ARTIGOS

 

Light Triad Scale: Propriedades psicométricas da versão português-brasileira e a relação com aspectos positivos

 

Light Triad Scale: Psychometric properties of the Brazilian-Portuguese version and the relationship with positive aspects

 

Light Triad Scale: Propiedades psicométricas de la versión portugués-brasileña y la relación con aspectos positivos

 

 

Leonardo de Oliveira Barros^I; Bruno Bonfá-Araujo^II; Ana Paula Porto Noronha^III

^IUniversidade Federal da Bahia (UFBA). E-mail; leonardobarros_lob@hotmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8406-0515
^IIUniversidade São Francisco. E-mail: brunobonffa@outlook.com ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0702-9992
^IIIUniversidade São Francisco . E-mail: ana.noronha8@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6821-0299

Endereço para correspondência

 

 

---

RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo adaptar a Light Triad Scale para o contexto brasileiro. Foram realizados dois estudos. O primeiro testou evidências de validade baseadas na estrutura interna, e o segundo, as evidências baseadas na relação com outras variáveis. A amostra foi composta por 454 participantes, com idades entre 18 e 64 anos, que responderam a Light Triad Scale, a Escala de Forças de Caráter, a Prosocial Personality Inventory e o Inventário de Competências Emocionais. O instrumento em sua versão brasileira apresentou evidências satisfatórias e demonstrou ser útil para a mensuração de traços positivos de personalidade.

Palavras-chave: Psicologia Positiva; Testes Psicológicos; Traços de Personalidade.

---

ABSTRACT

This research aimed to adapt the Light Triad Scale to the Brazilian context. Two studies were carried out. The first tested for evidence based on internal structure, while the second evidence based on relations to other variables. The sample consisted of 454 participants, aged between 18 and 64 years, who responded to the Light Triad Scale, the Escala de Forças de Caráter, the Prosocial Personality Inventory, and the Inventário de Competências Emocionais. The Brazilian version of the instrument presented satisfactory evidence and proved to be useful for measuring positive personality traits.

Keywords: Positive Psychology; Psychological Tests; Personality Traits.

---

RESUMEN

Esta investigación tuvo como objetivo adaptar la Light Triad Scale al contexto brasileño. Se realizaron dos estudios. El primero probó evidencias de validez basada en la estructura interna y el segundo, las evidencias basadas en la relación con otras variables. La muestra consistió en 454 participantes, con edades comprendidas entre 18 y 64 años, que respondieron la Light Triad Scale, la Escala de Fuerzas de Carácter, la Prosocial Personality Inventory y el Inventario de Competencias Emocionales. La versión brasileña del instrumento presentó evidencias satisfactorias y demostró ser útil para medir rasgos de personalidad positivos.

Palabras clave: Psicología Positiva; Tests Psicológicos; Rasgos de Personalidad.

---

 

 

A personalidade é um construto há muito estudado na Psicologia, de maneira que o conceito utilizado atualmente foi proposto por Allport (1937). Contudo, existe uma diversidade de modelos teóricos e definições. Neste estudo, ela será definida como traços que refletem um padrão consistente e estável de comportamentos de um indivíduo ao longo da vida e em situações distintas (Diener & Lucas, 2019). O construto ocupa uma posição de destaque na Psicologia, subsidiando o desenvolvimento de diversos instrumentos de medida e de intervenções (Costa, McCrae, & Löckenhoff, 2018). Dentre os referenciais teóricos, há a predominância de modelos desenvolvidos na década de 1940 (i.e., cinco grandes fatores da personalidade) ou com ênfase em comportamentos considerados indesejáveis (Gouveia, Oliveira, Grangeiro, Monteiro, & Coelho, 2020), tais como as propostas da tríade sombria da personalidade (Paulhus & Williams, 2002), e os mais recentes tétrade sombria (Paulhus, 2014) e fator sombrio da personalidade (Moshagen, Hilbig, & Zettler, 2018).

A Psicologia Positiva surgiu como uma proposta alternativa à visão patológica ou inadequada do funcionamento humano, buscando desenvolver um modelo teórico pautado nos traços individuais positivos dos sujeitos (Seligman & Csikszentmihalyi, 2014). Ela está embasada em uma perspectiva holística do ser humano e o foco está em pesquisa e intervenção de atributos que possam ajudar os indivíduos a serem mais felizes, saudáveis e realizados (Reppold, Zanini, Campos, Faria, & Tocchetto, 2019). O desenvolvimento da proposta e das práticas é fundamentado em evidências científicas obtidas por meio de ensaios clínicos e de estudos empíricos, nos quais ocorre a mensuração dos construtos relativos às emoções, traços e instituições positivas (Seligman, 2002).

Especificamente em relação à medida dos traços positivos, há algumas lacunas na área, tal como o baixo investimento em pesquisas sobre os traços de personalidade pró-sociais, uma vez que a maioria dos estudos aborda o construto como fator situacional e não em nível de diferenças individuais (Johnson, 2018). O comportamento pró-social corresponde a ações desempenhadas intencionalmente e de modo voluntário por um indivíduo em benefício de outras pessoas ou da sociedade, sendo geralmente representados pelo altruísmo, compaixão, perdão e gratidão (Graziano & Eisenberg, 1997). Cabe ressaltar que, além dos impactos positivos para a coletividade, estes traços podem beneficiar os níveis de saúde física e psicológica de quem os desenvolve (Hilbrand, Coall, Meyer, Gerstorf, & Hertwig, 2017).

No intuito de avançar as discussões sobre as medidas de traços positivos e partindo de uma perspectiva filosófica do comportamento pró-social, Kaufman, Yaden, Dyde e Tsukayama (2019) desenvolveram a Light Triad Scale (LTS). O instrumento é composto por 12 itens que se dividem em três fatores de orientação benevolente contrastantes à orientação antagônica dos fatores da tríade sombria da personalidade (Paulhus & Williams, 2002). Os fatores da LTS são: Kantianismo (relacionar-se com as pessoas de forma respeitosa e não para obter algo); Humanismo (entender que cada pessoa tem valor e dignidade) e; Fé na Humanidade (acreditar que as pessoas são essencialmente bondosas). Em conjunto, os fatores indicam uma postura benéfica e de carinho para com outras pessoas e estão em consonância com a Psicologia Positiva ao reforçar a visão otimista do ser humano (Gerymski & Krok, 2019).

Os resultados do estudo de construção da LTS nos Estados Unidos da América, indicaram a pertinência de três fatores por meio de análise fatorial exploratória (AFE), bem como um modelo bem ajustado a partir da análise fatorial confirmatória (AFC) e índices de precisão adequados (Kantianismo α = 0,80; Humanismo α = 0,76; Fé na humanidade α = 0,67). Por sua vez, evidências de validade baseadas na relação com outras variáveis da LTS indicaram correlações variando de fracas a moderadas, em sentido positivo, entre os fatores do instrumento com 18 das 24 forças de caráter, sexo feminino, renda e idade. Em relação a outras variáveis do comportamento pró-social, a tríade luminosa foi predita positivamente por modéstia, justiça, sinceridade e empatia (Kaufman et al., 2019).

Até o presente momento, a LTS foi adaptada apenas ao contexto polonês (Gerymski & Krok, 2019) e, apesar de serem encontradas boas propriedades psicométricas, os autores da adaptação indicaram que o modelo com dois fatores (sem a subescala Kantianismo) apresentou um ajuste ligeiramente melhor em detrimento da proposta original. Os índices de consistência interna também foram satisfatórios na versão adaptada (Kantianismo α = 0,73; Humanismo α = 0,65; Fé na humanidade α = 0,54). Na versão polonesa, houve a sugestão para exclusão de um item do fator Kantianismo (Prefiro honestidade em vez de charme), uma vez que sua carga fatorial foi baixa, mas sua exclusão reduzia a qualidade dos índices de ajuste e não aumentava confiabilidade da subescala. Por sua vez, observou-se que as pontuações das mulheres nos três fatores foram maiores do que a dos homens de forma estatisticamente significativa.

De tal modo, a LTS se apresenta como um instrumento promissor para avaliação de traços de personalidade pró-social. Uma das vantagens do instrumento é permitir a avaliação simultânea de traços que em geral são estudados isoladamente, ao mesmo tempo em que possibilita os avanços de estudos pautados em uma perspectiva positiva da existência humana (Johnson, 2018). Cabe ressaltar que a proposta do instrumento é ser uma medida contrastante da tríade sombria da personalidade, porém, isso não significa que seja um polo oposto do construto (Kaufman et al., 2019). Assim, a ênfase está em identificar como as pessoas podem construir relações pautadas na ética e com objetivos construtivos, e como resistir aos pensamentos egoístas e ao desejo de tirar vantagens de outras pessoas (Gerymski & Krok, 2019).

Frente ao exposto e aliado à possibilidade de se realizar comparações transculturais sobre um construto a partir de uma medida única, o que é desejável, tal como mencionado por International Test Commission [ITC] (2017), o objetivo deste artigo é apresentar o processo de tradução e adaptação transcultural da Light Triad Scale ao contexto brasileiro. O manuscrito é dividido em dois estudos, sendo que o primeiro descreve as etapas da tradução e adaptação, e as evidências de validade baseadas na estrutura interna. Por sua vez, o segundo estudo apresenta as evidências de validade baseadas na relação com outras variáveis, sendo que foram analisadas as relações com forças de caráter, comportamento pró-sociais e competências emocionais.

 

Estudo 1: Tradução, Adaptação e Estrutura Interna

Método

Participantes.

O estudo 1 foi composto por 307 indivíduos, com idades de 18 até 64 anos (M = 29,05; DP = 10,90), sendo 83,1% do sexo feminino, solteiros (73,3%), em maioria provenientes da região sudeste do Brasil (46,9%), cursando o ensino superior (40,1%) e desempregados ou sem renda (34,5%).

Instrumentos.

Questionário sociodemográfico.

Desenvolvido pelos autores desta pesquisa para coletar os dados demográficos sexo, estado civil, região, escolaridade e situação trabalhista.

Light Triad Scale.

(LTS; Kaufman et al., 2019). A LTS tem como proposta avaliar três traços positivos da personalidade a partir de 12 itens em escala Likert de 5 pontos (1 = Discordo totalmente até 5 = Concordo totalmente). Compõem a tríade luminosa, a Fé na Humanidade (i.e., crer na bondade do ser humano), o Humanismo (i.e., valorizar o merecimento e dignidade de cada indivíduo) e o Kantianismo (i.e., considerar as pessoas como um fim em si mesmas, sem a busca por vantagens). A versão em português-brasileiro encontra-se no Anexo A.

Procedimentos.

Os autores desse estudo contataram os responsáveis pelo instrumento Light Triad Scale (Kaufman et al., 2019), solicitando autorização para o processo de adaptação para o idioma português-brasileiro. Após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco (CAAE: 14771019.6.0000.5514), a adaptação seguiu as recomendações propostas pela International Testing Commission (ITC, 2017), ou seja, seguida anuência dos autores originais, o instrumento é encaminhado para dois juízes independentes que realizam a tradução considerando as particularidades e cultura do país para o qual o teste será aplicado. Em seguida, ambas as versões são compiladas em um instrumento único que é enviado para outros dois juízes independentes retrotraduzirem-no para o idioma original. Por fim, os autores dessa pesquisa elaboraram a síntese, chegando a uma versão prévia do instrumento, que foi enviada para análise dos autores do idioma original.

Posteriormente, a versão obtida sofreu modificações considerando pontos apresentados pelos autores da versão norte-americana, a fim de se obter um instrumento que pudesse ser compatível entre ambos os idiomas e culturas. Dado o aceite dos responsáveis para a versão final do instrumento, deu-se início à coleta de dados com a proposta de buscar evidências de validade baseadas na estrutura interna e índices de fidedignidade. A Light Triad Scale foi, então, alocada na plataforma online Google Forms e o link foi divulgado nas redes sociais dos pesquisadores e grupos de pesquisa. Para serem incluídos, os participantes deveriam aceitar as informações contidas no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), bem como indicar que possuíam idade de 18 anos ou mais. O protocolo continha um questionário sociodemográfico e a Light Triad Scale em sua versão português-brasileiro, respectivamente.

Análise de dados.

Optou-se pela utilização da Modelagem por Equações Estruturais Exploratória (Asparouhov & Muthén, 2009) para investigar a estrutura fatorial da Light Triad Scale na cultura brasileira. A seleção dessa análise se deu em função da sua capacidade ao considerar as vantagens de um modelo exploratório e confirmatório simultaneamente, possibilitando a apresentação de cargas cruzadas, bem como evitando possíveis especificações erradas atribuídas ao modelo de equações estruturais confirmatório. Foi utilizado o estimador Weighted Least Square Mean and Variance Adjusted (WLSMV) com rotação Geomin, e analisados os índices de ajuste qui-quadrado dividido por graus de liberdade (c²/df < 3), Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA < 0,06) e Comparative Fit Index (CFI > 0,95; Hu & Bentler, 1999). Uma vez obtido o modelo, testou-se a diferença na variável sexo pelo teste t de Student, considerando o tamanho de efeito a partir do d de Cohen; assim como as diferenças de média para as variáveis demográficas estado civil, escolaridade e situação trabalhista pela análise de variância (ANOVA). Estimou-se os índices de fidedignidade a partir dos coeficientes alfa de Cronbach e ômega de McDonald (Dann, Baguley, & Brunsden, 2014). As análises foram realizadas nos softwares MPlus 8 (Muthén & Muthén, 1998-2012) e jamovi 1.2 (The Jamovi Project, 2020).

Resultados e Discussão

Após a obtenção de uma versão semântica considerada adequada ao contexto brasileiro e para a mensuração do construto, houve a aplicação em uma amostra da população. Em seguida, foi realizada a Modelagem de Equações Estruturais Exploratória (ESEM) para a Light Triad Scale. Os índices de ajuste foram excelentes c²/df = 1,27; p = 0,133; RMSEA = 0,030 [I.C. 0,000 até 0,054] e CFI = 0,998. As cargas fatoriais da ESEM estão apresentadas na Tabela 1.

As intercorrelações variaram de 0,45 até 0,56, sendo Fé na Humanidade e Kantianismo r = 0,45; Humanismo e Kantianismo r = 0,47 e; Fé na Humanidade e Humanismo r = 0,56. Estes resultados indicam que o processo de adaptação transcultural foi bem-sucedido, sendo os resultados aqui encontrados compatíveis com os achados apresentados por Kaufman et al. (2019). Todavia, é importante considerar a existência de itens com cargas fatoriais marginalmente significativas (e.g., item 4) e a presença de cargas cruzadas para os itens 9 e 11 nas dimensões Humanismo e Kantianismo. A baixa carga fatorial apresentada no item 4 ("Perdoo com facilidade pessoas que me magoaram") é similar ao resultado no qual foi realizada a análise fatorial confirmatória no estudo original (r = 0,53; Kaufman et al., 2019). Possivelmente, este resultado foi obtido devido à presença de duas informações em um mesmo item, ou seja, perdoar as pessoas com facilidade e perdoar as pessoas que magoam.

No que diz respeito às cargas cruzadas, para os itens 9 ("Prefiro honestidade em vez de charme") e 11 ("Gosto de ser autêntico mesmo que isso prejudique minha reputação"), isto também pode ter ocorrido devido ao processo semântico contido nas afirmativas. Ambos os itens retratam informações que compreendem não apenas características de pessoas que concebem outras como um fim em si mesmas, estes também captam valores individuais, portanto, traços tanto de Humanismo, quanto de Kantianismo. Além disso, pode ser atribuído à semelhança no conteúdo de ambos os itens, podendo, assim, caracterizar a crença de bondade no ser humano e ao mesmo tempo considerar os indivíduos como um fim em si mesmos. A versão adaptada para o polonês (Gerymski & Krok, 2019) encontrou a mesma problemática para estes itens, o que culminou na proposta de uma "díade luminosa" apenas com os fatores Fé na Humanidade e Humanismo.

Considerando as diferenças de média para a variável sexo, nenhum dos fatores apresentou resultados estatisticamente significativos (Fé na Humanidade t = 0,90; p = 0,36; d = 0,13; Humanismo t = 0,34; p = 0,72; d = 0,05; e Kantianismo t = -0,51; p = 0,60; d = -0,07). O resultado não significativo também se aplica para a ANOVA considerando as variáveis estado civil (Fé na Humanidade F = 2,82; p = 0,06; Humanismo F = 1,63; p = 0,19; Kantianismo F = 2,72; p = 0,06), situação trabalhista (Humanismo F = 1,79; p = 0,10; Kantianismo F = 0,37; p = 0,89) e escolaridade (Fé na Humanidade F = 1,23; p = 0,28; Humanismo F = 1,57; p = 0,15; Kantianismo F = 0,78; p = 0,58). O único achado significativo ocorreu para o fator Fé na Humanidade, considerando a variável situação trabalhista (F(300) = 2,18; p = 0,04), porém o teste post-hoc de Tuckey não apresentou resultado significativo p = 0,21.

Os resultados aqui encontrados dão indícios para uma não diferença de média entre as variáveis luminosas no que tange às características sociodemográficas investigadas. Os achados são similares ao estudo original que também não encontrou diferença estatisticamente significativa em relação à escolaridade (Kaufman et al., 2019). Todavia, a adaptação polonesa indicou diferenças significativas para a variável sexo, considerando Humanismo e Kantianismo (Gerymski & Krok, 2019), com mulheres apresentando maior resultado para ambas as variáveis, de maneira que este resultado pode ser atribuído a características culturais brasileiras e polonesas.

Finalmente, foram analisados os índices de fidedignidade alfa de Cronbach e ômega de McDonald. Para Fé na Humanidade, os valores obtidos foram a = 0,72; w = 0,74; Humanismo, a = 0,84; w = 0,85 e; Kantianismo, a = 0,69; w = 0,71. Estes resultados indicam que em sua versão português-brasileiro a Light Triad Scale apresenta resultados confiáveis para nossa cultura. Quando os achados brasileiros foram comparados com os advindos da versão norte-americana e polonesa, houve concordância (Gerymski & Krok, 2019; Kaufman et al., 2019).

 

Estudo 2: Relações com variáveis externas

Método

Participantes.

O Estudo 2 foi composto por 147 participantes, com idades de 18 até 63 anos (M = 29,90; DP = 11,80), sendo a maioria do sexo feminino (86,4%); 44,2% dos participantes eram da região sudeste do Brasil, 74,1% se declararam como solteiras(os), 43,5% cursando o ensino superior e 38,8% desempregadas(os) ou sem renda.

Instrumentos.

Questionário Sociodemográfico.

Instrumento que visou coletar informações sociodemográficas dos participantes, como sexo, idade, região do Brasil, estado civil, escolaridade e situação trabalhista.

Escala de Tríade Luminosa.

(ETL; Kaufman et al., 2019): adaptada no estudo 1. Com mínimo de 1 e máximo de 20 pontos por fator.

Escala de Forças de Caráter.

(EFC; Noronha & Barbosa, 2016). A EFC tem por proposta mensurar as 24 forças de caráter (i.e., Criatividade, Pensamento Crítico, Amor ao aprendizado, Sensatez, Curiosidade, Autenticidade, Bravura, Perseverança, Vitalidade, Amor, Bondade, Inteligência Social, Cidadania, Liderança, Imparcialidade, Autorregulação, Modéstia, Perdão, Prudência, Apreciação ao belo, Gratidão, Humor, Espiritualidade e Esperança), e apresenta uma estrutura unidimensional (α = 0,93 no estudo de desenvolvimento). A escala possui 71 itens respondidos em formato Likert de 5 pontos (0 = Nada a ver comigo até 4 = Tudo a ver comigo). Alguns exemplos de itens são "1. Sei o que fazer para que as pessoas se sintam bem"; "20. Expresso meus afetos com clareza" e; "71. Mantenho minha mente aberta". Com mínimo de 0 e máximo de 284 pontos.

Prosocial Personality Inventory.

(PSPI+; Gouveia et al., 2020). A PSPI+ tem como objetivo mensurar três traços positivos de personalidade (i.e., Perdão, Gratidão e Altruísmo), de modo que cada fator é composto por duas facetas, sendo uma positiva e outra negativa (Remissão [α = 0,83] e Incriminação [α = 0,82] para o Perdão; Reconhecimento [α = 0,78] e Inexpressividade [α = 0,91] para a Gratidão; e Beneficência [α = 0,78] e Egotismo [α = 0,89; todos os valores foram retirados do estudo de desenvolvimento] para o Altruísmo). A escala possui 18 itens respondidos em um formato Likert de 5 pontos (1 = Não me descreve até 5 = Descreve-me totalmente). Alguns exemplos de itens são: "1. Em geral, esqueço de agradecer as coisas boas que me fazem"; "10. Sei perdoar aqueles que me fazem ofensas intencionais" e; "18. Ajudo aos outros para receber elogios". Com mínimo de 1 e máximo de 30 pontos por fator.

Inventário de Competências Emocionais.

(ICE; Bueno et al., 2015). A ICE visa mensurar a inteligência emocional traço por meio de cinco dimensões (i.e., Regulação de emoções em outras pessoas [α = 0,91], Regulação de emoções de baixa potência [α = 0,83], Expressividade emocional [α = 0,67], Percepção de emoções [α = 0,86] e Regulação de emoções de alta potência [α = 0,76; todos os valores foram retirados do estudo de desenvolvimento]), podendo ser concebida a partir de um fator geral. A escala possui 34 itens respondidos em formato Likert de 5 pontos (1 = Absolutamente não se aplica ao seu caso até 5 = Se aplica perfeitamente ao seu caso). Alguns exemplos de itens são "1. Tenho jeito para lidar com pessoas problemáticas"; "20. Consigo expressar o meu descontentamento de forma apropriada" e; "34. "Conto até dez para não agir descontroladamente". Com mínimo de 4 pontos para Expressividade emocional, 7 pontos para Regulação de emoções de baixa potência e Percepção de emoções e 8 pontos para Regulação de emoções em outras pessoas e Regulação de emoções de alta potência e; máximo de 20 pontos para Expressividade emocional, 35 pontos para Regulação de emoções de baixa potência e Percepção de emoções e 40 pontos para Regulação de emoções em outras pessoas e Regulação de emoções de alta potência. Para o escore total, a quantidade de pontos mínima é 34 e máxima é 170.

Procedimentos.

Dado que o instrumento apresentou propriedades psicométricas adequadas, deu-se início à busca por evidências de validade baseadas na relação com outras variáveis. As escalas então selecionadas foram alocadas na plataforma online Google Forms e o link foi disponibilizado nas redes sociais dos pesquisadores e do grupo de pesquisa. Para compor a amostra, os participantes deveriam indicar anuência às informações contidas no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), assim como possuir 18 anos ou mais de idade. Os instrumentos foram apresentados na seguinte ordem: questionário sociodemográfico, Escala de Tríade Luminosa, Escala de Forças de Caráter, Prosocial Personality Inventory e Inventário de Competências Emocionais.

Análise de dados.

Foram analisados os índices de fidedignidade de cada um dos instrumentos utilizados a partir dos coeficientes alfa de Cronbach e ômega de McDonald (Dann et al., 2014). Em seguida, investigou-se a relação entre as variáveis a partir da correlação produto-momento de Pearson (r), considerando tanto os fatores específicos, quanto o fator geral dos instrumentos quando disponível. Por último, foi realizada uma Modelagem de Equações Estruturais (SEM), visando investigar a capacidade explicativa das forças de caráter sobre a tríade luminosa e a personalidade pró-social. Os estimadores e índices de ajuste considerados foram relatados no estudo 1. Realizou-se as análises nos softwares jamovi (The Jamovi Project, 2020) e MPlus 8 (Muthén & Muthén, 1998-2012).

Resultados e Discussão

Inicialmente, foram analisadas as estatísticas descritivas, bem como testou-se os índices de fidedignidade de todos os instrumentos utilizados no segundo estudo. As informações são apresentadas na Tabela 2.

Os resultados para os índices de ajuste foram satisfatórios no que concerne todos os instrumentos, e variaram de alfa 0,66 (w = 0,67) para Expressividade Emocional até 0,96 (w = 0,96) para o fator geral de Forças de Caráter. Em especial no que tange à tríade luminosa, os coeficientes mantiveram resultados satisfatórios quando comparados ao estudo 1, indicando mais uma vez que tal instrumento é confiável para ser utilizado em nossa cultura. Em seguida, testou-se as correlações entre a tríade luminosa, a personalidade pró-social, as forças de caráter e a inteligência emocional traço, os resultados são apresentados na Tabela 3.

A maior parte das correlações foi significativa e, como esperado, todas positivas. Os valores variaram de r = 0,20 para Kantianismo e Gratidão até r = 0,65 para Humanismo e Kantianismo. Estes achados indicam que as variáveis positivas aqui estudadas tendem a coocorrer nos indivíduos, de maneira que altos escores em uma delas possivelmente indicaria altos escores em outras.

Finalmente, com o objetivo de testar a capacidade explicativa das Forças de Caráter sobre a tríade luminosa e a personalidade pró-social, foi realizado o modelo de equações estruturais. A realização deste modelo se justifica na hipótese de que, ao considerarmos as Forças de Caráter como capazes de englobar todas as variáveis positivas, estas seriam aptas para explicar os traços avaliados por estes dois instrumentos (i.e., Escala de Tríade Luminosa e Prosocial Personality Inventory). Nessa conformidade, a inteligência emocional traço não foi utilizada no modelo visto que as características de inteligência se diferenciam dos traços mensurados pelas Forças de Caráter, principalmente, por envolverem aspectos cognitivos. O modelo pode ser visto na Figura 1.

Os resultados da Modelagem de Equações Estruturais (SEM) indicaram índices de ajuste parcialmente satisfatórios, c²/df = 1,40 p = 0,001; RMSEA = 0,053 [I.C. 0,050 até 0,056] e CFI = 0,811. Por um lado, a avaliação de c²/df e RMSEA apresentou resultados satisfatórios, por outro lado, o CFI indicou um índice insatisfatório (< 0,90), o que pode estar relacionado ao tamanho da amostra. Conforme apontado por Lai e Green (2016), embora o ajuste não seja plenamente satisfatório, o modelo pode ser utilizado como resultados exploratórios iniciais.

 

Discussão

Este estudo teve como objetivo realizar o processo de adaptação da Light Triad Scale (Kaufman et al., 2019) para o português-brasileiro, assim como analisar suas propriedades psicométricas a partir de evidências de validade baseadas na estrutura interna e na relação com outras variáveis. Para tanto, a pesquisa foi dividida em dois estudos, de modo que os resultados foram satisfatórios para ambos, acumulando assim evidências promissoras para o instrumento de personalidade luminosa. Os resultados encontrados no estudo 1 e reproduzidos no estudo 2 indicaram que a Escala de Tríade Luminosa apresentou boas propriedades psicométricas para a cultura brasileira. Assim como nas versões original e polonesa, o instrumento se mostra como uma ferramenta útil para a avaliação específica de traços positivos da personalidade (Gerymski & Krok, 2019; Kaufman et al., 2019).

Estudos recentes sobre a Psicologia Positiva propõem uma ampliação para a compreensão desta, sendo este instrumento um avanço na mensuração de tais traços. Mais especificamente, os avanços teóricos e empíricos caminham para a percepção do uso das características positivas em níveis ótimos, subutilizadas e superutilizadas (Niemiec, 2019); além de ser possível identificar um perfil latente luminoso e sombrio (Neumann et al., 2020). Neste sentido, seria possível caracterizar a função de tais traços nas situações específicas em que são expressos, culminando assim em um perfil de personalidade que mescle traços luminosos e sombrios a depender do contexto no qual o sujeito estaria inserido.

A partir do modelo de equações estruturais testado, foi possível verificar a adequação da tríade luminosa ao escopo da Psicologia Positiva mediante a explicação recebida pelas forças de caráter. Ainda que com as limitações estatísticas do modelo já apontadas, observou-se que a tríade luminosa foi tão bem explicada quanto às outras variáveis pró-sociais do PSPI+. Todavia, cabe destacar que todas as variáveis do modelo são consideradas traços de personalidade (Johnson, 2018; Seligman & Csikszentmihalyi, 2014), de modo que há necessidade de outros estudos que explorem a direcionalidade dos construtos em diferentes modelos.

Este estudo possui algumas limitações que devem ser consideradas. Em primeiro lugar, a não homogeneidade do sexo dos participantes e sua maior concentração na região sudeste. Contudo, o enfoque era buscar evidências iniciais para a Escala de Tríade Luminosa da Personalidade, de modo que o objetivo foi alcançado. Estudos futuros devem analisar outros tipos de evidências, bem como investigar o construto com maior ênfase no sexo masculino e em outras regiões do Brasil. Em segundo lugar, a menor quantidade de participantes no estudo dois indicou um modelo parcialmente satisfatório. Apesar disso, a modelagem realizada é um indicador inicial para a existência de relações explicativas entre variáveis positivas e pró-sociais. Outrossim, são necessárias maiores evidências que suportem a existência do modelo estadunidense como tríade luminosa em vez de díade luminosa, como sugerido pelos autores poloneses (Gerymski & Krok, 2019); bem como a testagem da invariância dos dados em diferentes culturas. Nessa conformidade, estudos futuros devem buscar testar a relação entre o modelo aqui apresentado e outros construtos vinculados à Psicologia Positiva, como satisfação com a vida e afetos.

 

Referências

Allport, G. W. (1937). Personality: A Psychological Interpretation. London: Constable.         [ Links ]

Asparouhov, T., & Muthén, B. (2009). Exploratory structural equation modeling. Structural Equation Modeling: A Multidisciplinary Journal, 16(3), 397-438. doi:10.1080/10705510903008204        [ Links ]

Bueno, J. M. H., Correia, F. M. de L., Abacar, M., Gomes, Y. de A., & Pereira Júnior, F. S. (2015). Competências emocionais: estudo de validação de um instrumento de medida. Revista Avaliação Psicológica, 14(1), 153-163. doi:10.15689/ap.2015.1401.17        [ Links ]

Costa Jr., P. T., McCrae, R. R., & Löckenhoff, C. E. (2018). Personality across the life span. Annual Review of Psychology, 70(1), 21.1-21.26. doi:10.1146/annurev-psych-010418-103244        [ Links ]

Dann, T. J., Baguley, T., & Brunsden, V. (2014). From alpha to omega: A pratical solution to the pervasive problem of internal consistency estimation. British Journal of Psychology, 105(3), 399-412. doi:10.1111/bjop.12046        [ Links ]

Diener, E., & Lucas, R. E. (2019). Personality Traits. In R. Biswas-Diener & E. Diener (Eds), Noba Textbook Series: Psychology. Champaign, IL: DEF Publishers. Recuperado de: https://nobaproject.com/modules/personalitytraits        [ Links ]

Gerymski, R., & Krok, D. (2019). Psychometrics properties and validation of the Polish adaptation of the Light Triad Scale. Current Issue in Personality Psychology, 7(4), 341-354. doi:10.5114/cipp.2019.92960        [ Links ]

Graziano, W. G., & Eisenberg, N. H. (1997). Agreeableness: A dimension of personality. In R. Hogan, J. Johnson, & S. Briggs (Eds.), Handbook of Personality Psychology (pp. 795-824). San Diego, CA: Academic Press.         [ Links ]

Gouveia, V. V., Oliveira, I. C. V., Grangeiro, A. S. M., Monteiro, R. P, & Coelho, G. L. H. (2020). The bright side of the human personality: Evidence of a measure of prosocial traits. Journal of Happiness Studies, 1-22. doi:10.1007/s10902-020-00280-2        [ Links ]

Hilbrand, S., Coall, D. A., Meyer, A. H., Gerstorf, D., & Hertwig, R. (2017). A prospective study of associations among helping, health, and longevity. Social Science & Medicine, 187, 109-117. doi:10.1016/j.socscimed.2017.06.035        [ Links ]

Hu, L., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural Equation Modeling: A Multidisciplinary Journal, 6(1), 1-55. doi:10.1080/10705519909540118        [ Links ]

International Test Commission. (2017). International Test Commission guidelines for translating and adapting tests (Second edition). Recuperado de https://www.intestcom.org/files/guideline_test_adaptation_2ed.pdf

Johnson, L. K. D. (2018). The Light Triad Scale: Developing and validating a preliminary measure of prosocial orientation (Master's thesis). Available from Electronic Thesis and Dissertation Repository. 5515. https://ir.lib.uwo.ca/etd/5515

Kaufman, S. B., Yaden, D. B., Hyde, E., & Tsukayama, E. (2019). The light vs. dark triad of personality: Contrasting two very different profiles of human nature. Frontiers in Psychology, 10, 1-26. doi:10.3389/fpsyg.2019.00467        [ Links ]

Lai, K., & Green, S. B. (2016). The problem with having two watches: Assessment of fit when RMSEA and CFI disagree. Multivariate Behavioral Research, 51(2-3), 220-239. doi:10.1080/00273171.2015.1134306        [ Links ]

Moshagen, M., Hilbig, B. E., & Zettler, I. (2018). The dark core of personality. Psychological Review, 125(5), 656-688. doi:10.1037/rev0000111        [ Links ]

Muthén, L. K., & Muthén, B. O. (1998-2012). Mplus User's Guide. Seventh Edition. Los Angeles, CA: Muthén & Muthén.         [ Links ]

Neumann, C. S., Kaufman, S. C., ten Brinke, L., Yaden, D. B., Hyde, E., & Tsykayama, E. (2020). Light and dark trait subtypes of human personality - A multi-study person-centered approach. Personality and Individual Differences, 164. doi:10.1016/j.paid.2020.110121        [ Links ]

Niemiec, R. M. (2019). Finding the golden mean: The overuse, underuse, and optimal use of character strengths. Counselling Psychology Quarterly, 1-19. doi:10.1080/09515070.2019.1617674        [ Links ]

Noronha, A. P. P., & Barbosa, A. J. C. (2016). Escala de Forças de Caráter. Amparo, SP: Universidade São Francisco.         [ Links ]

Paulhus, D. L. (2014). Toward a taxonomy of dark personalities. Current Directions in Psychological Science, 23(6), 421-426. doi:10.1177/0963721414547737        [ Links ]

Paulhus, D. L., & Williams, K. M. (2002). The dark triad of personality: Narcissism, machiavellianism, and psychopathy. Journal of research in personality, 36(6), 556-563. doi:10.1016/S0092-6566(02)00505-6        [ Links ]

Reppold, C. T., Zanini, D. S., Campos, D. C., de Gomes Faria, M. R. V., & Tocchetto, B. S. (2019). Felicidade como produto: Um olhar crítico sobre a ciência da psicologia positiva. Avaliaçao Psicologica, 18(4), 333-342. doi:10.15689/ap.2019.1804.18777.01        [ Links ]

Seligman, M. E. P. (2002). Positive Psychology, Positive Prevention and Positive Therapy. In C. Snyder & S. Lopez (Eds.). Handbook of Positive Psychology (pp. 3-9). New York: Oxford.         [ Links ]

Seligman, M. E. P., & Csikszentmihalyi, M. (2014). Positive Psychology: An Introduction. In Flow and the Foundations of Positive Psychology (pp. 279-298). Dordrecht: Springer.         [ Links ]

The Jamovi Project (2020). jamovi. (Versão 1.2) [Software]. Recuperado de https://www.jamovi.org.

 

 

Endereço para correspondência:
Leonardo de Oliveira Barros
leonardobarros_lob@hotmail.com

Recebido em: 03/06/2020
Aceito em: 15/10/2020

 

 

Anexo A. Escala de Tríade Luminosa

 

 

Fator 1 - Fé na Humanidade = Item 1 + Item 2 + Item 3 + Item 4

Fator 2 - Humanismo = Item 5 + Item 6 + Item 7 + Item 8

Fator 3 - Kantianismo = Item 9 + Item 10 + Item 11 + Item 12