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versão impressa ISSN 0102-7395

Reverso vol.35 no.66 Belo Horizonte dez. 2013

 

DISCURSO

 

Os 50 anos do Círculo Psicanalítico de Minas Gerais

 

 

Eliana Rodrigues Pereira Mendes

Círculo Psicanalítico de Minas Gerais

 

 

Em 1963, o desejo de alguns jovens psiquiatras mineiros de estudar e se submeter à psicanálise, no intuito de fazer sua formação psicanalítica propiciou a origem de um pequeno grupo interessado nesse tipo de conhecimento, também ele novo nas terras das Minas Gerais. Esse primeiro grupo era composto por Elba Duque de Moura, Antonio Franco Ribeiro da Silva, Djalma Teixeira de Oliveira e Jarbas Moacir Portela. Foi-lhes então apresentado um psicólogo e psicanalista que vinha do Rio Grande do Sul, o monsenhor da Igreja Católica, Malomar Lund Edelweiss.

Desse pequeno núcleo se derivou o que viria a ser o Círculo Psicanalítico de Minas Gerais, que em 2013 completa 50 anos de funcionamento ininterrupto.

Malomar Edelweiss, no início, fazia a análise de todos os participantes do grupo, além de ser também o transmissor da teoria analítica e o coordenador da nascente sociedade psicanalítica. Nessa ocasião voltava de Viena, onde havia feito um ano de análise com Igor Caruso, então renomado psicanalista na Europa. Caruso havia fundado e dirigia o Círculo de Psicologia Profunda de Viena, que logo no período pós-guerra reunia os mais importantes nomes da psicanálise.

Tendo como propósito oferecer uma formação teórica mais ampla e análises pessoais com um psicanalista com o estofo de Caruso, Malomar Edelweiss o convida para permanecer uma temporada em Belo Horizonte, onde iria oxigenar o grupo de psicanalistas iniciantes.

A permanência de Caruso se deu entre os anos 1968 e 1969, tendo ele ministrado cursos, inclusive um aberto a todos os interessados da cidade de Belo Horizonte, o que foi uma boa experiência para todos nós. Ainda nessa época foi fundado o Círculo Brasileiro de Psicanálise, congregando outros estados do Brasil. Caruso foi também responsável pela criação de outros grupos de psicanálise na América Latina, como no México, na Argentina e na Colômbia.

O grupo do CPMG era o único na cidade de Belo Horizonte, tendo catalisado todos os profissionais que desejavam se dedicar à psicanálise. Outros profissionais logo aderiram ao grupo: Carlos Pinto Correa, que mais tarde fundou o Círculo Psicanalítico da Bahia, Elias Hadad, Eunice Rangel, Luiz Carlos Drummond, que tiveram também o cargo de analistas didatas junto com os fundadores e coordenaram a formação psicanalítica como analistas pessoais e professores dos candidatos naquela ocasião. Cabe aqui ressaltar a figura de Célio Garcia, que foi para o nosso grupo uma espécie de Melquíades, o alquimista da Macondo, de Garcia Marques, em seu livro Cem anos de solidão, aquele que trazia de fora as novidades. Foi esse o seu papel entre nós, nos introduzindo, entre tantos outros conhecimentos, ao estudo de Lacan.

Tivemos também como professores de psicopatologia o trio de colegas: Arlindo Carlos Pimenta, Javert Rodrigues e Marco Aurélio Baggio, substituídos depois por Clóvis Figueiredo Sette Bicalho.

Nesses 50 anos de existência, o CPMG tem funcionado como uma sociedade psicanalítica cujo lastro é a teoria freudiana, sem, no entanto, deixar de estar aberta a novos autores pós-freudianos, especialmente Jacques Lacan, que, na releitura de Freud, trouxe inovações teóricas e clínicas importantes.

Foram presidentes do CPMG, no decorrer destas cinco décadas, os seguintes sócios:

1963-1969: Malomar Lund Edelweiss
1969-1075: Djalma Teixeira de Oliveira
1975-1977: Antonio Franco Ribeiro da Silva
1977-1979: Jarbas Moacir Portela
1979-1981: Luiz Carlos Drummond
1981-1983: Elias Hadad
1983-1985: Arlindo Carlos Pimenta
1985-1987: Johannes Hubertus Dousi
1987-1989: Javert Rodrigues
1989-1991: Adelson de Souza Pires
1991-1993: Clóvis Figueiredo Sette Bicalho
1993-1995: Vanessa Campos Santoro
1995-1997: José Domingues de Oliveira
1997-1999: Eliana Rodrigues Pereira Mendes
1999-2001: José Sebastião Menezes Fernandes
2001-2003: Clovis Figueiredo Sette Bicalho
2003-2005: Clovis Figueiredo Sette Bicalho
2005-2207: Maria Mazzarello Cotta Ribeiro
2007-2009: Ana Cristina Teixeira da Costa Salles
2009-2911: Ana Cristina Teixeira da Costa Salles
2011-2013: Eliana Rodrigues Pereira Mendes

Todos eles, a quem rendemos uma justa homenagem, deram muito de si para a instituição. Cada qual, a seu modo, contribuiu para que chegássemos a esta data. Por isso, achamos sem sentido uma comemoração que não abrangesse todos os sócios e os ex-sócios, porque essa conquista dos 50 anos pertence a todos nós que, nos mais diferentes cargos e tarefas, contribuímos para o CPMG chegar até aqui.

Como em todas as histórias de grupos, o nosso também sofreu mudanças em sua estrutura e troca de modelos de funcionamento, quando já não satisfaziam os objetivos propostos. A finalidade dessas mudanças foi sempre criar e fazer operar os dispositivos que favorecessem a busca de aprimoramento da transmissão clínica e teórica da psicanálise, além de sua divulgação.

Ao longo destes 50 anos, assistimos e fomos participantes da evolução da psicanálise em Minas Gerais. De uma posição tímida na década de 1960, a psicanálise passou a ser muito mais aceita e procurada, nos anos 1970 e 1980. Tal dado se confirma no fato de que novas sociedades psicanalíticas começaram a se firmar em nossa cidade, o que atesta o profundo interesse que a invenção psicanalítica desperta. Com isso, foi aberto um amplo leque de possibilidades de formação para os que desejam estudar a psicanálise e/ou se dedicar a ela como profissão.

Muitos desses grupos tiveram como origem o CPMG, sendo seus fundadores antigos sócios nossos, o que é de se esperar, já que fomos a sociedade pioneira de Belo Horizonte.

Num mundo em que a subjetividade, uma das principais referências do saber psicanalítico, tem ganhado grande espaço, o que caracteriza as mentalidades contemporâneas, a psicanálise, cada vez mais, se constitui como um valioso instrumento para que essa interiorização seja vivida com mais verdade e autoconhecimento. Os conceitos psicanalíticos e seu vocabulário específico estão hoje tão entranhados na cultura que é difícil imaginar uma sociedade que não os considere.

As recentes conquistas do gênero feminino e a atenção dada a crianças e jovens, o repúdio ao preconceito diante das diferenças entre os sujeitos, de modo geral, a condenação da intolerância e do domínio coercitivo, são todos tributários da psicanálise, que busca fomentar e alcançar melhores condições para os seres humanos. Isso apesar dos percalços e das dificuldades do caminho, que sempre foram inúmeros e de toda natureza.

Hoje, no CPMG contamos com uma formação psicanalítica sistematizada, com a duração de cerca de cinco anos, tendo como professores os próprios sócios efetivos. Chegamos a essa formação depois de muito estudo e de muitas tentativas de acerto.

Contamos com a estrutura de uma Clínica de Psicanálise onde quem atende são os candidatos dos últimos anos da formação psicanalítica. Essa clínica torna o tratamento analítico acessível a diferentes segmentos da população da cidade. Temos também um convênio com o Hospital Galba Velloso, aonde mensalmente os candidatos são levados a uma aula prática, com entrevista de pacientes internos.

Mantemos uma revista editada semestralmente, a Reverso, que é muito bem indexada e dá conta da produção teórica do grupo, além da participação de articulistas convidados, de outras procedências.

Anualmente é feita uma jornada com tema de interesse geral, propiciando o acesso à participação de todos os componentes do CPMG e também de convidados de fora.

No intuito de favorecer a atualização e a formação permanente de todos os sócios, há seminários regulares sobre temas de interesse comum, assim como cursos com profissionais de outras instituições. Mantemos uma programação cultural a cada mês, o chamado Dedo de Prosa, que procura fazer uma conexão com as ofertas culturais da cidade.

Organizamos um sistema próprio de passagem do candidato para sócio efetivo da sociedade, que compromete mais o passante com o seu desejo e com a sua participação em nossa sociedade.

E finalmente, temos uma biblioteca, que é considerada um dos melhores acervos em psicanálise no Brasil, aberta ao público em geral, num serviço à comunidade psicanalítica da cidade. A biblioteca leva o nome do colega Júlio César Valadares Roquete, que nos deixou precoce e repentinamente. Era um colega querido por todos, sempre pronto a colaborar com o CPMG, tendo chegado a coordenar o Boletim Informativo, um pouco antes de falecer. A biblioteca foi criada em 1975, e o nome do colega Júlio Roquete foi dado em 1985, logo depois de sua morte.

Nossa biblioteca foi recentemente enriquecida com a contribuição de grande parte do acervo particular de Antonio Franco Ribeiro, a quem homenageamos nesta data, agradecendo à sua família por esse gesto. Antonio Ribeiro nos acompanhou durante toda a sua vida, tendo sido um professor especial, conhecedor de Freud como poucos, um autor claro e preciso, um colega amigo e lúcido, enfim, um ser humano da melhor qualidade. De agora em diante, sua memória, que os que com ele conviveram guardam com o maior carinho, está materializada em seus livros, numa outra maneira de conservá-lo conosco.

Agradecemos também as recentes doações feitas pelas colegas Maria Angela de Assis Dayrell e Leila Marquez Lopes de Oliveira.

Somos gratos a todos os colegas que trabalharam para termos um encontro agradável nesta noite, além da presença importante de tantos colegas queridos.

É com alegria que faço um agradecimento especial à nossa diretora de Comunicação e Divulgação, Guiomar Antonieta Lage, que se empenhou ao máximo pela ampliação da nossa biblioteca. Seu entusiasmo e competência foram imprescindíveis para nosso evento.

Agradeço também a nossas funcionárias Edna Malacco de Resende e Patrícia Maria Figueiredo por sua valiosa contribuição.

Por fim, graças a tudo isso, reavivamos nosso desejo e empenho em levar adiante a chama da psicanálise.

Eliana Rodrigues Pereira Mendes
Presidente do CPMG
Triênio 2011/2014