EDITORIAL

Questões Contemporâneas II

Betty Bernardo Fuks

Editora Responsável

Devido ao grande número de artigos recebidos para publicação, todos eles problematizando as transformações culturais e mudanças sócio-políticas de nosso tempo, optamos por oferecer ao leitor uma oportunidade de ter acesso a mais uma série de trabalhos que estendem o universo das questões que deram corpo ao primeiro número da Trivium em 2018.

Abrindo essa nova edição, a conferência da psicanalista americana Patrícia Gherovici "A psicanálise está preparada para a mudança de sexo?", aborda o fenômeno cultural descrito nas notícias como "momento transgênero" que está mudando as noções de gênero, sexo e identidade sexual. Sua tese gira em torno da ideia de que essa evolução implica um realinhamento importante na prática psicanalítica.

Em Artigos Temáticos, "O discurso capitalista e seus gadgets" questiona o lugar do sujeito contemporâneo, a partir das evidências da falta de laço social provocado pelo discurso capitalista. "Slow Food e as práticas atuais de cuidado com a alimentação", traz uma reflexão contundente sobre os imperativos de vida saudável e seus efeitos nos modos de o sujeito alimentar-se, em articulação ao contexto político-subjetivo atual. "We are just bored teenagers: notas sobre o tédio na adolescência" oferece uma discussão sobre o tédio e sua relação com a cultura digital, buscando compreender se esse afeto seria uma característica particular da contemporaneidade ou uma manifestação própria da puberdade. Em seguida "Luto e melancolia nas demências: a psicanálise na clínica do envelhecimento" enfrenta a questão das perdas reais e simbólicas que se impõem como pilar fundamental à compreensão da clínica do envelhecimento; questão que se torna cada vez mais presente frente às atuais transformações históricas que atingem a terceira idade. Numa linha psicológica e filosófica, "Mitigação das perdas na população sênior participante de programas sociais" perscruta a figura da morte em grupos de atendimento que têm como meta reinserir socialmente o idoso. "O Ato Analítico no Âmbito da Saúde Mental Pública", contém reflexões teóricas de grande valia aos profissionais da rede pública que apostam no papel da psicanálise de propiciar um espaço para o psicótico fazer o seu trabalho de estabilização. Por fim, "Transferencia en condiciones no ortodoxas: su especificidad" problematiza a psicanálise extramuros e propõe dispositivos de análise necessários à fundamentação desse tipo de prática e de pesquisa que se vem impondo na atualidade.

Em Artigos, o ensaio "Liev Tolstói: o romancista e o dogmático. Do conflito perene à produção literária", mostra que o pathos inconfundível desse autor reside na tensão entre duas facetas, moralista e literária, de modo que sua relevância reside na construção de uma literatura híbrida, marcada por uma dialética conciliatória entre doutrina e ficção. "Memória, traço e escrita", tem como objetivo evidenciar a importância do traço unário na constituição da memória e evidenciar igualmente a presença no psiquismo de uma marca, a letra, que sustenta a relação do sujeito com o desejo. "L'enfant et son ludion", enuncia as bases de uma nova heterologia que, entre os termos lacanianos do Outro e do outro, acharia necessário inserir uma dimensão mais material do que a de objeto a que é ausência de objeto, qual seja, a dimensão de um artefato criado pela diferença que marca o corpo da criança em seu nascimento, entre a água e o ar, tornando este corpo um ludion.

A resenha "Criação, cuidado e (des)autorização na clínica e na formação do analista" sublinha a importância do livro de Daniel Kupermann Estilos do Cuidado: a psicanálise e o traumático, para a clínica contemporânea. O comentário crítico "Aos olhos da psicanálise" reconhece no filme Aos teus Olhos de Carolina Jabor, alguns dos destinos do mal-estar em nosso tempo.

Boa leitura!