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Psicologia Hospitalar
versão On-line ISSN 2175-3547
Psicol. hosp. (São Paulo) v.4 n.2 São Paulo ago. 2006
ARTIGOS ORIGINAIS
A compulsão alimentar na recepção dos profissionais de saúde
Binge eating disorders in the perception of the health professionals
Gabriela Alves de Olivera; Patricia Nunes da Fonsêca
RESUMO
O transtorno de Compulsão Alimentar é uma categoria diagnóstica recente, e tem como característica episódios de hiperfagia acompanhados da sensação de falta de controle. É um transtorno bem mais freqüente nas mulheres do que nos homens. Considerando esses aspectos, este trabalho teve como objetivo identificar as percepções dos profissionais de saúde sobre o Transtorno de Compulsão Alimentar e os pacientes acometidos dessa doença. Participaram nove profissionais de saúde (médicos, nutricionistas e psicólogos) que trabalhavam em hospitais públicos e clínicas particulares. Eles responderam a uma entrevista semi-estruturada. Os resultados mostraram que, apesar de os profissionais terem formações diferentes, apresentaram, em sua maioria, percepções semelhantes quanto à doença e aos pacientes acometidos desse transtorno. Considerando as limitações da pesquisa, sugere-se a replicação do estudo com uma amostra maior de profissionais e a averiguação da percepção dos familiares desses pacientes, tendo em vista serem personagens importantes no processo terapêutico.
Palavras-chave: Compulsão alimentar, Transtornos alimentares, Diagnóstico.
ABSTRACT
The binge eating disorders is a recent disgnostic category. It is characteristically followed by episodes of hyperphagia involving the sensation of a lack of control. It is a disorder wich is more frequent in womem than men. Considering these aspects, the objective of this study was to identify the perceptions that health professionals have on the binge eating disorders and the patients that suffer from this illness. Nine health professionals (doctors, nutritionists and psychologists) that worked in clinical public hospitals participated. They responded to a semi structured interview. The results showed that although the professionals have different backgrounds, similar perceptions showed up regarding the illness and the patients that suffered from this order. Considering limitations of this, another study involving a larger sample of professionals is suggested, including the perceptions of the family members of these patients since they are important in the therapeutic process.
Keywords: Eating disorder, Eating disorders, Diagnosis.
INTRODUÇÃO
A Organização Mundial da Saúde (OMS) verificou que o número de pessoas que tem problemas por comer a mais do que deveriam ultrapassou o número de pessoas que passam fome (Santiago, 2002). Frente a isto, há uma preocupação da comunidade acadêmica em estudar os transtornos alimentares, mais especificamente, as pessoas portadores destes transtornos visto apresentarem, não apenas problemas de ordem orgânica, mas também psicológicas como por exemplo: ansiedade, estresse e depressão (Sobreira, 2007).
Na classificação dos transtornos mentais, encontramos um grupo que se refere às perturbações no comportamento alimentar. Este grupo é denominado Transtornos Alimentares e, segundo a última edição do Manual Diagnostico e Estatístico (DSM-IV, 2002) da Associação Psiquiátrica Americana (APA) compreende três categorias diagnósticas: Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa e Transtornos Alimentares sem outras especificações. Neste último está o Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica que é uma categoria diagnóstica nova e controversa, cuja validade está sendo pesquisada e pode estar associada à obesidade (Appolinário, Nunes, Abuchaim & Coutinho, 2002; Azevedo, Santos & Fonseca, 2004; De Zwaan, 1997). Segundo os critérios do DSM-IV (2002) o diagnóstico requer a presença de três ou mais dos seguintes aspectos:
a) episódios recorrentes de compulsão alimentar estão caracterizados por comer em período limitado uma quantidade de alimentos considerada definitivamente maior que a aceitável para a maioria das pessoas durante um período e circunstâncias semelhantes; falta de um sentimento de controle sobre os episódios (a sensação de não poder parar, nem controlar o que está comendo e a sua quantidade).
b) os episódios de compulsão alimentar estão associados a pelo menos três dos aspectos seguintes: comer mais rápido do que o usual; ingerir os alimentos até sentir-se desconfortavelmente satisfeito; consumir grandes quantidades de alimentos, apesar de não sentir fome; comer sozinho por se sentir constrangido com a quantidade que está consumindo; sentir-se decepcionado, deprimido ou culpado pela superingestão;
c) o episódio de compulsão alimentar provoca um marcante desconforto;
d) os episódios ocorrem em média duas vezes por semana durante seis meses;
e) o episódio não está associado com o uso regular e inadequado de um comportamento compensatório (ex.: de tipo purgativo, jejum ou exercício excessivo) e não acontece exclusivamente durante o curso de Anorexia Nervosa ou Bulimia Nervosa.
De acordo com Stefano, Borges e Claudino (2002), os estudos epidemiológicos descrevem uma prevalência de TCAP (Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica) em 2%da população geral e cerca de 30%de obesos que procuram serviços especializados para tratamento de obesidade (Melin, 1998; Segal, Cardeal & Cordas, 2002). Apesar de estar presente em homens e mulheres, Sobreira (2007) afirma que há uma predominância no sexo feminino, na proporção de 3/2, geralmente tendo início na adolescência. Ademais, o índice de massa corporal (IMC = peso/altura ao quadrado) das mulheres com este diagnóstico são mais altas do que daquelas que não apresentam TCAP, bem como oscilações no peso (Siqueira, Appolinario & Sichieri, 2005; Vitolo, Bortolini & Horta, 2006).
Vários transtornos psíquicos podem vir associados à compulsão alimentar, como por exemplo: anorexia nervosa, bulimia nervosa, obesidade, diabetes e depressão (Sobreira, 2007), que de acordo com, estes últimos, Borges e Jorge (2000), estão 50%dos casos. Alguns casos podem ainda apresentar Transtorno obssessivo-compulsivo, ressalta Papelbaum & Appolinário (2001).
Os transtornos alimentares possuem uma etiologia multifatorial, composta de predisposições genéticas, socioculturais e vulnerabilidades biológicas e psicológicas. Entre os fatores predisponentes, destacam-se a história de Transtorno Alimentar e/ou Transtorno de Humor na família, os padrões de interação presentes no ambiente familiar e o contexto sócio-cultural em que o indivíduo está inserido, que na atual sociedade, caracteriza-se pela extrema valorização pela mídia das pessoas com corpo magro. Além disto, deve-se levar em consideração alguns traços de personalidade do indivíduo que, segundo Sobreira (2007), parecem favorecer o desenvolvimento do transtorno, como baixa auto-estima, perfeccionismo, impulsividade e pensamentos dicotômicos (total controle e total descontrole).
O curso transitório ou crônico de um transtorno alimentar está relacionado à persistência de distorções cognitivas, à ocorrência de eventos vitais significativos e a alterações secundárias ao estado de desnutrição. A gama de aspectos envolvidos na etiologia dos transtornos alimentares é imensa (Freitas, Lopes, Coutinho & Appolinário, 2001). O desafio para aqueles que trabalham tanto na clínica como na pesquisa destes transtornos não é simplesmente descrever todos os elementos envolvidos, mas sim, o de compreender como diversos fatores interagem entre si em cada caso ou situação. Finalmente, é importante lembrar que os transtornos alimentares não emergem abruptamente, mas se desenvolvem ao longo de vários anos, a partir de predisposições presentes desde o nascimento do indivíduo, de vulnerabilidade que emergem nas primeiras etapas da vida e de ocorrências mais tardias na sua história (Morgan, Vecchiatti & Negrão, 2002).
O ato de comer, muitas vezes, está ligado a uma forma de aliviar sentimentos negativos como raiva ou frustração. É comum a pessoa associar o alimento a uma forma de aliviar ou de compensar o sofrimento. Mas a função da comida é nutrir o organismo e, quando usada para preencher alguma lacuna emocional, é eficaz apenas temporariamente, pois o vazio sempre volta juntamente com o sentimento de culpa (Barros, 1997).
Um comedor compulsivo abrange no mínimo dois elementos: o subjetivo (a sensação de perda de controle) e o objetivo (a quantidade do consumo alimentar). Do ponto de vista psicológico, já se detectaram vários fatores (por exemplo, a ansiedade, estresse, depressão, raiva, tédio, frustração, solidão) que podem desencadear esses ataques. Eles acometem fundamentalmente pessoas que já passaram por vários períodos de jejum/fome devido a dietas. Existem também prováveis causas ligadas ao funcionamento do sistema nervoso central, mas ainda não completamente desvendadas pela medicina (Lemes, 2002).
O TCAP é um transtorno psiquiátrico e traz muitos riscos à saúde, devendo, assim, ser tratado diferenciadamente. Mas, mesmo assim, muitos dos pacientes que sofrem com a compulsão alimentar são freqüentemente encontrados em programas para perda de peso e lá recebem tratamento igual ao de uma pessoa sem o transtorno. Porém, a especificidade deste paciente deve ser levada em conta para que o tratamento tenha sucesso (Borges & Jorge, 2000). O TCAP tem solução e a orientação deve centrar-se inicialmente na diminuição da freqüência dos episódios de compulsão alimentar. O tratamento é composto por: medicamentos, psicoterapia e dietas que estejam enquadradas na realidade de cada paciente (Appolinario, 2004), além da incorporação de exercícios físicos na rotina.
A terapia cognitivo-comportamental desempenha uma importante função na adesão ao tratamento e no controle dos episódios de comer excessivo (Duchesne, 1995). De acordo com Perez (2004), a terapia cognitivo-comportamental é uma psicoterapia de curto prazo, que enfoca vários aspectos do problema, pensamentos distorcidos como a auto-avaliação centrada no peso e forma do corpo, baixa auto-estima, perfeccionismo, hábitos alimentares inadequados, fatores que precipitam o ataque de comer e os sentimentos relacionados.
Essa abordagem é considerada mais diretiva por trabalhar com os comportamentos dos sujeitos, auxiliando que estes encontrem autonomia no seu tratamento e, posteriormente em sua vida. A pessoa aprende a identificar o que causa a compulsão alimentar e um conjunto de técnicas para controlá-la, como por exemplo, a técnica do diário alimentar, na qual o paciente anota tudo relacionado às suas refeições como o que come; a hora que come; além dos sentimentos presentes antes, durante e depois de alimentar-se (Lemes, 2002). A psicoterapia cognitivo-comportamental tem entre seus propósitos, buscar eliminar comportamentos indesejáveis e prejudiciais ao indivíduo, trabalhando as crenças que os subsidiam e, por vezes, substituindo-os por outros ou tirando-lhes o grau de importância e significado de modo que possam ser abandonados.
Na compulsão alimentar fica claro que a dificuldade em aderir ao tratamento liga-se ao fato de que a ingestão alimentar tem importante função na manutenção do equilíbrio psíquico, sendo a restrição alimentar algo que terá impacto direto na vida emocional. A presença da depressão compreende também uma grande dificuldade de adesão ao tratamento e as limitações dos alcances terapêuticos no tratamento e, por isso, deve ser tratada concomitantemente com o transtorno de compulsão alimentar. Outro fator importante para uma boa adesão ao tratamento é que o paciente consiga manter uma relação de empatia e confiança com os profissionais que estiverem envolvidos no tratamento (Perez, 2004).
Inaugurado no Brasil há cerca de 20 anos, o grupo chamado Comedores Compulsivos Anônimos tem como pressuposto básico a idéia de que a compulsão alimentar é uma doença, mas que pode ser tratada com autocontrole e perseverança seguindo os princípios e o programa de doze passos e doze tradições de recuperação utilizados pelos Alcoólicos Anônimos. O apoio dos Comedores Compulsivos Anônimos pode ser decisivo para se aprender a lidar com a própria compulsão, distúrbio alimentar que é resultado de um relacionamento problemático com a comida. O grupo reúne homens e mulheres decididos a resolver uma dificuldade comum a todos, compartilhando experiências, força e esperança (Iász, 2004).
As pessoas que apresentam o transtorno da compulsão alimentar são atendidas por diversos profissionais, tais como: médicos, nutricionistas, educadores físicos, psiquiatras e psicólogos. Sabendo que a percepção destes profissionais acerca do transtorno pode intervir no tratamento, buscou-se, então, identificar as percepções dos médicos, nutricionistas e psicólogos sobre o transtorno da compulsão alimentar. De forma específica, procurou-se verificar a compreensão destes profissionais quanto aos sentimentos dos pacientes, do significado da comida para estes, das doenças associadas e das possibilidades de tratamento.
MÉTODO
Amostra
Participaram nove profissionais da área de saúde (médicos, psicólogos e nutricionistas) de instituições públicas e particulares da cidade de João Pessoa/PB, que trabalhavam diretamente com pacientes que apresentavam o diagnóstico de Compulsão Alimentar. Os participantes foram selecionados de acordo com a conveniência de acesso.
Instrumentos
Foi utilizado um roteiro de entrevista semi-estruturado contendo duas partes: informações sócio-demográfica dos participantes (sexo, idade, formação, etc.) e questões referentes ao Transtorno de Compulsão Alimentar e aos pacientes (tratamento, sentimentos mais presentes, significado do alimento, etc).
Procedimentos
Para a realização das entrevistas, as pesquisadoras fizeram uma primeira visita aos locais de trabalho de cada um dos profissionais, com o intuito de convidá-los a participarem da pesquisa e assinassem um termo de adesão e consentimento conforme a exigência do conselho de ética. A partir da autorização, foram organizados horários e dias específicos para que fossem realizadas as entrevistas pelas pesquisadoras.
Todas as entrevistas foram realizadas de forma individual e no local de trabalho dos participantes. Foi pedida a autorização para que as entrevistas fossem gravadas, mas apenas dois dos profissionais envolvidos concordaram com o pedido. Os demais optaram por escrever suas próprias respostas, falando ao mesmo tempo para que fossem ouvidos e tiradas as dúvidas que surgissem. Os participantes foram informados também de que as respostas seriam tratadas em conjunto, garantindo-lhes o direito de sigilo.
Analise dos Dados
Foram realizadas análises quantitativas (porcentagens) e qualitativas (análise de Bardin, 1977), sendo que nesta última, procurou-se analisar o seu conteúdo simbólico, ou seja, descobrir os "núcleos de sentido" que compõem a comunicação.
RESULTADOS
1. Percepção dos profissionais de saúde acerca dos sentimentos dos pacientes de compulsão alimentar
De acordo com os profissionais de saúde, o principal sentimento vivenciado pelos pacientes de compulsão alimentar é a baixa auto-estima, seguido por culpa, vergonha e inferioridade. Por fim, raiva, medo e angústia, como pode ser visto na Figura 1.
2. Percepção dos profissionais de saúde acerca do significado da comida para os pacientes de compulsão alimentar
Conforme os profissionais, o alimento para os pacientes não tem propriamente o significado de alimentar, ou seja, dar os nutrientes necessários para a sobrevivência do indivíduo, mas, significa a busca pelo prazer oral seguido de preenchimento de um vazio emocional, como pode ser visualizado na Figura 2.
3. Percepção dos profissionais de saúde acerca das doenças associadas à Compulsão Alimentar.
Com relação às doenças associadas à compulsão alimentar, os profissionais de saúde indicaram a hipertensão e o diabetes como as principais, seguida pela depressão, e em menor freqüência, as cardiopatias, a bulimia e o transtorno obsessivo compulsivo, como se pode ver na Figura 3.
4. Percepção dos profissionais de saúde referente ao Tratamento da Compulsão Alimentar.
O tratamento do transtorno da compulsão alimentar envolve vários aspectos desde o envolvimento dos profissionais de saúde responsáveis pelas indicações necessárias até a motivação do próprio paciente. Portanto, a seguir, na Tabela 1, são expostos alguns dos pontos apontados pelos profissionais de saúde acerca do tratamento.
De acordo com a Tabela 1, no que se refere à categoria Indicações para o tratamento, verificou-se que oito dos profissionais de saúde entrevistados ressaltaram a psicoterapia como importante aliada no tratamento do Transtorno de Compulsão Alimentar, seguido de seis respostas para reeducação alimentar, três para o uso de medicamentos e, por fim, duas respostas sobre a manutenção de um diário alimentar. Em relação à motivação para o tratamento, observaram-se seis respostas referentes à baixa auto-estima e cinco respostas referentes aos valores sociais e preconceito. Na categoria dificuldade de adesão ao tratamento às respostas foram as seguintes: quatro para problemas nas relações interpessoais ligados a falta de apoio e cinco respostas para disciplina e autocontrole. Sobre o sucesso do tratamento quatro dos profissionais falaram sobre a importância da boa auto-estima e força de vontade, e três deles falaram sobre a motivação. Já na categoria profissionais engajados para o tratamento, verificaram-se oito respostas referentes aos nutricionistas, nove referentes aos psicólogos, oito respostas referentes aos médicos e, por fim, três respostas referentes aos educadores físicos.
DISCUSSÃO
A presente pesquisa teve como objetivo principal conhecer as percepções dos médicos, nutricionistas e psicólogos acerca do transtorno da compulsão alimentar bem como, dos pacientes com este diagnóstico. Não obstante, cabe apontar algumas limitações desta pesquisa que, embora não a invalidem ou comprometam seus objetivos, demandam pensar criticamente os resultados previamente. Por exemplo, incluíram-se amostras de conveniência, não sendo representativas da população paraibana. Além disso, podem-se também ressaltar as questões que foram abordadas na entrevista, a qual pode não ter sido abrangente o suficiente para dar conta de toda a temática. Todavia, alguns resultados merecem ser discutido.
A literatura aponta que o paciente que sofre de compulsão alimentar vive em meio a centenas de sentimentos conflituosos, especialmente nos episódios de compulsão, onde eles são tomados por desconfortos físicos, além de sentimentos de autocondenação, medo, raiva, por exemplo (Espínola & Blay, 2006). Isto foi o observado no presente estudo, onde os profissionais percebem a baixa auto-estima, culpa e vergonha, como os sentimentos mais freqüentes nos indivíduos que sofrem com esse distúrbio. Ainda ressaltam que os pacientes ficam envergonhados do que fazem, sentem-se culpados por não conseguirem se controlar diante da comida. Isso faz com que eles se sintam mal consigo mesmos, e considerem-se fracos e impotentes.
Considerar e compreender as limitações do paciente parece ser importante para que os profissionais não recriminem nem os rejeitem os pacientes, atitudes ainda presentes na sociedade.
A comida, para as pessoas que apresentam a compulsão alimentar, tem um significado muito forte e, segundo Perez (2004), transcende a simples ingestão de alimentos, podendo vir a cumprir funções muito importantes e divergentes da nutrição orgânica, como a obtenção de prazer ou compensação psicológica ou emocional. Corroborando com a literatura, os participantes do estudo afirmaram que os pacientes usam os alimentos para preencher vazios emocionais causados pelas mais diversas causas, como, por exemplo, fracasso profissional, desilusões amorosas ou perda de alguém querido. Além disso, a comida traz para essas pessoas sentimentos de prazer, de euforia, como se fosse um presente, um sinônimo de felicidade.
O Transtorno de Compulsão Alimentar vem acompanhada de outras doenças, podendo ser uma causa ou uma conseqüência das mesmas. Neste estudo, foram citadas algumas doenças que geralmente apresentam-se associadas ao transtorno, como diabetes e a hipertensão, além da depressão, que, de acordo com Perez (2004), compreende uma grande dificuldade de adesão ao tratamento e, por isso, deve ser tratada concomitantemente.
Quanto à percepção dos profissionais de saúde acerca do tratamento do transtorno em questão, especificamente no que se refere às indicações de tratamento, verificou-se que a psicoterapia foi a opção que mais se destacou. Esse resultado vem confirmar o que Lemes (2002) afirma, quando ressalta que o transtorno de compulsão alimentar vem acompanhado de vários fatores psicológicos como a ansiedade, a depressão, a raiva, o tédio, a solidão - o que requer um tratamento psicoterapêutico.
No que diz respeito à motivação para o tratamento, verificou-se que para os profissionais que participaram do estudo, a baixa auto-estima e os valores sociais, bem como o preconceito, são fatores determinantes para que os pacientes decidam por iniciar o tratamento da compulsão alimentar. Estes dados confirmam o que Morgan, Vecchiatti e Negrão (2002) disseram sobre o contexto sócio-cultural. Para estes a sociedade é caracterizada pela extrema valorização do corpo e de certos traços de personalidade, discriminando aqueles que se mostram diferentes dos padrões considerados normais.
Esses valores sociais também podem vir a ser fatores que venham a atrapalhar o paciente no seu tratamento, uma vez que, segundo os resultados deste trabalho, as pessoas que sofrem dessa doença têm muita dificuldade para alcançar uma boa adesão ao tratamento, em virtude dos problemas nas relações interpessoais ligados à falta de apoio e de compreensão. Outra dificuldade citada está ligada à questão da disciplina e do autocontrole necessários, devido ao fato de que a base do tratamento está na mudança de hábitos. Segundo Perez (2004), a dificuldade em manter o tratamento está vinculada à importância que a ingestão alimentar tem para manter o equilíbrio psíquico, sendo a restrição alimentar algo que traz conseqüências diretas na vida emocional do paciente.
Com isso, os resultados sobre o sucesso do tratamento referem-se à importância de uma boa auto-estima, vinculada à força de vontade e uma motivação real, uma vez que, a partir do momento que a pessoa em tratamento mantém uma boa relação consigo mesma de confiança, compreensão e paciência - ela conseguirá sentir-se mais segura e forte o suficiente para alcançar suas metas.
Por fim, para um tratamento eficaz do transtorno de compulsão alimentar, o paciente precisa ser assistido por uma equipe profissional com várias especialidades. De acordo com Borges e Jorge (2000), a base do tratamento desse distúrbio é a psicoterapia, dietas que estejam de acordo com a realidade de cada paciente e/ou uso de certos medicamentos. Corroborando, assim, os resultados desse estudo, que afirma ser importante para o sucesso do tratamento, que a equipe profissional responsável pelo paciente seja composta de médicos, nutricionistas e psicólogos.
Para trabalhos futuros sobre o assunto poderiam buscar outros caminhos, usando amostras maiores, que pudessem englobar outros profissionais (por exemplo: educador físico) ou ainda, poderia estar direcionado para a percepção dos próprios pacientes portadores do distúrbio, onde pudesse abordar as dificuldades e expectativas. Desta forma expandia-se mais o conhecimento sobre o assunto e possibilitaria uma melhor compreensão dos aspectos que estão envolvidos no Transtorno de Compulsão Alimentar.
CONCLUSÕES
O conhecimento das percepções que fundamentam o comportamento dos profissionais de saúde que trabalham com o transtorno de compulsão alimentar, permitiu perceber as coerências e as incoerências na prática desses profissionais. Na verdade, os tratamentos sugeridos apresentaram-se sempre coerentes com as percepções que estes teriam sobre o que seria tal transtorno e suas peculiaridades. A ênfase na necessidade de uma equipe multidisciplinar veio mostrar como a existência de olhares diferentes enriquece o tratamento sugerido aos pacientes portadores desse distúrbio alimentar.
Nesta pesquisa, conclui-se que apesar de os profissionais, que participaram deste trabalho, serem de especialidades diferentes, apresentaram opiniões muito coerentes do tratamento que oferecem. Isto mostra a possibilidade de haver um trabalho multidisciplinar junto aos profissionais de saúde, pois a diversidade de conhecimentos que esses trazem podem vir a contribuir para a compressão do processo de adoecimento e cura, principalmente, quando o assunto em questão é uma doença tão complexa como o Transtorno de Compulsão Alimentar.
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