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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versão On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.12 no.2 São Paulo dez. 2011

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Avaliação de um programa de educação para a carreira no ensino fundamental

 

Evaluation of elementary school educational career program

 

Evaluación del programa de educación para la carrera en la enseñanza primaria

 

 

Margarida Dias Pocinho1

Universidade da Madeira, Funchal, Portugal

 

 


RESUMO

O Programa de Educação para a Carreira (PEC) foi desenvolvido para ser aplicado ao Ensino Fundamental, de 1ª ao 4ª ano, com o objectivo geral de desenvolver conhecimentos, atitudes e aptidões relativos à carreira ao longo da escolaridade. O objectivo específico deste programa é desenvolver o auto-conhecimento, a exploração educacional e ocupacional e o planejamento da carreira. Foi aplicado em 20 escolas, envolvendo 1394 alunos. A análise dos anos de frequência do PEC confirmou a eficácia do mesmo, conduzindo a um maior desenvolvimento de todas as dimensões de carreira, nas crianças com maior número de anos de frequência do PEC, o que permite concluir a boa qualidade do programa, assim como da viabilidade da sua implementação.

Palavras-chave: programa de educação para a carreira, desenvolvimento vocacional, planejamento de carreira, ensino fundamental


ABSTRACT

The Educational Career Program was developed to be used with elementary school students, from the 1st to the 4th grade, with the general aim of developing their knowledge, attitudes and skills related to career along their elementary education. The specific objective of this program is to develop self-knowledge, educational and occupational exploration and career planning and was applied in 20 schools involving 1,394 students. The analysis of program attendance duration confirmed its efficiency, leading to a further development of all aspects of career, with children who attended the program, for alonger time, which indicates the good quality of the program, as well as the feasibility of its implementation.

Keywords: educational career program, vocational development, career planning, elementary school


RESUMEN

El Programa de Educación para la Carrera (PEC) se desarrolló para ser aplicado a la Enseñanza Primaria, de 1º a 4º grado, con el objetivo general de desarrollar conocimientos, actitudes y aptitudes relativas a la carrera a lo largo de la escolaridad. El objetivo específico de este programa es desarrollar el autoconocimiento, la exploración educacional y ocupacional, y el planeamiento de la carrera. Se aplicó en 20 Escuelas involucrando a 1394 alumnos. El análisis de los años de frecuencia del PEC confirmó la eficacia del mismo, conduciendo a un mayor desarrollo de todas las dimensiones de carrera en los niños con mayor número de años de frecuencia del PEC, lo que nos permite deducir tanto la buena calidad del programa como la viabilidad de su implementación.

Palabras clave: programa de educación para la carrera, desarrollo vocacional, planeamiento de carrera, enseñanza primaria


 

 

A literatura existente acerca da educação para a carreira na infância é escassa e tem excluído um foco explícito que é a criança, apesar das teorias de vida orientadas por etapas reconhecerem a relevância do desenvolvimento deste processo desde a infância (Super, 1990) através do conceito de vida por etapas. Diversas investigações endereçaram preferências ocupacionais das crianças (Gottfredson, 2002; Stockard & McGee, 1990), aspirações e expectativas (Helwig, 2001, 2002; Phipps, 1995), e estereótipos do papel do sexo e influências parentais na escolha de carreira. De facto, a literatura tem mostrado que as meninas apresentam maturidade vocacional superior aos meninos e que quanto mais elevadas forem as qualificações dos pais mais adequado é o desenvolvimento vocacional (Pocinho, Correia, Carvalho, & Silva, 2010; Pocinho, Correia, & Tomás da Silva, 2009).

A pesquisa do desenvolvimento de carreira na infância revelou diferenças desenvolvimentais e de género em vários domínios. Tracey (2002) relatou que os interesses acerca da carreira mudam ao longo do tempo, tornando-se mais estáveis desde o 1º ciclo (escola elementar) até a escola secundária. Helwig (2001) chegou à conclusão que o valor social das aspirações ocupacionais das crianças aumenta desde a infância até ao começo da adolescência. Além disso, Schultheiss, Kress, Manzi, & Glasscock (2001) mostram que crianças do 5º ano descrevem uma consciência de interesses, reconhecendo os membros da família e professores como modelos de suporte social, e de consultar outros para os ajudarem na tomada de decisões, do que as do 4º ano. As diferenças de género foram relatadas igualmente. Helwig (2002) descobriu que os meninos tinham consistentemente mais trabalhos de fantasia como uma proporção de todas as aspirações ocupacionais do que as meninas. Schultheiss et al. (2001) referiram que as meninas tinham maior probabilidade do que os meninos para relatar uma consciência dos seus interesses e reconhecer o papel de outro significativo, como fornecedor de sustentação social.

A pesquisa longitudinal forneceu sustentação para as teorias de Gottfredson (2002), sugerindo que as aspirações ocupacionais se tornam limitadas pelo género e pela classe na infância adiantada e que estas preferências permanecem estáveis ao longo do tempo (Tracey, 2001; Tracey & Ward, 1998). A avaliação da estrutura de interesses das crianças tem emergido mais recentemente como um tópico importante (Tracey, 2001, 2002; Tracey & Ward, 1998). Usando a tipologia de Holland (1985), Tracey e Ward desenvolveram o Inventário de Actividades das Crianças para avaliar as percepções acerca dos seus interesses e das suas competências. Os resultados indicaram poucas diferenças na estrutura entre interesses e percepções da competência, uma variada estrutura dos interesses e da competência que aumenta com a idade, um relacionamento positivo entre o modelo circular e a idade, e diferenças nos interesses e habilidades para o género e a idade. Gottfredson esboçou um processo de desenvolvimento de carreira na infância que inclui a circunscrição (o processo através do qual as alternativas inaceitáveis da carreira são eliminadas progressivamente) e o acordo (o processo através do qual a maioria das alternativas de carreira consideradas preferíveis, são postas de parte para serem substituídas por outras, que apesar de não terem tanta preferência são entendidas como mais acessíveis). A teoria de Gottfredson enfatiza o modo como as crianças e os adolescentes estreitam as suas opções exploratórias do comportamento e da carreira, através das barreiras internas, externas e das expectativas culturais relativas aos papéis de sexo e ao valor social das ocupações.

Lent, Brown, & Hackett (1994) enfatizam a regra da aprendizagem do desenvolvimento do interesse nas origens da infância e releva a importância do ambiente interpessoal na exposição das crianças a uma variedade de actividades que tenham relevância no comportamento ocupacional. Schultheiss, Palma e Manzi (2002) investigaram alunos dos 4º e 5º anos para re-avaliar a teoria de Super (1990). Consistente com esta teoria, a análise revelou 8 das 9 (com excepção da curiosidade) dimensões do desenvolvimento de carreira da infância. Especificamente, a exploração, a informação, a perspectiva de tempo e o planeamento foram combinados para criar dois domínios de tópico.

Embora haja pouca urgência nas escolhas ocupacionais imediatas por parte das crianças, é imperativo que elas desenvolvam uma compreensão da relevância da escola, baseada na aprendizagem da sua futura carreira (Johnson, 2000). O sistema educativo português não tem dado muita relevância à educação para a carreira dos nossos jovens estudantes (M. Carvalho & Pocinho, 2010). A Escola, parece assim, virada para si mesma, fechada ao desenvolvimento dos jovens e das suas aptidões para fazerem escolhas ou tomarem decisões sobre o seu futuro escolar e profissional (Carvalho, Pocinho, & Silva, 2010).

Na verdade, e analisando a Lei de Bases do Sistema Educativo português (Lei n.º 46/86 de 14 de outubro, 1986) podemos encontrar uma única referência ou um único objectivo relativo à dimensão do trabalho na vida dos jovens estudantes. E mesmo assim, não se encontra em nenhuma delas, uma especial atenção para o desenvolvimento de competências que permitam aos jovens conhecer-se e conhecer os seus interesses, as suas aptidões e capacidades assim como a exploração e o planeamento das suas carreiras.

No sistema educativo português, os jovens tomam consciência, pela primeira vez, da necessidade de fazer escolhas e tomar decisões importantes acerca do seu futuro e no que respeita à sua formação e qualificação, apenas no final do Ensino Médio (9 anos de escolaridade), com 15 anos de idade, altura em que são confrontados com a transição para o Ensino Secundário...e apenas e só, os alunos que terminam o Ensino Médio. Em resumo, é só neste ponto do seu percurso que os jovens tomam consciência de que o que aprenderam (ou o que deixaram de aprender) se apresenta como uma ferramenta importantíssima para a consecução de objectivos de vida, e de realização escolar e profissional (M. Carvalho & Pocinho, 2010). A inexistência de um currículo nacional que dê relevância aos aspectos ligados ao desenvolvimento da carreira nos jovens, pode ter consequências graves na forma como estes monitorizam o seu próprio processo de ensino-aprendizagem.

Pese embora, a existência de Serviços de Orientação Escolar e Profissional nas escolas do Ensino Médio, a Orientação Vocacional é assegurada por um profissional de Psicologia, não dedicado apenas à problemática do desenvolvimento das carreiras (Pocinho et al., 2010). Por outro lado, não existe na maioria dos casos, um envolvimento da comunidade educativa no desenvolvimento vocacional (Carvalho, 2008). A Orientação Escolar e Profissional existe como um serviço de aconselhamento, pontual e pouco individualizado e não como, como seria o ideal, um programa estruturado e desenvolvido pela Escola à medida das necessidades da sua população estudantil.

Na tentativa de responder a esta problemática, o objectivo deste estudo é demonstrar a importância da educação para a carreira, através da concepção dum programa com essa finalidade (PEC), para os anos iniciais do Ensino Fundamental, da 1ª à 4ª ano (dos 6 aos 10 anos de idade), bem como fazer uma avaliação da sua eficácia evolutiva junto dos alunos e dos respectivos professores.

 

Importância dos programas de educação para a carreira

A inexistência de uma orientação educativa no âmbito da educação para a carreira das crianças e jovens é um facto que deverá ser alvo de uma reflexão séria, tendo em conta as recomendações da Organisation for Economic Co-Operation and Development [OECD] feitas na publicação Career Guidance and Public Policy (2004), onde refere que as políticas de Orientação Profissional nas escolas têm que deixar de se centrar unicamente nas escolhas imediatas, académicas ou laborais e tomar em consideração objectivos mais amplos que tratem de desenvolver aptidões de auto-gestão, por exemplo, a capacidade de decidir que carreira seguir e pôr em prática essa decisão. Esta abordagem deverá estar incluída no currículo e incorporar a aprendizagem pela experiência. Para tal terá que se envolver toda a escola, com as consequentes implicações ao nível dos recursos, formação de professores e planificação escolar.

Os programas de desenvolvimento de carreira têm ainda um papel importante no que concerne à prevenção do insucesso e do abandono escolar (Pocinho, 2005, 2006). Tendo em conta que abordam as necessidades dos alunos em risco e dos que precocemente abandonam a escola. Segundo ainda o mesmo documento, exemplos de sucesso neste campo são dados pelos países escandinavos onde os programas de orientação de carreira, dirigidos a alunos dos primeiros graus de ensino, obrigam a um envolvimento e a uma planificação abrangente de todos os intervenientes e onde se coloca em destaque a fixação de objectivos mútuos e a planificação de acções pessoais que se devem empreender.

Uma estrutura de suporte bem implantada ao nível da Educação para as Carreiras, em todos os graus de ensino, pode trazer muitos benefícios à sociedade, principalmente ao nível do abandono escolar precoce, uma vez que aqueles Programas permitem aos alunos, desde muito cedo, desenvolverem uma tomada de uma consciência de si, dos seus interesses capacidades e de competências de auto gestão dos seus percursos, determinando a sua auto orientação assim como a focalização dos seus esforços para o desenvolvimento de áreas reconhecidamente mais fracas, mas cuja importância pode ser conscientemente reconhecida (Carvalho, Silva, & Pocinho, 2010). Também ao nível da intervenção secundária, isto é, sobre os alunos que abandonaram a escola sem qualquer qualificação e sem terminar a escolaridade obrigatória, aqueles Programas poderão ajudar os jovens a planear o seu futuro em face das oportunidades existentes no sistema educativo e formativo, evitando uma desintegração social com consequências nefastas para os jovens, famílias e sociedade (Abreu, 1996).

 

Implicações pedagógicas dos programas de educação para a carreira

A escolha de uma carreira não se faz num ou em vários momentos isolados da vida das pessoas. Pelo contrário, a carreira é o resultado das múltiplas experiências de vida, escolares e extra escolares e das muitas actividades que têm significado para a pessoa. Segundo Hiebert (1993), a escola deve ser um momento privilegiado na preparação do sujeito para as exigências ao nível do trabalho neste novo século. Estas exigências, numa era em que a sociedade se transformou rapidamente, passando de uma estrutura baseada na industrialização para outra baseada nas tecnologias de informação, fazem cada vez mais apelo às capacidades de lidar com um conjunto vasto de informação. Não tanto com a quantidade de informação obtida, mas com a sua gestão eficaz. Coloca-se assim, o problema da instrumentalidade da escola, ou melhor, da instrumentalidade da informação, que pode (ou não) converter-se em aprendizagens.

Será que os nossos estudantes sabem realmente o valor, o propósito, a utilidade de toda a informação que receberam durante toda a vida escolar? Será que as aprendizagens escolares são percebidas pelos alunos como instrumentais relativamente aos seus futuros objectivos? Estas questões têm sido largamente discutidas, principalmente ao nível da auto-regulação do comportamento, relativamente às características temporais dos objectivos percebidos pelos alunos.

Os objectivos ideais são caracterizados por alguns autores (Locke & Latham, 1990) como sendo proximais, os seja, os que mais perto estão de poder ser concretizados, na medida em que exercem uma função auto-reguladora do comportamento. Os alunos, podem avaliar os seus progressos, assim como emitir julgamentos sobre si mesmos e compreender as suas consequências. No entanto os objectivos distais, ou mais longínquos, parecem exercer uma moldura importante na definição de objectivos proximais e na orientação da vida das pessoas.

Estes objectivos incluem as aspirações relativamente às carreiras, tais como, conseguir um determinado grau académico, esforçar-se por obter um bom emprego, desenvolver boas relações interpessoais, desenvolver um papel importante na sociedade, ou até ser uma pessoa bem educada (Cantor & Kihlstrom, 1987; Nurmi, 1991).

Pese embora, os objectivos distais poderem ser percebidos como grandes "linhas orientadoras" da vida do sujeito, estes são muitas vezes entendidos como muito gerais ou muito distantes. O seu papel é, no entanto, aglutinador e orientador da vida dos alunos na medida em que o seu significado, pode conduzir a um compromisso e ao desenvolvimento de objectivos proximais que conduzam ou orientem o aluno a objectivos mais distantes (Nurmi, 1991; Nuttin, 1984).

Os programas de desenvolvimento de carreiras podem ajudar os alunos, por um lado, a perceber a importância do estabelecimento de objectivos pessoais, num futuro distante, ajudando no processo de comprometimento com esses objectivos e, por outro, no estabelecimento de objectivos proximais (bom desempenho escolar, conhecimento de si, bom relacionamento social, etc), que desempenharão um papel auto-regulador do comportamento em direcção à consecução dos objectivos distais (Carvalho, Silva, et al., 2010).

A ausência de programas de desenvolvimento de carreira, em idades precoces, é também sentida pelos jovens, em períodos de dissonância quando se confrontam com a necessidade de tomar uma decisão relativamente aos seus percursos escolares (Faria, Taveira, & Saavedra, 2008). A ausência do estabelecimento de metas, associada a baixa percepção da instrumentalidade dos conhecimentos aprendidos, conduz a uma pobre monitorização e baixa motivação para intentar uma tomada de decisão eficaz (Pocinho & Correia, 2007, 2009a, 2009b).

As grandes modificações operadas nestes últimos anos, na estrutura do mundo do trabalho, originadas em parte pelo rápido avanço da tecnologia, pressuporiam uma modificação da estrutura do ensino, ao nível quer do currículo quer das metodologias e da organização. Esta mudança, não se requer apenas na sua forma, ou seja, na inovação tecnológica e dos equipamentos escolares. Falamos essencialmente de mudanças de conteúdo ou de mentalidade, pela necessidade de redefinir os objectivos do ensino e de "equipar" os nossos jovens estudantes de competências que lhes permitam, preparar o seu futuro com escolhas conscientes, a partir do conhecimento do mundo em que vivem e, sobretudo, de si mesmos.

A aquisição dessas competências deve, na opinião de Starr (1996), implicar, por parte das escolas, a inclusão de programas de educação para a carreira, que permitam aos alunos uma tomada de consciência de carreira, centrada no conhecimento de si, no desenvolvimento das relações com os outros, na aprendizagem das responsabilidades pessoais e familiares e no desenvolvimento de bons hábitos de trabalho. Os estudos sobre programas compreensivos de desenvolvimento de carreiras, demonstram a existência de uma maior implicação dos alunos nas tarefas escolares (Kuhl, 1994) assim como um maior número de alunos que consegue terminar ensino secundário (Lapan, Gysbers, & Sun, 1997). Estes autores, indicam ainda, que as escolas onde Programas com estas características foram implementados, revelaram um melhor clima escolar.

Torna-se também fundamental que os programas proporcionem o desenvolvimento de atitudes activas face à exploração da carreira, nomeadamente um bom conhecimento sobre as diferentes opções de educação e formação assim como as mudanças que se operam no mundo moderno e o impacto das mesmas na vida futura dos jovens (Starr, 1996).

Educar as crianças, implica um processo complexo e longitudinal, que deverá culminar numa autonomia, preparando-as para os desafios de um mundo em constante mudança, desenvolvendo atitudes e competências que facilitem as transições de vida. O desenvolvimento das atitudes de carreira, poderá iniciar-se nos primeiros anos de escolarização tendo em conta que é neste período que as crianças começam a internalizar percepções e preferências sobre vários domínios do mundo do trabalho e a adquirir percepções que permitem inferir a importância da escola e das aprendizagens na sua vida futura. Os estudos de Herr e Cramer (1996) indicam que muitos dos alunos que abandonam a escola aos 16 anos de idade, já tinha feito "psicologicamente" esse abandono por volta dos 9-10 anos, precisamente por terem fracassado, no seu processo de tomada de consciência de carreira, da importante ligação entre as aprendizagens escolares e as experiências fora da escola. Sem oportunidades para desenvolver uma consciência sobre si e sobre os vários domínios do mundo do trabalho, as crianças podem adquirir ideias e comportamentos inadequados sobre elas mesmas e sobre as oportunidades que o futuro lhes pode proporcionar (Pocinho & Correia, 2009a, 2009b). É por isso, que os programas de desenvolvimento de carreiras, em idades do início de escolarização, se centram no desenvolvimento da consciência de si, no conhecimento das suas capacidades, habilidades e interesses e das percepções sobre as carreiras, ajudando-as a planear correctamente o futuro com um sentimento de controlo efectivo sobre ele.

Estes objectivos, podem e devem também, ser atingidos a partir do contexto familiar. Os pais têm um papel importantíssimo, a par com a escola, no desenvolvimento da carreira dos seus filhos (Gonçalves & Coimbra, 2007; Pocinho & Correia, 2010; Pocinho et al., 2010). Segundo Super (1988) as maiores oportunidades de desenvolvimento do autoconhecimento são dadas, em primeiro lugar, no processo de socialização em meio familiar. A família pode assim, ter um papel importante no desenvolvimento das atitudes de carreira das crianças e jovens uma vez que ambos estão expostos a experiências relacionadas com o trabalho. No entanto, Middleton e Longhead (1993) referem que tal facto não é o que ocorre com maior frequência, uma vez que cada vez mais as crianças passam a maior parte do tempo na escola (podendo nos casos das Escolas a Tempo Inteiro ir até às 10 horas diárias), deixando os pais de poder proporcionar experiências enriquecedoras e de desenvolvimento de uma consciência de carreira. Desta forma, os princípios da educação básica, deverão andar de mão dada com os objectivos da educação de carreiras. O auto-conhecimento, a consciência de um futuro educativo e das alternativas ocupacionais e o desenvolvimento de competências de tomada de decisão deverão, na opinião de Herr e Cramer (1996), ser consideradas importantes tanto nos princípios como nas práticas do Ensino Fundamental.

 

Caracterização do Programa de Educação para a Carreira (PEC)

O PEC para os anos iniciais do Ensino Fundamental (de 1ª ao 4ª ano), destinado a crianças dos 6 aos 10-11 anos de idade, foi desenvolvido a partir do modelo preconizado por Norman Gysbers e seus colaboradores implementado em muitos dos estados e distritos dos Estados Unidos da América. Este modelo consiste em três elementos principais: conteúdo, moldura organizativa e recursos (Gysbers, 1997). O conteúdo refere-se à aquisição de conhecimentos e competências dos alunos, tais como o auto-conhecimento, competências interpessoais, papéis de vida e planeamento da carreira. A moldura organizativa implica a forma como este se implica com o currículo escolar, e os seus princípios e objectivos. Os recursos referem-se às necessidades humanas materiais e politicas para o desenvolvimento do programa.

O PEC foi concebido para ser implementado em escolas de 1ª ao 4ª ano (Ensino Fundamental), com o objectivo de desenvolver a consciência de carreira a crianças que frequentam este grau de ensino. A consciência de carreira, pode ser definida como o inventário de conhecimentos, valores, preferências e auto-conceitos que uma pessoa vai desenhando o seu percurso de vida de forma a poder tomar decisões de carreira (Wise, Charner, & Randour, 1978).

Durante os quatro primeiros anos do Ensino Fundamental, as crianças encontram-se numa fase exploratória, não só de si, mas também dos outros e do mundo onde estão inseridas. As actividades de desenvolvimento da consciência de carreira podem, nesta fase de escolarização e de desenvolvimento infantil, incrementar o conhecimento sobre a forma como a escola, as aprendizagens e as tarefas propostas pelo currículo estão intimamente ligadas às exigências do mundo do trabalho. A importância, que se reveste o Ensino Fundamental no desenvolvimento de competências para uma posterior tomada de decisão de carreira, implica uma especial atenção para o desenvolvimento de programas que facilitem o desenvolvimento dessas competências.

Uma abordagem desenvolvimentista da carreira, é altamente consistente com os princípios da educação básica, desenvolvendo capacidades intelectuais, competências sociais e emocionais que promovem o sucesso, desde idades precoces e durante toda a vida (Hoffman e McDaniels, 1991).

Ginzberg (1972) e Super (1980) conceberam o desenvolvimento da carreira como um processo que se dá ao longo da vida caracterizado por um determinado número de estágios. Nesta perspectiva desenvolvimentista, as pessoas devem ser capazes de resolver tarefas específicas e próprias de cada estádio ou aquelas que se encontram no estádio de desenvolvimento seguinte. O PEC foi elaborado e estruturado de forma a desenvolver, nas crianças, determinadas tarefas relacionadas com a carreira, reunidas em três grandes áreas: a consciência de si, a exploração educacional e ocupacional e o planeamento da carreira. O PEC foi concebido a partir das linhas orientadoras preconizadas pelo The National Career Development Guidelines (NCDG), um conjunto de linhas orientadoras para a concepção de programas de desenvolvimento de carreiras para alunos que frequentam os diferentes graus de ensino do sistema de ensino americano. A escolha deste modelo foi feita por duas razões essenciais: por ser um modelo que promove a concepção de programas compreensivos de carreira, baseados em actividades específicas para cada nível de ensino e por ser amplamente aplicado em mais de 40 estados dos EUA desde 1989 (America's Career Resource Network, s.d.). O objectivo principal deste programa foi proporcionar às crianças o envolvimento em actividades relacionadas com aspectos importantes do desenvolvimento pessoal, educativo e carreira, para que pudessem tomar consciência de si, das mudanças que se irão operar durante os próximos de vida e da relação entre as aprendizagens escolares e o mundo do trabalho e de como poderão utilizar as suas experiências de vida na exploração e preparação do seu futuro.

As competências a desenvolver nas crianças, a partir das actividades propostas e preconizadas pelas linhas orientadoras do NCDG, representam um conjunto de aptidões básicas e atitudes que as crianças devem adquirir para lidar com proficiência com o seu percurso escolar, tanto ao nível das futuras transições entre os vários níveis de ensino, como com os aspectos mais relevantes da sua vida do dia a dia, que sejam relacionados com a escola ou fora desta. Pretende-se ainda que as crianças sejam capazes de desenvolver um plano educativo que permita a continuidade do seu desenvolvimento de carreira.

A Tabela 1 mostra as 12 competências e respectivos indicadores constantes do PEC, adaptadas do modelo do NCGD, distribuídas por 3 áreas: consciência de si, exploração educacional e ocupacional e planeamento de carreira. Não sendo sequenciais, permitem o desenvolvimento de atitudes de carreira da 1ª ao 4ª ano do Ensino Fundamental.

O conjunto de actividades que fazem parte deste programa foi desenvolvido com base num manual de actividades intitulado Careers Now! Making the Future Work (Wishik, 1994). Este manual contem actividades de educação para a carreira, destinadas aos anos iniciais de escolaridade, e distribuídas pelas 3 áreas de desenvolvimento de competências de carreira já referidas. O PEC foi concebido de forma a ser aplicado pelos professores e é composto, para cada série, de 25 actividades. Cada uma das actividades está estruturada para que os professores compreendam como devem ser desenvolvidas pelas crianças.

A concepção e adaptação das actividades tiveram em conta aspectos de carácter desenvolvimentista (existem 4 Manuais do PEC, uma para cada série (http://dre.madeira-edu.pt). Cada professor teve formação adequada para aplicar o PEC de acordo com a etapa evolutiva e os temas de carreira adequados. Cada actividade, na sua estrutura, teve em conta o nível etário da criança, de forma a que a mesma competência pudesse ser desenvolvida ao longo dos 4 anos de escolaridade, sem que se fizesse apelo de outras competências ainda não desenvolvidas. Por exemplo, as actividades da 1.ª série (para os 6 anos de idade) revestem-se de um carácter mais lúdico com ausência de recurso a aptidões académicas (leitura e escrita). As actividades do Programa foram concebidas para ser implementadas em grupos (quer seja o grupo turma ou em grupos mais pequenos) e para que todas as crianças pudessem ser incluídas, independentemente das suas características individuais. Esta metodologia permite uma maior interacção entre os alunos e uma melhor compreensão do nível de aquisição das competências.

Não obstante, alguns procedimentos são efectuados individualmente e posteriormente partilhados com o resto do grupo. Na especificidade do programa, e das actividades que o compõem, os alunos poderem desenvolver outras aptidões, não estritamente ligadas à carreira, como sejam de comunicação, perceptivo-motoras, espaciais através da facilitação e encorajamento proposto por cada uma das actividades. Do PEC, fazem parte, ainda, um manual de normas de aplicação das actividades e propostas para estratégias pedagógicas para o desenvolvimento das mesmas.

Assim, a implementação do PEC teve como objectivos: (a) criar uma cultura de desenvolvimento de carreira na escola onde os professores ajudarão os alunos a valorizar o trabalho e a conhecer as competências a desenvolve; (b) expor os alunos a uma variedade de experiências com o fim de adquirirem aptidões e explorarem os seus interesses e as suas capacidades; (c) desenvolver competências e atitudes de carreira nos alunos para que possam fazer transições com sucesso, sejam elas ao nível educacional ou ao nível profissional.

Como referido anteriormente, o objectivo deste estudo é demonstrar a importância da educação para a carreira, através da implementação dum programa com essa finalidade (PEC), destinado a alunos de 1ª ao 4ª ano, bem como fazer uma avaliação da sua eficácia evolutiva junto dos alunos que o frequentaram e da opinião dos respectivos professores.

 

Método

Amostra

O PEC foi aplicado em 20 escolas públicas portuguesas (Região Autónoma da Madeira) de 1ª ao 4ª ano do Ensino Fundamental, entre 2007/8 e 2010/11 em 1394 crianças, compreendendo 69 turmas. A distribuição dos alunos foi a seguinte 342 da 1.ª série; 338 da 2.ª série; 346 da 3.ª série e 368 da 4.ª série, com idades entre os 5 e os 13 anos, sendo a média de 8 anos. Destes, 689 (49,4%) eram do sexo masculino e 705 (50,6%) do sexo feminino. Para a avaliação da eficácia do PEC na evolução dos alunos, dos 1394 alunos que frequentaram o PEC (Grupo Experimental), avaliaram-se 523 alunos. No Grupo de Controle avaliaram-se 391 alunos.

Instrumentos

Para avaliação da eficácia do PEC na evolução dos alunos foi usada a Escala de Avaliação da Consciência de Carreira para a Infância (EACC) de Jorge (2011). A escala é composta por 60 itens, reflectindo as 9 dimensões da Teoria do Desenvolvimento de Carreira na Infância de Super (1990), com respostas do tipo Likert de 4 pontos (1 - Não concordo nada; 2 - Concordo um pouco; 3 - Concordo muito; 4 - Concordo completamente), existindo campos para o preenchimento dos dados sociodemográficos como o género, a idade e os anos de frequência no PEC. Os itens subdividem-se em 6 factores. O Factor 1 (α = 0,74), definido como Autoconhecimento Escolar e Pessoal inclui 13 itens, que representam a consciência da importância do estudo, do trabalho, do treino e dos valores para o sucesso profissional futuro. O Factor 2 (α = 0,76), designado Planeamento/Tomada de Decisão, contém 9 itens que representam a consciência da importância de planear para o futuro. O Factor 3 (α = 0,70), definido como Locus de Controlo/Estereótipos, inclui 7 itens que representam a consciência da importância de possuir um sentido interno de controlo sobre a sua própria vida, e da consciência de que não existem profissões específicas a um dos géneros. O Factor 4 (α = 0,49), denominado Figuras de Referência, inclui 5 itens que possibilitam o reconhecimento de modelos e o desejo de ter a mesma profissão dessas pessoas. O Factor 5 (α = 0,62), Auto-estima, inclui 5 itens que conduzem ao auto-reconhecimento das capacidades. O Factor 6 (α = 0,52), Preocupação com o Futuro, inclui 4 itens que representam a consciência da importância de reflectir sobre a profissão futura.

Para a avaliação da qualidade técnica e adequação do mesmo aos alunos, por parte dos professores, foi usado o Questionário de Avaliação do PEC, com 5 questões: 1 - Grau de execução das actividades; 2 - Grau de adesão dos alunos às actividades; 3 - Grau de motivação para as actividades; 4 - Grau de compreensão das actividades; 5 - Qualidade dos materiais produzidos. As respostas ao questionário foram respostas de opinião ou de juízos, sobre cada uma das questões colocadas. Consoante a opinião mais favorável até a menos favorável, os professores responderam utilizando uma escala de Likert de 5 pontos (1 para a opinião menos favorável, até 5 - para a opinião mais favorável).

Procedimento

A aplicação do PEC (entre 2007/8 e 2010/11) e respectiva avaliação através da EACC (Janeiro e Fevereiro 2011) pressupôs o envio dos pedidos de autorização aos directores das escolas, assim como reuniões por um dos peritos vocacionais da Direcção Regional de Educação (Dr. Armando Correia) com os professores do ensino fundamental (1ª ao 4ª ano), no sentido de clarificar os obejctivos do PEC e da posterior administração da EACC. Para tal, foram seguidos todos os procedimentos éticos exigidos pela legislação portuguesa, tanto para a participação dos alunos no PEC como no processo de avaliação através da EACC. Estes procedimentos consitiram no pedido de autorização aos pais e encarregados de educação por meio da assinatura do consentimento informado.

A implementação do PEC decorreu entre 2007/8 e 2010/11 e pressupõe 3 fases distintas, sendo as fases 1 e 2 apenas para escolas e/ou professores novos que queiram aderir ao PEC.

Fase1 - Divulgação do PEC junto dos Directores das Escolas. Na Região Autónoma da Madeira, Portugal, 92% das escolas de 1ª ao 4ª ano são Escolas a Tempo Inteiro (http://dre.madeira-edu.pt), onde os alunos permanecem cerca de 10 horas diárias, com uma componente extra-curricular que ocupa metade do tempo em que os alunos estão na escola, e onde são desenvolvidas actividades de desenvolvimento de competências nas crianças. Por este motivo, cada escola estudou previamente a forma de implementar o Programa de acordo com as disponibilidades de tempo e recursos humanos. Esta fase decorreu durante o mês de Outubro (início do ano escolar).

Fase 2 - Formação de professores para a aplicação do PEC. Todos os professores que voluntariamente aplicaram o PEC foram sujeitos a formação com 2 objectivos: (a) dotar os professores de conhecimentos sobre o desenvolvimento de competências de carreira na infância e (b) dotar os professores de competências para aplicação do PEC junto de crianças de 1ª ao 4ª ano. Este período decorreu durante os meses de Novembro e Dezembro.

Fase 3 - Implementação das actividades. De Janeiro a Junho, os professores desenvolveram as actividades do PEC com as crianças.

No final de cada ano de frequência do PEC, cada professor preencheu o Questionário de Avaliação do PEC, incluído no próprio Manual.

 

Resultados

Avaliação da eficácia do PEC quanto aos objectivos evolutivos nos alunos

Podemos verificar a eficácia do PEC em todos os factores da Escala de Avaliação da Consciência de Carreira para a Infância, ou seja, estes factores são fortemente influenciados pela frequência do PEC. Os dados evidenciam que o autoconhecimento escolar e pessoal, o planeamento/tomada de decisão, o locus de controlo/estereótipos, as figuras de referência, a auto-estima e a preocupação com o futuro consistem em dimensões com maior desenvolvimento nas crianças com maior número de anos de frequência do PEC. Notam-se diferenças muito maiores entre os que nunca frequentaram o Programa e os que o frequentaram, nem que tenha sido apenas durante um ano (Tabela 2).

Avaliação da eficácia do PEC na perspectiva dos professores

Os Questionários de Avaliação das Actividades do PEC foram respondidos pelos 79 professores envolvidos, no final do ano lectivo, em Julho, e após todas as actividades terem sido aplicadas. As respostas aos questionários foram dadas por cada ano de escolaridade. Não tendo sido encontradas diferenças significativas quanto ao resultado final em cada um dos itens, relativamente ao ano de escolaridade, optou-se por apresentar apenas os resultados médios globais do programa.

No que respeita ao grau de execução das actividades, ou seja, à possibilidade de executar as actividades, de um modo geral, dentro do tempo preconizado para cada uma, obtive-se um valor médio de 4,3, numa escala de Likert de 5 pontos (1 para a opinião menos favorável, até 5 -para a opinião mais favorável), ou seja, uma opinião que variou entre o grau elevado e muito elevado de execução.

Quanto ao grau de adesão dos alunos, ou seja a proporção de alunos de uma turma ou grupo, o valor médio obtido para a generalidade das actividades foi de 4,2. Este valor indica que, de uma maneira geral, mais de 75% dos alunos conseguiu terminar todas as tarefas propostas pelas actividades.

No que respeita, ao grau de satisfação dos alunos, obtive-se a partir das respostas dos professores um valor médio de 4,1. Este item pretendia avaliar a opinião dos professores sobre a satisfação dos alunos no final das actividades. A avaliação da satisfação foi feita pelo professor no final de cada actividade, e a resposta ao questionário reflectiu a sua opinião geral sobre a satisfação dos alunos sobre a generalidade do programa. O valor obtido revela um grau situado entre o Bom e o Muito Bom.

O grau de compreensão das actividades, referia-se ao grau de clareza com que os procedimentos para o desenvolvimento de cada uma das actividades estavam explicitados. O valor médio obtido no questionário foi de 4,1, reflectindo um grau de clareza situado entre o Muito Claro e Completamente Claro.

A qualidade dos materiais produzidos pela equipa que elaborou o programa, foi também avaliada. Neste item, os professores deram a sua opinião sobre o nível de adequação dos materiais produzidos (quando foi o caso) tanto à consecução da tarefa, como ao nível etário dos alunos. O valor médio obtido foi de 4 pontos revelando uma boa qualidade dos materiais.

 

Discussão

A opinião dos professores sobre a qualidade técnica e adequação das actividades aos alunos foi positiva, permitindo-nos dar continuidade ao programa em próximos anos. O propósito, em 2011 foi avaliar a coerência e impacto do PEC relativamente aos objectivos evolutivos a que este se propõe, através duma escala elaborada propositadamente para este efeito (EACC, Jorge, 2011). A avaliação sobre os resultados ou efeitos do PEC sobre a tomada de consciência de carreira realizou-se a fim de verificar a coerência do mesmo, com alunos de 1ª ao 4ª ano, desde os que nunca frequentaram o PEC até aos que o frequentaram na totalidade das actividades no final dos 4 anos de escolaridade.

Assim, a análise dos anos de frequência no PEC veio confirmar a importância e eficácia do mesmo, uma vez que influenciou fortemente todos os factores, conduzindo a um maior desenvolvimento de todas as dimensões, nas crianças com maior número de anos de frequência do PEC. Estes resultados são congruentes com os obtidos no estudo de Hughes e Karp (2004) sobre o desenvolvimento de carreira nalgumas escolas do Estado de Arizona em que os mesmos autores (Hughes & Karp, 2004) referem que a implementação de um programa de desenvolvimento de carreira, de carácter anual, envolvendo alunos do ensino básico, promoveu a relação entre o crescimento académico e o profissional; aumentou o conhecimento dos alunos sobre carreiras, elevou-lhes a auto-estima e capacitou-os para o cuidadoso planeamento académico. Mais ainda, os programas de desenvolvimento de carreira de Oliver e Spokane (1988), também conduziram a resultados positivos, nomeadamente ao nível do conhecimento de carreiras, da tomada de decisões, da compreensão de carreiras e do ajustamento à carreira, o que mais uma vez corrobora a importância da participação das crianças em programas de desenvolvimento vocacional.

No entanto, outros efeitos poderão estar subjacentes à aplicação de um programa desta natureza. Lapan, Gysbers e Petroski (2001) encontraram, em escolas com programas abrangentes de carreira, diferenças significativas ao nível da percepção de segurança, da relação interpessoal entre alunos e alunos e professores, das crenças na relevância da educação na satisfação com a qualidade da educação quando comparados com escolas onde não eram implementados programas desta natureza.

Acredita-se também, que os programas de desenvolvimento de carreiras, quando aplicados a partir dos primeiros anos de escolaridade poderão ajudar os alunos na tomada de consciência dos seus futuros papéis como cidadãos e nas escolhas e decisões que terão que tomar ao longo da sua vida escolar e profissional, e criar um novo clima de confiança no sistema educativo. Cada vez mais se torna necessário que os alunos desenvolvam competências ao nível do planeamento da carreira e da tomada de decisão e que o façam precocemente e durante todo o seu percurso escolar (Mouta & Nascimento, 2008). O PEC permitiu que os alunos relacionassem os seus valores pessoais, interesses e prioridades com o potencial plano de carreira que começam a desenhar, o que confirmam as investigações de Faria e Taveira (2006). Eles reconhecem o possível e real impacto que as decisões de carreira poderão ter tanto nas suas vidas como nas vidas dos seus próximos. Os alunos começam a compreender que o processo de tomada de decisão, nas carreiras, é um processo contínuo que começando cedo se prolonga por toda a sua vida útil (Pocinho, 2006). Aceitando as responsabilidades das suas decisões e escolhas, gerindo os seus próprios recursos e direccionando a sua vida, os alunos vão reflectindo a sua maturidade e o seu processo de crescimento. O processo de desenvolvimento de carreira, também envolve competências académicas e vocacionais. Os alunos aprendem que a educação e o trabalho estão intimamente ligados e que a aprendizagem é um processo que nunca termina.

 

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Recebido: 10/02/2011
1ª Revisão: 09/07/2011
Aceite final: 01/08/2011

 

 

Sobre a autora
Margarida Maria Ferreira Diogo Dias Pocinho é Doutorada em Psicologia da Educação, Directora do Doutoramento em Psicologia, Vice-Presidente do Centro de Competência de Artes e Humanidades da Universidade da Madeira, Presidente do Conselho Científico da Associação Educação & Psicologia, Membro do Instituto de Psicologia Cognitiva, Desenvolvimento Vocacional e Social da Universidade de Coimbra.
1 Endereço para correspondência:Centro de Competência de Artes e Humanidades da Universidade da Madeira, Campus Universitario da Penteada, 9000, Funchal, Portugal. Fone: 351 966 511792. E-mail: mpocinho@uma.pt

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