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Revista da Abordagem Gestáltica

versão impressa ISSN 1809-6867

Rev. abordagem gestalt. vol.27 no.3 Goiânia set./dez. 2021

https://doi.org/10.18065/2021v27n3.6 

ESTUDOS TEÓRICOS OU HISTÓRICOS

 

Gestalt-Terapia e Daniel Stern: dialogando sobre a relevância da corporeidade e da dimensão afetiva na psicoterapia

 

Gestalt-Therapy and Daniel Stern: dialoguing about the relevance of the corporeity and the affective dimension in psychotherapy

 

La Terapia Gestalt y Daniel Stern: dialogando sobre la relevancia de la corporeidad y la dimensión afectiva en psicoterapia

 

 

Thatiana Caputo Domingues da SilvaI; Mônica Botelho AlvimII

IUniversidade Federal do Rio de Janeiro. Email: thatiana.caputo@gmail.com
IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro

 

 


RESUMO

Este artigo busca pensar a respeito da importância da dimensão afetiva, corporal e implícita da experiência para a teoria e a prática psicoterápica da Gestalt-Terapia, apostando em um tipo de fazer clínico que tome essa dimensão como central. Parte de uma breve exploração da compreensão de self como processo de contato, dando destaque ao momento do pré-contato e da função id do self como aquela dimensão comum da experiência que partilhamos com o mundo e com o outro; entendendo-a como uma função predominantemente sensória, calcada na corporeidade, se configurando como suporte fundamental para a experiência da diferença e da novidade. A partir disso, realizamos um diálogo com o autor Daniel Stern, passando pelos seus conceitos de afetos de vitalidade e de sintonia afetiva para afirmarmos que nossa comunicação com o outro se estabelece não apenas pela via da fala, pelo pensamento formal, explícito e reflexivo, mas também por uma dimensão afetiva e vital. A partir dessas noções, discutimos o conceito de awareness da Gestalt-Terapia, diferenciando-a da noção de consciência reflexiva e considerando-a um tipo de saber da experiência, corporal e implícito, dado na relação com a alteridade. Concluímos que o trabalho e o diálogo psicoterapêuticos se constituem como uma relação de co-afetação que gera desvios, des-centramentos, e transformações.

Palavras-chave: Gestalt-Terapia; Corporeidade; Função Id; Awareness; Psicoterapia;


ABSTRACT

This paper discusses the importance of the corporal and implicit dimension of the experience for the theory and practice of Gestalt-Therapy psychotherapy. We believe in a model of clinical practice that leans on this affective dimension. We start with a brief exploration of the notion of self as a process of contact, emphasizing the pre-contact and the id function of the self as the moment of the common dimension of the experience we share with the world and with the other. As we understand it, the id function is predominantly sensory, based on corporeality, being configured as a fundamental support for the experience of the difference and the novelty. From this, we propose a dialogue with Daniel Stern, exploring his concepts of vitality affect and affective attunement to affirm that our communication with the other is established not only by the way of speech, by formal thought, explicit and reflective, but also by an affective and vital dimension. From these notions, we discuss the concept of Gestalt-Therapy's awareness, differentiating it from the notion of reflective consciousness and considering it a kind of "bodily knowledge" and implicit experience, apprehended when relating to otherness. Finally, we conclude that psychotherapeutic work and dialogue constitute a relationship of coaffectation that generates deviations, "dis-centerment", and transformations.

Keywords: Gestalt-Therapy; Corporeity; Id Function; Awareness; Psychotherapy.


RESUMEN

Este artículo discute la importancia de la dimensión corporal e implícita de la experiencia para la teoría y la práctica de la Terapia Gestalt. Creemos en un modelo de práctica clínica que se apoya en esta dimensión afectiva. Comenzamos con una breve exploración de la noción de self como un proceso de contacto, enfatizando el pré-contacto y la función id del self como el momento de la dimensión común de la experiencia que compartimos con el mundo y con el otro. Tal como lo entendemos, la función id es predominantemente sensorial, basada en la corporalidad, y se configura como un soporte fundamental para la experiencia de la diferencia y la novedad. A partir de esto, proponemos un diálogo con Daniel Stern, explorando sus conceptos afecto de vitalidad y sintonía afectiva para afirmar que nuestra comunicación con el otro se establece no solo por el modo de hablar, por el pensamiento formal, explícito y reflexivo, sino además por una dimensión afectiva y vital. A partir de estas nociones, discutimos el concepto de awareness en la Terapia Gestalt, diferenciándolo de la noción de conciencia reflexiva y considerándolo como una clase de "conocimiento corporal" y experiencia implícita, aprehendida cuando se relaciona con la otredad. Finalmente, concluimos que el trabajo psicoterapéutico y el diálogo constituyen una relación de co-afectación que genera desviaciones, "des-centramientos" y transformaciones.

Palabras clave: Terapia Gestalt; Corporalidad; Función Id; Awareness; Psicoterapia


 

 

Introdução

A Gestalt-Terapia foi proposta como uma perspectiva clínica fundada na experiência e no contato, cujo foco está na situação concreta de interação de terapeuta e cliente (Perls, Hefferline e Goodman, 1997). Tendo sido influenciada por um leque de teorias e filosofias, tem na noção de forma ou configuração um eixo central que indica a temporalidade como elemento fundante, sendo a interação no campo organismo/ambiente o ponto de partida para pensar a experiência no mundo como contato, um processo temporal de formação e dissolução de formas. Alguns autores vêm buscando na fenomenologia elementos para explorar os conceitos e método clínico na Gestalt-terapia (Ribeiro, 2012; Robine, 2015). Alvim (2012, 2014a, 2016) vem destacando a temática do corpo a partir de um diálogo com a fenomenologia de Merleau-Ponty, buscando ampliar a perspectiva experiencial da abordagem a partir da exploração da dimensão sensível.

Neste artigo propomos discutir a importância da dimensão afetiva, corporal e implícita da experiência para a teoria e a prática psicoterápica da Gestalt-Terapia. Em nossa experiência clínica, temos percebido a importância do corpo, dos afetos, da presença, da qualidade da escuta do terapeuta como instrumentos terapêuticos fundantes, o que motivam nosso movimento de busca de aprofundamento do estudo da corporeidade e seu papel no trabalho clínico.

O diálogo aqui proposto pretende articular fundamentos da Gestalt-Terapia - tendo a fenomenologia de Merleau-Ponty como um fundo de suporte, às vezes pouco visível na superfície, mas ainda sim muito presente - com alguns conceitos mais específicos do psicanalista Daniel Stern. Margherita Spagnuolo-Lobb, Gestalt-terapeuta radicada na Itália, e outros autores já vêm abrindo uma frente de diálogo com Stern em alguns de seus trabalhos (Spagnuolo-Lobb, 2013, 2018).

O contato com a obra de Stern e comentadores nos trouxe um ângulo de visão complementar para as questões que nos propomos a discutir, o que se mostrou adequado tanto pela maneira simples dele de colocar temas complexos, como por ter um olhar fenomenológico para sua pesquisa. A partir disso, consideramos que o debate com esse autor pode trazer uma interessante contribuição para o tema, no âmbito da Gestalt-Terapia brasileira.

 

Sobre a Existência e o Sistema Self de Contatos

Vir-a-ser é uma lenta e lenta dor boa.
É o espreguiçamento amplo até onde a pessoa
pode se esticar.
E o sangue agradece. Respiro, respiro.
(Clarice Lispector)

A Gestalt-terapia compreende a existência como experiência no mundo com o outro, sendo imprescindível a compreensão de que pensar o sujeito é necessariamente pensá-lo enquanto organismo, totalidade mente-corpo, que se dá de forma inseparável do ambiente, se estabelecendo sempre no fluxo do tempo em relação com a alteridade (Perls, Hefferline e Goodman, 1997; Perls, 1978).

Nesse sentido o estudo da psicologia não se baseia nem em um mergulho introspectivo no sujeito isolado do mundo, com uma mente/psiquismo sem corpo, um inconsciente determinante, nem na consideração de comportamentos reflexos, respostas automáticas dadas a estímulos e influências puramente ambientais; mas seria o estudo do processo de contatar, das inter-relações dadas em um campo onde estão imbricados pessoa e ambiente (Alvim, 2014a).

A existência é antes de tudo contato, sendo este a realidade primeira. A pessoa e o ambiente seriam desdobramentos, um desenrolar temporal dado a partir da experiência de encontro com o novo. Portanto, o contato é um fenômeno primário que articula o sujeito e o ambiente, o eu, o já conhecido e o não-eu, o diferente (Perls, Hefferline e Goodman, 1997). É constante vir-a-ser, aberta/não fixa, uma relação entre conservação e transformação, entre o já conhecido e a novidade.

Como dito na epígrafe, entrar em contato com o novo e a mudança, vir-a-ser, se transformar, é uma lenta dor boa, é "o espreguiçamento amplo até onde a pessoa pode se esticar" (Lispector, 1998, p. 44), é o respiro do ser "e o sangue agradece", pois ele pode fluir, se renovar, no lugar de necrosar e estagnar. É nesse sentido que na Gestalt-Terapia temos a máxima "self é contato" (Perls, Hefferline e Goodman, 1997). O sujeito não é considerado uma unidade fechada sobre si, pré-dada, persona estática; o que desloca uma compreensão tradicional de "eu" como indivíduo isolado no interior de si, como personalidade fechada dotada de certas características imutáveis, para uma compreensão de self como processo, selfing (Távora, 2014), um tornarse, fazer-se e refazer-se no mundo com o outro.

A teoria do self é concebida como a descrição do próprio processo de contato. Essa descrição é feita de forma mais detalhada por Perls, Hefferline e Goodman (1997) a partir da diferenciação de três modos de funcionamento, onde self funciona no desenrolar do tempo ora na modalidade id, ora na modalidade ego e ora na modalidade personalidade. É importante compreendermos essas modalidades funcionando como uma totalidade integrada, onde no momento em que uma se destaca como figura as outras se apresentam como fundo. Em um momento inicial, denominado pré-contato, o self funciona na modalidade id. Nesse momento, só há fundo e nada é ainda figura, nada ainda é novidade e diferença no campo. Eu e mundo ainda não se diferenciaram, e a pessoa encontra-se em contiguidade com o ambiente, em um estado de indiferenciação eumundo. Falamos, então, de um momento em que estamos engajados e sincronizados com a situação e que não há diferenciação self-mundo. Ao discutir a teoria do self da Gestalt-Terapia, Alvim (2018) faz uma aproximação com a perspectiva fenomenológica de Merleau-Ponty e ressalta a dimensão de comunalidade desse fundo da experiência préreflexiva.

Uma camada de sentido bruto onde se confundem necessidades, apetites, excitações orgânicas, situações inacabadas, imagens de si próprio, hábitos de lealdade de grupo e onde há dispersão: a vivência está diluída no campo, ou seja, um fundo indiferenciado de possibilidades. A função id do sistema self de contatos é, assim, função pré-reflexiva, dada como configuração, ou seja, um todo indissociável organismo/ambiente (Alvim, 2018, p. 336).

Falamos, então de um "isso" (id), uma afetação ainda sem nome, que surge como pura sensação difusa, implícita e corporal. Esse "isso" se apresenta como um dado da situação e é experienciado corporalmente, apontando para uma progressiva diferenciação de uma figura. Assim, ao sofrermos um desequilíbrio momentâneo, dado pela novidade no campo, somos solicitados a um trabalho de assimilação disso que se apresenta.

Esse trabalho é função ego do sistema self de contatos e é compreendido como identificação progressiva com as possibilidades e alienação destas, inclui o comportamento motor, a orientação, criação, agressão, é a dimensão pessoal da ação (Alvim, 2018). Fala do conflito e do processo de assimilação do novo. É, portanto, o momento do embate vigoroso, do encontro e da diferenciação eu e não-eu. Onde o sistema self de contatos, frente a um conflito, ao lançar-se completamente no processo de assimilação, passa a se perceber e a estar mais destacado da experiência como diferença.

O processo de assimilar a novidade envolve transformação e criação e o resultado desse processo é o que chamamos de função personalidade. Esta funciona como aquela que confere caráter de continuidade ao sistema self, se configurando como "o sistema do que foi reconhecido" (Perls, Hefferline e Goodman, 1997, p. 188), sendo assim, "a figura criada na qual o self se transforma e assimila ao organismo unindo-a com os resultados de um crescimento anterior" (Perls, Hefferline e Goodman, 1997, p. 184). É a função que os autores chamam de o que já é conhecido, domesticado.

 

Corporeidade e Id da Situação: A Dimensão Comum da Experiência

A função id (isso) é a que pretendemos dar mais destaque no recorte deste artigo, uma vez que nosso diálogo está dirigido à dimensão pré-reflexiva e pré-verbal da experiencia. Esta é referenciada pelos fundadores da Gestalt-Terapia no livro inaugural da teoria, como "função id do self" ou, pontualmente, como "id da situação", nos indicando que essa função é fundamental para a compreensão de nossa ligação íntima com o mundo/outro, sendo compreendida como uma função de partilha, de situação ou como nos aponta Alvim (2018) como "o solo comum da experiência".

Segundo Alvim (2018), nesse momento do processo a fonte de excitamento está na situação concreta, nessa imbricação eu-outro-mundo e parte da corporeidade como fundo. Para Perls, Hefferline e Goodman (1997) na função id o corpo se agiganta enormemente sendo "fundo determinado que se dissolve em suas possibilidades, incluindo as excitações orgânicas e as situações passadas inacabadas, o ambiente percebido de maneira vaga e os sentimentos incipientes que conectam organismo e ambiente" (p. 184). Se configurando como um momento no qual "eu" e "mundo" nos encontramos embaralhados de forma vaga na experiência perceptiva, pré-reflexiva e sensível, que é o corpo no mundo.

O corpo vem a ser compreendido aqui não como aquele que separa organismo e ambiente, mas como aquele que "contém e protege o organismo ao mesmo tempo em que contata o ambiente", não sendo "tão parte do 'organismo' como sendo essencialmente o órgão de uma relação específica do organismo com o ambiente" (Perls, Hefferline e Goodman, 1997, p. 43-44). Assim, podemos afirmar que não habitamos nosso corpo como em uma prisão que nos isola, mas estamos entrelaçados a ele como em um aparelho que nos transporta magicamente a perspectiva do outro e do mundo (Merleau-Ponty, 2012a).

O corpo é aquilo que em nós é o dentro e o fora ao mesmo tempo, o ponto nevrálgico, ponto de intersecção de uma totalidade sujeito-mundo. Ele pertence tanto ao sujeito quanto ao mundo é ponto de dobra dentro-fora. É como corpo que somos imbricação no mundo, e dialogando essas noções com a fenomenologia de Merleau-Ponty (1999), podemos dizer ainda que o "espaço corporal" e o "espaço exterior" formam um único sistema prático, onde só é possível termos consciência de nosso corpo através do mundo, e do mundo através do nosso corpo; onde representamos apenas um elemento no sistema corpo-mundo/outro.

Isso quer dizer que o "eu" só tem noção de si, em última instância, quando em contato com o mundo/outro. É esse contato, que dá contorno e facilita o processo de diferenciação. Assim, é pela nossa mais profunda ligação e enraizamento no mundo que podemos nos diferenciar. Outra maneira de dizer a mesma coisa seria dizer que o que eu vivo, sinto, experiencio e falo, aqui e agora com o outro no mundo, é produto do nosso encontro, do campo, e como tal, fala tanto de mim quanto do outro (Robine, 2015). Assim, nosso paradigma de campo e nossa noção de que o contato é a realidade primeira, aponta que em termos metodológicos nós pensamos o nosso cliente e nós mesmos enquanto terapeutas, não como indivíduos separados, mas como partindo de uma indiferenciação.

Com essas afirmações, então, podemos dizer que em um primeiro momento não há indivíduos dados a priori, mas uma situação que se desenrola como processo temporal de diferenciação. Essa situação se desdobra a partir de um id/isso, um dado presente no campo que aponta um sentido para um determinado encontro. Esse sentido que brota é um nó de significações e fala tanto da pessoa, quanto da própria situação.

Segundo Robine (2015) se partimos dessas premissas em nossa abordagem, isso implica que, enquanto terapeutas, se imputarmos imediatamente a sensação ou a experiência do momento àquele que as anuncia, estaremos revelando um preconceito teórico que se baseia na ideia de que somos indivíduos separados a priori e por isso seria impossível o "eu" sentir algo que não seja só seu, do seu interior. Essa afirmação de Robine assume grande importância se pensarmos o quanto ela rompe com nossos modos usuais, principalmente ocidentais, não só de fazer e pensar a psicoterapia, como de entender o sujeito e o mundo. Estamos muito acostumados ao pensamento dicotômico e individualista. Acostumados a olhar para nós e para os outros como personalidades mais ou menos fixas, entidades separadas que posteriormente se encontram.

No entanto, esse modo de pensar seria, na perspectiva da Gestalt-Terapia, inverter a ordem do contato, nos relacionarmos no mundo como que presos a nossa função personalidade, deixando de vivê-la como função aberta que nos permite novas formas criativas no contato com a alteridade, passando a vivê-la como prisão, modo único prédado de existência. Na função personalidade, self está ligado às representações do que "sabe sobre si" e que Robine (2015) propõe chamar como "o que sabe sobre o que era". Ela se dá na nossa experiência como fundo, dando suporte, chão para novos saltos, pronta para ser reconfigurada e ressignificada a cada novo encontro. Diz sobre o que já foi domesticado, e é conhecido, seguro. Se, no entanto, nos fixarmos apenas nessa função, se a apartarmos das demais de modo crônico, a tornamos uma entidade dura e a reificamos, nada novo pode surgir.

Presos nessa ideia de que a personalidade a partir de então representa, não podemos nos tornar outra coisa, nos ultrapassar, nos permitir mudar ao encontrar com o outro. Nesse sentido, podemos dizer que passamos a tratar a nós mesmos como objetos prontos e acabados, nos olhamos e falamos sobre nós em terceira pessoa, distantes, como uma ideia racionalizada do que achamos que somos; e deixamos de nos experienciar em primeira pessoa, sendo aqueles que vivem, são afetados e agem no mundo aqui e agora com os outros.

Se preservamos o self como uma função plástica, este pode permanecer aberto aos encontros no mundo e pode ser afetado, sendo instado a criar novas formas para si e para o mundo. É apenas a partir da manutenção da possibilidade da afetação que o contato pode se desenrolar. A função id, novamente aparece como o momento da possibilidade desta, sendo o momento do pré-contato, portanto, crucial para eu e outro se experienciarem como partilhando de um solo comum, de afetos, sentidos possíveis, sensações, que são mais atmosferas, vibrações e reverberações de um campo, um tom da situação, que abre múltiplos possíveis, múltiplas tomadas de posição criativa.

 

Afetos de Vitalidade e a Experiência de Pertencimento na Psicoterapia

É nesse ponto - no que concerne a experiência de partilhar um solo comum de afetações com o outro - que acreditamos que alguns conceitos de Daniel Stern, podem ser de interessante contribuição para a presente discussão. Torna-se importante pontuar que este é um psicanalista que além de atuar na clínica também realiza uma pesquisa ampla sobre desenvolvimento infantil, focando seus estudos em bebês que ainda não adquiriram a linguagem, dando grande ênfase ao pré-verbal e ao que ele chama de desenvolvimento anterior ao pensamento reflexivo, formal.

Em suas pesquisas, o autor nos aponta a importância que outro tipo de comunicação, que não a estritamente verbal, possui para o compartilhamento de afetos e sentidos entre mãe e bebê. Na observação das suas relações ele passa a dirigir a sua atenção para a capacidade humana de sintonizar e compartilhar sem a linguagem, privilegiando o campo do afeto e das dimensões pré-reflexivas da experiência, passando então a compreendê-los como originários.

Ao se aprofundar nesse tipo de comunicação, Stern (1992) conceitua o que irá chamar de afetos de vitalidade, entendendo-os como qualidades da experiência, como certos afetos dados préreflexivamente e que não se ajustam a nosso léxico comum de afetos. Normalmente as teorias vigentes antes de Stern colocavam os afetos apenas em termos de afetos categoriais, que representam categorias distintas de afeto como medo, raiva, alegria, tristeza, surpresa, entre outras. Para Stern (1992) haveria outras qualidades de afetos que até então não eram contemplados e que se referem a sensações sem categorias definidas se remetendo a experiências que podem ser melhor descritas a partir de termos dinâmicos e cinéticos tais como: surgindo, desaparecendo, passando rapidamente, crescendo, explodindo e assim por diante. Portanto, por expressões que denotam movimento e que são qualidades estéticas da experiência.

Assim, os afetos de vitalidade remetem a sensações difusas, pré-reflexivas, que são sentidas como alterações dinâmicas no campo ou mudanças nos padrões em si mesmo ou no outro, diferentemente dos aspectos objetivos que os afetos categóricos possuem. Com isso, o autor enfatiza que estamos falando de afetos com certo contorno temporal que não são submetidos primariamente a uma consciência reflexiva ou racionalizada. Estes fazem parte de toda experiência, são constantes na vida e em qualquer processo vital, sendo inerentes a qualquer comportamento; jamais ficamos sem sua presença, estando ou não conscientes deles, enquanto os afetos categóricos vêm e vão (Stern, 1992).

Os afetos de vitalidade falam de um modo de perceber que se remete a uma apreensão de aspectos mais globais da experiência como base e suporte para qualquer categoria que possa vir a se estabelecer posteriormente. Assim, existiriam várias maneiras e variações de se realizar qualquer comportamento, como sorrir, se levantar, pegar um objeto, porém cada um deles pode estar colorido com um afeto de vitalidade diferente: como um sorriso explosivo ou que vai enfraquecendo, um levantar-se rapidamente como num salto ou um longo e duradouro. Um mesmo comportamento, como levantar-se num salto, pode conotar raiva, surpresa, medo, ou nenhuma dessas categorias nos mostrando que o afeto de vitalidade não tem a ver necessariamente com um afeto específico categórico (Stern, 1992).

Com isso, falamos de afetos que expressam uma maneira/modo de sentir, muito mais que um conteúdo específico de sentimento. Um afeto que oferece um certo "tom" para a situação. A música e a dança abstrata seriam para o autor o exemplo por excelência da expressão dos afetos de vitalidade, revelando ao espectador múltiplas sensações e suas variações sem recorrer aos sinais dos afetos categóricos, que, supomos, poderiam cair facilmente em uma expressão caricata. Para Stern (1992), esses exemplos podem nos aproximar da forma como o bebê observa o mundo: provavelmente em uma posição muito próxima a de um espectador de uma dança abstrata ou do ouvinte de música. Forma essa que o próprio terapeuta pode se aproximar ao estar com um cliente para, com isso, poder se conectar com os aspectos afetivos, implícitos na psicoterapia e operar com eles.

A ênfase na dimensão afetiva que Stern realiza contribui para a discussão que estamos propondo, pois, além de ampliar, nos convida a pensar sobre a importância da dimensão sensível de nossa corporeidade para além de nossa dimensão mais reflexiva ou categorial quando no encontro com o outro no mundo. Entendemos que é nesse mesmo sentido que geralmente apontamos em Gestalt-Terapia, desde Laura Perls (1978), que a corporeidade do terapeuta é o seu maior instrumento. Pois é, principalmente, a partir da conexão e do contato que o terapeuta realiza corporalmente na situação, que este irá poder sentir os afetos, ritmos, frequências presentes no campo. O terapeuta sente corporalmente, ou melhor, intercorporalmente, as vibrações, as frequências afetivas vitais do outro e do campo, o tom que emana da situação atual. Esses afetos que reverberam em seu corpo como os sons de um tambor, não vêm a ele com clareza, são préreflexivos, intuídos, turvos e apontam uma direção, um 'isso' da situação. Ele vê e ouve o cliente a partir de uma experiência estética (Alvim, 2014) como quem assiste à um espetáculo de dança contemporânea ou um concerto de música: se permitindo ser afetado pela dinâmica das formas.

É a partir dessas consideraçõese compreendendo que a afetividade passa a ser tomada como uma via privilegiada que torna possível se pensar a comunicação em uma dimensão implícita, não verbal, que Stern (1992) irá falar também dos afetos de vitalidade como aqueles que tornam possível um plano comum de pertencimento na experiência.

Para se referir a esse plano comum, o autor nos aponta um conceito muito importante em sua obra: o de sintonia afetiva. Este conceito será o cerne da sua teoria sobre a comunicação entre mãe e bebê e, nas suas elaborações sobre a clínica, da comunicação entre terapeuta e paciente. Entendendo a sintonia afetiva como fundamental para o estabelecimento de um campo intersubjetivo de pertencimento, como via, meio, agente para constituição da intersubjetividade e de estados afetivos comuns.

Os afetos de vitalidade passam a ser entendidos como "o assunto em questão da sintonia" (Stern, 1992, p.139), ou como a via que possibilita a sintonia, o meio em que sintonia afetiva opera. Assim, esse processo passa a ser melhor compreendido como uma experiência de equivalência, equiparação de ritmos vitais e de afetos de vitalidade, não sendo um comportamento específico que é equiparado, mas algum aspecto do comportamento que reflete o afeto, ou estado afetivo. Isso quer dizer que não se trata de uma imitação de um comportamento, mas de uma equiparação sensível no ritmo, na intensidade, na duração de um afeto vital que faz com que eu e outro experienciemos estar em sintonia.

Essa experiência de sintonia descrita pelo autor aparece como uma forma de responder algumas de suas perguntas, tais como: como é possível ir "dentro" da experiência de outra pessoa e fazer com que ela saiba que você chegou lá sem usar palavras? Quais são os atos ou processos que fazem o outro perceber que você está sentindo algo semelhante ao que ele sente? (Stern, 1992).

Com isso, ele descreve a sintonia como essa comunicação afetiva que gera um sentimento de partilhar estados comuns, de se estar com a mesma vibração. Para o autor, essa seria a verdadeira experiência intersubjetiva, em que se experiencia 'estar com' como que sentindo em unidade com o outro; uma experiência em que o eu pode sentir que o outro sente o que ele está sentindo e, assim, sentir que está partilhando com ele um estado afetivo.

Stern (1992) acredita na importância do estabelecimento desse campo intersubjetivo de pertencimento apontando que este seria o cerne do trabalho terapêutico e também a grande motivação para a procura de terapia, entendendo que a falta dessa experiência durante o desenvolvimento infantil estaria na base de muitas patologias.

Tanto Stern quanto os fundadores da Gestalt-Terapia, nos parecem chegar a uma conclusão bem próxima quando se diz respeito à via privilegiada para a experiência de compartilhamento e de pertencimento com o outro. Uma vez que dão ênfase ao âmbito do pré-reflexivo, da afetividade e do isso/ id como esta dimensão de partilha.

A função id nos parece essencial, portanto, para pensarmos a terapia, ao nos remeter ao momento do contato que é primordialmente intercorporal, sensível e intuído da experiência. Ao nos remeter também a um momento do contato onde não há diferenciação entre o sujeito e o mundo/outro e que, neste estado de indiferenciação, esses podem compartilhar sentidos e sensações. Quando estamos comungando com o outro da situação, na dimensão sensível, podemos compartilhar sentidos silenciosos e sermos afetados. O id da situação, ou o "isso" da situação se apresenta para nós, portanto, quando estamos presentes corporalmente na situação, engajados em uma escuta e em uma presença sensível.

Quando partimos da afirmação de que eu e outro nos encontramos primeiramente indiferenciados, construindo e partilhando juntos uma situação, não só deixa de ser impossível que eu e outro possamos sentir em unidade, como passa a ser possível nos olhar e estabelecer um diálogo silencioso, sentindo que estamos em partilha: "Não me contento mais em sentir, eu sinto que me sentem, e estou sentindo esse fato mesmo de me sentirem". (Merleau-Ponty, 2012a, p. 220).

Grande parte do nosso trabalho como clínicos em Gestalt-Terapia é nos conectarmos com a dimensão sensível e estética da experiência e afirmarmos a alteridade. É na dimensão sensível que eu e outro podemos nos encontrar como pertencentes à um solo comum e que podemos experienciar uma dimensão de partilha onde ambos estamos expostos, sensíveis e vulneráveis a experiência. Com o suporte promovido por essa experiência de vínculo humano intercorpos, em que sentimos em unidade, é que podemos estar abertos e disponíveis para a experiência do outro como diferença.

A experiência de pertencimento, de sintonia afetiva, cria um campo comum de partilha e de confiança que é afirmação da vida, do sofrimento, da alegria, da angústia do outro e de si. Ela atesta e valida uma experiência. Faz humana e legitima uma forma de existir. O trabalho em psicoterapia em Gestalt-Terapia, e em muitas outras abordagens, não pode prescindir dessa experiência, porém não se resume a ela. Também somos diferença em relação ao outro, dissenso, não apenas semelhança e confirmação. E é essa experiência da diferença que nos desloca e produz mudança. Só há crescimento quando há encontro com a novidade da alteridade, pois é este encontro que desequilibra e descentra nossas representações de mundo, de si e de outro, que nos coloca em um vazio de significação, e nos faz buscar um novo sentido para a experiência.

Antes de nos debruçarmos mais sobre esse ponto gostaríamos de propor um novo tópico e a leitura de um pequeno conto.

 

Awareness e Diálogo: Contribuições para a Psicoterapia

Sem convite

Sentada, eu lia. Entretida... absorvida... Pra mim só existia livro. Quando em rompante uma senhora me obrigou sua presença e exclamou saudosa: "Ah... minha filha, assim você estraga suas vistas. Com essa luz? A vista é uma coisa preciosa".

Dalí tudo se fez presença. Trilho, campainha, murmúrios, uma lâmpada queimada, um senhor que cantarolava de olhos fechados de um lado, e de outro, uma cabeça branca doce e imperiosa. Sua doçura perfurou meu mundo sem convite, e sua preocupação atingiu mais que um punhal.

Fingi não me abalar e continuei. Mas não era mais a mesma. Havia comigo uma intrusa e agora não mais poderia ser eu e o livro. Chuvas de pensamentos me abalroaram e não consegui mais me concentrar. Maldita doçura impertinente. Maldita maldição velada.

A frase se repetia em eco e denunciava minha farsa: "A vista é uma coisa preciosa...". Era impossível ser indiferente àquela frase, da mesma forma que era impossível ignorar a vista. Não podia teimar e retrucar a isso.

Olhava o livro em malogro, mas era em vão. Meu embaraço era nítido, escancarado na minha movimentação de quem já não mais encontrava conforto em seu próprio lugar. Não enganava a ninguém e ainda ofendia a senhora de pele de algodão doce.

Não demorei muito e fechei o livro. Como continuar? Se aquele presságio vindo de alhures me despertou de meu transe e me feriu ao me arrastar para um beco de imediata constatação. Com ela não havia medição de forças.

O soco de suas palavras, de seu olhar cinza, sua catarata, seu corpo pequeno e curvado me atingiu em cheio na boca do estômago e senti a amargura da perda da vista. Sentia o peso da idade daquela senhora nas minhas costas, ao mesmo tempo em que sentia a energia de jovem borbulhar em meu sangue. Naquele momento eu era jovem e velha, minha pele não era pálida, mas minha vista estava irremediavelmente turva. Sentia meus ossos frágeis e a lentidão. O esforço e a espera.

Sem dizer mais palavra, a senhora se foi e tudo silenciou, restando somente a frase em eco no fundo: "A vista é uma coisa preciosa...".

Thatiana Caputo

Queremos oferecer com este conto algo que seja disparador de reflexões a respeito da experiência de alteridade, do descentramento e do diálogo. Pois queremos aprofundar neste tópico a compreensão sobre um tipo de comunicação e experiência, incluindo aqui o fazer clínico, que se constitui como co-afetação e que gera desvios, des-centramentos, transformando-nos, eu e outro, ao longo desse percurso.

Queremos chamar atenção para um tipo de experiência que estabelece uma comunicação, uma dança, uma troca, um diálogo entre eu e outro, nem sempre necessariamente verbal, e que se institui como sensibilidade e presença. Esta pode ser entendida também, a partir de uma diferenciação do que seria uma comunicação apenas pelo pensamento analítico, racional, objetivo e distanciado, certa transmissão de informação descolada da experiência.

Baseando-nos no conto podemos pontuar que é a partir, primeiramente, do fato de tanto a senhora quanto a jovem partilharem uma corporeidade, se comunicarem em suas significações comuns, pertencerem ao mesmo mundo cultural, a mesma língua, e dividirem a possibilidade de ver, que uma pôde falar à outra de sua diferença. E que essa diferença pôde retirar a jovem de seu centro.

O convite invisível da senhora foi para que a jovem pudesse partilhar de sua experiência, de sua diferença, a partir do que ambas tinham como semelhança. Ela comunicou como experiência sensível, ali compartilhada não apenas pela palavra, pela fala audível na frase "a vista é uma coisa preciosa", mas também pela sua catarata, "seus olhos cinza", seu tom saudoso, sua postura curvada, sua "pele de algodão doce". Comunicou com o todo que era, como corpo e experiência, e transmitiu muito mais do que uma simples informação sobre os bastonetes e sua degeneração com a falta de luz. Comunicou no sensível, e atingiu para além de uma pura conceituação racional, foi mais longe do que qualquer ciência vazia de sentido experiencial jamais chegaria.

A jovem sabia intelectualmente e, de forma quase abstrata, do risco da perda da vista. Porém, foi quando pode ver na vista do outro a dificuldade e, enfim, sentir em si a amargura da perda da vista da senhora que isso pode ser sentido em seu próprio corpo e de fato virado uma comunicação que nela instituiu um desvio, um des-centramento, um passo atrás, que permitiu a criação de um novo sentido; de uma nova concepção da vista, de si, do ser vidente. Foi na quase cegueira da senhora que a jovem, enfim, pode perceber sua visão: "... somos plenamente visíveis para nós mesmos, graças a outros olhos. Essa lacuna onde se encontram nossos olhos, nosso dorso, é de fato preenchida, mas preenchida por um visível de que não somos titulares." (Merleau-Ponty, 1964/2012b, p. 139).

Tendo esse conto e essa breve reflexão como plano de fundo, resgatemos agora o que falávamos sobre a experiência de alteridade e sobre a dimensão sensível. Relembremos que dizíamos que nossa primeira compreensão do mundo nos é apresentada no sentir, sendo uma compreensão corporal. Como corporeidade, somos afetados pelo campo e vivemos essa afetação primeiramente de forma préreflexiva muito antes de qualquer representação. Desse modo, o que vivemos no sensível não pode ser reduzido a uma reflexão racional e nos aparece primeiramente como um "isso", como um tipo de consciência escorregadia que aponta um sentido nebuloso e intuído para a experiência, que é um tipo de compreensão sensível que se consuma e ganha concretude na relação com o outro. (Alvim, 2012)

Sendo assim podemos dizer que é nossa experiência pré-reflexiva, irrefletida no mundo que sustenta a reflexão e os significados que construímos. Portanto, os sentidos que damos para as coisas no mundo são apoiados na experiência inter-corporal que temos nele e do qual temos uma compreensão sensível, encarnada e afetiva.

É sobre essa compreensão, esse tipo de consciência intuída e fugidia, que queremos começar refletindo aqui, relacionando-a com a clínica da Gestalt-Terapia. Essa relação se baseia no fato de que grande parte do entendimento que esta abordagem faz a respeito do trabalho em psicoterapia se ancora em uma noção muito próxima a essa. O conceito do qual estamos falando é muito caro aos fundadores da abordagem gestaltíca e é o de awareness, sendo ele mesmo um conceito bastante difícil de se teorizar. Muitos dizem que entendem experiencialmente em seu corpo o que é awareness, mas que encontram dificuldades em explicar em palavras. Este é um comentário frequente e com bastante sentido, uma vez que essa noção é de fato essencialmente experiencial, sendo intimamente ligada a nossa experiência pré-reflexiva, pré-teorética, ou seja: anterior à reflexão e ao juízo.

No português e em algumas outras línguas a palavra awareness não encontra definição apropriada sendo comumente traduzida por consciência, mas não encontrando nessa tradução seu pleno sentido. Por conta disso, a maioria dos estudiosos da Gestalt-Terapia de países de língua não inglesa, optaram por manter a utilização do termo em inglês para marcar a diferenciação em relação ao termo consciousness, que, diferente da awareness, faz referência a uma consciência reflexiva, a um conhecimento representativo e analítico.

Para realizar uma diferenciação dessa noção de consciência reflexiva, Robine (2006) propõe definirmos awareness como: conhecimento imediato e implícito do campo. E assim, o autor promove uma distinção desta em relação à consciência - consciousness que quase sempre é caracterizada por certa clareza explícita, certa transparência.

Ao definir awareness dessa forma, e dialogando esse autor com Alvim (2014b), podemos acrescentar que esta noção propõe certa forma de conhecimento mais turvo e opaco: intuído, anterior à consciência deliberativa e racional. O conhecimento do campo proposto aponta, então, para uma apreensão do todo percebido que passa pelo corpo e pela afetação, não podendo prescindir desses para sua realização.

Alvim (2014b), em sua definição de awareness, propõe compreendê-la como "experiência e saber da experiência", dando foco para um tipo de saber corporal e sensível, dado a partir da imbricação do sujeito no campo, não sendo um saber análogo ao conhecimento intelectual de um sujeito isolado, mas um saber dado como sensação de fundo presente no campo, que sustenta e aponta toda emergência de uma figura.

Desta forma podemos destacar como a awareness está na base do processo do contato, sendo suporte para o processo de construção de uma figura no campo. Perls, Hefferline e Goodman (1997) apontam que o contato é awareness do campo ou resposta motora no campo. Assim, o processo de contato é compreendido como uma totalidade que envolve awareness e atividade motora, a partir da interação organismo-ambiente. (Alvim, 2014b)

Com isso, entendemos que é a aceitação desse saber da experiência, o livre fluir desse conhecimento imediato e implícito do campo, que sustenta e indica a necessidade presente na situação, apontando sensivelmente, intuitivamente para a direção do sentido dessa necessidade. Para isso é necessário que estejamos engajados aqui e agora na situação presente, e abertos para sentirmos as afetações do campo.

Na neurose esse fluxo está reduzido e ou interrompido tendo no lugar da experiência da awareness, a inibição da dimensão sensível e uma antecipação e fixação em uma consciência deliberativa reflexiva, como falamos anteriormente. Nosso saber intuído perde potência e nosso contato com o mundo torna-se fragmentado, engasgado e interrompido.

Assim, na Gestalt-Terapia compreende-se que a função da psicoterapia é a restauração ou ampliação do fluxo de awareness, privilegiando o que é da ordem sensível, de uma ampliação da nossa percepção corporal, estética no contato, e do que Laura Perls (1978) denominava continuum de presentificação, afirmando a importância do engajamento e da presença na situação, para a awareness.

Uma boa forma para pensarmos nesse continuum de presentificação como essencial para a awareness é retornando, como exemplo, ao conto inicial. Quando a jovem sofre uma afetação pela aproximação da senhora, ela é chamada, quase sugada, para a situação presente, para ouvir os trilhos, o cantarolar ao seu lado, a luz apagada, tudo aquilo que estava desaparecido no fundo, que ela "ignorava" ao estar absorta no livro. Essa tomada de contato com o presente não se deu intelectualmente, mas como um despertar onde seu corpo se abriu e percebeu de imediato e implicitamente a situação em que se encontrava. A presença da senhora e sua intrusão trouxe a jovem para o contato presente e atual com o meio, consigo mesma e com a própria senhora, favorecendo o continuum de presentificação e com isso a awareness da situação presente no processo de contato, que se iniciou com a aparição de outrem.

Pensando na psicoterapia - onde a pessoa que nos aparece está muitas vezes reproduzindo formas fixadas que se dão automaticamente sem awareness e sem contato com a situação presente - o foco no continuum de presentificação, apontado por Laura Perls, visa o aumento da percepção da situação presente, do aqui e agora e com isso a ampliação da awareness e o restabelecimento do contato. Isto é, visa que a pessoa, ao se sentir cada vez mais presente na situação, possa percebê-la de forma ampliada, perceber seu meio, a si mesma, suas sensações e o outro e, com isso, notar sensivelmente qual é a necessidade, qual é a sensação de fundo que sustenta sua fala ou ação, e para onde ela aponta espontaneamente.

É importante ressaltar que quando utilizamos os termos "presentificação" ou "presença" não estamos afirmando uma presença à consciência, mas referimo-nos a um engajamento corporal dado na ordem do corpo sensível. E isso é o que está em jogo na dimensão sentir da awareness, que Alvim (2014b) discute distinguindo duas nuances do sentir: um sentir como abertura e um sentir como afetação.

A proposta, portanto, é focarmos como método terapêutico na relação, no contato concreto na terapia como experimentação em presença, no sentir e na experiência atual tal como se apresenta nos afetos, no lugar de apenas falar sobre uma experiência ou queixa; o que privilegiaria a reflexão deliberada e certo distanciamento seguro do que se está dizendo (sendo assim distanciamento do presente e da sensação de fundo que sustenta a fala, do que está no âmbito "implícito" da situação).

Quando se privilegia a reflexão, como a etimologia mesma da palavra mostra, se coloca em primeiro plano essa flexão para traz ou volta para si, (Alvim, 2014a) o que caracteriza uma experiência de isolamento, separação ou, para usar termos gestálticos, de descontinuidade e retardamento da experiência do contato.

Diferente disso, dando atenção e privilegiando um saber corporal, estético da experiência afirmase a dimensão sensível como aquela de abertura ao outro e ao mundo, sendo proximidade e permitindo o contato fluido, onde eu e outro podemos nos coafetar com as coisas e as pessoas. Uma vez que é como corpos sensíveis que podemos nos encontrar e nos afetar mutuamente, gerando crescimento e saúde.

O foco da terapia não seria a busca ativa por uma análise reflexiva, mas um diálogo alicerçado no contato e na experiência pré-reflexiva, sensível com o outro. Um diálogo que se distancia de uma relação objetificante ou puramente técnica, onde o outro figuraria para o terapeuta estritamente como um dado que este vai analisar ou diagnosticar.

O diálogo terapêutico convida para que olhemos, como falamos com Stern, para o plano sensível das formas em movimento e é nesse sentido que a Gestalt-Terapia dirige sua atenção para o como da experiência e não para o porquê. Esta busca olhar para o processo, para como ele se dá, para onde, aqui e agora, terapeuta e cliente sentem que o fluxo se interrompe, se enfraquece, engasga, rompe. Ou onde vibra, pulsa, cresce, explode. O terapeuta deixa-se afetar pela experiência de alteridade, pela presença do outro e dirige sua atenção para a dinâmica temporal da formação e dissolução de formas. Voltase, principalmente, para o que está acontecendo na situação clínica. Sua pergunta direcionadora é: como está se dando a relação terapeuta-cliente na situação presente?

Podemos também aqui trazer algumas contribuições do trabalho de Stern, no que concerne as suas pesquisas a respeito de uma comunicação que não se estabelece pela via direta da fala ou pelo que é considerada a via formal da consciência e do pensamento. Apresentando estudos bastante relevantes para pensarmos a psicoterapia como um lugar que pode explorar as vias significativas não apenas da fala, como de outros tipos de formas de se encontrar com o outro e se comunicar; o que o autor chama de privilegiar o implícito na situação clínica.

Como "conhecimento implícito" (Stern, 2003) ele compreende tudo aquilo que não é verbal, não é simbólico e também não é consciente reflexivamente - não sendo também inconsciente no sentido de reprimido. Na maioria das vezes, é entendido apenas como o conhecimento sensório-motor, mas, para o autor, é mais do que isso, pois inclui também afetos, pensamentos, antecipações, modos de se estar com alguém que não são reflexivos, mas que aparecem na forma como nos comunicamos e em nossas ações.

Assim, ele diz que na psicoterapia teríamos duas "agendas" ou ordens do dia: a explícita, mais ligada ao conteúdo, à narrativa co-construida e ao o que está sendo dito, e a implícita, que ele aponta como sendo a intersubjetiva, aquela onde eu e outro estamos constantemente achando e expandindo nossa partilha intersubjetiva, nosso solo comum de pertencimento.

Na agenda implícita o que está em jogo geralmente é o que está acontecendo entre eu e outro, entre terapeuta e cliente. Esta agenda aponta para questões como: "Eu estou interessado em você? Eu gosto de você? Você gosta de mim? Você está muito distante, chegue mais perto. Não! Não tão perto. Não estou pronto. Você está ouvindo o que estou dizendo? Não faça nada agora. Queria que parasse com isso..." (Stern, 2003, p. 223). Na agenda implícita nada precisa estar sendo dito, explicitado. Ela envolve o que as duas pessoas estão entendendo a respeito de como elas estão juntas. Podemos estar em silêncio ou podemos estar trocando palavras, mas não necessariamente aquilo que estamos dizendo coincide com o que está se dando implicitamente, não necessariamente aquilo que está na agenda explícita passa a mesma mensagem do que está na implícita.

Podemos dialogar essa ideia de duas diferentes agendas de Stern com o que na Gestalt-Terapia chamamos de atenção a forma e ao conteúdo. As "ordens do dia" de nós Gestalt-Terapeutas são, então: a da forma, que carrega também esse sentido do mais implícito, do como, daquilo que acontece e está presente no campo, mas que não está necessariamente sendo enunciado verbalmente, e o conteúdo, que seria aquilo que está sendo dito de modo explícito.

A grande questão é frisar que o que está sendo enunciado e dito é importante, mas não é tudo. Pois muito do que acontece está mais ligado ao modo, ao como essas palavras estão sendo pronunciadas e que sentido esse como carrega consigo. Se o cliente interroga ao terapeuta se este acredita nele, se ele acredita que ele tem valor, importa tanto o que o terapeuta responde como a forma que ele responde, o afeto em sua fala, sua crença autêntica ou não no cliente. Esses são os pequenos pedaços de conhecimento implícito que nem sempre são enunciados e que fazem toda a diferença para a terapia.

Esses implícitos, não ditos, falam do modo, da qualidade da nossa presença, do afeto e do que de intensivo existe ali naquela relação para além do explícito. Fala do ritmo, da respiração, do tom da voz, do silêncio, da dinâmica, da intensidade, da postura corporal, de características estéticas e afetivas da experiência que comunicam tanto quanto o conteúdo do que se é dito e que muitas vezes deixam escapar sentidos intuídos que nem sempre nos damos conta.

O foco na dimensão pré-reflexiva também se dá na Gestalt-Terapia com o que falávamos sobre a awareness, noção tão central para o trabalho clínico. Mostrando que nesta abordagem aquilo que é implícito e anterior à reflexão ganha grande destaque.

Resgatando o que falávamos com Robine (2006) a awareness é conhecimento imediato e implícito do campo. Se a isso somarmos o que trouxemos com Stern também sobre conhecimento implícito, podemos dizer que estar aware é estar presente na situação, em contato intuitivamente com seus afetos de vitalidade e os do outro, a par do sentido global que eles nos oferecem em uma experiência. Não significa estar consciente reflexivamente, mas em conexão implícita, aberto à, não dessensibilizado.

Dessa forma, dizer que o terapeuta trabalha para a ampliação do fluxo de awareness é dizer que este convida o outro, ao mesmo tempo em que se convida, a se experienciar como presença sensível engajada na situação. O convite é para que ambos, terapeuta e cliente, possam se dirigir para a experiência estética, ao âmbito do sensível e do corpo, se distanciando de uma fala falada (Merleau-Ponty 1964/2012a), repetitiva e fundada no eu racionalizado, para se dirigir à uma fala falante (op. cit.) e expressiva, vibrante diante do outro e que se configura como espontaneidade no campo.

Moreira (2011) em seu artigo "O inconsciente no pensamento de Merleau-Ponty: contribuição para a psicoterapia" desenvolve a ideia de fala falante ou autêntica em Merleau-Ponty como fundamental para se pensar a psicoterapia. Para tanto, a autora discorre, primeiramente, sobre a ideia de inconsciente em Merleau-Ponty de forma a apontar que, diferentemente do seu sentido clássico na psicanálise, o inconsciente na obra do filósofo pode ser entendido como articulação do campo. O que nos remete às discussões que fizemos até aqui sobre o id da situação e da awareness (conhecimento implícito do campo). O id da situação é sentido intuído que brota do solo comum da experiência, é articulação do campo. Com as contribuições de Moreira (2011) poderíamos dizer que é expressão, fala autêntica que surge de um fundo, entendido como inconsciente, invisível. Este inconsciente, não é, portanto, estrutura intrapsíquica, conteúdo reprimido dentro de um sujeito, mas diz da articulação de um campo que é imbricação ser-mundo-outro, está dado como um sentido que brota da articulação entre visibilidades e invisibilidades.

A partir disso, dizemos que a fala racionalizada traz o conteúdo representado da palavra, uma fala sobre falas, já instituída e formulada anteriormente, é segunda, hábito e dá continuidade. A fala falante, por sua vez é primeira, originária, é gesto espontâneo que traz uma forma que não passa pela razão, mas que é nova e significante. É fala que está sendo formulada pela primeira vez como improvisação no campo e dá concretude a um sentido que nunca ainda tinha sido formulado. Brota do plano préreflexivo, corporal e sensível.

A fala autêntica para Merleau-Ponty é, então, a fala original, que jamais havia sido formulada anteriormente. Ela não é uma representação consciente de alguma coisa, mas uma percepção que faz parte da experiência sensível, uma expressão do inconsciente como articulações do campo. Ela é um tipo de tecido latente ou ainda o fundo que torna possível a constituição da figura no quiasma corpo-mundo. Neste sentido, quando na psicoterapia nós buscamos o que emerge na fala autêntica, não estamos buscando algo que está escondido ou recalcado; buscamos algo que está diante de nós, na relação psicoterapeuta-paciente-mundo sensível (Moreira, 2011, p. 117).

É nesse sentido que dizemos que a criação é gesto expressivo, fala e ação espontânea que parte da experiência sensível do encontro pessoamundo-outro. A psicoterapia trabalha com a forma que emana do gesto, deixando-se afetar por ela para, a partir dessa, direcionar suas intervenções. É, portanto, profundamente direcionada pela experiência estética (Alvim, 2014a).

Alvim (2012, 2014a, 2016), em muitos de seus estudos sobre a Gestalt-Terapia, realiza um diálogo com a arte e nos afirma, a partir de Laura Perls, que os conceitos básicos da Gestalt-Terapia são filosóficos e estéticos. Com isso, nos convida a olharmos para a presença do terapeuta como aquela da experiência estética, de aesthesis, que se permite afetar. Aquela que vê de olhos fechados, que ouve com o corpo, que dança com os ouvidos, tateia um sorriso e que degusta o doce de um olhar. Em sua afetação, a presença do terapeuta convida o outro a se dirigir também para sua dimensão sensível e estética, gerando um diálogo intercorpos, de afetos de vitalidade, que é dança suave, que busca um passo comum, uma sintonia que respeite os diferentes ritmos, ao som da mesma música.

A situação terapêutica, enquanto experiência aqui e agora com o outro, pode facilitar a retomada da fluidez e do contato ao privilegiar a relação e a awareness, o contato com o que está acontecendo, no implícito. Isso não significa, contudo, que a figura que entraremos em contato é necessariamente agradável, muitas vezes o que se encontra nos implícitos das relações são dores profundas, feridas não cicatrizadas, hostilidades, conflitos, difíceis de se contactar, mas extremamente necessários pra o resgate da fluidez e da plasticidade, o resgate da confiança no contato. Este imprescindível para a saúde, para o movimento e o vir-a-ser.

Stern (2003) descreve um tipo de consciência que podemos vir a ter na experiência com o outro que é diferente daquela cartesiana, da consciência reflexiva e voltada para si que temos sozinhos, uma que ele chama de consciência intersubjetiva e que acreditamos conversar em muito com o sentido de awareness como foco da terapia que queremos trazer aqui.

Ele fala de consciência como um ato social em que vivendo em uma matriz intersubjetiva, nos comunicando e dividindo pontos de vista, a consciência que se tem daí passa ser uma que é um trabalho coletivo, ao menos de dois, uma awareness que é "mutual sharing" (mútua partilha), em que uma experiência implícita pode se tornar aware na medida em que se torna pública pela e na relação.

É um tipo de ampliação da awareness que se dá quando em terapia o cliente se vê fazendo algo com o terapeuta que anuncia, torna acontecimento, publicita sua forma de ser e estar no mundo, suas questões, o que ele espera do outro, suas frustrações, suas expectativas e desejos. Ali com o terapeuta isso se torna presente e possível de entrar em contato, e dessa forma possível de mudar, se atualizar, na medida em que se dá na presença da alteridade que é o terapeuta. Alteridade essa que em sua presença, tendo como suporte um campo de pertencimento, um solo comum, pode oferecer sua diferença, uma nova forma de olhar, uma outra perspectiva que descentra o olhar fixado e oferece uma nova mirada.

 

Considerações Finais

A troca que acontece na psicoterapia e a relação em sua dimensão afetiva é o mais curativo e, em última instância, grande parte da relevância do nosso trabalho na clínica se dá no processo de compartilhar, na medida em que nossa experiência com o outro, valida, dá contorno e concretude à experiência de si, faz com que, de alguma forma, possamos sentir que não estamos sozinhos no mundo.

Um filme que nos faz pensar de forma bastante emblemática sobre isso é "O náufrago". Como o protagonista acaba criando, a partir de uma bola de vôlei, a figura de um outro na tentativa de não se perder de si e enlouquecer, para conseguir elaborar de alguma forma a sua própria experiência e se sentir menos solitário. A experiência de falar, de sair da clausura que não encontra espaço de expressão, já oferecia algum suporte, no entanto não o suficiente, pois ali não havia um outro de fato que responde e o incita a novas formas de ver e estar no mundo: "(...) na experiência do diálogo, a fala do outro vem tocar em nós nossas significações, e nossa fala vai, como atestam as respostas, tocar nele suas significações, invadimo-nos um ao outro" (Merleau-Ponty, 2012b, p. 227).

Concluímos, aqui, que o verdadeiro diálogo, aquele em que se funda o nosso trabalho na clínica, não é o encontro de duas pessoas que comunicam, ou falam sobre os significados e representações que já possuíam antes, mas é um ato comum de invenção de novos sentidos. Diz respeito ao momento em que eu e outro estamos em uma espécie de mútua improvisação, onde as palavras-gestos se invadem, convocam afetivamente outras palavras e as lacunas dos discursos solicitam movimento de significação. É aquele da fala falante em que se está formulando o pensamento no ato de falar, pela primeira vez. Ela dá forma aos sentidos intuídos, implícitos, às inquietações, ao que ainda não foi pronunciado e objetivado, mas está em gestação no campo intercorporal e em vias de nascer. Nasce do silêncio e das lacunas, das invisibilidades do mundo. "A fala falada obtura o silêncio (...) ao passo que a fala falante cresce na proximidade do silêncio e reconduz a fala ao silêncio" (Dupond, 2010, p. 33).

É apenas nesse sentido que uma pessoa pode se surpreender ou estranhar aquilo que ela mesma disse, que ela pode se ouvir como que a primeira vez e descobrir sentidos que ela sempre soube e ao mesmo tempo nunca soube (Moreira, 2011), que estavam sempre ali, em sua proximidade, mas nunca totalmente alcançados. Precisavam do outro para nascer, das suas indagações, suas torções, seus ouvidos nunca totalmente passivos e da sua presença, mesmo sem emitir uma só palavra.

É esse diálogo que buscamos na psicoterapia, um diálogo que seja fundado na corporeidade. Esse que é relação entre implícito e explícito, forma e conteúdo, fala e silêncio e que nesse jogo se estabelece como uma co-construção, um fazer conjunto. Este se alicerça na experiência estética, sensível, pré-reflexiva, intercorporal como solo comum de pertencimento que abre espaço de acolhida para o outro em sua diferença, como ação expressiva, improviso, ação no risco. Apostamos em uma relação terapêutica que dê suporte para a afetação e o descentramento. Que se funde em um tipo de diálogo que toque as nossas significações corriqueiras, que invada todo uma formulação habitual através de um pequeno desvio de ângulo. Que se dê em torno de uma relação de partilha na qual estamos voltados um para o outro em reciprocidade, atentos na construção de um caminho que não se faz sozinho, mas na presença e na companhia de um outro significativo.

 

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Recebido em 12.07.2019
Primeira Decisão Editorial em 01.09.2020
Aceito em 26.01.2021

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