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Revista Mal Estar e Subjetividade
versão impressa ISSN 1518-6148
Rev. Mal-Estar Subj. vol.10 no.3 Fortaleza set. 2010
AUTORES DO BRASIL
ARTIGOS
O mal-estar na docência em tempos líquidos de modernidade
Edgar Zanini TimmI; Juan José Mouriño MosqueraII; Claus Dieter StobäusIII
IDoutor em Ciências Humanas- Educação. Professor titular da Faculdade de Educação, Programas de Pós-Graduação em Educação da PUCRS e Gerontologia Biomédica e UNILASALLE. End.: Av. Ipiranga, 6691. Porto Alegre-RS. CEP: 90619-900. E-mail: edgar.timm@metodistadosul.edu.br
IILivre-Docente em Psicologia Educacional. Professor titular da Faculdade de Educação e da Faculdade de Letras, Professor Titular nos Programas de Pós-Graduação em Educação e Letras da PUCRS. End.: Av. Ipiranga, 6691. Porto Alegre-RS. CEP: 90619-900
IIIDoutor em Educação, professor titular da PUCRS, Centro Universitário La Salle. End.: Av. Ipiranga, 6691. Porto Alegre-RS. CEP: 90619-900. E-mail: stobaus@pucrs.br
RESUMO
Partindo da constatação de que o magistério não fica imune ao mal-estar que se experimenta atualmente, o artigo alinha-se à compreensão de que as condições do mal-estar na docência precisam ser problematizadas; afirmando que é possível ao professor lidar com o fenômeno, ao estar consciente da sua responsabilidade em seu processo de auto-subjetivação, desenvolvendo-se em termos de autoimagem e de autoestima, para que melhor movimente-se, renove e amplie o compromisso de cuidar de si em uma perspectiva diferenciada.
Palavras-chave: Docência. Mal-estar docente. Bem-estar docente. Auto-imagem. Auto-estima.
ABSTRACT
Taking as its point of departure the assertion that the teaching action has not been immune to the discomfort we have experienced nowadays, this article aligns to the understanding that the conditions of the discomfort at teaching should be problematized in affirming that it is possible to the teacher to deal with this phenomenon when he/she is aware of his/her responsibility in the process of self-subjection, and developing him/herself into terms of self-image and self-esteem which enables to the teachers' better movement, renewing and enhancing his/her commitment of taking care of him/herself in a distinct perspective.
Keywords: Teachers discomfort. Teachers. Well-being. Self-image. Self-esteem.
Introdução
Falar ou escrever sobre mal-estar, hoje, pode implicar um risco. Mas é preciso assumi-lo. Mais do que isso, é preciso marcar a diferença; ou, pelo menos, tentar. Porque existe o risco de o discurso cair em lugar comum. Lugar comum é aquele para onde vão as palavras e as frases que perderam a força original de seu sentido, porque se tornaram muito 'fáceis' de serem 'ouvidas', 'entendidas', 'assimiladas' e 'reproduzidas' inconsequentemente. Quando algo não consegue mais nos tocar, nos comover, nos fazer prestar atenção, pode ser pelo fato de que, de 'tão frequente', tenha já se 'naturalizado' no pior sentido desta palavra e, com isso, banalizado. Olhamos, mas não vemos; ouvimos, mas não escutamos, simplesmente deixamos que habite em nós ou que passe por nós sem nos darmos conta do que isso significa. Assim, isto também pode ocorrer com a expressão mal-estar. O mercado editorial e suas publicações de autoajuda fáceis e instantâneas e a indústria farmacêutica com seus 'milagres' também instantâneos de psicofármacos parece que se apropriaram dela. Suas páginas e medicamentos parecem querer alcançar a tudo e a todos, em qualquer desempenho de nossa condição existencial, seja no âmbito familiar, profissional, social, religioso e outros.
Posto isso, a expressão parece, mais do que estar na 'moda', correndo o risco de tornar-se, com o desgaste causado pelo seu uso sem melhor problematização, banal. Acreditamos, no entanto, que ela precisa continuar sendo problematizada de outra maneira, principalmente pelo magistério, em que as duas referidas 'indústrias' também alcançam um ser humano chamado professor. Na problematização da questão do mal-estar na docência, há, pelo menos, duas possibilidades para escolher.
Numa delas está o acomodar-se ao coro daqueles que lamentam sua condição, mas que nada mais fazem para lidar com ela a não ser manter-se passivos esperando até que as coisas mudem. Na outra encontramos o convite à aceitação de um compromisso que se faça consigo mesmo (ou, que se renove ou se amplie porque já existe) de melhor trabalhar sua autoimagem e sua autoestima, no processo de sua auto-subjetivação docente, porém, numa perspectiva diferente àquela ofertada pelo 'mercado', de uma modernidade que não mais dá conta de nossa ânsia por segurança. Optando pela segunda possibilidade, passamos a considerá-la a seguir.
O mal-estar em nossos dias
No final da segunda década do século que terminou, Sigmund Freud apresentava, de uma forma que ainda hoje nos encanta por sua profundidade de base psicanalítica, um entendimento sobre o mal-estar na civilização. Segundo o psicanalista brasileiro Birman, J. (2003, p. 38), "a ideia de mal-estar na civilização [em Freud] deve ser interpretada como uma crítica da modernidade", uma vez que, nesse texto, diz o autor, a palavra civilização refere-se "ao discurso civilizatório constituído no Ocidente desde o século XVIII e que assume uma feição marcadamente evolucionista desde a segunda metade do século XIX", tratando-se, portanto, de entender por essa palavra, o "processo de modernização do social que se realizou no Ocidente desde então".
Freud, S. (1978) nos faz ver que, paradoxalmente, o que chamamos de nossa civilização é, em grande parte, responsável por nossa desgraça. Desenvolvendo o raciocínio nessa linha, ele nos permite perceber que a civilização fora criada para nos proteger das ameaças, mas que ela ainda não conseguiu tal proeza, porque continuamos nos sentindo infelizes, inseguros e indefesos, cabendo, então, com legitimidade, nossa humana pergunta sobre o que pode nos proteger da civilização.
A constatação feita por Freud, que inspira seu texto, evidenciava já à sua época uma descrença dele nas promessas da modernidade, porque, conforme explica Birman, J. (2003, p. 138), que isso constatou no autor, "o desamparo do sujeito seria o contraponto permanente à ideologia do progresso e do cientificismo iluminista", dando a entender (p. 43) que "o desamparo seria aquilo que instaura o mal-estar na modernidade". Segundo ele (p. 143), "o discurso do último Freud indica como a racionalização do mundo pela ciência e o correlato esvaziamento dos deuses que encantavam o mundo produzem, no sujeito, um desamparo originário e inevitável".
Mesmo tendo 'acoplado' para si poderes artificiais que lhe permitiram sentir-se superior, ao perceber que já era capaz de fazer coisas que somente aos 'deuses' era possível, o ser humano, constatou Freud, S. (1978) à sua época "não se sente feliz em seu papel de semelhante a Deus". A busca pela construção de um sentido continua.
Birman, J. (2003, p. 229) constata que, realmente, "foi no vazio existencial produzido pela evaporação das visões de mundo, numa ordem social inteiramente perpassada pela ciência, que o desamparo do sujeito se tornou agudo e assumiu formas até então inexistentes"; e, ainda: "o mundo desencantado e sem Deus, marcado pela absoluta racionalização científica, produziu formas inéditas de desamparo quando as utopias do iluminismo e da modernidade foram silenciadas". Por tudo isso, entende novas as condições do mal-estar na civilização, em que se busca (p. 228) "uma visão de mundo reasseguradora que possibilite proteção ao sujeito frente ao medo do indeterminado e do acaso".
Mas, afinal, onde estamos hoje? Na modernidade? Na pós-modernidade? O que significam essas expressões? Bem percebe Veiga-Neto, A. (2004, p. 20) que "tem sido comum caracterizar a pós-modernidade numa perspectiva de negação, isso é, pelo que ela não é, por aquilo que ela não quer fazer", complementando, que, "assim, o pensamento pós-moderno opera uma mudança, uma reversão, em relação às condições anteriores, próprias da Modernidade, tomada essa no plano histórico como quase sinônimo de Iluminismo".
Então, como podemos ouvir e dizer afirmativamente de nosso tempo? Merece destaque a problematização feita por Bauman, Z. (2005, p. 60), sociólogo polonês contemporâneo, que pensa que a modernidade em termos 'líquidos': "para a grande maioria dos habitantes do líquido mundo moderno, atitudes como cuidar da coesão, apegar-se às regras, agir de acordo com os precedentes e manter-se fiel à lógica da continuidade, em vez de flutuar na onda das oportunidades mutáveis e de curta duração, não constituem opções promissoras". Entendendo a expressão 'pós' não no sentido cronológico, evidencia que as promessas da modernidade foram enganosas (2003, p. 279), e:
O de que a mente pós-moderna está consciente [é o sentimento que] há problemas na vida humana e social sem nenhuma solução boa [...] trajetórias torcidas que não se podem endireitar [...] ambivalências que são mais que erros linguísticos [...] dúvidas que não se podem banir da existência [...] angústias que nenhuma receita pode suavizar [...] curar [...].
Tal constatação é possível situar no entendimento que o autor apresenta da questão da ética nos dias atuais (2003, p. 15), "o pensamento e a prática morais da modernidade estavam animados pela crença na possibilidade de um código ético não ambivalente e não aporético":
É a descrença nessa possibilidade que é pós-moderna, "pós" não no sentido "cronológico" (não no sentido de deslocar e substituir a modernidade, de nascer só no momento em que a modernidade termina e desaparece, de tornar a visão moderna impossível uma vez chegada ao que lhe é próprio), mas no sentido de implicar (na forma de conclusão, ou de mera premonição) que os longos e sérios esforços da modernidade foram enganosos, foram empreendidos sob falsas pretensões, e são destinados a terminar [...]; que, em outras palavras, é a própria modernidade que vai demonstrar (se é que ainda não demonstrou) [...] sua impossibilidade, a vaidade de suas esperanças e o desperdício de seus trabalhos. O código ético a toda prova - universal e fundado inabalavelmente - nunca vai ser encontrado [...] sabemos agora o que não sabíamos então ao embarcarmos nessa viagem de exploração: que uma moralidade não aporética e não ambivalente, uma ética que seja universal e "objetivamente fundamentada", constitui impossibilidade prática" [...].
No palco da atualidade, em que o espetáculo de si mesmo precisa estar constantemente em cartaz para não ser substituído por/pelo outro, uma das estratégias usadas pelos diretores, cenógrafos, roteiristas e atores é o movimento. Segundo constata o mesmo autor, hoje não se busca mais assumir uma única identidade, porém 'várias'. Dizer 'eu sou assim' seria perigoso nesse contexto, porque o sólido corre o risco de desmanchar-se. Não sabemos mais o que realmente significa o 'eu sou eu'. É preciso estar em constante movimento, aptos para trocar rapidamente falas, roupas e gestos que usamos para nos representar conforme os cenários, diretores e roteiros que vão sendo mudados, mesmo que nos sintamos a deriva numa modernidade cada vez mais líquida. É possível alinhar aqui a constatação de Bauman, Z. (2005, p. 33) de que, "no admirável mundo novo das oportunidades fugazes e das seguranças frágeis, as identidades ao estilo antigo, rígidas e inegociáveis, simplesmente não funcionam", e perceber que (p. 35):
As identidades ganharam livre curso, e agora cabe a cada indivíduo, homem ou mulher, capturá-las em pleno vôo, usando os seus próprios recursos e ferramentas. O anseio por identidade vem do desejo de segurança, ele próprio um sentimento ambíguo. Embora possa parecer estimulante no curto prazo, cheio de promessas e premonições vagas de uma experiência ainda não vivenciada, flutuar sem apoio num espaço pouco definido, num lugar teimosamente, perturbadoramente, "nem-um-nem-outro", torna-se a longo prazo uma condição enervante e produtora de ansiedade. Por outro lado, uma posição fixa dentro de uma infinidade de possibilidades também não é uma perspectiva atraente. Em nossa época líquido-moderna, em que o indivíduo livremente flutuante, desimpedido, é o herói popular, "estar fixo" - ser "identificado" de modo inflexível e sem alternativa - é algo cada vez mais malvisto.
Reflitamos, com base nestas considerações.
O magistério não fica imune: por isso é preciso que problematize esse fenômeno que o alcança
Esteve, J. (1994, p. 12), através de suas pesquisas, vem problematizando o fenômeno do mal-estar na docência, destacando que é preciso distinguir, nessa problematização, entre a dor e o 'mal-estar', pois "a dor é algo determinado e que podemos localizar. A enfermidade tem sintomas manifestos. Quando usamos a palavra 'mal-estar' sabemos que algo não anda bem, porém não somos capazes de definir o que é que não anda bem e porque".
O magistério está ao alcance desse mal-estar que tem caracterizado o sentimento das pessoas em tempos muito líquidos da modernidade, pelos motivos já anteriormente referidos. A docência não fica imune a esse show que desenrola-se no palco da pós-modernidade, pois, constatamos, "em cada sala de aula, em cada pátio, em cada discurso, suas cenas muitas vezes são reprisadas. Ou contestadas". (Timm, E. 2006, p. 43).
Já Jesus, S. (2002, p. 15), que faz sua escolha na problematização da questão do mal-estar na docência pela abordagem, segundo o que entende como sendo o viés de sua positividade:
O mal-estar docente é um fenômeno dos nossos dias, quer pelo aumento brusco da percentagem de professores com sintomas de mal-estar nos últimos anos quer pelo facto (sic) de no passado os professores não apresentarem índices mais elevados de insatisfação, stress ou exaustão do que outros profissionais. Assim, o mal-estar docente é um fenômeno da sociedade actual (sic), estando interligado com as mudanças sociais que ocorreram nas últimas décadas, com implicações no comportamento dos alunos na escola [...]
Alinhando o entendimento de Jesus, S. (2002, p. 14) ao de Esteve, J. (1994), conforme escreve o primeiro sem discordância manifesta pelo segundo, o mal-estar na docência implica "os conceitos de insatisfação, desinvestimento, desresponsabilização, desejo de abandonar a docência, absentismo, esgotamento, ansiedade, stress, neurose e depressão".
O sentimento de autorealização, não apenas na sua dimensão de produto, mas, principalmente enquanto processo, isto é, de que o professor sente-se permanentemente construindo a si próprio em seu processo de subjetivação, é afetado pelo mal-estar que se experimenta hoje em nosso mundo.
Mosquera, J. (1979, p. 255), pensando reflexivamente sobre "as ilusões e os problemas da vida", apresenta sério questionamento que envolve o ser humano contemporâneo. Pode, sem dúvida, contextualizar o sentimento de desconforto que invade a docência nesses tempos:
A negação das emoções e sentimentos, hipocrisia que continuamente nos rodeia, parecem ser culpáveis do vazio no qual nos encontramos, e isto tem conseqüências trágicas para o processo de auto-realização, pois, os seres humanos só se realizam quando conseguem expandir seus sentimentos, colocar suas emoções e encontrar um universo que, no mínimo, dê algumas respostas às angústias da vida. Cremos que a auto-realização se tornará mais difícil na medida em que esqueçamos a pessoa na sua totalidade e parece que a tendência atual é mais para o esquecimento do que a valorização. Será um sinal dos tempos?
Portanto, é nesse contexto que desejamos que seja compreendido, aqui, o entendimento da expressão 'mal-estar docente', lembrando de Esteve, J. (1994, p. 24), quando escreve que ela pode ser utilizada para "descrever os efeitos permanentes de caráter negativo que afetam a personalidade do professor como resultado das condições psicológicas e sociais em que se exerce a docência".
É possível o professor lidar com o mal-estar na docência em tempos de modernidade líquida
Mosquera, J. e Stobäus, C. (In Enricone, D., 2004, p. 93) constatam que "sempre se alerta para não misturar o lado pessoal com o lado profissional", indagam sobre "como seria possível deixar de lado a dimensão pessoal e tentar agir unicamente com o lado profissional". E concluem indicando que "não somos pessoas divididas e [que] é extremamente difícil entrar em ambientes realizando este tipo de separação, já que a pessoa é uma, única, apesar de que possa ter diferentes facetas e dimensões".
Uma das questões que podem apresentar-se quando se problematiza o mal-estar na docência é, sem dúvida, essa que apresentam: muitos docentes aumentam seu mal-estar porque cobram-se, muitas vezes inconscientemente, o fato de não estarem conseguindo um bom desempenho em seu trabalho, por algo que imaginam ser de natureza privada ou pessoal, e que esteja supostamente interferindo em seu desempenho. Pensam justamente nessa linha de raciocínio que tradicionalmente se impôs ao professor: não misturar o lado profissional com o lado pessoal, exigindo-se desse ser humano que deixe problemas suspensos e que deles lembre após o sinal de término de suas aulas e estando já longe da escola.
Por sua vez, a recíproca apresenta-se. Muitas vezes um professor sente que o seu desempenho familiar ou pessoal é afetado por seu 'lado profissional' (não dar a atenção suficiente às pessoas de seu convívio, estar sempre 'pré-ocupado' com tarefas do trabalho justamente nos dias de descanso e que deveriam ser reservados para o seu lazer e o daqueles que com ele repartem a existência). Em uma e em outra dessas duas condições, o professor sente uma espécie de culpa. Culpa a si mesmo, ou disto se sente culpado pelos outros: por não saber ou não conseguir 'separar o lado profissional do lado pessoal'.
Ora, sabemos que, na construção de nossa existência no mundo, o que fazemos profissionalmente e o seu consequente desempenho repercutem em nossa dimensão pessoal, mas também nosso desempenho pessoal repercute em nossa profissão. Não há como negar. Daí, a necessidade de construir formas de sentir-se bem. Isto é dito na perspectiva do entendimento que compartilhamos de que, como já destacávamos (Timm, E., 2006, p. 49), "como profissional do ensino, o professor precisa sentir-se bem, com maior prazer naquilo que faz. Mas, acima de tudo, [compreendendo que] ele é, antes, um ser humano, e como ser humano é mais do que aquilo que seu fazer social lhe denomina ser", e de que, "mais do que um profissional é um ser humano que tem uma profissão, mas que não se resume a essa profissão", pois precisa, por isso, ser compreendido em toda sua complexidade e singularidade.
Mesmo que se sinta a deriva, navegando num mundo 'líquido', em que a pergunta derradeira pela ética, pela segurança e estabilidade nas relações humanas fique aparentemente sem respostas convincentes a dar-lhe rumo, é preciso que 'o professor, como pessoa', dito por Mosquera, J. (1978), não desista de cuidar de si. Pelo contrário, quando tudo parece dizer-lhe não ou estar a confundir seus projetos, é preciso que reassuma o comando de si mesmo.
Acreditamos que é possível o professor desenvolver formas próprias para lidar com o mal-estar que está instalado na docência, desenvolvendo uma postura frente ao mal-estar maior que se experimenta hoje em tempos de 'modernidade líquida', expressão de Bauman, Z.(2001).
Para o desenvolvimento dessa postura desejada, um dos passos necessários consiste, cremos, na confiança do professor de que é possível trabalhar-se a si mesmo, isto é, construir-se e reconstruir-se cotidianamente. Nessa perspectiva, ele precisa evitar sentimentos de 'autopiedade' e de 'autocomiseração', no pior sentido destas expressões. Em poucas palavras: é preciso, primeiro, legitimar, no sentido de reconhecer-se e não de que deva acomodar-se em sua possível condição de mal-estar e, segundo, desejar trocar esses dois sentimentos pelo sentimento de ter amor por si, o que implicará priorizar positivamente a dimensão do cuidado de si mesmo.
O cuidado de si na docência: implica respeito e dignidade na ocupação consigo mesmo
Sabemos que muito esperam todos do professor atualmente. As exigências que o olhar da sociedade lhe dirige, em nossa 'era líquido-moderna', diz Bauman, Z. (2005), são múltiplas e mutantes, confundindo-lhe o desempenho.
Nessa linha de raciocínio, também é possível verificar que Travers, C. e Cooper, C. (1997, p. 21) compartilham da percepção de Esteve, J. (1994), salientado mais tarde por Mosquera, J. e Stobäus, C. (In Enricone, D., 2004), de que aceleradas mudanças sociais possuem um profundo efeito sobre o papel que desempenham docentes, e que muitos deles não conseguem adaptar-se a tais mudanças. Para Travers, C. e Cooper, C. (1997, p. 25), "os motivos principais para pôr uma maior ênfase sobre os problemas próprios da profissão docente e sobre o stress que esta provoca se devem às mudanças no papel dos professores e as formas de trabalho [...]".
São novas e não tão claramente definidas as exigências para docentes, pede-se que repensem seu papel, cobra-se que eduquem para tempos que não se sabe ao certo dizer como são, que 'preparem' mesmo que não saibam ao certo para quem, em que e para que mundo.
Confrontado com as exigências cada vez mais acentuadas, rápidas e metamórficas, muitas vezes o professor sente que as condições que tem para fazer frente às demandas mostram-se insuficientes, mínimas ou então é como se ele estivesse fazendo parte de um outro roteiro, diferente daquele da 'peça' em que está sendo chamado a atuar. Sentindo-se desacreditado, ou com medo de ser desacreditado, pode perder seu sentimento de 'geratividade', não conseguindo estabelecer vínculos de afetividade com os outros e consigo mesmo, desacreditando, com isso, de si mesmo e também do valor do que ensina; o que vai dificultar o desenvolvimento sadio de sua autoestima.
Saber cuidar de si, desenvolvendo-se em sua autoimagem e autoestima de forma mais real e positivamente, na perspectiva de que pode desenvolver ou ampliar o compromisso consigo mesmo, em defesa de sua humanidade, parece-nos ser algo que não mais pode esperar. É uma atitude que rejeita a espera pura e passiva de que 'um dia tudo vai melhorar'. É cuidando de si que o professor torna-se melhor naquilo que ele é, melhor na sua condição de um ser humano chamado professor, alguém que quer ver respeitada sua dignidade e que, para tanto, respeita e dignifica a si próprio nesse propósito.
O que implica cuidar de si? Foucault, M. (2002, p. 55) ocupou-se dessa temática, resgatando o termo grego de epiméleia heautoû, que "não designa simplesmente uma preocupação, mas todo um conjunto de ocupações [...] em relação a si mesmo [...] a epimelèia implica um labor". Segundo ele entendeu dos gregos, "epimelèia não designa simplesmente uma atitude ou uma forma de atenção sobre si mesmo; designa uma ocupação regulada, um trabalho com prosseguimentos e objetivos"; não implica (Foucault, M., 1997, p. 121) somente "prestar atenção em si mesmo, evitar as faltas ou os perigos e se proteger".
"Ocupar-se consigo mesmo" (Foucault, M. 2004, p. 71) implica, na perspectiva grega da epimèleia, certas 'tecnologias de si', 'técnicas de si', que são (2001, p. 15) "práticas refletidas e voluntárias através das quais os homens não somente se fixam regras de conduta, como também procuram se transformar, modificar-se em seu ser singular e fazer de sua vida uma obra que seja portadora de certos valores estéticos e responda a certos critérios de estilo".
Ortega, F. (1999, p. 23), autor que estuda o pensamento de Foucault, ajuda nesse entendimento quando esclarece que a subjetividade em Foucault se mostra em seus últimos textos como 'decisão ético-estética, como cuidado de si'. Segundo ele, nessa perspectiva adotada por Foucault, "o indivíduo possui a capacidade de efetuar determinadas operações sobre si para se transformar e constituir para si uma forma desejada de existência (Foucault denomina este processo ascese ou tecnologias de si)", e, ainda, "a relação consigo oferece uma alternativa a Foucault, uma forma de resistência diante do poder moderno".
Concordamos com Foucault em que uma solução para problemas desenvolvida por outros povos e em outras épocas não pode ser, simplesmente, 'transplantada' sem maiores consequências para outros problemas e outras épocas. Por isso, segundo ele mesmo deixa claro, não se trata de reduzir a questão do cuidado de si a uma 'volta aos gregos', mas é importante ver como tais povos, no caso dos gregos, lidaram com seus problemas. Afinal, o cuidado de si, embora zelosamente trabalhado então por eles, também verificava-se de outras maneiras em outros povos e épocas.
Hoje, epiméleia tem sua possibilidade de problematização também à luz do que experimentamos em nossa condição de professores, num mundo cada vez mais virtual e de relações ainda mais, no dizer de Bauman, Z. (2003): 'líquidas'.
No magistério, uma das profissões de ajuda, o cuidado de si implica também no cuidado do outro. Portanto, o que estamos propondo não é epiméleia na perspectiva acenada pelo 'cada um cuida de si', constatada por Birman, J. (2003, p. 262) quando descreve o que entende como sendo o modelo antropológico da modernidade, no "estilo perverso de ser, [...] o outro como singularidade insubstituível e inconfundível não pode ser reconhecido como tal [...], se reduz à condição de um corpo para ser usufruído e devastado", tratando-se, portanto, de uma ação predatória e canibalesca que marca 'o estilo perverso de existir'.
Neste estilo perverso de existência, temos medo da exclusão, diz Bauman, Z. (2005, p. 99),:
O que todos nós parecemos temer, quer estejamos ou não sofrendo de 'depressão dependente', seja à luz do dia ou assombrados por alucinações noturnas, é o abandono, a exclusão, ser rejeitado, ser banido, ser repudiado, descartado, despido daquilo que se é, não ter permissão de ser o que se deseja ser. Temos medo de nos deixarem sozinhos, indefesos e infelizes. Tememos que nos neguem companhia, corações amorosos, mãos amigas. Receamos ser atirados ao depósito de sucata. O que mais nos faz falta é a certeza de que isso não vai acontecer - não conosco. Sentimos falta da garantia de exclusão da ameaça universal e ubíqua da exclusão...
A noção de epiméleia heautoû (cuidado de si) implica, necessariamente, a noção de epiméleia tonallon (cuidado dos outros). O respeito ao princípio da alteridade está presente.
É preciso que nos perguntemos, como docentes, como problematizamos a questão epiméleia em nossa vida. Mosquera, J. e Stobäus, C. (In Enricone, D., 2004, p. 95) indicam a necessidade de estarmos conscientes de que "não se alcança jamais a maturidade plena" e de que as crises existenciais na docência são constantes e devem ser trabalhadas pelo próprio professor, e, acrescentamos também, na perspectiva de melhor cuidar de si:
Os ajustamentos ou mudanças existem em cada um de nós, nos evidenciam que somos pessoas inacabadas, que estamos eternamente começando nossas vidas e reestruturando nossas relações. [...] os professores têm de construir-se diariamente e trabalhar em um mundo mutável, em constante transformação.
Isto faz-se importante de compreender porque compartilhamos da percepção de que "qualquer pessoa passa por fases que lhe são específicas e que precisa vencer para tornar-se mais equilibrada e conforme consigo" (Mosquera, J., 1979, p. 264). Por isso, cremos que a noção de epiméleia, tratada por Foucault, é possível de ser estendida ao magistério, de forma a contribuir na problematização que faz-se hoje sobre a questão do mal-estar na docência e suas possibilidades de superação.
Jesus, S. (2002) faz referência à necessidade de tratarmos dessa questão pelo viés de sua positividade, justificando seu pensamento ao mostrar que, de tanto insistir-se nela, pode que torne-se natural e conceda-se como algo de fato existente e irreversível no magistério.
Timm, E. (2006) reflete, perspectivado em Foucault, que esse viés pode ser ampliado para além da possibilidade de ser a afirmação do contrário do mal-estar. Pode-se problematizar a questão do mal-estar em uma perspectiva análoga àquela, como Foucault entendeu o poder em sua dimensão positiva, isto é, capaz de gerar comportamentos e não apenas de inibi-los. Gerar comportamentos de resistência ao mal-estar, criando condições de emergência das possibilidades de bem-estar na docência.
Isto se torna claro, e possível, ao trabalharmos a auto-subjetivação docente na perspectiva de Foucault, chamando "subjetivação o processo pelo qual se obtém a constituição de um sujeito, mais exatamente, de um (sic) subjetividade que, evidentemente, é apenas uma das possibilidades dadas de organização de uma consciência de si", conforme registra Ortega, F. (1999, p. 16).
Na constituição da produção de seu modo de existência ou estilo de vida, propomos, ao docente, perspectivado no indicativo que fazemos de que problematize a forma como vem ocupando-se de si mesmo (epiméleia), que trabalhe cotidianamente de forma real e positivamente sua autoimagem e sua autoestima na perspectiva de sua autorealização.
São conceitos que podem estar desgastados pelo uso comercial que deles muitas vezes o mercado tem feito. Ou que parecem não merecer a reflexividade de nossa atenção, em um mundo apressado no qual podemos adquiri-las ou melhorá-las pelo uso de algum psicofármaco. Lembramos, no entanto, que, se bem trabalhados, podem ter efeitos muito mais duradouros do que o número de páginas de livro de autoajuda de 'sucesso' ou o efeito 'milagroso' de um medicamento.
A auto-estima e a auto-imagem: perspectiva de um compromisso intransferível do professor com sua própria humanidade
A expressão autoestima está na moda, constata Polaino-Lorente, A. (2003, p. 17). Mas, sem dúvida, "é muito possível que o seu significado mais profundo todavia não haja sido desvelado como merece, e isso com independência de que seja um conceito de muito ampla circulação social na atualidade". E acrescenta, "quanto mais frequente é seu uso na linguagem coloquial, mais parece que seu autêntico significado é ignorado e passa inadvertido a muitos". Não cabe aqui neste texto tratar extensamente da problemática específica do entendimento do que seja a autoestima. Vamos ficar, no entanto, com o entendimento inicial deste autor que ela (p. 17): "denota a íntima valoração que uma pessoa faz de si mesma".
A autoestima, diz, está vinculada ao autoconceito, porém conhecer a si mesmo é importante, mas não significa o mesmo que estimar-se. Nessa questão, ele recorda William James, que já em 1890 entendia que (p. 20) "a autoestima é um sentimento que depende por completo do que nos propomos ser e fazer e que está determinado pela relação de nossa realidade com nossas supostas potencialidades", expressando-se, por isso, na fórmula de "uma fração, em que no denominador encontramos nossas pretensões e no numerador os êxitos alcançados".
A fórmula é Autoestima = Êxito /(sobre/dividida pelas) Pretensões. Isto significa que, conforme Palaino-Lorente, A. (2003, p. 21) "ela pode aumentar ou diminuir de acordo com os valores que se atribuam ao numerador e ao denominador". Por isso, "quanto maior seja o êxito esperado e não alcançado, mais baixa será a autoestima"; e, por sua vez, "quanto menores sejam as aspirações das pessoas ou maiores sejam os êxitos alcançados, tanto maior será a autoestima obtida".
Polaino-Lorente, A. (2003) desconfia, no entanto, de que possamos reduzir a questão da autoestima aos resultados alcançados. Porque, constata, existem pessoas que mostram-se triunfantes na vida, mas possuem baixa/irreal autoestima. Decorre disto, raciocina, observar que ela não pode ser atribuída exclusivamente aos resultados que se obtêm nas pretensões.
Nessa linha de reflexão, Mosquera, J. (1979, p. 251) escrevia sobre autorealização:
[...] a reflexão que o homem faz a respeito de sua pessoa indica sua capacidade de crescimento e opção no mundo. [...] Entretanto, nem sempre as ilusões se cumprem e os empecilhos da vida provocam mudanças na existência do indivíduo, que por vezes, traz conseqüências imprevisíveis para o desenvolvimento pessoal e social.
Polaino-Lorente, A. (2003, p. 28) oferece-nos três possibilidades para dizer da autoestima, das quais enfatizamos na perspectiva deste texto, porque faz menção ao conceito de pessoa "a convicção de ser digno de ser amado por si mesmo - e por esse mesmo motivo pelos demais -, com independência do que se é, tenha ou pareça". Segundo ele (p. 31), mesmo que sejam discutíveis neste campo teórico, as causas que produzem a autoestima e os fatores que contribuem para seu desenvolvimento podem variar de pessoa para pessoa:
A estima de cada pessoa com respeito a si mesmo não acontece no vazio, não é fruto de uma auto-percepção isolada, solitária e silenciosa, ao estilo da afilada e sutil introspecção. A auto-estima surge [...] da percepção de si mesmo [...], porém entreverada com a experiência que cada pessoa tem do modo em que os outros lhe estimam.
Para Polaino-Lorente, A. (2003, p. 34) é preciso reconhecer, ainda, que a autoestima tem se mostrado "um conceito muito pouco estável e excessivamente versátil que, logicamente, vai se modificando ao longo da vida". Nisto está contida a questão do autoconhecimento, ou seja, o que a pessoa pensa a respeito de si mesma. O autoconceito, nessa perspectiva, segundo Mosquera, J. (1983, p. 62), "é aquilo que pensamos ser". Cabe, portanto, a pergunta: o que pensa o professor de si mesmo? Que imagem constrói de si?
Segundo Mosquera, J. et al. (1979, p. 11), a "autoimagem é a visão pessoal que o indivíduo elabora a partir de seus pontos referenciais, da sua existência em contínua mutabilidade, e da imagem que ele faz das outras pessoas e que se reflete nele". E acrescenta que é "decorrente da autoimagem está a autoestima".
Refletindo sobre "a autoimagem e a autoestima como fatores básicos da construção do pessoal", Mosquera, J. (1983, p. 51) reafirma estudos anteriores por ele realizados em que constatou que "a natureza da autoimagem reside no conhecimento individual de si mesmo e no desenvolvimento das próprias potencialidades" (p. 52). Segundo Mosquera, J. et al. (1979, p. 7), "identidade, autoimagem e autoestima, são elementos nucleares da personalidade".
Mosquera, J. et al. (1979, p. 9), na perspectiva de que "o processo de formação da identidade está sempre em constante mudança e desenvolvimento, desde os primeiros dias de vida [...]", ainda afirma que a "identidade jamais é algo estabelecido, permanente ou estático" (p. 10) e que "não podemos criar uma imagem ideal do homem - ele é o que é no momento histórico em que vive" (p. 9). Portanto, - e aqui nos alinhamos -, faz-se importante, segundo o mesmo autor (1983, p. 62), "salientar a necessidade do estudo da autoimagem e da autoestima como processos permanentes e continuados da personalidade humana em qualquer etapa da vida".
Autoestima e autoimagem, cremos, não podem ser focalizados apenas na sua dimensão de resultado. Mas, principalmente, de processo, porque "nada nos garante uma estabilidade comportamental, seja no peso dos anos ou na experiência que desempenhamos". (Mosquera, J., 1983, p. 62). São processos permanentes, que desenvolvemos durante toda a nossa existência. Construídos e reconstruídos. Direcionados e redirecionados, em função das experiências que vamos somando em nossos anos de vida. No entanto, é preciso dar-se conta de que tais processos (p. 62) "em si são fluídos, mutáveis, mas paradoxalmente garantem consistência e continuidade".
A fluidez de tais processos, no entanto, não pode ser confundida com a fluidez da nossa 'era líquido-moderna' (Bauman, Z., 2003) em que o modelo antropológico em cartaz revela um 'estilo perverso de existir' (Birman, J., 2003). Trabalhar a si mesmo, de maneira a evidenciar que assume a responsabilidade pelo seu próprio processo de subjetivação, nos parece algo fundamental ao professor que não se resume à denominação que o seu fazer profissional lhe confere. Para tanto, o cuidado para com sua autoestima e sua autoimagem são importantes. Afinal, o que se busca com essa ocupação de si na perspectiva anteriormente apresentada é o sentimento de que se está num processo de autorealização permanente.
Considerações Finais
Em forma de um convite, para que o professor ocupe-se melhor consigo mesmo e que dê um pouco mais de atenção à sua humanidade, para que o 'mal-estar' não seja naturalizado e banalizado também na docência, enfatizamos que não podemos ignorar ou ser indiferentes ao fato de que o mal-estar que experimentamos nos dias de hoje alcança o magistério e, neste, principalmente a figura do professor. Mas, acreditamos, cabe ao professor ocupar-se consigo mesmo, da melhor forma possível, buscando construir sua vida numa perspectiva alternativa ao modelo oferecido pela liquidez dos dias que correm que despersonaliza e torna as pessoas insensíveis à vida - um modelo que banaliza o mal e legitima a perversidade.
Cuidar de si implica querer realizar-se todos os dias de sua vida. Reconhecer-se no comando de si, um arquiteto de si, um criador de si. Ser "capaz de doar-se e ao mesmo tempo manter-se íntegro, possibilitando o crescimento de si como algo original, típico e intransferível" (Mosquera, J., 1979, p. 263), e considerar que (p. 254) "a autorealização envolve muito mais que título, honrarias ou riquezas. Está centrada na pessoa [...]".
Centrar-se em si implica desenvolver uma educação de si que considere também os outros, que conosco repartem a existência. Não significa isolar-se, levantar barreiras e tornar-se invulnerável - entenda-se, aqui, insensível -. Não! Centrar-se em si implica, isto sim, ocupar-se melhor de si mesmo, construindo, na perspectiva das palavras de Foucault, a sua própria vida como uma obra de arte. A vida como uma obra de arte... Uma decisão ético-estética... Por que não? Vale lembrar, aqui, quando "Foucault nos pergunta por que 'não poderia a vida de todos se transformar numa obra de arte?'. Não poderíamos, então, dimensionar sua indagação ao contexto do magistério e perguntar por que não poderia a docência ser vivida pelo professor como uma obra de arte?" (Timm, E., 2006, p. 61).
Mas, - convém lembrar -, na perspectiva que estamos propondo do pensamento do filósofo francês, o entendimento da Epiméleia, no processo de autosubjetivação docente implica perceber que "ocupar-se de si não é uma sinecura", diz Foucault, M. (2002, p. 56). Isto é fundamental na problematização que fazemos do mal-estar na docência, tendo em vista as condições de bem-estar. Finalizando, cabe dizer que procuramos, como recomendou o poeta Mario Quintana, ferir de leve a frase, repetindo em linguagem amorosa essa mesma coisa - talvez mais de cem mil vezes dita e tratada filosoficamente pelos gregos: Epiméleia heautoû. O cuidado de si.
Referências
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Recebido em 12 de julho de 2010
Aceito em 25 de julho de 2010
Revisado em 08 de agosto de 2010