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Estilos da Clinica
versão impressa ISSN 1415-7128
Estilos clin. vol.4 no.6 São Paulo jul. 1999
ARTIGO
De que se trata... Uma criança?1, 2
What is about?
Elsa Coriat
Psicanalista; membro da Escuela Freudiana de Buenos Aires, membro da equipe de direção do Centro Dra. Lydia Coriat de Buenos Aires, Argentina
RESUMO
Neste artigo, procura-se rever alguns "preconceitos escolásticos" - preconceitos que envolvem aqueles que participam de determinada escola, neste caso, a escola criada a partir dos ensinamentos de Lacan - e suas implicações na clínica de bebês e crianças pequenas. Para tanto, atravessamos algumas questões: a criança nasce como uma página em branco? O que é desenvolvimento? A partir de quando podemos supor a existência do inconsciente? Por que é importante para o psicanalista o que diz respeito ao orgânico e ao desenvolvimento? A interdisciplina é entendida como fundamental, assim como a clareza por parte do psicanalista, das contribuições e limites da psicanálise na referida clínica.
Bebês; interdisciplina; psicanálise
ABSTRACT
In this paper, we try to review some "scholastic prejudices"- which includes those who participate of a specific theoretical school, in this case, the school that follows Lacan's ideas - and its implications on the clinic of babies and litlle children. We discuss some questions: is the child born as a white paper? What is development? Since when can we suppose the existence of the insconscious? Why are psychoanalysts concerned with the organic? The interdiscipline is here understood as fundamental.
Babies; interdiscipline; psychoanalysis
O analista lacaniano que queira avançar na formalização da psicanálise de crianças terá que se desembaraçar de uma série de preconceitos escolásticos.
Este pequeno parágrafo me ocorreu em um momento qualquer, quando eu estava preocupada com o convite recebido para participar neste Congresso e tentando situar qual seria o novo ângulo que me permitiria retomar meus temas de sempre.
Estava caminhando pela rua junto com minha filha - uma jovem de 16 anos - e, enquanto tentava recordar o que eu queria dizer com "escolástico", lhe perguntei:
- Você gosta da expressão "preconceitos escolásticos"?
- O que quer dizer "escolástico"? - perguntou-me ela.
Enquanto eu continuava tentando encontrar a resposta que me escapava, ela acrescentou:
- "Escolástico" vem de "escola"?
Neste momento... eu teria feito uma homenagem à língua!
A partir da momentânea ignorância das duas a respeito do significado de uma palavra, minha filha me mostrou que carregava exatamente a significação que eu queria dar-lhe. Já quase não importava o que poderia encontrar no dicionário, porque até mesmo quem nada sabia sobre o tema escutava o que me interessava discutir, ou seja, os preconceitos que envolvem os que participam de determinada escola - a escola criada a partir do ensinamento de Lacan - nos dias de hoje.
Não me refiro aqui a nenhuma instituição em particular, mas ao conjunto do lacanismo em geral - reconhecendo que nem todas as instituições, nem todos que se reconhecem ou se autodenominam "lacanianos" participam igualmente na extensão e sustentação daquilo que chamo preconceitos.
Seguindo Bachelard, chamo "preconceitos" aos "conhecimentos usuais, ao que acreditamos saber".
Diante do mistério do real a alma não pode, por decreto, tornar-se ingênua. (...) diante da cultura científica, o espírito jamais é jovem. É até muito velho, pois tem a idade de seus preconceitos.
(...) Se não houve pergunta, não pode haver conhecimento científico. No entanto; um conhecimento adquirido por um esforço científico pode declinar. A pergunta abstrata e franca se desgasta; a resposta concreta fica. (...) Com o uso, as idéias se valorizamindevidamente. Um valor em si se opõe à circulação dos valores. É um fator de inércia para o espírito.
(...) pode-se reconhecer que a idéia científica muito familiar carrega um concreto psicológico excessivamente pesado (...) e que pouco a pouco perde seu valor de abstração, sua afiada ponta abstrata (Bachelard, pp. 15-9).
Vocês não sentem, às vezes, que amplos setores do lacanismo estão voltando a ocultar a afiada relha do arado freudiano com um acúmulo de enunciados, articulados formalmente entre si, mas vazios?
Se trago à tona estas questões em um encontro sobre psicanálise de crianças, é porque a pergunta que, em tantos humanos, inaugura o desejo de saber é a pergunta sobre a origem, e as que continuam alimentando a luz das indagações são as perguntas sobre como e por quê.
Que aos 4 ou 5 anos estas perguntas não cheguem a produzir mais que teorias sexuais infantis, ou que nos primórdios da humanidade tenham se satisfeito com a construção de mitos, isso não implica que sejam perguntas pueris ou primitivas. A própria psicanálise não haveria nascido se Freud não as houvesse formulado. São as perguntas proibidas pela religião, são as que a magia não se preocupa em formular, e são as que a psicanálise partilha com a ciência na construção da teoria.
O conceito de estrutura, por exemplo, é imprescindível à teoria e à clínica psicanalítica, mas certas maneiras de utilizá-lo -muito em voga nestes tempos pós-modernos - fazem convergir passado, presente e futuro em uma eterna sincronia, obturando as perguntas sobre a origem, assim como sobre as sucessivas transformações que vão se operando no devir, ou seja, no necessário transcorrer de um tempo que denominamos cronológico3.
Há alguns anos, quando ainda não havia me formado, paralelamente ao que me ensinavam na Faculdade de Psicologia passei a fazer parte de um grupo de estudos coordenado por uma docente lacaniana. Ainda hoje lhe agradeço que tenha marcado como primeira leitura o Capítulo VII da Interpretação dos sonhos, no qual Freud nos fala da primeira experiência de satisfação e do esquema do pente. No entanto, comentando esse esquema, acrescentou algo como: "Há quem considere que cada bebê nasce como uma página em branco. Não leva em conta que há toda uma história que o precede, que vem de antes do seu nascimento!"
Alguém saberá quem foi o autor da idéia de que um bebê nasce como uma página em branco... Neste momento, junto com a docente, todos os do grupo rimos de semelhante absurdo, quase aliviados de que Lacan houvesse voltado a trazer à ordem do dia a descoberta freudiana do determinante da história familiar. Com tudo o que havia sido escrito, como pensar que um bebê vinha em branco?
Não muito tempo depois, comecei a trabalhar na clínica de crianças e de bebês, e continuei me perguntando por quais caminhos o bebê se converte em um sujeito desejante, até que me dei conta do pequeno e ao mesmo tempo enorme mal-entendido condensado na crítica aos que o consideravam como uma página em branco. É certo que há toda uma história que o precede! Mas o detalhe é que essa história está escrita em outro lugar, e não justamente no recém-nascido.
No início, o infans limita-se a receber do Outro as marcas dessa história. A partir do fort-da começará a apropriar-se das mesmas, brincando com elas. Enquanto é pequenino e vai construindo a capacidade - sempre fracassada - de entender a linguagem, irá escutando as histórias que são contadas na vida familiar ou recolhendo pedacinhos de anedotas, mas só ao chegar à puberdade contará com a dimensão histórica suficiente para situar-se ele mesmo como herdeiro de sua própria linhagem.
Não é a mesma coisa receber e tomar. Não é a mesma coisa herdar e adquirir.
Em meu "Projeto de uma neurologia para psicanalistas" (Reunião Lacano-americana de Porto Alegre), texto produzido há cinco anos, apresentei pela primeira vez a metáfora em que considerava o sistema nervoso central o papel no qual a letra ficará registrada. Obviamente, isso implicava que o papel estivesse em branco até então e, com a primeira experiência de satisfação, ficasse escrito o primeiro traço mnemônico. Obviamente também, implicava que os traços mnemônicos que continuariam a série seriam os deixados pelas sucessivas experiências.
Isso é Freud básico. Por que dar tanta importância a uma metáfora que nem sequer é minha?
Porque em minha própria resistência a apresentá-la assim - demorei vários anos - leio os preconceitos pelos quais fui tomada. E é parte de um Freud forcluído, acusado de biologista, tomado pelas supostas necessidades do discurso cientificista da época.
Atualmente, não é que nunca se fale da primeira experiência de satisfação, ela é descrita freqüentemente, mas quase como uma simpática história infantil, proveniente da infância da psicanálise, sem nenhuma outra implicação prática que a de suturar com palavras um ponto cego no saber.
Enquanto eu apresentava esta primeira experiência em tais termos, ocorreu, mais de uma vez, que alguém - e sempre se tratava de alguém que se considerava "lacaniano" - julgasse necessário frisar: "Mas é um mito!" Como se esse mito não tivesse nada a ver com o que acontece a um bebê no real, ou como se minhas palavras, mostrando até que ponto a construção de Freud é coincidente com o que efetiva e necessariamente tem lugar na vida de qualquer bebê, violassem o que devia permanecer como puro postulado teórico.
Adianto que, se estas questões não tivessem importantes implicações na clínica de crianças e de bebês, não me deteria a comentá-las. Quais são estas implicações?
Determinada maneira de entender o conceito de estrutura e de papel fundante do Outro levou a que, nas primeiras tentativas de uma clínica lacaniana de crianças, se desprezasse o trabalho com a criança e apenas se levasse em conta o Outro, encarnado nos pais. Mas, ainda que o desejo do Outro seja a condição de onde provém toda escritura fundante, o que fica efetivamente escrito é a marca deixada pela experiência tal como a mesma é registrada pela criança. Se o Outro tem um papel fundante, isso se dá porque é ele quem cria as condições nas quais a experiência se apresenta - incluindo a apresentação do objeto -, mas o registro corre por conta da criança e de suas possibilidades.
Na Carta 52, Freud propõe que consideremos três sistemas de inscrição: o dos signos de percepção, o inconsciente e o pré-consciente. "Devo destacar", diz, "que as sucessivas transcrições representam a obra psíquica de sucessivas épocas da vida" (Freud, 1973a, pp.3551-2).
O sistema de inscrição dos signos de percepção é, em sua origem, cronologicamente anterior ao sistema inconsciente, e nele opera exclusivamente "a associação por simultaneidade". Logo em seguida, quando se forma o sistema inconsciente., aparecerão as associações causais e poderão ficar registradas lembranças conceituais.
O que foi feito dos signos de percepção no pensamento freudiano? Até recentemente, cada vez que me detinha a olhar o esquema do pente me perguntava por que Freud dedicou-se a grafar primeiro os dentes correspondentes aos traços mnemônicos e logo depois situou o inconsciente. Perguntava-me: será que os traços mnemônicos não estão no inconsciente.? Somente depois de confrontar este esquema com a Carta 52 pude encontrar uma resposta.
É que o inconsciente não vem dado a princípio, nem aparece de um dia para outro, instalando-se a partir do nada. Precedendo-o, faz-se necessária a inscrição, na criança-bebê, de toda uma série prévia de traços mnemônicos.
Se dizíamos que a inscrição da experiência corre por conta da criança, quais são suas possibilidades de registro? Em um primeiro momento, conta apenas com o biologicamente herdado: seus órgãos de percepção. As primeiras experiências irão deixando sua marca, seu traço mnemônico, imprimindo os signos com o que impactou como prazer ou desprazer.
Se diante do primeiro desprazer o organismo reagiu com o choro em forma reflexa, uma vez instalado o primeiro traço mnemônico do objeto -desconhecido até então - que proporcionou prazer, a atividade intencional irá substituindo cada vez mais a ação reflexa e, paralelamente, irá recortando cada vez mais a realidade do mundo.
A partir de quando podemos começar a supor a existência de um inconsciente? Se o inconsciente está estaiturado como uma linguagem, e se a estrutura de uma linguagem consiste em um "colar de anéis que se sela no anel de outro colar feito de anéis" (Lacan, 1985, p.481), necessita então, no mínimo, da existência de suas unidades, esses elementos diferenciais últimos que são os fonemas.
Para o bebê, e desde recém-nascido, o objeto voz encontra-se entre os privilegiados; pode-se supor que, como tal, fica registrado entre os traços mnemônicos do sistema de signos de percepção desde o começo. Mas uma coisa é a voz como objeto e outra a discriminação dos fonemas da língua que a voz transporta. Roman Jakobson nos informa que entre os 6 e 8 meses os bebês começam a selecionar os fonemas de sua língua materna - e os bebês nos dão provas disso. A partir disso têm a possibilidade de começar a ir registrando as seqüências fonéticas que implicam os significantes, os primeiros S2 da bateria inconsciente, bem antes também de relacioná-las com o significado convencional que lhe atribui sua língua e que se alojará no pré-consciente.
Nestes últimos parágrafos venho fazendo um breve resumo de questões que desenvolvi mais longamente em outros textos4, mas se volto a abordá-las é para que se perceba a importância do transcorrer do tempo, do tempo em que se produz a repetição da experiência. E também para que se perceba que, no compasso dessa experiência de repetição, vai se construindo a estrutura do aparelho psíquico.
Nos tempos prévios à emergência de um sujeito no real, o que a intervenção do Outro proporciona é a libidinização e o delineamento da zona erógena, a delimitação de suas bordas de forma que terminarão recortando e fazendo cair o objeto como impossível de voltar a encontrar. A criança começa a encarregar-se desta queda ao fazer cair o carretel do fort-da; recupera e volta a perder o objeto, mas com o barbante ao qual está atado, com os laços de presença-ausência do significante. Não deixemos de mencionar aqui que, para a clínica de crianças, é fundamental não esquecer que o pequenino precisa de carretel e barbante para começar seu jogo de elaboração significante.
Aproximadamente no tempo do fort-da se iniciará a descoberta do pai em sua função enquanto tal; em seguida, com um pouco de sorte e poucos anos mais tarde, o encontro com o objeto (que ainda se empenhava em conseguir) passará a estar definitivamente proibido.
Volto a dizer que, até aqui, venho repetindo uma série de questões, a maioria das quais vocês já conhecem. Qual é a novidade que justifica esta exposição? Talvez a novidade seja pô-las em série. Pô-las em série para evidenciar que todo desenvolvimento infantil implica percorrer uma série de marcos ou pontos fundamentais que necessariamente vão se sucedendo um ao outro, em uma certa ordem, requerendo por sua vez um certo tempo. Para que cada passo seja dado, é condição necessária que se tenha verificado o anterior, ainda que nenhum seja condição suficiente para garantir o que virá em seguida.
Creio que isso também não é uma grande novidade: começando por Freud há muitos outros autores que se ocuparam do tema, mas as duras críticas que Lacan efetuou às muito criticáveis concepções do desenvolvimento pós-freudianas fizeram com que o próprio conceito de desenvolvimento ficasse semiforcluído do pensamento lacaniano, com os conseguintes efeitos limitantes sobre a clínica de crianças.
Não me parece que a psicanálise avance em relação à psicologia e à neurologia negando o desenvolvimento ou desinteressando-se pelo mesmo, mas, ao contrário, se veria amplamente enriquecida em sua teoria e em sua clínica se levasse em conta as investigações de outras disciplinas afins, e, por sua vez, me parece que à psicanálise corresponde contribuir com algumas explicações fundamentais, que permitem dar conta do que possibilita, condiciona e ordena o desenvolvimento5.
O QUE É O DESENVOLVIMENTO?
No Seminário XXI: Les non dupes errent..., Lacan diz que "o desenvolvimento seria essa viagem do nascimento à morte" e o grafa com um vetor que teria seu ponto de origem no nascimento e sua conclusão na morte.
Sobre o mesmo vetor, podemos marcar o ponto correspondente à puberdade, dizendo que, a partir desta, a estrutura do sujeito a cuja vida estamos nos referindo, já definiu e modelou no real as linhas principais de sua singularidade, e que previamente a isso a estrutura encontrava-se em construção.
Continua Lacan: "Em qualquer ponto em que se esteja desta aspirada viagem (...) a estrutura não dá seu braço a torcer, e o desejo é, estritamente, sempre o mesmo". Lacan refere-se, logicamente, ao indestrutível desejo freudiano. Continua dizendo que o ser surge "em um mundo no qual reina esse discurso e que tal sujeito está perfeitamente determinado enquanto a seu desejo, do começo ao fim".
Estas afirmações parecem-me especialmente coerentes com o que Freud escreve em "Três ensaios...": "Enquanto, pelos processos da puberdade, fica fixada a primazia das zonas erógenas (...), tem lugar nos domínios psíquicos a descoberta do objeto, momento que vem se preparando desde a mais tenra infância. (...) A descoberta do objeto não é realmente mais que um retorno ao passado" (Freud, 1973b, pp. 1224-5).
Mas... o que pode querer dizer que "o desejo estava perfeitamente determinado desde o começo"? Será que, por exemplo, desde antes do nascimento de um sujeito em particular já estava escrito que, ao chegar à puberdade, sua escolha iria recair sobre um objeto heterossexual - ou homossexual, se fosse o caso?
Se "Três ensaios..." foi escrito para sepultar todo determinismo pseudobiológico prévio, o substituiremos agora por um determinismo supostamente estrutural? Não creio que essa tenha sido a idéia de Freud, nem de Lacan. Não creio que essa seja a leitura que convém à psicanálise. A princípio, o determinismo da psicanálise constrói-se aprés-coup, não serve para prognosticar o futuro. De qualquer maneira, o tema é muito mais sutil e complicado, e, como a clínica de crianças, em boa medida, diz respeito ao futuro, vale a pena que nos detenhamos a aprofundar esta questão. Volto a apoiar-me então em um parágrafo de Freud, ao qual já recorri em outras oportunidades:
"Teremos que prevenir-nos novamente (...) contra uma injusta censura. Pelo fato de ressaltarmos a importância das impressões infantis, acusam-nos de negar a que corresponde aos fatores congênitos (constitucionais). Esta censura tem sua origem na restrita necessidade causal dos homens, que, em franca contradição com a estrutura geral da realidade, procura satisfazer-se com um único fator causal" (Freud, 1973c, p.1648).
Freud está falando aqui do que ele mesmo denominou "séries complementares". Entendo que a "disposição congênita, o constitucional", somente pode referir-se ao biologicamente her- dado, ao orgânico, ao real do corpo que é objeto de estudo da medicina. E as "impressões infantis"? São a marca do vivido nas experiências infantis, especialmente aquelas que acontecem no tempo prévio à repressão edípica e que passarão a formar o acervo da repressão primária.
Dizíamos acima que o saldo das primeiras experiências infantis é, definitivamente, a marca deixada pelo Outro sobre o papel do sistema nervoso central ao cortar o objeto da pulsão, com o que poderíamos afirmar que em cada "impressão", ou seja, cada vez que um traço mnemônico é impresso, intervém fatores causais: o orgânico, por um lado (no que diz respeito a sua capacidade para registrar o ocorrido), e o significante, por outro (enquanto Outro real que escreve, a partir de uma história significante prévia e, mais adiante, também enquanto Outro, o inconsciente, que começa a estar inscrito na própria criança).
Freud continua dizendo que "a psicanálise disse muitas coisas sobre os fatores acidentais da etiologia e muito poucas sobre os constitucionais, mas somente porque podia contribuir para os primeiros com grande quantidade de novos dados, e, em troca, não sabia nada especial sobre os últimos, exceto o já conhecido".
Quais seriam os "fatores acidentais da etiologia"? Pelo fato de estarem postos em oposição aos constitucionais, e, pelo que continua dizendo depois, não restam dúvidas de que se refere às experiências infantis, às quais atribui, então, um caráter acidental, do qual careceria o congênito.
Continua Freud: "Recusamo-nos a estabelecer uma oposição fundamental entre ambas as séries de fatores etiológicos (...)".
A esta altura, torna-se necessário explicitar: para Freud, "ambas as séries de fatores" são as impressões infantis (às quais atribui um caráter acidental) e o constitucional (que não teria esse caráter). De minha parte - e com a conseqüente fundamentação -, algumas linhas acima substituí as duas séries de fatores mencionados por Freud por outras duas: a causa relativa ao orgânico e a causa significante (implicada esta última na experiência infantil).
Retomemos Freud, que, em seguida, acrescenta o melhor: "Recusamo-nos a estabelecer uma oposição fundamental entre ambas as séries de fatores etiológicos, e supomos a existência de uma colaboração regular de ambas para a produção do efeito observado. O destino de um homem é determinado pelos dois poderes - daimon e tujé -, raramente, talvez nunca, por apenas um deles" (Freud, 1973c, p.1648).
Para aqueles que leram o Seminário XI, digamos que daimon e tujé implicam os mesmos conceitos que Lacan menciona como automatone tyché (Lacan, 1973).
Tyché,em grego antigo, quer dizer destino, acaso. Aristóteles o contrapõe a automaton. Freud, por sua vez, utiliza daimon, mas, a partir de Além do princípio do prazer, o demoníaco (daimon) tem a ver com a compulsão à repetição, compulsão que Lacan mostra como efeito da repetição significante, e a qual, seguindo a terminologia de Aristóteles, denomina automaton.
Nos termos da epistemologia da ciência moderna, da mesma forma que, para Aristóteles e Lacan, tyché fica situada ao lado do casual, do fortuito, do contingente, enquanto automaton (ou daimon,se for o caso) fica situado ao lado do necessário, do que necessariamente se repete.
Para Lacan, tyché fica situada ao lado do real - é "o encontro com o real", diz -, enquanto automaton fica ao lado da repetição significante, ou seja, pertenceria ao domínio do simbólico.
Se me seguiram até aqui, talvez tenham escutado algo que não deixa de ser surpreendente: enquanto nas séries complementares Freud põe daimon ao lado do real (o congênito, o biologicamente herdado) e tujé ao lado da experiência (na qual necessariamente está implicada a estrutura simbólica posta em jogo), Lacan viria a pôr os termos exatamente aó contrário. Mais que isso, Freud se contradiz ao situar daimon ao lado do constitucional, enquanto foi ele quem nos mostrou pela primeira vez que o caráter demoníaco do destino não se herda, mas se constitui na infância.
Vejam só onde nos metemos! Que ganância! Propusemo-nos a trabalhar este parágrafo para tentar aprofundar-nos na solução de uma cilada dialética, e terminamos deparando com uma contradição pior...
No entanto, nas palavras freudianas - "O destino de um homem é determinado por dois poderes: daimon e tujé"- percebe-se uma verdade tal que convém determo-nos a decifrá-la em seu justo sentido.
Em um trabalho anterior, substituí diretamente daimon e tujé por uma expressão mais próxima: "causas e acasos" (Coriat, 1997). Fiz isso recorrendo a uma licença poética, baseada em minha pura confiança no que a língua é capaz de transmitir. Naquela ocasião não me ocupei em fundamentar por que me autorizava a traduzir daimon ou automaton por causas, nem tampouco em explicitar que, enquanto Freud situa como causas o constitucional e a experiência infantil, eu estava situando como tais o orgânico e o significante. Creio que, se ninguém se ocupou em fazer-me notar minha "armadilha" retórica, foi porque é uma leitura possível e legítima do que Freud visava transmitir.
Situo aqui as causas ao lado de automaton porque somente é possível encontrar uma causa onde nos deparamos com algo que se repete. O que se repete é da ordem do real, mas seria impossível reconhecê-lo como repetente se não fosse a partir do simbólico. Assim nasce a ciência moderna - começando pela astronomia, que nasce registrando a repetição dos movimentos dos corpos celestes.
Cada disciplina científica surge a partir do recorte de um objeto no real, mas o próprio objeto é recortado a partir do encontro com determinada repetição; em seguida vem a pergunta sobre o porquê e busca-se articular as causas que determinam a aparição do que se repete. Cada disciplina científica é, em suma, o acúmulo do saber articulado sobre alguma das caras com as quais se apresenta o real. E, uma vez situadas as causas do que se repete, torna-se então possível predizer sua futura aparição, seja para controlá-la ou para produzi-la.
E é muito importante levar em conta que aquilo que em alguma disciplina apresenta-se como causa, pode aparecer como tyché para alguma outra.
Talvez comecem a suspeitar para onde me dirijo com toda essa série de elucubrações. Na clínica, deparamos a cada passo com o debate sobre a causa, sob a forma de: o autismo é orgânico ou psicológico? E a psicose infantil? Tal dificuldade escolar é orgânica, psicológica ou psicopedagógica? Tal dificuldade motora será orgânica, cinestésica ou de outra ordem? O atraso na linguagem é orgânico-fonoaudiológico ou porque falam à criança como se fosse um bebê?
Ainda que não aconteça em todos os lugares, está muito difundido que os diferentes profissionais implicados em cada disciplina disputem a criança e os pais, com fundamentadas razões e propostas de trabalho, tentando situar o problema e sua solução dentro do próprio campo - não excluo os psicanalistas deste tipo de disputa.
Descartemos os "profissionais" que tomam a clínica como um comércio e aqueles que, irresponsavelmente, não se preocupam em aperfeiçoar a própria formação e continuam trabalhando em uma rotina burocrática. Fiquemos com aqueles que oferecem seu diagnóstico e sua proposta a partir de um elevado compromisso ético. É muito possível que no que cada um diz situe-se uma parte da verdade a respeito do problema da criança, mas trabalhar sobre esta parte - refiro-me a alguma função específica -, bem o sabemos os psicanalistas, termina convertendo-se em um problema em relação à constituição subjetiva da criança.
E, se não se quer deixar nenhuma parte solta, e, como solução, a criança é incluída em uma somatória de tratamentos paralelos, cada profissional concentrado na sua "parte", quase poderia garantir que o futuro da criança ficará... destroçado - junto com o lugar imaginário, tecido pela trama do desejo, em que os pais haveriam de esperá-la.
Qual poderia ser o problema então se do tratamento de uma criança se encarregasse exclusivamente um psicanalista? Nenhum - sempre e quando tivesse claro que se trata de uma criança (diferente de um adulto), e que também estivesse claro que, em relação a essa criança, no que diz respeito ao orgânico, tudo funcionasse como um relógio, em perfeitas condições. Mas as crianças organicamente "puras", sem padecer de nenhuma pequena disfunção, não são muito fáceis de encontrar. Entre os que solicitam uma consulta clínica (de qualquer tipo), não são a maioria. O significante, na infância, entrelaça-se com o corpo de uma maneira muito mais estreita que no adulto.
Quero dizer então que um psicanalista não se deve encarregar do tratamento de uma criança com problemas orgânicos? Não, não quero dizer isso em absoluto, mas, pela interconsulta, se verá na necessidade de recorrer ao saber e/ou à intervenção de profissionais de outras disciplinas.
Da mesma forma que Freud, "recusamo-nos a estabelecer uma oposição entre as diferentes séries de fatores etiológicos", e pensamos em uma "colaboração regular entre ambas". Como seria esta colaboração? Poderemos articulá-la retornando ao conceito de desenvolvimento.
A neuropediatria diferencia maturação de desenvolvimento. A maturação leva em conta de que maneira transcorre o desdobramento do biologicamente herdado, enquanto o desenvolvimento é um conceito mais amplo, que inclui os efeitos do ocorrido a posteriori, o adquirido, os efeitos da interação do organismo com o meio.
Parece-me que nós, psicanalistas, podemos concordar com o fato de que, no caso dos humanos, aquilo que a medicina e outras disciplinas denominam "o meio ambiente" está organizado pelo Outro, para não precisarmos combater o conceito de desenvolvimento.
Torna-se tão evidente a série de transformações estruturais que se produzem na infância, até nos aspectos específicos que dizem respeito à constituição do sujeito, que só nos resta pensar que, na realidade, o que se debate a esse respeito, mais que o conceito de desenvolvimento, é o que o determina. Aqui vem Freud em nosso auxílio, dizendo-nos: uma colaboração de causas.
A primeira experiência é o momento do encontro entre duas estruturas de diferente natureza material: o corpo do bebê, feito de seu puro real biológico inicial e o campo do simbólico, o Outro por excelência. O saldo desta experiência é um primeiro traço mnemônico, uma letra que se escreve, e, a partir disso, o real do organismo é transformado, porque essa letra ficou escrita. A experiência seguinte já não será igual, porque novamente será, sim, o encontro entre o Outro e o organismo no real, mas este organismo já terá sido modificado e voltará a ser transformado pela nova letra que será o saldo da nova experiência.
As investigações sobre plasticidade cerebral dão-nos o modelo no qual o Outro, ao incidir sobre o sistema nervoso central, e especialmente nos primeiros tempos, "desenha" o cérebro; o Outro é condição para que se completem as estruturas nervosas que acedem prematuras à luz do dia.
Se as letras foram postas na ordem adequada e se o organismo conta por sua vez com a informação biológica necessária para continuar desdobrando na forma correta seu processo de maturação, o bebê poderá ter acesso ao júbilo com que reconhece sua imagem no espelho no momento esperado. Se falha qualquer uma das duas condições, isso ocorrerá mais tarde ou poderá não ocorrer.
As sucessivas experiências lhe permitirão depois recortar a imagem de sua mãe como um objeto diferente de todos os objetos do mundo, e em seguida haverá uma direção específica para sua demanda. Nesta nova realidade, as letras, até agora soltas, mas que já tatuaram com profusão as zonas erógenas, poderão dar o salto que as articule entre si como significantes. Se tudo ocorreu como deveria, a criancinha já terá sido sujeitada.
Começará a converter-se em sujeito de direito próprio quando, a partir dos significantes já instalados nela, começar a manipular objetos no jogo do fort-da. Daí por diante, o jogo lhe permitirá a apropriação e elaboração dos significantes que a marcaram.
A construção da estrutura de linguagem e das estruturas cognitivas - que de fato também começou com a primeira experiência - segue seu curso, florescendo em suas sucessivas complexidades. Florescendo, claro, se até aqui se cumpriram os passos precedentes, tanto na ordem da maturação como na ordem do Outro, e se além disso estão presentes os novos elementos que serão necessários - novamente, tanto na ordem do suporte do papel neurológico, como na ordem do desejo dos pais dirigido à criança, como na ordem do incipiente desejo, já instalado nele mesmo.
Tanto as transformações no desenvolvimento da linguagem como as novas aquisições cognitivas ou motoras - ou sua pobreza ou ausência - terão necessariamente efeito sobre a maneira singular em que essa criança atravesse seu Édipo. Um fracasso na escola não afeta somente um brilhante futuro intelectual.
A divisão que fazemos das crianças em áreas, no ângulo de enfoque e de trabalho das diferentes disciplinas (psicanálise incluída), tem a finalidade de estudo, mas é extremamente difícil que, em um bebê ou em uma criança pequena em particular, o que origine um problema em uma área não acabe originando problemas nas outras.
Em qualquer área, o atraso na produção de uma resposta por parte da criança, ainda que sua causa esteja exclusivamente no orgânico, converte-se por sua vez, para os pais, em um problema de ordem psicológica que termina afetando, em maior ou menor medida, o lugar que outorgam a seu filho e a demanda que lhe dirigem. Por isso, habitualmente, observamos que, em torno de um contratempo neurológico, por exemplo, se emaranha um nó de ordem significante, e às vezes é este mesmo nó o que trava o desenvolvimento favorável da criança.
É exclusivamente sobre o nó significante - haja ou não causa orgânica -que terá de operar e incidir o psicanalista. Esse é nosso métier, para isso fomos convocados.
Mas então por que seria importante para um psicanalista tudo o que tem a ver com o orgânico ou com o desenvolvimento?
Eu diria que, freqüentemente, e com a melhor fé, simplesmente por desconhecimento, o psicanalista intervém atribuindo a alguma faceta misteriosa do fantasma dos pais o atraso da criança na fala, ou o sintoma psicomotor, ou a dificuldade na leitura e na escrita, quando na realidade, em sua origem, trata-se de alguma disfunção neurológica ou de alguma alteração na qualidade do papel que deveria sustentar o processo de apropriação.
Esse tipo de confusões diagnósticas em relação à causa etiológica pode tornar-se tão iatrogênico como seu oposto, ou seja, quando se atribuem ao orgânico questões que são exclusivamente de ordem psi - e que também podem apresentar-se como alterações da fala, do motor ou da aprendizagem.
Se dizíamos que, no desenvolvimento, os fatores causais formam uma combinatória, outro tanto acontece com a apresentação do problema: não é o mais freqüente que se apresentem puros. Em cada caso singular é preciso decidir - fundamentando-se a partir da disciplina com a qual se intervém - qual é o tratamento que convém a essa criança e com quem; mas, independentemente de quem seja o encarregado, convirá que atue- a partir da interdisciplina.
Com o que contribui cada disciplina?
Um psicopedagogo, por seu saber sobre os processos de aprendizagem, estará em melhores condições que um psicanalista para possibilitar que uma criança realize as experiências necessárias através de cada um dos múltiplos passos que precisará seguir de maneira singular para que possa ir se apropriando dos objetos cognitivos.
Pode-se dizer o mesmo a respeito dos especialistas em problemas motores e da linguagem.
A questão é que reconhecer um problema específico não apenas facilitará a escolha do tratamento mais adequado, mas esclarecerá o compromisso dos pais com a origem do mesmo. O analista terá mais possibilidade de intervir sobre o que lhe compete em cada caso, sem enredar-se em suposições arbitrárias. A interconsulta é, na clínica, expressão necessária da combinatória de fatores causais.
E a psicanálise contribui para as demais disciplinas afirmando que o que está em jogo na infância é a constituição do sujeito, e propondo, portanto, o brincar e a transferência como eixos centrais na direção da cura para qualquer tratamento clínico de crianças. É fundamental que cada profissional resgate e aperfeiçoe o valioso acervo de saber da disciplina na qual foi formado, mas que, para sua implementação no tratamento de uma criança, leve em conta, sobretudo, de que maneira possibilitar-lhe que, aos poucos, possa se apropriar do saber, sem converter-se ele mesmo - refiro-me ao profissional - em um esmagador obstáculo superegóico; pelo contrário, propiciando, em sua intervenção, a construção da estrutura que possibilite um sujeito desejante.
Isso requer uma ética compartilhada por todos, mesmo que esteja conjugada em cada um dos diferentes objetos que cada disciplina recorta.
Sempre me acontece a mesma coisa... Termina o tempo e não consigo desenvolver tudo aquilo a que me havia proposto. Espero que, no mínimo, tenha ficado claro que o antídoto encontrado por mim para nossos próprios preconceitos é - em um contaminado fim de século, diante do real com o qual nos encontramos na clínica e a partir da língua na qual fomos feitos -voltar a ler Freud, voltar a ler Lacan.
Já nas últimas linhas, não quero concluir sem tentar definir de que se trata uma criança. Tentando fazê-lo, diria o seguinte:
As crianças são esses seres quase humanos que vêm em tamanho pequeno. Devido a determinada falha estrutural, são lançados a representar-se entre os significantes manipulando os objetos; por isso, apresentam o problema de desordenar nossos consultórios e, o que é pior, de desordenar nossas idéias. Brincando, nos obrigam a voltar a pensar a realidade da psicanálise, seus temas cruciais. Seu passado, seu presente e seu futuro. Seu destino. "Mas não importa", nos diz a voz da experiência, "logicamente, com o passar do tempo, estes problemas se curam sozinhos."
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Bachelard, G. La formación dei espíritu científico. México: Siglo XXI. [ Links ]
Coriat, E. (1997). Causas e acasos. Estilos da Clínica: Revista sobre a Infância com Problemas, 2 (3). [ Links ]
Freud, S. (1896). Carta 52. In Obras completas. Madrid: Biblioteca Nueva, 1973a. [ Links ]
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Lacan, J. (inédito). Seminário XXI: Les non dupes errent. Aula 1 (inédito) (I. A. de Ramos, trad.). Escuela Freudiana de Buenos Aires. [ Links ]
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_____. (1957). La instancia de la letra en el inconsciente. In Escritos 1. Buenos Aires: Siglo XXI, 1985. [ Links ]
NOTAS
Tradução: Daniela Teperman
1 Trabalho apresentado no Congresso Internacional de Psicanálise e suas Conexões: Trata-se uma Criança. Organizado pela Escola Lacaniana de Psicanálise, Rio de Janeiro, 19 a 22 de agosto de 1998.
2 Devido a problemas ocoridos no processo de editoração, este artigo foi publicado apenas parcialmente no número anterior desta mesma revista. Estilos da Clínica optou pela reedição integral do texto no presente número.
3 Jerusalinsky, A. e colab. (198 ). Psicoanálisis en problemas dei desarrollo infantil. Buenos Aires: Nueva Vision [o Cap. III, "Desarrollo: lugar y tiempo dei organismo vs. lugar y tiempo dei sujeto", cujo autor é Alfredo Jerusalinsky, é reconhecido como um antecessor em relação à problemática trabalhada no presente texto].
4 Coriat, E. (1997). Psicanálise e clínica de bebês. Porto Alegre, RS: Artes e Ofícios.
5 Levin, E. (1995). La infância en escena. Buenos Aires: Nueva visión [no seio da equipe do Centro Dra. Lydia Coriat, Esteban Levin voltou a trazer à tona a polêmica em torno da relação entre estrutura e desenvolvimento. O debate a respeito sensibilizou-me para a profunda importância do tema, e, de alguma maneira, o presente trabalho é efeito do que venho elaborando desde então. Se comparar ambos os textos, o leitor poderá encontrar alguns pontos de coincidência (são anos de trabalho compartilhado!), mas, em relação a outros, estruturais, notará que, decididamente, não afirmamos o mesmo].