios de un Centro de Atención Psicosocial
Débora Jerônima ArantesI; Raíssa PicassoII; Elisa Alves da SilvaIII
IMestre em Psicologia Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). E-mail: deborajeronima@hotmail.com
IIBacharela e Licenciada em Psicologia pela Universidade Federal de Goiás (UFG). E-mail: raissa.picasso@hotmail.com
IIIDoutora em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília (UnB). E-mail: elisapsi@gmail.com
RESUMO
O artigo relata a experiência vivenciada em 2015, no estágio obrigatório supervisionado em Psicologia. O estudo de campo ocorreu em um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) de Goiânia - GO, sendo realizado com base no método observacional. Foi identificada demanda referente à atenção aos familiares dos usuários do Caps, sendo desenvolvida intervenção de grupos psicoeducativos com esse público. O objetivo foi proporcionar um espaço de troca de experiências, informações e elaboração das angústias dos familiares com relação aos processos de cuidado. As vivências teórico-práticas e reflexões suscitadas pela experiência possibilitaram o reconhecimento de resistências e avanços no campo da saúde mental psicossocial, destacando a importância do acolhimento das demandas dos familiares e o potencial do grupo psicoeducativo no processo de enfrentamento e corresponsabilização em saúde mental.
Palavras-chave: Psicologia. Saúde mental. Caps. Familiares. Grupo.
ABSTRACT
The article reports the experience gathered in 2015, in the mandatory and supervised psychology internship. The field study was carried out in a Psychosocial Care Center (Caps), in Goiânia - GO, based on the observational method. It was identified a demand related to the care of family members of Caps users, being developed intervention of psychoeducational groups with this public. The objective was to provide a space for the exchange of experiences, information and elaboration of the anxieties of family members regarding the care processes. The theoretical-practical experiences and reflections provoked by the experience enabled the recognition of resistance and advances in the field of psychosocial mental health, highlighting the importance of welcoming the demands of family members and the potential of the psychoeducational group in the process of confrontation and co-responsibility in mental health.
Keywords: Psychology. Mental health. Caps. Family. Group.
RESUMEN
El artículo relata la experiencia vivida en 2015, en prácticas obligatoria supervisada en Psicología. El estudio de campo ocurrió en un Centro de Atención Psicosocial (Caps), de Goiânia - GO, realizándose con base en el método observacional. Se identificó demanda referente a la atención a los familiares de los usuarios del Caps y se desarrolló una intervención de grupos psicoeducativos con ese público. El objetivo fue proporcionar un espacio de intercambio de experiencias, informaciones y elaboración de las angustias de los familiares con relación a los procesos de cuidado. Las vivencias teórico-prácticas y reflexiones suscitadas por la experiencia posibilitar el reconocimiento de resistencias y avances en el campo de la salud mental psicosocial, destacando la importancia de acoger las demandas de los familiares y el potencial del grupo psicoeducacional en el proceso de enfrentamiento y corresponsabilidad en salud mental.
Palabras clave: Psicología. Salud mental. Caps. Familia. Grupo.
Introdução
Este trabalho consiste em um relato de experiência, tendo por objetivo descrever a concretização dos aprendizados teórico-práticos e as reflexões suscitadas por meio de uma intervenção psicoeducativa com familiares dos usuários de um Centro de Atenção Psicossocial (Caps). As experiências vivenciadas ocorreram no primeiro e segundo semestres letivos do ano de 2015, durante a realização do estágio curricular obrigatório, o qual é pré-requisito para a conclusão do curso de Psicologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), Campus Goiânia, tendo sido supervisionado por um professor da instituição de ensino e por um profissional psicólogo do Caps onde ocorreu a atuação.
A prática do estágio se desenvolveu em um Caps, tipo II da cidade de Goiânia - GO, mediante parceria entre a Universidade e a Secretaria Municipal de Saúde (SMS). O Caps era de pequeno porte, com funcionamento diurno e o público-alvo eram adultos com intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e/ou persistentes.
Este relato de experiência consiste em um estudo de campo fundado no método observacional, tendo como técnica a observação participante (Gil, 2008). Desse modo, primeiramente objetiva-se apresentar as observações realizadas no campo e descrever o projeto de intervenção elaborado e executado para, posteriormente, delinear as reflexões suscitadas pela experiência.
As reflexões são advindas com aporte do paradigma psicossocial e antimanicomial de assistência e cuidado em saúde mental. De modo inverso ao modelo biomédico psiquiátrico, o paradigma psicossocial preconiza que a doença seja colocada entre parênteses, mudando o
enfoque para o sujeito, sua história de vida e os processos sociais envolvidos na vivência do sofrimento psíquico. No âmbito da assistência, investe-se na mobilização do sujeito como participante do processo de tratamento, propondo uma implicação subjetiva e a parceira das instituições intersetoriais e sociais, como a família, a cultura e a comunidade, no processo de cuidado (Costa-Rosa, 2000; Amarante, 2013).
A partir da observação e acompanhamento diário de todas as atividades que eram realizadas no serviço, as estagiárias perceberam que não havia uma proposta sistematizada de atendimento às famílias dos usuários do serviço. Sendo assim, com o intuito de contribuir nesse âmbito, foi proposto e desenvolvido um projeto de intervenção consistindo na realização de grupos psicoeducativos com os familiares dos usuários do Caps.
Os grupos psicoeducativos têm como objetivo conhecer as crenças, ideias e sentimentos de seus participantes, visando à reflexão das experiências e a mudança da realidade, por meio de aspectos educativos e da estimulação de novas aprendizagens e da comunicação no grupo (Afonso, 2006). Seguindo a estrutura de grupos psicoeducativos, o projeto de intervenção desenvolvido teve como intuito proporcionar um espaço de troca de experiência, de informações e de elaboração das angústias e questões dos familiares com relação aos processos de cuidado do outro e de si.
A experiência do estágio proporcionou uma compreensão do campo da saúde mental no município de Goiânia, além da formação profissional, a partir das atividades e intervenções desenvolvidas no serviço, com a coordenação supervisionada dos grupos psicoeducativos com os familiares dos usuários do Caps.
Reforma Psiquiátrica, modelo psicossocial e os Caps
O paradigma de crítica ao modelo psiquiátrico clássico1 emergiu no Brasil na década de 1970, consistindo no Movimento da Reforma Psiquiátrica. Esse período foi marcado pelo processo sociopolítico de redemocratização do país, o qual influenciou e se inter-relacionou ao Movimento da Reforma Psiquiátrica, que denunciou e requereu o resgate dos direitos e cidadania do "louco" (Tenório, 2002). Destarte, a Reforma Psiquiátrica passou a considerar "inaceitável a utilização da psiquiatria como instrumento de segregação e controle social. Desvincula-se do foco na doença mental para apropriar-se da atenção psicossocial como meio de resgate da cidadania e autonomia do sujeito que sofre" (Tavares, Rabelo & Faria, 2009, p. 21).
Ao longo do processo histórico, o Movimento da Reforma Psiquiátrica e a luta dos atores sociais consolidou-se como antimanicomial. Assim, para inclusão e reabilitação social das pessoas com transtornos mentais, passou-se a reivindicar a desinstitucionalização psiquiátrica, a criação de serviços substitutivos e a constituição da atenção psicossocial e comunitária como modelo de cuidado em saúde mental (Brasil, 2004).
Um dos novos serviços substitutivos criados pelo processo da Reforma Psiquiátrica foram os Centros de Atenção Psicossociais (Caps). Com a consolidação do modelo psicossocial, integrado à rede do Sistema Único de Saúde (SUS), esse serviço se tornou um dos dispositivos estratégicos da Reforma Psiquiátrica, possibilitando o deslocamento do cuidado para fora dos hospitais e em direção à comunidade. Os Caps são regulados pela Portaria nº 336/GM, de 19 de fevereiro de 2002, e compõem a Rede de Atenção Psicossocial - Raps (Brasil, 2011). Por definição,
têm a missão de dar um atendimento diuturno às pessoas que sofrem com transtornos mentais severos e persistentes, num dado território, oferecendo cuidados clínicos e de reabilitação psicossocial, com o objetivo de substituir o modelo hospitalocêntrico, evitando as internações e favorecendo o exercício da cidadania e da inclusão social dos usuários e de suas famílias. (Brasil, 2004, p. 12)
As pessoas atendidas nos Caps são aquelas que apresentam intenso sofrimento psíquico que lhes impossibilita de estabelecer laços sociais e realizar seus projetos de vida (Brasil, 2015). São, preferencialmente, pessoas com transtornos mentais severos e/ou persistentes, incluindo os transtornos relacionados às substâncias psicoativas (álcool e outras drogas) e também crianças e adolescentes com transtornos mentais.
Os Caps funcionam a partir do trabalho em equipes multiprofissionais e podem oferecer diferentes tipos de atividades terapêuticas aos usuários, que objetivam uma maior integração social e familiar, a manifestação de sentimentos e problemas, o desenvolvimento de habilidades corporais, a realização de atividades produtivas e o exercício coletivo da cidadania. A pessoa que procurar o serviço deve ser acolhida e escutada em seu sofrimento para então ser possível a elaboração e desenvolvimento do projeto terapêutico singular.
Assim, os recursos terapêuticos do Caps vão além do uso de consultas e de medicamentos, e caracterizam a clínica ampliada. Essa ideia de clínica vem sendo (re)construída nas práticas de atenção psicossocial, provocando mudanças nas formas tradicionais de compreensão e de tratamento dos transtornos mentais (Brasil, 2004).
Família e psicoeducação
No modelo de atenção psicossocial em saúde mental, a clínica se faz no território, ou seja, no local que o sujeito vive; em domicílio, com a "comunidade social", a família e os conhecidos, com os quais os sujeitos em sofrimento psíquico compartilham a vida. Assim, o modelo de assistência psicossocial é territorial e comunitário, efetivando-se por meio dos serviços da rede de atenção à saúde mental e saúde básica (Brasil, 2004; Brasil, 2015).
Os Caps têm, como uma das atribuições, a realização do atendimento à família, que abrange "ações voltadas para o acolhimento individual ou coletivo dos familiares e suas demandas, que garantam a corresponsabilização no contexto do cuidado, propiciando o compartilhamento de experiências e de informações" (Brasil, 2015, p. 12). O trabalho com a família é uma das estratégias da assistência psicossocial, de ação conjunta na terapêutica, sendo uma via indireta para manter o quadro estável do usuário, evitando as internações psiquiátricas e contribuindo para a integração e reinserção social dos usuários de saúde mental.
Segundo Silva (2007), é a dinâmica da interação psíquica entre os familiares e o usuário da saúde mental que produz a maior parte dos fatores a serem cuidados nos processos terapêuticos dos usuários. Destaca-se, desse modo, a importância de os serviços substitutivos compreenderem a dinâmica familiar dos usuários e de se realizar um trabalho em conjunto com as famílias, percebendo-as como parceiras nos cuidados e atenção e não meramente como responsáveis e/ou culpadas pelos processos de adoecimento psíquico de seu membro.
Silva (2007) também destaca a necessidade da mudança no modo de relação da equipe de assistência e a família, estabelecendo-se uma relação de confiança. Outro aspecto a ser trabalhado pela equipe são as relações vinculares entre o usuário e seus familiares, para que estes realizem os cuidados fundados em uma responsabilidade vincular e não apenas em uma atribuição de responsabilidade normativa e moral.
Nesse contexto, na área da saúde, um dispositivo de trabalho muito utilizado são os grupos. No trabalho com famílias, uma forma largamente utilizada é o grupo psicoeducativo (Afonso, 2006; Nicoletti, Gonzaga, Modesto & Cobelo, 2010); pois, conforme Lemes e Neto (2017), a intervenção psicoeducacional é importante para dar suporte e apoio ao cuidador.
Segundo Afonso (2006), os grupos psicoeducativos têm como foco de trabalho o enfrentamento de uma dada problemática. A autora afirma que tal enfrentamento se dá principalmente pelos aspectos educativos que proporcionam novas informações, questionamentos dos mitos e preconceitos e a reflexão da experiência, podendo culminar na mudança das representações que as pessoas fazem da problemática.
Os grupos psicoeducativos se constituem por membros que compartilham dificuldades/problemáticas semelhantes, pois "[....] vão além da transmissão de informação, criando um ambiente que acolhe os diversos sentimentos que surgem ao lidar com um indivíduo portador de uma doença, e que considera as questões econômicas, sociais, culturais que influenciam as decisões" (Benute et al., 2001, citado por Cerdeira & Villela, 2011, p. 7).
Comumente os familiares dos usuários de saúde mental apresentam cansaço físico e emocional, assim como um provável isolamento social devido à sobrecarga em seu papel de cuidadores. A família se sente mai bem preparada para lidar e cuidar do sujeito em sofrimento psíquico quando recebe informação adequada sobre a doença e seu tratamento, além de aconselhamento familiar que ofereça apoio emocional e conselhos práticos (Pereira & Gomes, 2012).
A partir do exposto, evidencia-se a importância da realização de grupos psicoeducativos com esse público, tendo em vista desenvolver um espaço específico para as demandas dos familiares dos usuários de saúde mental com o intuito de troca de experiências, discussão de informações, proposição de um espaço de fala e acolhimento dos diversos sentimentos, como angústias e ansiedades, que perpassam a prática cotidiana de cuidado.
Método: observações do/no campo e projeto de intervenção
O estágio supervisionado consiste em um processo de formação teórico-prática. A ação se estabeleceu como um estudo de campo de base social, qualitativa e observacional. Conforme Minayo (2016), a pesquisa qualitativa se aprofunda no mundo dos significados, cujo nível de realidade não é visível, precisa ser exposto e interpretado, primeiramente pelos próprios pesquisadores e, posteriormente, por um processo compreensivo e interpretativo contextualizado.
Para compreensão do contexto do campo, foi utilizada a técnica da observação participante. Os dados foram levantados em dois semestres letivos do ano de 2015, sendo registrados em diários de campo, nos quais eram anotadas as impressões e experiências vivenciadas diariamente para posterior discussão nas supervisões de campo e de ensino.
As atividades do estágio se iniciaram com a proposta das estagiárias acompanharem todas as atividades do serviço (grupos, oficinas, consultas, acolhimentos e reuniões) realizadas nos dois turnos de funcionamento do Caps, matutino e vespertino. A equipe técnica ativa era composta por três médicos, seis psicólogas, duas arteterapeutas, uma farmacêutica, uma artista plástica, duas enfermeiras, duas educadoras físicas, uma terapeuta ocupacional, três assistentes sociais, uma musicoterapeuta e uma gestora geral.
Com relação à estrutura física, o Caps funcionava em um sobrado, consistindo em uma casa alugada pela prefeitura para o funcionamento do serviço e, desse modo, não tinha as devidas adequações para o funcionamento de um Caps. A estrutura tinha uma área frontal que funcionava como sala de espera. Adentrando no prédio, encontrava-se a cozinha e duas salas sem divisórias: a primeira acomodava a recepção, funcionários administrativos e a gestão, e a outra sala, a equipe técnica. A maior parte das atividades com os usuários do serviço era realizada no segundo andar, cujo único acesso era por uma escada. No andar superior, havia duas salas amplas para realização de grupos e oficinas e duas salas menores, onde eram realizados acolhimentos e consultas. No fundo do sobrado, havia uma área destinada ao refeitório e também espaço livre com uma piscina pequena.
O sobrado era antigo, necessitava de reformas e não era amplo o suficiente para o funcionamento do serviço, pois faltava uma área maior de convivência e mais salas para a realização das atividades. Desse modo, os horários e funcionamento das atividades deviam se adequar à disponibilidade de uso das salas e espaços.
A equipe técnica do Caps se organizava em quatro equipes de referência, sendo que, quando o usuário procurava o serviço, era direcionado à equipe responsável por sua região territorial. Além das atividades de cada uma das quatro equipes, cada trabalhador técnico realizava atividades individuais ou em duplas, propondo grupos e oficinas. O Caps tinha uma gestora geral e grande parte das decisões sobre o funcionamento do serviço era discutida em equipe em uma reunião que ocorria semanalmente.
Algumas das atividades acompanhadas pelas estagiárias de Psicologia foram: 1. Escuta. 2. Acolhimento. 3. Grupos de medicação. 4. Grupos psicoterápicos. 5. Grupos projetivos. 6. Grupo de cidadania. 7. Grupo para usuários com diagnóstico de esquizofrenia, denominado "ouvidores de vozes". 8. Oficinas artísticas. 9. Oficinas corporais. 10. Atividades culturais. 11. Atividades manuais. 12. Visitas domiciliares. 13. Assembleia do conselho local de saúde mental. 14. Reuniões das quatro equipes e da equipe geral de técnicos.
Dessa forma, no primeiro semestre, realizou-se a observação do/no campo, para depois ter definido o objetivo da intervenção. Algumas demandas foram observadas pelas estagiárias, uma delas referindo-se a uma área de atuação do serviço que, no momento que ocorreu o estágio, era pouco explorada: o atendimento aos familiares dos usuários. No segundo semestre, então, foi desenvolvido o projeto de intervenção, que objetivava a realização e coordenação de grupos psicoeducativos com os familiares dos usuários do Caps.
O projeto de intervenção foi apresentado à equipe do Caps, consistindo na realização de um grupo psicoeducativo semanal com os familiares dos usuários, sendo de participação aberta e coordenado pelas estagiárias de Psicologia, acompanhadas por uma supervisora do campo. Contudo, como o serviço dividia a demanda de atendimento em quatro equipes de referência, após discussão da proposta de intervenção, o serviço solicitou que, em vez de um único grupo, fossem constituídos quatro grupos referentes a cada uma das equipes de trabalho.
Considerando o tempo de duração das atividades do estágio, foi desenvolvido, em conjunto com cada equipe, um cronograma para os encontros. Em um período de três meses, realizamos um encontro por semana, alternando as quatro equipes, de forma que cada grupo teve um encontro por mês e três encontros no total. A proposta, com o término das intervenções pelas estagiárias, era que cada equipe se organizasse para dar continuidade aos grupos, garantindo assim o atendimento ao familiar do usuário do Caps.
Assim sendo, a análise do diário de campo ocorreu de modo a correlacionar a experiência desenvolvida com o aporte teórico do paradigma psicossocial e antimanicomial de assistência e cuidado em saúde mental, o qual também pautou o olhar e a ação em campo.
Grupos psicoeducativos com os familiares dos usuários do Caps
Após a reunião com as equipes do serviço, foram estabelecidos a ordem dos grupos e os horários, tendo duração de uma hora cada encontro; cada equipe passou uma lista indicando de 20 a 30 nomes de usuários para entrarmos em contato por telefone e realizarmos o convite aos familiares para participação nos grupos.
O primeiro grupo teve início no mês de setembro, após feita a ligação para a lista de nomes indicados e também confeccionados convites, que foram distribuídos na recepção e também pela equipe durante os grupos de medicação e acolhimento. Essa foi a estratégia adotada antes do primeiro encontro de cada grupo.
O roteiro preparado para o primeiro encontro objetivou apresentar as coordenadoras, explicar o caráter do grupo psicoeducativo e os objetivos de ser um espaço informativo e de troca de experiências entre os membros; propor o contrato do grupo, como a questão do sigilo e pontualidade; esclarecer os dias e horários dos encontros e que a continuidade do grupo seria organizada pela equipe de referência, após o encerramento do projeto proposto pelas estagiárias.
Foi pensada também uma dinâmica de apresentação dos membros do grupo, consistindo na formação de duplas para se apresentarem um para o outro e posteriormente cada um apresentar, ao grupo todo, a pessoa com quem conversou. Foram sugeridas algumas perguntas orientadoras como nome, profissão, região onde mora, familiar que acompanha como cuidador, como era o processo de cuidado e as dificuldades e/ou facilidades do papel de cuidador.
Após as apresentações e esclarecimentos, foi colocada a proposta que os familiares escolhessem, dentro de algumas possíveis temáticas, quais gostariam de discutir nos próximos dois encontros dos grupos. A escolha ocorreu por meio de votação, podendo ser escolhidas duas dentre cinco temáticas elencadas: tratamento e medicação; sinais do próximo surto (crise); convivência diária; atividades que ampliassem as potencialidades e possibilidades de vida; sofrimento e cuidado de si. O plano para o encontro tinha como base um roteiro orientador, mas ressalta-se que, diante da realidade e singularidade de cada grupo, ocorreram modificações e adequações ao que foi previamente planejado.
No primeiro encontro do grupo da equipe 3, estiveram presentes três pessoas, duas mães e uma irmã de usuários do serviço. O roteiro foi seguido em sua parte inicial, mas como o grupo estava pequeno, a apresentação ocorreu em uma conversa com o grupo todo. No momento de votação das temáticas, foram escolhidos os temas tratamento/medicação e atividades potencializadoras de vida para serem trabalhadas nos próximos encontros.
O primeiro encontro do grupo da equipe 4 contou com a presença de nove familiares, sendo quatro irmãos, um pai, três mães e uma filha. O roteiro planejado para o encontro foi executado. Devido à quantidade de pessoas presentes, a dinâmica de apresentação possibilitou a todos os presentes espaço de fala e de troca de experiência do processo de cuidado. As temáticas votadas para os encontros seguintes foram convivência diária e tratamento/medicação.
O primeiro encontro da equipe 1 ocorreu com a presença de sete familiares, sendo quatro mães, um irmão, uma cunhada e uma filha de usuários do serviço. A apresentação dos membros ocorreu com o grupo todo. Foram votadas as temáticas e esse grupo em específico pediu para contemplar a maioria dos temas, como tratamento/medicação, sinais do primeiro surto, convivência diária e atividades promotoras de vida. Nesse encontro, sentiu-se pela primeira vez, de forma mais acentuada, a dificuldade em conseguir "interromper" a fala de um participante do grupo e conduzir a dinâmica proposta, de forma a garantir que todos os membros do grupo pudessem verbalizar. Essa vivência foi formativa e influenciou a nossa coordenação nos demais encontros.
O primeiro encontro da equipe 2 contou com a presença de 13 familiares, sendo cinco mães, dois pais, cinco irmãos e irmãs e um cunhado. O roteiro foi seguido e, após os esclarecimentos iniciais, foi realizada a dinâmica de apresentação dos membros. Devido à quantidade de membros, a dinâmica de apresentação foi muito rica, possibilitando espaço de fala a todos e troca de experiências de situações diversas sobre o processo de cuidado. Devido ao tempo, não foi possível realizar a votação das temáticas, mas foi esclarecido ao grupo quais seriam as temáticas que perpassariam os próximos encontros.
Com relação aos temas escolhidos, a sistematização apontou que o tema tratamento/medicação foi o mais votado, sendo escolhido em todos os grupos em que ocorreu a votação. Em sequência, os temas mais votados foram atividades promotoras de possibilidades e potencialidades de vida, convivência diária e sinais do próximo surto.
O roteiro do segundo encontro abordou a temática do tratamento/medicação e a discussão foi ampliada, perpassando os sinais dos próximos surtos (crise) e a convivência diária. Como fonte de referência para o desenvolvimento dos conteúdos educativos e informativos, foram utilizados os seis volumes dos livretos "Conversando sobre a Esquizofrenia", de Assis, Villares e Bressan (2007), desenvolvidos por membros da Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Esquizofrenia (Abre), e também o livro "Guia para cuidadores de pessoas com transtorno bipolar", de Berk (2011). Assim, no segundo encontro, foram apresentadas as informações e orientações com base nas referências citadas, quando também foi fomentado o diálogo em grupo com o relato dos familiares a respeito das experiências com relação às discussões suscitadas.
Os conteúdos trabalhados no segundo encontro perpassaram os seguintes tópicos de questionamento e discussão: o que são os transtornos mentais?; quais os sintomas?; tratamento medicamentoso e psicossocial; quais os efeitos colaterais dos medicamentos?; a internação é necessária?; a família e a convivência diária como parte essencial do tratamento; a importância do diálogo; a doença não é o centro de tudo (a pessoa é muito mais que o adoecimento psíquico); estar bem para cuidar do próximo; um novo caminho de vida é possível (reabilitação).
O segundo encontro da equipe 4 contou com a presença de dois familiares, um irmão e uma irmã de usuários do serviço. No momento das discussões, foi possível perceber nos presentes um conhecimento teórico, mas principalmente um conhecimento prático, compreendendo que o familiar com sofrimento psíquico tem um modo de funcionar e reagir diferente daquele que as pessoas estão habituadas a esperar. Essa compreensão é fundamental para o respeito e construção de soluções, com a pessoa adoecida, para as situações do cotidiano. Diante do exposto, foi possível perceber que os familiares presentes eram comprometidos e se envolviam em atividades desenvolvidas pelo serviço.
O segundo encontro da equipe três contou com a presença de três pessoas, sendo uma mãe, uma irmã e um irmão. O grupo relatou um pouco dos "sintomas" dos familiares com sofrimento psíquico, pontuando algumas dificuldades. A discussão perpassou casos de usuários estáveis e em crise. Com relação aos usuários estáveis, a discussão decorreu da manutenção desse quadro e a preocupação com os cuidados com a saúde e qualidade de vida. Os principais aspectos destacados nesse grupo foram a necessidade do diálogo e a negociação para a resolução das problemáticas do cotidiano.
No segundo encontro do grupo da equipe 1, estiveram presentes duas mães, que relataram um pouco do histórico de adoecimento dos filhos e as estratégias e/ou dificuldades para realizar o diálogo e evitar os embates. A necessidade de compreensão do processo de reabilitação - que poderia ser mais rápido ou mais lento, dependendo da singularidade de cada caso - e a necessidade de compartilhar as informações e orientações sobre o tratamento com os demais membros da família ao grupo todo foram destacadas para que compreendessem que a pessoa com sofrimento psíquico tem um modo de funcionar e reagir às situações da vida diferente do que muitas vezes é esperado, e que um dos tratamentos para o sofrimento psíquico é a compreensão e o respeito do meio familiar e social.
No segundo encontro da equipe 2, estiveram presentes seis familiares, sendo duas mães, dois pais e duas irmãs. Nesse encontro, com relação à exposição teórica, um membro do grupo apresentou dificuldade na compreensão do que são os transtornos psíquicos. Desse modo, foi esclarecido que os transtornos psíquicos são determinados por fatores biológicos, sociais, psicológicos e espirituais e, assim sendo, o tratamento também envolveria todos esses aspectos, sendo assim biopsicossocial. Para evitar a centralidade de falas, ao final foi questionado a cada membro sobre os processos de tratamento e medicação dos familiares que acompanham.
A proposta para o último encontro foi que os familiares pudessem verbalizar e refletir a partir da questão: "A partir do que discutimos, quais podem ser, ou o que você já tem feito, de atividades promotoras e potencializadoras de vida para o familiar com transtorno e para você cuidador?" Após a discussão, o objetivo consistiu em reforçar a necessidades desses espaços, sendo um compromisso do serviço dar continuidade aos grupos com familiares. Também foi planejada uma avaliação do projeto e a realização de um lanche de encerramento.
O grupo com os familiares da equipe 4 contou com dois familiares, uma irmã e um irmão. Quando questionados sobre as atividades que poderiam desenvolver como possibilidade de vida, um membro ressaltou que está bem e que com relação ao usuário pode pensar em propor mais atividades, como esportes em ambientes da comunidade. O outro membro ressaltou que o usuário está bem e autônomo e tem liberdade para expor suas necessidades com a família; e, com relação a si, relatou que no momento precisa de descanso. Sobre a avaliação do projeto, destacam-se as seguintes falas - com relação ao formato do grupo: "ouvindo absorve, vai gravando", "gostei de saber o que seria discutido"; com relação ao grupo, conteúdos e condução: "gostei de tudo", "são atenciosas, achei ótima a maneira de tratar". Não houve queixas ou sugestões.
O grupo com os familiares da equipe três não ocorreu. Nas ligações, feitas antes da data do encontro, algumas pessoas avisaram que não poderiam comparecer e não conseguimos entrar em contato com uma mãe que participou dos dois encontros anteriores.
No terceiro encontro da equipe 1, esteve presente apenas uma família, a mãe e um irmão de uma usuária. Desse modo, ocorreu um atendimento familiar com orientação sobre as questões do tratamento. Após a escuta, foi realizada a orientação para que eles conseguissem compreender as singularidades do funcionamento psicossocial do familiar com transtorno. Foram passadas referências bibliográficas didáticas para que a família pudesse buscar mais informações para ajudá-los nas condutas e na convivência diária. Ao final, foi realizada uma avaliação que considerou o projeto como bom e que deveria continuar, não havendo queixas ou sugestões.
No terceiro encontro da equipe 2, estiveram presentes um pai, uma mãe e um irmão. Foram relembrados os pontos mais importantes das discussões suscitadas nos encontros anteriores. Posteriormente, foram discutidas as atividades que poderiam ser desenvolvidas para promover e potencializar a vida. Um dos membros relatou que o familiar está bem, já realiza suas atividades de forma mais autônoma e está em busca dos seus direitos e benefícios sociais. Outro membro refletiu que pode buscar mais atividades para os familiares em tratamento, como o Centro de Convivência da rede de saúde mental. Já no terceiro caso, a usuária estava em crise e, assim sendo, foram realizadas orientações, reafirmando a necessidade de buscar o apoio da equipe de referência no serviço. Ao final, foi realizada uma avaliação do projeto, sendo destacadas as seguintes falas: "se não tem orientação a gente fica sem rumo [...] não dá o resultado da forma que a gente quer, mas ajuda bastante", "foi bom, a gente sabe que tem gente para ajudar a gente se precisar", "esse trabalho tem que continuar, a gente também precisa de ajuda e orientação". Não houve queixas ou sugestões.
Com o encerramento dos grupos, nos reunimos com as equipes para realizar o repasse do que havíamos discutido. Também ficou acordada com a equipe técnica uma apresentação aberta a todos, no dia da reunião de equipe, para apresentar os resultados da intervenção realizada e fazer o fechamento, tendo em vista a conclusão do estágio na instituição.
Reflexões e discussões sobre o campo e a experiência de estágio
A inserção no campo possibilitou perceber que a saúde pública, no município de Goiânia, tem passado por uma crise na distribuição e gestão dos recursos financeiros para o funcionamento dos serviços. Tal situação ocasionou a falta de refeições e de materiais para as atividades com os usuários, o que demonstra uma insuficiência de condições adequadas de trabalho.
Diante de tal cenário, logo após o processo de observação no campo, foi deflagrada a greve da saúde no município de Goiânia. A greve reivindicava condições adequadas de trabalho e reajustes salariais e teve duração de 26 dias. Esse era o contexto do campo de estágio, caracterizado pela negligência do governo local com a saúde pública e a saúde mental.
Essa realidade evidencia que, mesmo sendo uma política pública do Ministério da Saúde, os cuidados psicossocial e antimanicomial ainda enfrentam desafios para a sua implementação. Tais desafios perpassam determinantes históricos, econômicos, socioculturais e políticos, pois a Reforma Psiquiátrica caminha na contramão da política neoliberal de enxugamento do investimento público nas áreas sociais, bem como do modelo psiquiátrico tradicional e da indústria da loucura (Amarante, 1999).
Os Caps são um dos dispositivos estratégicos da Reforma Psiquiátrica para o deslocamento do cuidado para fora dos hospitais em direção à comunidade, por meio da atuação no território e em rede (Brasil, 2015). Se a manutenção dos Caps se precariza, são comprometidos os seus objetivos de oferta de diferentes atividades terapêuticas, de reinserção social dos usuários e familiares e de organização da rede de saúde mental no território.
Destarte, a experiência no Caps foi formativa por possibilitar a compreensão de que a realidade da saúde mental no município era marcada por desafios micro e macroestruturais, mas também avanços, observados no contato com as práticas inovadoras de assistência/cuidado psicossocial. O estágio proporcionou a atuação em uma instituição substitutiva ao modelo hospitalocêntrico, o contato com o usuário, como sujeito concreto e com projetos de vida; a participação em atividades terapêuticas e culturais de cunho psicossocial; e o trabalho em equipe multiprofissional.
Assim, a experiência no Caps foi ao encontro da expectativa com relação à atuação terapêutica segundo um fazer psicossocial e antimanicomial, caracterizando-se por um processo de (re)construção da clínica ampliada, segundo os preceitos e normatizações da Reforma Psiquiátrica (Brasil, 2004; Brasil, 2015).
Os Caps têm, como uma de suas atribuições, a realização de atendimento à família, sendo esse trabalho uma das estratégias da assistência psicossocial, de corresponsabilização na terapêutica (Brasil, 2015). Desse modo, mesmo enfrentando dificuldades, como as alterações na proposta inicial de intervenção e a adesão dos familiares, demonstrada pela diminuição do número de participantes nos grupos ao longo dos meses, reafirmamos a importância e o potencial do trabalho com famílias nos serviços de saúde mental.
Nas discussões durante os grupos, percebemos que alguns familiares desconheciam a multiplicidade dos processos de adoecimento e tratamento. Não compreendiam que a pessoa com sofrimento e transtorno é muito mais que o adoecimento ou os "sintomas" e que tem uma forma diferente de sentir, pensar e se relacionar, sendo necessários e imprescindíveis, para o convívio familiar, a compreensão e o respeito a essa diferença. Assim, o esclarecimento desses processos foi de grande importância no trabalho realizado com os familiares, indo ao encontro de princípios de (re)construção da clínica ampliada.
É preciso criar, observar, escutar, estar atento à complexidade da vida das pessoas, que é maior que a doença ou o transtorno. Para tanto, é necessário que, ao definir atividades, como estratégias terapêuticas nos Caps, se repensem os conceitos, as práticas e as relações que podem promover saúde entre as pessoas: técnicos, usuários, familiares e comunidade. (Brasil, 2004, p. 17)
Comparando as dinâmicas dos grupos psicoeducativos realizados, destaca-se a riqueza das trocas de experiências entre os membros. Por meio das discussões, todos percebiam que o caso do familiar não era um caso isolado e que existiam outras pessoas e famílias em situações similares. A troca de experiências também possibilitou que pessoas com mais informação, teórica e da vivência cotidiana, relatassem estratégias positivas para a manutenção da harmonia na convivência diária e no manejo de situações conflitantes.
Como apontado por Silva (2007), é a interação entre o usuário da saúde mental e os familiares que produz a maior parte dos fatores a serem cuidados nos processos terapêuticos. Evidencia-se, assim, que o compartilhamento de experiências e informações entre os familiares proporciona apoio e ferramentas para o manejo relacional, contribuindo na manutenção do quadro estável do usuário.
Foi percebido que os grupos se constituíram como um espaço acolhedor para a fala e expressão dos sentimentos dos participantes, corroborando as reflexões de Benute (2001), citado por Cerdeira e Villela (2011), de que os grupos psicoeducativos vão muito além da transmissão de informações, configurando-se como espaço que acolhe os diversos sentimentos, como angústias e ansiedades que perpassam a prática cotidiana de cuidado.
As falas dos familiares na avaliação do projeto indicaram a importância do trabalho com as famílias e sua continuidade. Ao final dos grupos, percebemos a relevância do processo educativo para o questionamento de mitos e preconceitos, tal como para a mobilização de mudanças nas representações que as pessoas fazem da problemática, confirmando o que indicou Afonso (2006).
A equipe do serviço acolheu o projeto realizado, ficando instigada a dar continuidade ao trabalho com famílias. Logo, a proposta, dentro do possível, cumpriu os objetivos e se configurou como uma experiência positiva para os familiares participantes, para a formação das estagiárias e para o serviço.
Considerações finais
A experiência do estágio supervisionado permitiu uma articulação entre os conhecimentos teóricos adquiridos ao longo do processo de formação em Psicologia e a atuação profissional no campo da saúde mental. Essa correlação possibilitou a compreensão da importância de uma formação teórica sólida para uma atuação prática qualificada.
Ter como campo de estágio um Caps da cidade de Goiânia, possibilitou a compreensão da realidade da saúde mental na forma como é abordada no âmbito das políticas públicas na área nacional e municipal. Foi possível perceber que, mesmo sendo uma política pública do Ministério da Saúde, os paradigmas de assistência e cuidado psicossocial e antimanicomial ainda enfrentam desafios para a implementação na sociedade brasileira, não sendo diferente no serviço acompanhado.
Foi possível também, por meio da experiência, reconhecer os avanços do processo da reforma psiquiátrica e a consequente transformação das políticas públicas em saúde mental. A experiência no Caps proporcionou a atuação em uma instituição substitutiva, o contato com práticas inovadoras, o trabalho multiprofissional e, principalmente, a atuação com os sujeitos em sofrimento psíquico e as diversas possibilidades de ações necessárias nesse campo.
A intervenção proposta, de coordenação dos grupos psicoeducativos com os familiares dos usuários do Caps, foi uma experiência formativa no âmbito acadêmico-profissional e humano. Por meio dessa experiência, foi possível aprofundar os conhecimentos sobre dinâmica e coordenação de grupos, didática e sistematização de informações, papel do familiar nos procedimentos de cuidado e a multiplicidade e singularidade dos processos de sofrimento e tratamento em saúde mental.
A partir da contextualização teórica, descrição da experiência de intervenção e reflexões apresentadas, buscamos contribuir com o debate psicossocial e antimanicomial no campo da saúde mental; a reafirmação da importância e potencialidade de ações direcionadas às famílias dos usuários para suporte e apoio no processo de cuidado; a exposição de uma ferramenta de intervenção em saúde, o grupo psicoeducativo como estratégia de acolhimento e orientação grupal.
Para tanto, o estudo de campo evidenciou a importância dos conhecimentos adquiridos ao longo da formação, da pesquisa e da observação para a inovação dos saberes e práticas no âmbito da saúde mental. Considerando os limites temporais e regionais, bem como o fato de o processo da Reforma Psiquiátrica ser um movimento histórico multideterminado e em perene construção, objetivamos, por fim, fomentar futuras pesquisas de exploração da temática.
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Recebido em: 29/10/2016
Aprovado em: 8/6/2019
1 Modelo de cuidado, que emerge no século XIX, baseado no modelo biomédico de associação entre hospital e medicina. A partir desse referencial, a psiquiatria, com uma visão biologicista, nosográfica e sintomatológica se institui como a ciência médica que estuda e "cura" as doenças mentais, e o manicômio/asilo a instituição na qual ocorrem as práticas clínicas (Vietta, Kodato & Furlan, 2001; Coelho, 2010).