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Psicologia da Educação

versão impressa ISSN 1414-6975versão On-line ISSN 2175-3520

Psicol. educ.  no.46 São Paulo jan./jun. 2018

 

10.5935/2175-3520.20180004 ARTIGOS

 

Mapeamento do conhecimento de professores sobre violência intrafamiliar

 

Mapping of the teachers knowledge on family violence

 

Mapeo de conocimiento del profesor sobre la violencia familiar

 

 

Geysa Machado Cascardo; Alex Eduardo Gallo

Universidade Estadual de Londrina

 

 


RESUMO

A violência está presente em todos os contextos e ocorre de várias formas: física, psicológica, sexual e a negligência. O presente estudo buscou mapear o conhecimento que os professores possuem relacionados à violência intrafamiliar que se reflete no ambiente escolar. Participaram do estudo, 161 professores, da rede Estadual, de uma cidade do interior do Paraná, com turmas de 6º ao ensino médio. Foi utilizado um questionário em escala tipo likert. Dentre outros aspectos, verificou-se que os participantes eram mulheres (72%), com idades entre 23 e 66 anos, tempo médio de 17 anos de atuação e de formação, metade na área de humanas. Desses participantes, 46,6% afirmaram ter identificado algum caso de violência intrafamiliar. Quanto ao conhecimento sobre violência intrafamiliar, a maioria apresentou respostas esperadas em relação a: consequências no comportamento do aluno, características do agressor, informações para os professores, informações gerais sobre violência. Quando focalizadas as possíveis intervenções, as respostas esperadas foram escolhidas por 47,57% dos professores. Os resultados apontaram que professores tem conhecimento sobre a temática, contudo não sabem como intervir adequadamente.

Palavras-chave: Violência intrafamiliar, Professores, Escola.


ABSTRACT

Violence is present in all contexts and happens in different ways: physical, psychological, sexual and neglect. The present study aimed at mapping the knowledge teachers have about family violence that reflects in school environment. 161 teachers of public schools in a country town in Parana state participated. We developed and teachers answered a likert questionnaire. Among other things, it was verified that participants were women (72%), with ages between 23 and 66, and average time of formation and working of 17 years, half from human science field. 46.6% of participants stated that they had identified some case of family violence. As to the knowledge of family violence, most teachers answered as expected about: consequences to student behavior, aggressors' characteristics, information for teachers, general information about violence. When focusing on possible interventions, expected answers were given by 48.86% of participants. Results pointed out teachers know about violence; however they do not know how to properly intervene.

Keywords: Family Violence, Teacher, School.


RESUMEN

La violencia está presente en todos los contextos y se produce de varias maneras: física, psicológica, sexual y por negligencia. Este estudio investigó el conocimiento que tienen los maestros acerca de la violencia doméstica que se refleja en el entorno escolar. Participaron 161 maestros del estado de una ciudad en el interior de Paraná, con alumnos en clases de 6º hasta la secundaria. Se ha hecho la elaboración y la categorización de un cuestionario en escala tipo likert. Entre otros aspectos, se verificó que los participantes eran mujeres (72%), con edades entre 23 y 66 años, tiempo promedio de 17 años de actuación y de formación, mitad en el área de humanas. De estos participantes, el 46,6% afirmó haber identificado algún caso de violencia intrafamiliar. En cuanto al conocimiento sobre violencia intrafamiliar, la mayoría presentó respuestas esperadas en relación a: consecuencias en el comportamiento del alumno, características del agresor, informaciones para los profesores, informaciones generales sobre violencia. Cuando se focalizó las posibles intervenciones, las respuestas esperadas fueron elegidas por 47,57% de los profesores. Los resultados apuntaron que los maestros tienen conocimiento sobre el tema, pero no saben cómo proceder adecuadamente.

Palabras clave: violencia intrafamiliar, maestros, escuela.


 

 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define violência como: "o uso intencional de força física ou poder, em forma de ameaça ou praticada, contra si mesmo, contra outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulta ou tem uma grande possibilidade de ocasionar machucados, morte, consequências psicológicas negativas, mau desenvolvimento ou privação" (Krug, Dahlberg, Mercy, Zwi & Lozano, 2002,p. 2).

A violência atinge a vida e a integridade física das pessoas, pode ser definida como "intervenção de um indivíduo ou grupo contra a integridade de outro", de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura(Unesco, 2009, p. 94).Está presente no cotidiano de todos os indivíduos e tem se tornado cada vez mais notória na sociedade, com a mídia expondo constantemente essa temática. Brino e Williams (2009) pontuam que a violência tem muitas facetas, por exemplo: a encontrada no trânsito, nas escolas, em casa, nos meios de comunicação ou na guerra, dentre outras.

Considerando os casos de violência contra crianças e adolescentes, os dados da Secretaria de Direitos Humanos (Brasil, 2013) apontam que, cerca de 70% dos casos de violência contra crianças e/ou adolescentes, no Brasil, acontecem em residências, seja da vítima ou do agressor, e acabam sendo cometidos pelos pais (pai ou mãe). Uma possível explicação para que estes agridam seus filhos vem da cultura com a qual grande parte da sociedade é conivente e cuja educação (dos filhos) é baseada na violência. Sendo considerada uma prática histórica e mutável, até pouco tempo era regularizada, porém, atualmente, tem sido objeto de enfrentamento e punição jurídica e social (Lei n. 13.010, 2014). Contudo, existem famílias que praticam a violência com base nas concepções antigas (Politi, 2016). A violência intrafamiliar ainda é justificada como um processo educativo. O "bater" é admitido, sendo censurado apenas quando produz uma lesão grave às crianças e/ou adolescente (Moreira & Sousa, 2012; Politi, 2016).

De acordo com o Mapa da Violência (Waiselfisz, 2015), 39,1% dos atendimentos de crianças e/ou adolescentes no SUS são de agressões cometidas pelos responsáveis. Em relação específica da violência física praticada pelo pai ou mãe corresponde a mais de 50% das notificações até os nove anos, 31,3% até os 14 anos e 11,6% dos 15 aos 19, ou seja, até os nove anos, de cada 10 crianças, pelo menos cinco já sofreram algum episódio de violência física que precisou de atendimento no SUS.

As modalidades de violência mais comuns no cotidiano são: a física, psicológica, sexual e negligência (Gomide, 2006, 2007; Williams, 2004; Biscouto, 2012). A violência física é a mais fácil de ser visualizada, visto que pode deixar hematomas pelo corpo, por exemplo, beliscões, chutes e tapas (Azevedo & Guerra, 2016). A psicológica ou emocional é a menos visível, já que não deixa traços físicos ou provas do ocorrido,envolve humilhações constantes e ameaças (Azevedo & Guerra, 2016). A negligência envolve a omissão, ou seja, alude em não fazer quando se deveria fazer, implica um abandono das crianças, em não efetuar os cuidados básicos de saúde e segurança das mesmas (Lamb, 2013). A violência sexual implica qualquer jogo sexual imposto que vise o prazer do agressor (Lima, 2016. Morete, 2015). No abuso sexual pode ou não ocorrer a penetração, visto que a exposição dos órgãos genitais, imagens eróticas, tocar as partes íntimas da vítima, ou pedir para que ela toque, são formas de violência sexual (Lamb, 2013). O abuso sexual infantil pode ser definido como situação na qual a criança e/ou adolescente é usado para gratificação de outro indivíduo mais velho, com base em uma relação de poder (Brino, 2009; Morete, 2015).

Segundo Brino e Williams (2009), o abuso sexual infantil pode ser prevenido com base em três níveis: (a) primário, com o objetivo de detecção precoce das crianças em situação de risco, como por exemplo, ensinar estratégias de enfrentamento; (b) secundário, com o objetivo de eliminar ou reduzir os fatores que propiciam os atos agressivos, por exemplo, capacitação com professores; (c) terciário, que implica o acompanhamento tanto das vítimas quanto do agressor por profissionais. Esses níveis de prevenção, especificados por Brino e Williams (2009), também são condizentes com todos os tipos de violência, sendo a intervenção, nesses casos, adequada à temática.

Contudo, essas modalidades de violência só são separadas para a melhor compreensão dos tipos e de suas características, pois elas raramente aparecem de modo isolado, sendo na maior parte inter-relacionadas. Para exemplificar, quando existe a violência sexual, há também a psicológica, visto que um responsável que abusa sexualmente de uma criança utiliza-se da violência psicológica em forma de ameaça para que o infante não relate o abuso.

A violência intrafamiliar é o tipo de violência mais comum na sociedade, que abarca todas as formas. Ela pode ser caracterizada como uma omissão ou ação que deprecie o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de um membro da família. Pode ocorrer dentro ou fora do ambiente residencial, cometida por um membro familiar tendo ou não laços consanguíneos, inclusive indivíduos com alguma função parental, na presença de relação de poder (Brasil, 2013).

Widom e Brzustowicz (2006) afirmam que, quando uma criança sofre maus tratos durante a infância, existe a possibilidade de no futuro cometer crimes violentos, gerando dessa forma um ciclo. O comportamento violento é complexo, tendo em vista sua multideterminação e a ausência de um agente iniciador. De acordo com Gallo (2008), em uma análise funcional é possível identificar de quais variáveis o comportamento violento é função (Gomide, 2006; Del Prette & Del Prette 2003; Cicchetti, 2004, 2016).

A necessidade de estudos sobre a prevenção de violência intrafamiliar justifica-se pelos altos índices dos casos de violência (OMS, 2012). A prevenção é uma das melhores alternativas para esta problemática contra a criança, e a família é o ambiente mais adequado à intervenção. Alguns estudos, como Prada e Williams (2007) e Gallo, Cheffer, Morais, Cascardo, Lima e Duarte (2010) realizaram programas de intervenção com pais para reduzir o índice de violência. Esses estudos ensinaram estratégias que permitissem a eles, alternativas para o uso da punição, para que não fosse necessária a utilização da violência física ou psicológica. Os resultados apontaram melhoras não apenas para a criança, mas nas interações dos pais com elas e na relação entre todos os membros da família.

Quando uma criança e/ou um adolescente é agredido no local onde, supostamente, deveria estar protegido da violência, sua casa, por exemplo, fica exposta a uma situação de desamparo. O Estatuto da Criança e do Adolescente -ECA(Lei n. 8.069, 1990)prevê a proteção contra qualquer forma de exploração, discriminação, violência e opressão. De acordo com o artigo 56, inciso primeiro, os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de maus-tratos envolvendo seus alunos (Bonfim, 2014).

Nesse contexto, a escola tem um papel preponderante que pode influenciar, positivamente, pais e comunidade (Brino& Williams, 2009; Gallo, 2008). Ela torna-se um dos lugares a quem as crianças e/ou os adolescentes podem contatar para auxiliar na denúncia e no enfrentamento da violência. Para que isso aconteça, é preciso que a comunidade escolar esteja preparada para lidar com esses casos e, em parceria com os demais atores das Redes de Proteção Integral, participar dos processos de notificação dos responsáveis e do acompanhamento dos casos após a denúncia. Também é imprescindível capacitar gestores, professores e demais profissionais de educação a fim de fortalecê-los para lidar com situações e assuntos, na maioria das vezes, dolorosos, constrangedores e, em certos casos, ameaçadores, que, por muito tempo, foram silenciados e negligenciados pela sociedade (Brasil, 2013).

Diante disso, a escola seria um ambiente de proteção para a criança, podendo ser a maior interventora nos casos de violência intrafamiliar, por se tratar de um local neutro onde a criança está inserida e apresentar condições favoráveis no sentido de identificar casos suspeitos (Brino& Williams, 2009). É um lugar adequado para a identificação de casos de violência contra crianças e/ou adolescentes, já que esse local permite o encontro cotidiano entre alunos e profissionais e proporciona o estabelecimento de afetividade, confiança e proteção (Brasil, 2013).

Diante disso, o convívio diário permite notar alterações no comportamento, no humor, na capacidade de aprendizagem e no corpo da criança e/ou do adolescente. De acordo com Brino e Williams (2009) e Maldonado (2011), há ausência de discussão acerca da violência intrafamiliar na formação inicial e continuada dos professores, o que pode produzir atitudes equivocadas em relação ao encaminhamento e à solução do problema. Miranda (2003) ressalta que grande parte dos educadores não está preparada para identificar os casos de violência e adotar as ações adequadas para seu enfrentamento.

O estudo de Silva (2006)trouxe a importância de capacitar melhor os professores que atuam com esta problemática. A autora sinaliza, ainda, a necessidade de melhoria no atendimento às vítimas de violência, visto que os serviços precisariam ser integrados, pois a denúncia, em uma parcela expressiva dos casos de violência, pode trazer danos aos denunciantes, como ameaças e até agressões. Desta maneira, nos resultados de Silva (2006), os professores expressaram o medo que sentem diante da possibilidade de denunciar, porém, disseram conhecer as consequências que a omissão pode proporcionar na vida dessas crianças e desses adolescentes.

Brino e Williams (2009) realizaram um programa de intervenção para capacitar professores a atuar como agentes de prevenção do abuso sexual infantil. Os resultados permitiram considerar os professores como importantes agentes de prevenção do abuso sexual, já que, de maneira geral, houve melhora do desempenho nos instrumentos na análise pré e pós teste. Um dado relevante trazido pelas autoras é a necessidade de capacitar os professores para identificar os sinais e sintomas do abuso sexual, uma vez que eles apresentaram dificuldade em discriminar os comportamentos inespecíficos do abuso. Assim sendo, o objetivo do presente estudo foi mapear o conhecimento que os professores têm relacionado à violência intrafamiliar.

 

MÉTODO

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade (número CAAE 47850715.3.0000.5231).

Participantes

No município selecionado para a realização da pesquisa, existem oito escolas públicas estaduais onde atuam 276 professores, com alunos do 6º ao 9º ano e do ensino médio. O número de participantes foi baseado em uma amostra representativa dos docentes do interior do Estado do Paraná que trabalham nas escolas desse município, levando em consideração um erro amostral de 5%, com nível de confiança de 95%. Do conjunto de professores alocados nas oito escolas públicas estaduais do município convidados,161 aceitaram participar, tendo assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Local

O levantamento foi realizado nas oito escolas, no horário de hora atividade, para que fosse possível a adesão e não ocorresse interrupção das atividades diárias.

Materiais

Foi utilizado, como Instrumento, questionário de escala tipo likert (variando de concordo totalmente [1] até discordo totalmente [5], adaptado de Brino e Williams (2009), Padilha e Williams (2007) e Brum, Lourenço, Gebara e Ronzani (2013), contendo 61 questões que foram categorizadas de acordo com os seguintes temas: consequências no comportamento do aluno questões: 1/8/20/21/30/32/52, possíveis intervenções questões: 2/11/14/15/25/26/27/28/29, repertório do professor:3/4/5/6/7/10/12/13/16/17/18/19/61,informações sobre violência:22/24/34/35/39/48/51/53/54/56/57/58/60, características do agressor: 23/41/42/46/47/55, informações para professores: 31/33/44/49/50/59, interferência no ambiente escolar: 9/36/37/38/40/43/45.

Foram obtidas informações dos profissionais quanto a: sexo, idade, tempo de formação, religião, área de atuação, tempo de prática profissional; também, há uma questão de múltipla escolha relacionada à identificação do caso de violência intrafamiliar no âmbito escolar. As questões foram elaboradas para que possibilitasse uma melhor compreensão de como o professor se vê em relação à violência intrafamiliar que se reflete no ambiente escolar e como esse professor age em caso de contato prévio com esse tipo de situação em seu trabalho.

Procedimento

Realizada a adaptação do Instrumento, esse passou por avaliação de seis juízes (três alunos de mestrado que estudam a temática da violência intrafamiliar e três professores doutores). Após a realização das devidas correções, foi realizado um estudo piloto com um professor da rede estadual, para avaliar o tempo necessário para o término do questionário e possíveis necessidades de revisão no instrumento.

Foi agendado, nas escolas, o momento apropriado para a coleta de dados, que se deu de maneira individual, durante a hora atividade, na sala de permanência. Os participantes foram orientados a responder o Instrumento da maneira que melhor se adequasse à sua concepção do tema. Levaram,aproximadamente, 20 minutos, contudo o ritmo de cada um foi respeitado.

A coleta dos dados foi realizada em, aproximadamente, oito semanas, respeitando-se o período de funcionamento da escola. A pesquisadora foi em cada escola, durante uma semana, de segunda a sexta-feira, em todos os horários de funcionamento, podendo ser manhã e tarde ou manhã e noite ou, ainda, manhã, tarde e noite.

Procedimento de análise. No Instrumento, para cada pergunta havia uma assertiva que foi considerada como resposta ou opção esperada, tendo como critério o esperado de acordo com a literatura da área. A análise das respostas dos participantes foi realizada tendo por referência o esperado com base na literatura da área. Por exemplo, na questão 1 "perguntar aos alunos sobre as relações familiares fornecerá informações sobre seus riscos relacionados à violência intrafamiliar", o esperado era que se respondesse 'concordo totalmente' ou 'mais concordo do que discordo', pois a literatura indica que perguntar trará informações sobre as relações familiares. As cinco opções de resposta - "concordo totalmente"; "mais concordo do que discordo"; "discordo totalmente"; "mais discordo do que concordo"; "nem concordo, nem discordo - foram agrupadas, por estarem inter-relacionadas, da seguinte maneira: resposta esperada; resposta contrária; nem concordo nem discordo. Desse modo, pode-se avaliar o conhecimento dos professores sobre aquele tema.

 

RESULTADOS

Os resultados são apresentados em duas partes: os dados gerais dos participantes e os relativos ao conhecimento que os professores têm sobre violência intrafamiliar.

Em relação aos participantes, verificou-se que72% são mulheres. A média da idade foi de 43,3 anos, com desvio padrão de 7,56, sendo a mais jovem de 23 anos e a mais velha de 66 anos. A média do tempo de formação ficou em 17,41 anos, e a professora formada há menos tempo apresentava oito meses de formação e a mais velha era formada há 35 anos, com desvio padrão de 8,62. A média do tempo de atuação foi de 17,01 anos, com desvio padrão de 9,15 anos.

Em relação à área de formação, a de humanas (abarcando as disciplinas de história, artes, letras, filosofia, sociologia, pedagogia e música) correspondeu a 53% dos formados; a de exatas (abarcando as disciplinas de matemática, física, química, engenharia, geografia e administração) correspondeu a 25% e a de biológicas (ciências biológicas, ciências e educação física)a 19% (não responderam 3%).

Com relação à religião, a maioria (70,6% dos participantes) declarou-se católica, 14,6% declararam-se evangélicos, 7,5% declararam outras religiões (7,3% não responderam). Em relação a serem praticantes ou não da religião, 80% declararam-se praticantes e 6,6% não praticantes (6,6% não responderam).

Em relação ao conhecimento dos professores relativo à violência intrafamiliar, os dados foram agrupados segundo (A) Consequências no comportamento, (B) Repertório dos professores, (C) Característica do agressor, (D) Possíveis intervenções, (E) Informações para professores, (F) Interferência no ambiente escolar, e (G) Informações de violência, conforme Figura 1.

Quando questionados sobre já terem identificado algum caso de violência intrafamiliar", 39,1% responderam que não, enquanto 46, 6% responderam sim (14,3% não responderam).

Em relação às possíveis consequências no comportamento do aluno, 72,92% dos participantes optaram pela resposta esperada, mostrando que têm conhecimento em relação à forma como a violência interfere no comportamento do aluno.

No que se refere à categoria repertório, que analisa quais comportamentos o professor tem para auxiliar os alunos vítimas de violência intrafamiliar, verificou-se que 48,86% responderam o que se esperava. Deste modo, pode-se identificar que menos de 50% têm um repertório necessário para analisar o comportamento dos alunos que sofrem algum tipo de violência intrafamiliar.

Quanto às características do agressor, 76,38% dos entrevistados assinalaram o esperado, indicativo de que eles conhecem as características comportamentais de um agressor. Essa foi a segunda categoria com mais respostas aproximadas do esperado.

Quanto às possíveis intervenções, verificou-se que existe dificuldade por parte dos educadores em relação às intervenções com os alunos vítimas de violência intrafamiliar, pois apenas 47,57% assinalaram a resposta esperada.

No que se refere às informações para professores, 71,23% assinalaram a resposta esperada, o que indica que eles recebem informações em relação à violência intrafamiliar; seja por meio de palestras, de folders, as informações em relação à violência intrafamiliar têm sido apresentadas.

Quanto à interferência no ambiente escolar, 61,12% assinalaram a resposta esperada o que pode indicar que pouco mais da metade tem conhecimento sobre os problemas causados pela violência intrafamiliar, sobre os danos que podem ser provocados no indivíduo.

Em relação às informações gerais sobre o tema, 78,49% assinalaram a questão esperada,indicando que a maioria dos docentes já tem essa informação.

Assim, os resultados apontaram que os professores têm informações sobre violência intrafamiliar, entretanto poucos apresentam repertórios adequados para uma intervenção.

 

DISCUSSÃO

Os dados gerais obtidos corroboram com os dados da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (2014), já que no Estado do Paraná apenas 25,4% dos professores são do sexo masculino, 44,7% têm formação na área de humanas (53% nesse estudo), 23,1% em exatas (25% no estudo) e 19,8% em biológicas (19% na pesquisa), o que mostra distribuição dos participantes em áreas de conhecimento condizentes com as demais escolas do estado.

Em relação aos conhecimentos dos participantes, a maioria foi capaz de identificar as consequências no comportamento do aluno que sofreu violência intrafamiliar. De acordo com estudos (Wolfe, Crooks, Lee, McIntyre-Smith & Jaffe, 2003), é possível observar alterações no funcionamento cognitivo, emocional e na vida escolar e social das crianças e/ou dos adolescentes expostos à violência intrafamiliar. Alguns exemplos são as ausências frequentes, o baixo rendimento, a falta de atenção e de concentração e os comportamentos como agressividade, passividade, apatia e choro que podem ser indicadores significativos de abuso (Azevedo & Guerra, 2016, Furniss, 1993; Gabel, 1997; Hutz, 2002). Assim, pode-se afirmar que os docentes têm condições de observar essas mudanças.

Verificou-se que os professores têm informações sobre violência intrafamiliar. Essa categoria foi a que mais se aproximou do esperado. É possível que, dada a Lei 10.349/2015 que obriga a mídia a veicular propaganda contra a violência, os professores obtenham informações sobre violência. A violência em nosso país é evidenciada por Waiselfisz (2015), que informa, em 2014, a ocorrência de: - mais de 52.000 pessoas vítimas de homicídio (29,1 mortes por 100.000 habitantes), com 143 assassinatos por dia; - notificação de mais de 50.000 casos de estupro (25,9 estupros por 100.000 habitantes), número referente aos casos confirmados, sendo excluídas as tentativas de estupro.

Grande parte dos participantes identificou características do agressor. Essa foi a segunda categoria com mais respostas aproximadas do esperado, provavelmente porque a agressão está muito presente em nossa sociedade, repercutindo casos na mídia ou em grupos de pessoas próximas.

Quanto à atuação nos casos de violência intrafamiliar, menos da metade dos participantes identificou os comportamentos que o professor deve ter para auxiliar os alunos vítimas de violência intrafamiliar. De acordo com Vagostello, Oliveira, Silva, Donofrio e Moreno (2003), os docentes são capazes de identificar as vítimas, mas não conseguem solucionar os casos adequadamente. A escola, quando tem conhecimento de um caso, em 69,6% das vezes aciona os pais para uma orientação, o que contrasta com o esperado que é informar os órgãos competentes (apenas 33% o fazem). Chamar os responsáveis não é o procedimento mais apropriado, uma vez que a maioria dos casos é intrafamiliar, ou seja, contatando os pais, a escola estaria informando aos agressores sobre suas suspeitas, o que levaria ao acobertamento do caso.

Os resultados indicaram que os professores têm dificuldades em promover intervenções efetivas para alunos vítimas de violência. De acordo com Vagostello, Oliveira, Silva, Donofrio e Moreno (2003), as intervenções da escola, nos casos de violência, resultaram no compromisso verbal dos responsáveis em modificar sua conduta. Isso tem se mostrado ineficiente, uma vez que os pais se comprometem a transformar sua conduta, contudo ela volta a ocorrer.

De acordo com os resultados, no que se refere a informações, seja em relação à violência, ao comportamento do agressor, ao comportamento do aluno que sofre violência, a maioria dos participantes apresentou desempenho esperado. Contudo, quando se fazia referência ao " o que fazer", "quais problemas provocados pela violência" e ao "saber intervir", os participantes não apresentaram o desempenho esperado, o que indica serem necessárias capacitações sobre essa temática, com conhecimentos específicos sobre como intervir e com atividades que os aproximem dos problemas decorrentes da violência intrafamiliar, dando-lhes ferramentas para identificar e encaminhar, adequadamente, alunos vítimas de tal tipo de violência.

Considera-se, ainda, necessário apoio governamental na capacitação dos que lhes são apresentadas no cotidiano, dentre as quais a violência intrafamiliar. São indispensáveis políticas públicas que promovam estratégias de intervenção, tanto na escola como em diferentes ambientes para que ocorra a redução da violência no âmbito familiar.

De acordo com Brino e Williams (2009), os educadores, quando capacitados, são capazes de identificar o abuso. Porém, a violência intrafamiliar não é abordada na formação dos professores, tanto na inicial quanto na continuada, o que produz, inúmeras vezes, encaminhamento equivocado na tentativa de solucionar o problema (Brino & Williams, 2009).

Batista e Weber (2015), em pesquisa com professores sobre estilos de liderança, indicam que o comportamento dos docentes pode apresentar-se tanto como um fator de risco, como de proteção. Tendo a devida formação, conhecimento e sabendo intervir com os alunos que sofrem violência intrafamiliar, os professores terão condições de atuar como fatores de proteção.

O presente trabalho possibilitou levantar o repertório de professores sobre violência intrafamiliar. A partir desse estudo, são possíveis futuras pesquisas com estratégias e intervenções, junto aos professores, com o objetivo de capacitá-los a atuar, de forma adequada, em relação à violência intrafamiliar.

Também considera-se necessário realizar novos estudos focalizando o instrumento utilizado, seja em relação às questões,já que havia número grande de questões e algumas questões provocaram dúvida sobre o que precisava ser respondido, seja em relação à escala; nesse último caso, seria importante comparar uma escala de cinco pontos, como a do presente estudo que acabou deixando o professor um tanto confuso, com uma de três pontos ou diminuição do número de questões. Apesar do tempo médio de aplicação ter sido de 20 minutos, dispor desse tempo pode, em alguns momentos, interferir nos afazeres dos professores, por isso novos estudos devem repensar não apenas o instrumento, mas também a estratégia de sua utilização com professores.

Assim, novas pesquisas sobre violência intrafamiliar são necessárias, já que é um tema pouco estudado, especialmente em nosso país.

 

REFERÊNCIAS

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