EDITORIAL

Editorial

A revista Psicologia Clínica apresenta seu número 32.3, intitulado "Psicanálise, Clínica e Literatura". Esta publicação se compõe de nove artigos, divididos em duas seções: uma temática, com o mesmo título do número, e outra livre.

A seção temática abre esta edição do periódico, e o primeiro artigo, de autoria de Daniela Fernández (Universidad Viña del Mar, Chile), tem o título Entre los afectos y la autoridad: Discursos de padres y madres sobre la adolescencia de sus hijos e hijas. O trabalho, publicado em espanhol, apresenta uma discussão dos impactos no desenvolvimento psicológico de diversos estilos e condutas dos pais na criação de seus filhos. A discussão, embasada em um referencial psicanalítico, utiliza duas vinhetas para exemplificação dos fenômenos e suas apresentações na clínica. Dessa forma, a seção temática se inicia trazendo à tona o referencial psicanalítico e aspectos da clínica.

O segundo trabalho da seção, de autoria de Marina Firpo Siqueira Pereira (Universidade Franciscana - UFN, Santa Maria, RS), Diego Frichs Antonello (Faculdade Integrada de Santa Maria, RS), Carolina Schumacher e Cristina Saling Kruel (ambas da UFN), tem o título A experiência traumática precoce no berço das crianças "sábias". Também envolvendo a temática do desenvolvimento sob a luz da psicanálise, neste caso através das formulações de Winnnicott e Ferenczi relacionadas ao uso indevido da mente e à autoclivagem narcísica, os autores ressaltam como, mesmo que em janelas desenvolvimentais distintas, os efeitos traumáticos precoces podem repercutir em manifestações posteriores, na vida adulta.

O terceiro artigo, Sobre intervenções do analista: Uma experiência clínica articulada aos quatro discursos de Lacan, é de autoria de Maria Lúcia da Silva Bueno e Carlos Henrique Kessler (ambos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS). Este estudo utiliza fragmentos de um processo terapêutico já finalizado para analisar como o material clínico produzido influencia o analista de diferentes formas. A construção do trabalho ilustra de forma substancial a ética psicanalítica e terapêutica sob a pressão de efeitos pessoais, técnicos e teóricos que o conteúdo do material clínico produz.

O quarto artigo da seção temática é intitulado Schreber escritor, cujos autores são Renata Gruner, Amadeu de Oliveira Weinmann e Priscilla Machado de Souza (todos filiados à UFRGS, sendo Priscilla Machado de Souza também membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre). Dentro da seção temática, o artigo mantém o fio condutor da psicanálise, mas insere elementos da literatura no contexto. Os autores apresentam uma construção baseada nos comentários de Freud e nas teorizações de Lacan sobre a autobiografia de Daniel Paul Scherber, que subsidiaram elementos da clínica psicanalítica relacionada às psicoses. O trabalho ressalta como a produção escrita pode ter um papel no funcionamento psíquico e traz para nossa seção temática o aspecto da literatura.

O último artigo da s eção temática também é relacionado à literatura. Intitulado Cortar para ler: O que "Tree of codes" pode ensinar sobre a arte da escuta, tem como autoras Camila Backes dos Santos (UFRGS e Feevale, Novo Hamburgo, RS) e Simone Zanon Moschen (UFRGS). Neste trabalho, as autoras também usam das teorias de Freud e Lacan considerando pontos da obra literária Tree of Codes, de Jonathan Safran Foer. Relacionando aspectos desta obra e das teorias, indicam como o papel da escuta no processo terapêutico pode ser ligado ao da leitura.

Já na seção livre, quatro artigos são apresentados. A seção se abre com Suicide and social media: Dialogue with clinical psychologists, de Tales Vilela Santeiro, Rafael Franco Dutra Leite (ambos da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, MG) e Glaucia Mitsuko Ataka da Rocha (Universidade Federal do Tocantins). Em inglês, o trabalho investigou, de forma prioritariamente qualitativa, como psicólogos clínicos relacionam o uso de ferramentas associadas à internet e o comportamento suicida.

O segundo artigo da seção livre, El rol de las funciones ejecutivas en las estrategias cognitivas de regulación emocional no adaptativas en niños, em espanhol, é de um grupo de autoras argentinas: María Laura Andrés, Lorena Canet Juric, Florencia Stelzer, Isabel Introzzi (todas filiadas à Universidade Nacional de Mar del Plata - UNMDP e ao Consejo Nacional de Investigaciones Cientificas y Tecnicas - CONICET, Argentina) e María Cristina Richaud (CONICET). A produção internacional investiga o papel de diferentes funções executivas em desfechos relacionados à regulação emocional de crianças. Utilizando métodos quantitativos, resultados que consideram diferenças de sexo foram apresentados, levantando interessantes perspectivas.

O penúltimo trabalho deste número tem o título Development of the PSI: A phone interview for screening for Autistic Spectrum Disorder (ASD) symptoms. O trabalho, apresentado em inglês, é mais uma produção exclusivamente de autoras do sexo feminino: Helenice Charchat Fichman, Conceição Santos Fernandes, Laryssa Siqueira Couto da Cunha Heckert Alves da Costa (as três da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio), Rachel de Figueiredo Barbabela e Oliveira Valois (Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, Portugal), Mariana de Miranda Seize (PUC-Rio) e Fabiana Estrela Silveira Bethlem (Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ). No trabalho são apresentados os passos realizados para a construção de uma entrevista de detecção telefônica de sintomas do transtorno do espectro autista em crianças. A construção, apresentada respeitando etapas específicas, resulta em um instrumento útil para áreas de pesquisa e clínica.

Fechando este número da revista, apresentamos o artigo A família na psicoterapia infantil: Uma revisão integrativa das abordagens humanistas e fenomenológicas, de autoria de Manuela de Albuquerque Rocha Siqueira, Lucas Bloc e Virginia Moreira (todos da Universidade de Fortaleza, CE). O estudo consistiu em uma revisão bibliográfica focada em publicações que tivessem como referencial teórico as linhas humanistas e/ou fenomenológica e, ao mesmo tempo, abordassem a participação da família no processo terapêutico de crianças. Os resultados sustentam a necessidade de um maior investimento em formação na área, bem como na sistematização da publicação científica sobre o tema.

Breno Sanvicente-Vieira