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Revista Psicopedagogia
versão impressa ISSN 0103-8486
Rev. psicopedag. vol.27 no.82 São Paulo 2010
ARTIGO ESPECIAL
Mediação escolar e inclusão: revisão, dicas e reflexões
Teacher assistant and inclusive education: review, tips and reflections
Renata MousinhoI; Evelin SchmidII; Fernanda MesquitaIII; Juliana PereiraIV; Luciana MendesV; Renata ShollVI; Vanessa NóbregaVII
IMestre e Doutora em Linguística UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Professora da UFRJ
IIMestre em Linguística PUC-RJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga Lexus
IIIMestranda em Psicologia UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga Lexus
IVMestre em Linguística da UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga AE e Lexus
VMestre em Linguística UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga UFRRJ e Lexus
VIMestre em Linguística UFRJ. Fonoaudióloga Secretaria Municipal de Saúde -RJ e Lexus
VIIMestre em Linguística UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga Lexus
RESUMO
A mediação escolar passou a se tornar mais frequente a partir da Convenção de Salamanca. As escolas de todo o mundo tiveram que dar conta de incluir crianças que precisavam de ajuda em classes já existentes, muitas vezes com grande número de alunos e professores, cuja formação não havia se preocupado com esses aspectos. O mediador pode atuar como intermediário nas questões sociais e de comportamento, na comunicação e linguagem, nas atividades e/ou brincadeiras escolares, e nas atividades pedagógicas, nas limitações motoras ou da leitura, nos diversos níveis escolares. Um mediador estimulando a aquisição de linguagem e habilidades sociais no cotidiano escolar amplia a possibilidade da quantidade de estímulo recebido, como também a qualidade já que sempre ocorrerá em situação real de uso, diferente do que se pode proporcionar num consultório. Conhecer o aluno que será acompanhado pela mediação, discutir com a equipe pedagógica da escola e com a equipe de apoio terapêutico são pontos fundamentais. Apesar da figura do mediador ser considerada uma adaptação no espaço pedagógico, portanto garantido pela lei, não existe muita clareza quanto o papel e as atribuições deste profissional nem quanto à regulamentação da profissão.
Unitermos: Educação especial/tendências. Mainstreaming (Educação). Educação.
SUMMARY
The school mediation has become more frequent from the Salamanca Convention. Schools around the world had to give account to include children who needed help in existing classes, often with large numbers of students and teachers whose training had not been concerned with these aspects. The mediator can act as an intermediary in social and behavior, communication and language, activities and / or school play, and educational activities in the motor or reading in the various school grades. A teacher assistant can stimulate the language acquisition and social skills in everyday school enhances the possibility of the amount of stimulation received, but also the quality as always occur in real situations of use, different from what we can provide a therapy set. To know the student who will be accompanied in school, discuss with the school's teaching staff and the therapeutic support staff are key points. Although the figure of the teacher assistant can be regarded as an adaptation in the pedagogical space, thus guaranteed by law, there is not much clarity about the role and responsibilities of the professional or on the regulation of the profession.
Key words: Education, special/trends. Mainstreaming (Education). Education.
INTRODUÇÃO
Diversos documentos foram gerados ao longo dos anos por organizações internacionais na tentativa de garantir o direito universal à educação, como também orientar o processo de inclusão, tais como: Declaração de Cuenca, em 1981; Declaração de Sunderberger, em 1981; Declaração Mundial sobre Educação para Todos - UNESCO, em 1990; aprovada pela Conferência Mundial sobre Educação para Todos - Tailândia, em 1990; Informe Final do Seminário da Unesco de Caracas, em 1992; Declaração de Santiago, em 1993; Normas Uniformes para Pessoas com Incapacidades, aprovadas em Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1993; Declaração de Salamanca, de Princípios, Política e Prática em Educação Especial - Unesco, em 1994; Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência - ONU, em 2006. Vale destacar que os documentos da Unesco em 1990 e em 1994 são considerados internacionalmente momentos históricos a favor da Educação Inclusiva1.
O panorama no Brasil também não é diferente historicamente, onde leis e documentos foram criados na intenção de garantir o sucesso da inclusão. Assim, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1998 garante a oferta do atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. A constituição, art. 208, inciso III, o Plano Decenal de Educação para todos, 1993 - 2003, e os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1999 são exemplos de documentos que defendem e asseguram o direito de todos à educação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 define, no capítulo V, que a educação para alunos com deficiência deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, assegurando aos mesmos currículo, técnicas, recursos educativos específicos para atender às suas necessidades, métodos dentre outros recursos e adaptações2,3.
Diante da filosofia de inclusão como um movimento mundial, impulsionada sobretudo pela Convenção de Salamanca, as escolas de todo o mundo tiveram que dar conta de incluir crianças que precisavam de ajuda em classes já existentes, muitas vezes com grande número de alunos e professores, cuja formação não havia se preocupado com esses aspectos. Neste momento, a opção para muitos foi colocar um profissional especializado na sala de aula, a fim de acompanhar uma criança ou adolescente em parceria com o professor de classe. Com o crescimento e propagação da ideia do mediador escolar, despontou a necessidade de se estudar mais a fundo o assunto, apesar do pouco material teórico disponível sobre o tema.
A variação na nomenclatura também dificulta pesquisas mais amplas. Em inglês, por exemplo, pode-se encontrar com o nome de Teacher Assistant, Instructional Assistant, Special Education Teaching Assistant, Special Education Paraprofessional, Teacher Aide, Paraeducator, Teaching Assistant, Special Education Aide, Special Education Instructional Assistant, Shadow Aide. No Brasil, já surgiram expressões como facilitador escolar, tutor escolar, assistente educacional e mediador escolar. Esta última denominação parece melhor explicitar a função de quem acompanha a criança de inclusão dentro de uma classe regular de ensino, terminologia que será utilizada doravante neste artigo. A palavra "mediador" faz menção àquele indivíduo que media e mediar significa ficar no meio de dois pontos4. O conceito de professor mediador já foi utilizado em outro contexto para caracterizar aquele que "trabalha com a mediação pedagógica, significando uma atitude e um comportamento do docente que se coloca como um facilitador, incentivador ou motivador da aprendizagem, que ativamente colabora para que o aprendiz chegue aos seus objetivos"5.
Alguns países apresentam mais registros desta experiência. Na França, entre 1998 e 2003, foram desenvolvidas as primeiras integrações individuais com mediadores escolares. Esses profissionais eram recrutados e formados por associações, de forma pontual, visando ao tipo de dificuldade que eles acompanhavam. Em junho de 2003, eles passaram à responsabilidade da Educação Nacional6. Nos EUA, uma característica relevante da mediação é que todo o staff, equipe escolar, deve compreender a dificuldade do aluno, que o faz responder de uma forma diferente dos outros estudantes. É importante o treinamento dos colegas. O staff educacional deve ser treinado diretamente para aquela criança com sua equipe, compreendendo seus pontos fortes e necessidades prioritárias para poder atuar com ela. A equipe deve incluir os professores, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, além dos pais7. Na Grã-Bretanha, os mediadores escolares trabalham em escolas com professores de turma, a fim de ajudar a oferecer experiências relevantes de aprendizagem para as crianças. Independente do título que apresentam, ficam baseados em escolas primárias, secundárias ou especiais. Em escolas primárias e especiais, eles devem ser os primeiros a ajudar uma criança ou um pequeno grupo de crianças com necessidades especiais, ou podem trabalhar direto numa classe particular. Em escolas secundárias, eles devem trabalhar com uma única criança, abarcando todas as áreas do currículo. Cabe destacar que, na última década, o número de mediadores escolares cresceu impressionantemente neste país8.
No Brasil, fala-se de inclusão com mediador escolar de modo mais intenso em torno dos anos 2000, mas sem nenhum registro sistemático. Aqui surgiram para acompanhar as crianças que necessitavam de auxílio na sala de aula e este era orientado pelos profissionais que acompanhavam a criança nas terapias de apoio, aliando trocas com a escola. Aos poucos essa função foi se especializando e ampliando, sendo cada vez mais frequente sua presença em escolas públicas e particulares. Exatamente por esse fato, faz-se necessário pontuar a atuação da mediação escolar e realizar trabalhos científicos que valorizem essa função, para que assim possamos refletir sobre os reais caminhos que nos levam à inclusão e melhor acolher as crianças que necessitam destas pequenas, médias e grandes adaptações. Cabe pontuar que, na maior parte das vezes, ao menos em escolas privadas, este profissional tem sido pago pelos pais da criança. Estagiários têm sido eventualmente utilizados na rede pública.
Todos esses países, incluindo o Brasil, compartilham uma característica: a formação de base do mediador pode estar relacionada à área da saúde ou da educação. Portanto, os mediadores escolares podem ser professores, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos, pedagogos, psicopedagogos, fisioterapeutas, sempre acompanhados pela equipe terapêutica da criança ou adolescente e pela equipe escolar. A escolha do mediador está na relação entre sua formação acadêmica e a maior demanda da criança (comunicação, comportamento ou motora, por exemplo). Além disso, o mediador escolar deve ter a aptidão e habilidades interpessoais necessárias para desenvolver e manter relações de trabalho eficazes com as crianças, famílias e demais profissionais que as assistem, que inclui saber respeitar e compreender as dificuldades da família e da criança, ter flexibilidade para se adequar à dinâmica do ambiente escolar que estará se inserindo, disponibilidade para aprender e muita criatividade6,8.
O PAPEL DO MEDIADOR ESCOLAR
O mediador é aquele que no processo de aprendizagem favorece a interpretação do estímulo ambiental, chamando a atenção para os seus aspectos cruciais, atribuindo significado à informação recebida, possibilitando que a mesma aprendizagem de regras e princípios sejam aplicados às novas aprendizagens, tornando o estímulo ambiental relevante e significativo, favorecendo o desenvolvimento9.
O mediador pode levar a criança a detectar variações por meio da diferenciação de informações sensoriais, como visão, audição e outras; reconhecer que está enfrentando um obstáculo e identificar o problema10,11. Pode também contribuir para que a criança tome mais iniciativa mediante diferentes contextos, sem deixar que este processo siga automaticamente e encorajar a criança a ser menos passiva no ambiente. Desenvolver a flexibilidade também é importante. O mediador pode atuar criando pequenas mudanças e problemas para que a criança perceba, inicie, tolere mudanças e aprenda a lidar com estas situações.
De acordo com esses autores, por meio da mediação, a criança pode ser levada a permanecer por mais tempo em atividades sequenciais que exijam ações complexas e comunicação. Para isso o mediador pode: lançar experiências que solicitem várias etapas na resolução do problema (usando uma forma de comunicação); questionar quem quer resolver o problema; o que deve ser resolvido e oferecer recursos para que o problema seja resolvido. A oferta de recursos no auxílio à resolução do problema deve ser realizada de forma sutil, indicando, por exemplo, onde a resolução do problema pode ser procurada e quais as ferramentas necessárias.
A principal função do mediador é ser o intermediário entre a criança e as situações vivenciadas por ela, onde se depare com dificuldades de interpretação e ação. Logo, o mediador pode atuar como intermediário nas questões sociais e de comportamento, na comunicação e linguagem, nas atividades e/ou brincadeiras escolares, e nas atividades dirigidas e/ou pedagógicas na escola. O mediador também atua em diferentes ambientes escolares, tais como a sala de aula, as dependências da escola, pátio e nos passeios escolares que forem de objetivo social e pedagógico. Também pode acompanhar a criança ao banheiro, principalmente se estiver com objetivo de desfralde, auxiliando nos hábitos de higiene, promovendo independência e autonomia no decorrer da rotina. Isso poderá ser acordado junto à equipe escolar, se esta tiver auxiliar de turma, para que não aconteça conflito nas ações. Adaptar a estrutura física para organizar objetos no entorno, evitando grandes distratores ou exposição daqueles que representam manias é uma ação igualmente relevante.
Mediadores escolares também prestam apoio aos professores em sala de aula. Eles ajudam com as atividades e trabalhos de adaptação individualizada, a fim de permitir que os professores ganhem tempo com as demais atividades do dia a dia. Podem ajudar e apoiar as crianças na aprendizagem e aplicação de material de classe. Também proporcionam aos alunos uma atenção individual, quando os alunos estão tendo dificuldades com o material proposto para o resto do grupo. Algumas adaptações curriculares podem ser feitas seguindo a proposta do professor da turma e das terapias de apoio. Para tanto, é necessário conversar com a equipe terapêutica para que as ações sejam coerentes e uniformes.
A parceria entre mediador e escola favorece o estabelecimento de metas realistas no que se refere ao desenvolvimento, como também possibilita avaliar a criança de acordo com suas próprias conquistas. Como mostra a literatura, o mediador deveria ser encarado como um profissional que assume o papel de auxiliar na inclusão do aluno com deficiência e não o papel de professor principal da criança. Ele deveria ser visto como mais um agente de inclusão, na medida em que ele teria circulação pela instituição, produzindo questionamentos na equipe escolar e estando sempre atento a quando e como deve fazer sua entrada em sala de aula, sem permanecer ali esquecido e excluído junto com o aluno12. Cabe ressaltar que o mediador pode assumir o papel de ser um apoio para que a criança possa ser incluída em um processo educacional que, de outra maneira, ou seja, sem uma pessoa diretamente a apoiando numa relação um para um, poderia ser desestruturante e insuportável, tanto para a escola quanto para o aluno com deficiência13.
Em linhas gerais, observa-se que há diversos tipos de alunos que podem precisar do apoio de um Mediador Escolar, cujas dificuldades podem ser de diversas naturezas, tal qual listado (mas não esgotado) nos próximos tópicos.
Dificuldade motora geral e acessibilidade: alunos com limitações motoras, mesmo com acessórios que facilitem a locomoção ou digitação, por exemplo, podem necessitar, pelo menos num período de adaptação, de mediadores escolares. A implementação de muitos recursos só é possível com este auxílio individualizado. Adaptações de material também podem ser uma constante;
Dificuldades comportamentais importantes: determinados comportamentos, sobretudo agressivos, podem colocar em risco a integridade do próprio aluno, bem como de seus colegas. Neste caso, o mediador escolar pode favorecer interações saudáveis e, quando necessário, intervir em comportamentos que possam prejudicar alguém no ambiente escolar;
Dificuldades de concentração e impulsividade: uma criança com déficit de atenção importante pode precisar de um profissional que possa mediar sua atenção e ensiná-lo a se auto-regular no tempo, com seus materiais, facilitando assim a organização da criança, o planejamento de atividades e a antecipação das possíveis reações, como controle da impulsividade, eventualmente;
Dificuldades de leitura: Nestes casos, o mediador ajuda os estudantes a rever informações sobre trabalhos ou relatórios, aulas de revisão de classe. Compartilha leituras, para que não haja sobrecarga na tarefa. Organiza a produção da escrita, quando a dificuldade prejudica muito a expressão de seus pensamentos. Seguindo a orientação do professor de turma, busca antecipar situações oferecendo outros recursos (vídeos, fotos, experiências), para que estes não dependam exclusivamente da leitura, criando experiências diferenciadas sobre os mais variados assuntos. Adaptações de materiais podem ser importantes também. Além disso, o mediador pode aproveitar diversas situações do cotidiano escolar para estimular as habilidades necessárias para alfabetização;
Dificuldades no ensino fundamental II e ensino médio: nesta etapa escolar, o mediador muitas vezes se especializa em um assunto específico, como o Inglês ou Ciências. Ele é muitas vezes responsável por projetos especiais e pelo preparo de materiais e equipamentos específicos para determinadas disciplinas ou conteúdos;
Dificuldades na comunicação e interação: A estimulação de linguagem e da interação no ambiente privilegiado da escola visa não somente estimular a fala, como também tem o objetivo de desenvolver e promover a competência comunicativa e interacional. Comumente, este tipo de abordagem produz um efeito no comportamento geral, uma vez que o desenvolvimento da comunicação favorece as relações, bem como a organização do mesmo.
Não há uma etapa escolar restrita que precise de mediador, e sim uma demanda do aluno.
SUGESTÕES GERAIS: DIFICULDADES NA COMUNICAÇÃO E INTERAÇÃO
Em relação ao último tópico, dificuldades na interação e na comunicação, o papel do mediador escolar vem no sentido de funcionar como intermediário nas questões sociais e de linguagem. O objetivo é ensinar para a criança com características desta natureza a como participar das atividades sociais, como se relacionar com crianças da sua idade e no esclarecimento do que se espera dela em cada situação14.
A possibilidade de considerar o foco atencional do outro, ou seja, seus interesses e chamar a atenção do outro para objetos ou assuntos de interesse mútuo constituem importantes capacidades para a aquisição e o desenvolvimento da linguagem, de habilidades sociais e das relações sociais. O seu aprimoramento permite o uso dos gestos, o contato físico e a linguagem para deliberadamente influenciar e dirigir o comportamento do outro durante a comunicação. Essas habilidades também possuem uma forte relação com a possibilidade de interpretar e compartilhar emoções e intenções levando em consideração experiências anteriores não só relacionadas a eventos como também em relação a temas de conversação15. Compartilhar a atenção, dividir emoções e expressar suas intenções facilitam o engajamento no processo de comunicação social recíproca.
A comunicação não envolve somente o uso da linguagem com função regulatória, ou seja, o uso do outro apenas para atender às suas demandas ou com a função de protesto por meio do choro. O compartilhar da atenção propicia o uso da comunicação com propósito social, utilizando o apontar para dividir opiniões e interesses sobre determinado objeto. Para crianças que já adquiriram a linguagem, dividir a atenção com o outro garante o suporte para uma comunicação efetiva (ou bem sucedida) sobre eventos já ocorridos ou futuros permitindo que a criança considere o que é novo, interessante e importante para o seu par interacional. Tal escolha deve ser baseada no foco atencional do ouvinte, seu interesse e conhecimentos prévios15. Essas ações permitem que durante a interação o indivíduo consiga alternar o olhar entre objetos e seu par, com objetivo de monitorar os interesses do interlocutor e assim conseguir manter reciprocidade na comunicação. A atenção compartilhada traz efeitos na comunicação ao orientar e adequar o comportamento e a linguagem a um padrão social. Por meio do contato visual com o outro, a criança pode adequar o próprio comportamento em virtude do foco de atenção e dos interesses de seus pares.
Dentro deste pressuposto, é importante para a criança em desenvolvimento poder dividir suas emoções, buscar a atenção do outro para compartilhar opiniões e experiências, desenvolver a comunicação recíproca. Também se faz fundamental dividir a intenção e ganhar a atenção do outro na comunicação por meio do uso adequado da linguagem não verbal (expressão facial, gestos, entonação da fala), desenvolver a habilidade de perceber e reparar quebras ou falhas na comunicação, aumentar a gama de funções comunicativas da linguagem, principalmente aquelas que tenham como objetivo as trocas sociais, como por exemplo, dividir e comentar experiências e emoções. Inferir os estados mentais e emoções do outro, selecionar o tópico verbal apropriado, promover as informações suficientes para dar suporte ao diálogo, conseguir fazer uma leitura adequada das expressões faciais e responder de maneira adequada ajustando o seu próprio comportamento também são habilidades importantes a serem desenvolvidas.
Pretendemos oferecer uma série de ideias nas próximas linhas, sem perder de vista alguns aspectos relevantes. Ao atuar com as crianças com transtornos de linguagem, o mediador poderá favorecer as interações sociais. As interações são fundamentais para a construção dos processos mentais superiores. A transformação de processos mentais elementares em funções superiores ocorre por meio das atividades mediadas16. Sendo assim, o mediador poderá incluir a criança no cenário da interação, sendo o elo entre a criança e seus pares e, ao mesmo tempo, irá traduzir a leitura social para a criança. Estimular a comunicação e a interação social são ferramentas básicas para promover a inclusão destas crianças.
Por esse aspecto, ter um mediador propiciando a aquisição de linguagem e das habilidades sociais no cotidiano escolar amplia a possibilidade da quantidade de estímulo recebido, como também a qualidade, já que a estimulação sempre ocorrerá em situação real de uso, diferente do que se pode proporcionar num consultório. O mediador favorece, por meio da interação, que a criança desenvolva a leitura e ajuste ao contexto social, aprenda a brincar e a fazer amigos, aprenda a mudar o turno nas situações dialógicas, ensina formas convencionais de comunicação, melhora a compreensão da linguagem. Nas crianças que começam a falar tardiamente, facilita o desenvolvimento de vocabulário expressivo durante as rotinas e atividades diárias, expandindo-o.
Outro cuidado que é digno de nota é o da aplicação de dicas sem conhecer a natureza das dificuldades que estão por traz, o que é insuficiente e até arriscado. Estar capacitado naquela área, a fim de que comportamentos ou produções verbais que parecem sem sentido possam ser significados: essa é uma condição indispensável para poder lançar mão das sugestões de forma consciente e produtiva. A escola e o professor devem basear sua prática a partir da compreensão dos diferentes aspectos relacionados a problemas de interação social, interesses restritos e comunicação13.
As sugestões a seguir foram baseadas em diversas fontes7,14,17-34, bem como na prática clínica. A separação em subitens nas seções subsequentes tem somente a função de organizar didaticamente para a leitura os objetivos e metas a serem atingidos por meio das ações propostas. A interrelação entre todos é plena. Vale realçar que são apenas sugestões que só têm função se aplicadas com coerência, conhecimento, bom senso e individualização.
Estimulação da comunicação
Como já referendamos anteriormente, uma comunicação bem sucedida previne problemas comportamentais que possam interferir com o aprendizado e o desenvolvimento de relacionamentos sociais. A capacidade de estabelecer e manter a demanda de atenção durante a comunicação entre pares influencia diretamente no desenvolvimento de habilidades conversacionais. Então, o uso adequado de gestos, da linguagem simbólica, a habilidade para reconhecer e reparar quebras ou falhas na comunicação e responder às dicas do contexto e interpessoais devem fazer parte do repertório de estimulação para melhora da comunicação. Neste sentido que o mediador consegue ampliar e qualificar os aspectos comunicativos no ambiente escolar. É bem documentado na literatura que o melhor prognóstico de indivíduos com dificuldades de interação, comunicação e interesses restritos está intimamente relacionado com sua competência linguística e comunicativa29.
Alguns aspectos que deverão ser estimulados:
Desenvolvimento da comunicação espontânea e funcional;
Aumento do contato visual, reconhecimento das expressões faciais e seus significados;
Desenvolvimento da reciprocidade social, verificando se a comunicação foi efetiva, assim como repará-la e persistir no ato comunicativo;
Estimulação da imaginação e do simbolismo;
Atribuição de significado às estereotipias;
Melhora da compreensão;
Estimular sempre o apontar e o direcionamento do olhar da criança para aquilo ou para quem está falando;
Estimular a imitação de movimentos, sons e atitudes;
Estimular a "triangulação do olhar", que significa olhar para pessoa e para o objeto, alternadamente, fechando os vértices de um triângulo com o olhar;
Traduzir ou complementar as informações auditivas com informações visuais através de fotos, objetos ou figuras;
Utilizar fotos de pessoas, locais ou situações para ajudar a criança a compreender o que vai acontecer (antecipação);
Utilizar informações verbais curtas, ou seja, partir as informações em frases pequenas e objetivas;
Ajudar a criança a modificar seu discurso utilizando a primeira pessoa, quando esta não o faz;
Ajudar a criança a organizar seu discurso com lógica e clareza;
Ajudar a criança a utilizar os turnos de diálogo, respeitando a vez de cada um na comunicação verbal, fazendo-a perceber os marcadores para iniciar ou terminar uma conversa;
Dirigir a atenção da criança para quem se fala ou para as atividades que estão sendo utilizadas na sala de aula;
Ensinar a criança a perceber a linguagem corporal, apontando o comportamento corporal do outro como modelo ou o seu próprio;
Ensinar a criança a perceber as emoções. Pode-se utilizar recursos visuais de expressão facial, ensinando a criança a detectar pistas que indiquem as emoções;
Auxiliar a criança na compreensão de comentários do amigo, sem que aconteça um mal entendido;
Explicar o sentido de metáforas e expressões idiomáticas;
Fazer uso de assuntos que fazem parte do interesse restrito como parte motivacional e inicial da conversação;
Favorecer a diminuição do uso de sons e emissões verbais não convencionais, como as estereotipias verbais, a ecolalia (imediata ou remota) e as perguntas incessantes, podendo atribuir significado aos mesmos;
Responder a qualquer som que a criança faça;
Usar gestos apropriados, tom de voz, linguagem corporal para acentuar as emoções;
Usar agendas de visualização e esquemas de atividades com figuras ou palavras, rotina diária e sequência de figuras na área de trabalho para definir a sequência de atividades, auxiliando a linguagem bem como o comportamento;
Manter a atenção da criança voltada para as ordens e informações dirigidas pela professora;
Nos momentos livre de pátio e recreio, proporcionar melhor comunicação entre as crianças, direcionando para a interação e fazendo leituras de comportamentos para que a criança saiba como agir junto aos outros amigos.
Comportamento e socialização
As crianças que apresentam dificuldades de comportamento e socialização são geralmente vistas como excêntricas e bizarras por seus colegas. Elas têm dificuldade de entender sobre as relações humanas e as regras e convenções sociais. Podem ser ingênuas e não compartilham do senso comum. Sua rigidez gera dificuldade em gerir a mudança e as tornam mais vulneráveis e ansiosas. Muitas vezes não gostam de contato físico. Se a situação for mal manejada, podem acabar exploradas e ridicularizadas por outras crianças. No entanto, elas querem ser parte do mundo social e ter amigos, mas não sabem como fazer para se aproximar35. Então, mediar neste caso significa:
Proporcionar segurança e confiança nas relações adulto/criança. Um bom engajamento afetivo abre as portas para interação;
Ensinar a criança a como participar das atividades sociais, a como se relacionar com outras crianças e o que se espera dela em cada situação;
Minimizar a tendência ao isolamento social, facilitando sua interação;
Ensinar a criança a como abordar o outro na tentativa de interação;
Minimizar comportamentos inadequados e repetitivos;
Desviar a atenção da criança em relação às manias, rituais e atividades repetitivas e estereotipadas;
Intervir nas reações comportamentais drásticas diante de mudanças na rotina ou no ambiente escolar, contextualizando a situação;
Ensinar a criança a olhar para o grupo e a observar o comportamento das outras, estimulando assim a imitação. O mediador pode direcionar o olhar da criança, apontando, virando delicadamente o rosto da criança ou falando baixinho ao seu ouvido;
Observar o comportamento livre da criança e tentar antecipar as inadequações, prevenindo;
Minimizar e intervir nas situações de desconforto sensorial, ensinando a criança a se acalmar, caso necessário, levando-a para outro ambiente;
Usar histórias ou representações pictóricas (com desenhos esquemáticos) para explicar soluções e possibilidades de ações em situações sociais difíceis (cortar cabelo, dentista...) ou todas as vezes que a criança tiver reações exacerbadas de birra;
Estimular a empatia, o vínculo e o prazer do convívio social;
Encorajar a criança a solicitar ajuda da professora e dos colegas;
Controlar o acesso a objetos ou matérias que dispersem ou façam parte do interesse restrito da criança e, consequentemente, o afaste do grupo ou das atividades;
Aproveitar o interesse restrito para aproximá-lo das situações sociais, sendo uma fonte motivadora inicial do contato e interação;
Organizar a sequência de atividades da criança visualmente por meio de fotos, gravuras, ou por escrito, visando antecipar concretamente os fatos e, consequentemente, diminuindo a ansiedade dela;
Utilizar relógio e calendário para que a criança aprenda a controlar seu tempo e entenda o que significa intervalo de tempo e sequência dos dias da semana e mês;
Em situações reais de interação, ensinar a criança a se colocar no lugar do outro, refletindo sobre os sentimentos e pensamentos das pessoas, exercitando assim a empatia;
Após uma situação de conflito, rever a situação com a criança, refletindo sobre seu comportamento. Pode-se usar para isso, desenho esquemático em sequência, como se fosse história em quadrinhos. Neste mesmo sentido, estimular a criança a pensar em situações alternativas de solução do conflito;
Ensinar habilidades sociais, tais como: se apresentar, cumprimentar as pessoas, despedir-se, pedir algo ou comprar alguma coisa;
Dar reforço positivo sempre que houver êxito nas ações da criança, ou seu comportamento apresentar-se adequado;
Ignorar, sempre que possível, os comportamentos inadequados que a criança apresente. Se não for possível, corrigir ou redirecionar;
Sempre dizer o que espera do comportamento da criança em cada situação problema;
Auxiliar e promover a autonomia, iniciativa e compreensão da criança a respeito daquilo que ela está fazendo ou necessita fazer;
Fornecer um ambiente seguro. Minimizar intrusões inesperadas de estranhos à sala de aula, ou inexplicáveis ruídos repentinos;
Minimizar as transições. Um tempo de transição de uma atividade para outra pode ser experimentada por alguns como um período onde não há registro exato. Eles estão agitados porque não sabem o que fazer, ou como se comportar;
Proporcionar uma rotina diária. A criança precisa entender cada rotina e predizer a ordem em que isso ocorre para se concentrar na tarefa. Isso tira a vontade de saber o que ele ou ela será "depois". Certifique-se de lado para cumprir as rotinas estabelecidas;
Evitar surpresas, preparar a criança com antecedência para eventos especiais, mudanças de horários ou outras alterações na rotina;
Tentar reduzir os temores e gradualmente expor crianças a novas atividades, a apresentar um novo professor, um novo local de trabalho. Informá-los com calma o que está à frente pode evitar medos obsessivos;
Alunos novos se beneficiarão enormemente com a presença de um mediador escolar a partir da entrada em classe. É sensato pensar que prevêem atendimento com antecedência, o que limita a ocorrência de birras nos estágios iniciais de adaptação da criança e, assim, reduz o risco de rejeição por parte de outras crianças, e frustração para o professor;
Auxiliar o grupo no qual a criança esteja inserida a não valorizar, ou a ignorar movimentos estereotipados ou outros comportamentos inadequados que a criança realize;
Atuar no momento de entrada e saída da escola, direcionando a criança ao grupo, favorecendo um comportamento contextualizado (estimular cumprimento, seguir os outros na fila...);
Para crianças mais velhas, ensinar outros alunos quais são as mudanças sociais, descrevendo os problemas sociais do seu companheiro como verdadeiras dificuldades. O fornecimento de informações, promovendo a empatia e a tolerância de outras crianças que podem impedir mal entendidos;
Concentrar-se no conhecimento do aluno, a fim de criar situações cooperativas de ensino em que os pontos fortes da criança, como a leitura, o vocabulário, a memória possam ser observados por outros estudantes do grupo. Esta abordagem irá aumentar a auto-estima da criança que está se esforçando para integrar e conduzir a uma maior aceitação entre os outros alunos;
Muitas dessas crianças querem amigos, mas não sabem como interagir. Devemos ensiná-los a responder aos estímulos sociais e fornecer um repertório de respostas para ser usado em diferentes situações sociais. Ensine a criança a dizer-lhes e como dizê-las;
O julgamento social dessas crianças muitas vezes só melhora quando as suas regras são aprendidas. Não tenha medo de ser explícito: as crianças estão se esforçando para ir além das aparências, sua compreensão de situações sociais geralmente é imatura e muito prática;
Ensinar a perspectiva e pensamentos dos outros usando jogos dos papéis encenados pelas pessoas e jogos de instrução; estimular a criança a parar e refletir sobre como a pessoa se sente antes dela falar;
Alguns alunos podem se beneficiar de um sistema de tutoria. O professor pode ligar a criança a outro aluno de sua classe de modo a incluir a criança nas atividades escolares. Há crianças que são especialmente sensíveis para exercer esse papel, o que chamamos de mediadores naturais.
Jogos e brincadeiras
Além da função comunicativa, a linguagem possui funções cognitivas, atuando na resolução de problemas, no planejamento da ação, na regulação do comportamento e do estado emocional. O simbolismo se refere à compreensão da comunicação gestual, das palavras, da linguagem figurada e da possibilidade de se engajar em brincadeiras que envolvam a imaginação e o uso não convencional de objetos, este último corresponde ao jogo simbólico36. As dificuldades no desenvolvimento do simbolismo podem ser encontradas em crianças com dificuldades sociais e apresentam íntima relação com o desenvolvimento da linguagem. O desenvolvimento do simbolismo deve seguir uma escala de complexidade. Por exemplo, comportamentos pré-simbólicos como alguns tipos de gestos devem ser estimulados antes do uso de sistemas de comunicação com figuras, que são consideradas habilidades quase simbólicas.
Além do jogo simbólico, as crianças com dificuldades de interação social também devem ser estimuladas para o jogo livre. Uma vez que conseguem realizar tais jogos com autonomia, eles deixam de ser um risco para a própria criança, e deixam de ser atividades solitárias e ritualizadas. Devemos estimular a criança a brincar com uma ou duas crianças sob supervisão, a fim de oferecer a oportunidade a desenvolver suas habilidades sociais.
A estimulação poderá focar:
Aumento do uso de gestos associados com a emissão verbal;
Uso de gestos convencionados socialmente (exemplo: balançar a cabeça negativamente);
O interesse diversificado por brinquedos, ensinando a criança a como brincar de forma convencional e funcional;
O uso da fala durante a brincadeira, dando sentido às ações e dizendo o que está acontecendo na brincadeira;
Para uma abordagem inicial, imitar a forma de brincar da criança e aos poucos propor mudanças na sua brincadeira, ensinando-a a ser flexível;
A possibilidade de compreender a finalização de jogos: ganhar e perder;
A compreensão dos colegas, para que estes visualizem que às vezes é difícil para o amigo compreender que perdeu o jogo, mas que nem por isso a criança deixou de ser legal, e que não vai querer brincar outras vezes;
A busca de ideias de interação e brincadeiras observando o comportamento das outras crianças, pois estas são mediadores natos e naturais;
Brincadeiras sensoriais como pular, fazer cócegas, balanço;
O uso de brinquedos com causa e efeito (esconda e deixe aparecer depois como mágica; faça cócegas com uma pena ou com algo delicado para estimular os sentidos);
A brincadeira de ping-pong usando a verbalização;
Jogos competitivos que envolvem convenções sociais, difíceis de serem compreendidas e aplicadas por crianças com dificuldades sociais.
Tarefas de apoio pedagógico
Considerando-se o currículo como uma base para atuação do professor, e não uma prisão para ele e seus alunos, cabe inicialmente discutir seus modelos. Deixando para trás um modelo fechado, que engessa e parte do pressuposto de que todos aprendem da mesma forma37, abre-se a perspectiva de um currículo aberto, que orienta, mas considera as diferenças individuais, o contexto, a interdisciplinaridade. Para ensinar na diversidade, essa flexibilização se torna uma máxima. Partindo-se do pressuposto de que o currículo deva necessariamente estar vinculado ao projeto político pedagógico da escola, trabalhar verdadeiramente com o aluno em sua diversidade deve ser uma filosofia, uma política e uma prática institucional. Esta concepção de currículo é compatível com a filosofia de se educar na diversidade. O projeto curricular, neste prisma, deve considerar o movimento da escola para atender às diferenças individuais, à identificação das necessidades educacionais especiais, visando ao planejamento, propostas curriculares diversificadas, flexibilidade na organização e funcionamento da escola.
Solicitar no início do ano o calendário escolar e planejamento semanal pedagógico da turma;
Conhecer o projeto pedagógico e método de aprendizado da escola que a criança está inserida;
Adaptar, sempre que necessário, e com a orientação da professora e da equipe terapêutica, o planejamento pedagógico para a criança;
Antecipar as atividades a serem realizadas na sala de aula com esquema de fotos, figuras ou por escrito;
Ensinar a criança a pedir ajuda ao professor quando não estiver entendendo determinada tarefa;
Ser capaz de improvisar recursos para a criança conseguir executar as tarefas, ou oferecer a tarefa em partes para que seja possível o raciocínio autônomo da criança;
Junto à equipe escolar e terapêutica, adaptar as avaliações e provas, mesmo que seja conteúdo, ou formatação ou quantidade de exercícios;
Motivar o desempenho da criança sempre, estimulando-a a persistir e a manter a atenção na tarefa;
Buscar temas do seu interesse que possam ser utilizados como recursos para atingir um determinado objetivo pedagógico;
Desenvolver memória de informação factual e trivial através de jogos;
Praticar a reflexão sobre estratégias alternativas e aprender a pedir ajuda - flexibilidade do pensamento;
Leitura, soletração, cálculo - observar se e quando a criança está utilizando uma estratégia não convencional e auxiliá-la a compreender o processo realizado;
Pensamento visual - encorajar visualização usando diagramas e analogias. A aprendizagem visual é frequentemente melhor;
Modificar estruturas de perguntas de interpretação de textos;
Buscar recursos extras em DVDs ou jogos para conteúdos que serão desenvolvidos;
Escolher os conteúdos mais relevantes para serem trabalhados. Ações devem envolver os alunos no mundo real; isso vai constituir oportunidades para a participação ativa, dirigir seus aprendizados, proporcionar desafio;
Usar grupos flexíveis. Os grupos devem ser baseados nos objetivos, interesses, necessidades e habilidades. Agrupamento de alunos com necessidades semelhantes e diferentes necessidades devem ter lugar, conforme o caso, para permitir aos estudantes a compartilhar e ensinar uns aos outros;
Usar uma ampla variedade de materiais. Alguns alunos podem apresentar dificuldade no uso de materiais "tradicionais" de ensino. Usar uma grande variedade de materiais oferece mais chances de ser bem sucedido;
Misturar formatos das atividades propostas, favorecendo alunos que aprendem de forma diferente;
Flexibilizar avaliações. Os testes tradicionais podem ser problemáticos para muitos estudantes, e o mediador poderá refletir com o professor sobre a maneira mais adequada o aluno em questão.
LIMITES E CUIDADOS DA MEDIAÇÃO ESCOLAR
Como em todas as experiências novas, conflitos e falhas acontecem, e devem ser tomados como base para uma aprendizagem. Portanto, serão compartilhadas situações que podem ser geradoras de estresse se não devidamente gerenciadas:
Individualização
A singularidade é uma questão central na compreensão do desenvolvimento infantil. Esta premissa requer dos profissionais um trabalho individualizado. Cada criança tem diferentes necessidades educacionais, cada um deles tem pontos fortes e desafios diferentes, valores, interesses pessoais e personalidade única. Além disso, os sintomas encontrados se manifestam de forma diferente. Portanto, não é possível estabelecer uma receita única para trabalhar. O que funciona para um, talvez não seja tão útil para outra criança. Conhecer o aluno que será acompanhado pela mediação, discutir com a equipe pedagógica da escola e com a equipe de apoio terapêutico são pontos fundamentais para atender à necessidade específica e assim alcançar os objetivos estabelecidos pela equipe.
Relação mediador - família
O Mediador, por acompanhar de perto o desenrolar da escolarização, deve ter especial atenção ao reportar aos pais sobre os fatos mais importantes ocorridos na sala de aula e no ambiente escolar. Este compartilha de informações não deve perder de vista que o objetivo principal é verificar quais foram as situações mais favoráveis de estimulação para aquela criança e possibilitar a sua generalização no ambiente doméstico. As estratégias de estimulação e intervenção pedagógicas que não forem bem sucedidas devem orientar futuras tentativas/intervenções e somente servir para tal propósito. Em hipótese alguma o mediador escolar deve perder de vista a ética das informações que deve passar à família. As impressões pessoais e sugestões no tratamento, por exemplo, devem ser discutidas com toda a equipe. Somente informações pertinentes ao desenvolvimento da criança, em concordância com a escola e terapeutas, deverão ser repassadas.
Mesmo considerando uma boa relação entre mediador e família, uma grande confiança no trabalho deste profissional, ampliar os momentos e ambientes em que o mediador vai trabalhar pode ser uma grande armadilha. Se o objetivo deste profissional é trabalhar em situação de interação e aprendizagem em tempo real, aproveitar um tempo livre da criança em sua própria casa pode confundi-la, prejudicando a atuação no retorno ao ambiente escolar. Por este motivo, normalmente, a priori, é contraindicado.
Relação mediador - aluno
Não se pode perder de vista que o objetivo maior do mediador escolar é promover o desenvolvimento da criança, que precisa de um suporte adicional no ambiente natural de aprendizagem. Portanto, posturas de superproteção ou a atuação como cuidador são ineficientes e não condizem com a proposta da mediação. O profissional deve, sempre em parceria com o professor, saber quando o apoio deve ser mais diretivo, a hora que deve se afastar visando à autonomia. É importante também saber identificar o momento em que um outro aluno pode ser incentivado a assumir momentaneamente esse papel.
Outro problema ético considerado grave nesta relação é a saída do profissional antes do fim do ano letivo. Mudanças constantes de mediadores escolares trazem prejuízos importantes para o desenvolvimento da criança que precisa de um vínculo estável nesta função, como também desorganiza o ambiente escolar. O mediador não pode esquecer que também há vínculos criados com os demais alunos da turma, que ele faz parte da rotina deles. Assumir a mediação é assumir um ano letivo de trabalho, já que o seu desligamento pode provocar uma recusa da escola em aceitar submeter toda a turma à adaptação de um novo adulto em sala de aula, o que comprometerá o desenvolvimento da criança, a relação da família com a escola e da família com os outros pais de alunos.
Relação mediador-professor-escola
O professor da classe é o responsável por organizar as ações de todos os seus alunos, inclusive do que precisa, ao menos momentaneamente, de um mediador escolar. O mediador atua em parceira com a escola com objetivo de compartilhar conhecimento. Quanto mais os profissionais que assistem a criança estiverem preparados, maior será o desenvolvimento dela e, consequentemente, o êxito profissional daqueles que nela investem. Além disso, a atuação do mediador também diz respeito a atividades que favoreçam a interação do professor com aquela criança. Ter outro adulto na turma atuando com uma criança especifica, não exclui o professor da relação com seu aluno. O mediador deve estar apto a orientar o professor com estratégias que favoreçam o comportamento interativo com o aluno. O mediador não pode esquecer que a turma, incluindo a criança que ele atua, tem um professor para conduzi-la. É fundamental ter sensibilidade para que o professor não se sinta invadido, mas que ele entenda o mediador como um parceiro profissional que entrou na turma dele para somar.
Uma pesquisa que visou estudar o papel dos mediadores escolares evidenciou que aqueles que estavam engajados com o planejamento escolar e que concebiam o professor da turma como um parceiro de trabalho eram os que atingiam práticas mais efetivas de inclusão38.
Relação família-escola
A inserção do mediador no ambiente escolar tem, dentre outros objetivos, facilitar a aprendizagem e a aquisição do conteúdo pedagógico. A família, principal interessada no pleno desenvolvimento daquela criança, aspira pela apreensão de conhecimento por parte do aluno e pode, em alguns momentos, questionar determinados objetivos pedagógicos elencados pela equipe da instituição de ensino. Devemos ter cautela nessas situações, pois a equipe pedagógica da escola possui o conhecimento específico necessário para identificar quais serão os objetivos adequados a cada seriação. A parceria é necessária. Se são as famílias os que conhecem seus filhos no dia a dia, os especialistas na área estão na escola e devem ser respeitados em seu papel. Portanto, esta troca, envolvendo também a equipe terapêutica de apoio, é que vai favorecer a adaptação necessária ao desenvolvimento da criança.
Outro ponto a ser discutido é quanto à frequência do mediador na escola. Nem sempre a lógica "quanto mais, melhor" funciona nestas circunstâncias. Há de se considerar o momento da criança, a autonomia adquirida, os tipos de aula propostos em cada dia. Portanto este é mais um ponto a ser definido em função de cada aluno.
Relação escola-outras famílias
A presença de um profissional na sala de aula para determinado aluno com o objetivo de realizar intervenções específicas pode soar estranho para muitos pais que desconhecem os entraves que podem ocorrer no desenvolvimento infantil. O papel do mediador só é justificável na medida em que suas funções são compreendidas e tal esclarecimento deve ser feito a todos os pais daquela classe ou escola. Esse esclarecimento dilui futuros questionamentos para que a presença do mediador não gere mal-estar entre os pais. Ademais, inclusão é um movimento útil não somente para crianças com necessidades educacionais especiais, mas para todo cidadão em formação, em busca de uma sociedade mais justa. Por meio dos filhos, os pais de outras crianças podem aprender a se despir de preconceitos, compreendendo que nem todos precisam do mesmo tipo de ajuda.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A educação inclusiva é um "estudo de caso", o que significa dizer que cada caso é único. Não se pode perder de vista a singularidade do sujeito, seu momento, nem sua história construída na família e continuada na escola. Tanto os pais, quanto os profissionais (professores, mediadores e terapeutas) devem estar cientes que a heterogeneidade daqueles que são auxiliados pelos programas de mediação precisa ser levada em consideração quando tratamos das expectativas de evolução.
As crianças devem ser comparadas com elas mesmas, avaliando quais habilidades foram desenvolvidas num determinado espaço de tempo. Portanto, apesar de apresentarmos uma gama de sugestões para favorecer a adaptação da criança ao ambiente escolar e do ambiente escolar à criança, é fundamental que todos os envolvidos no processo tenham conhecimento e sensibilidade para identificar o que é específico para cada aprendiz.
Todos os programas de mediação devem partir do nível em que a criança se encontra e, uma vez que não se observem progressos, o programa deve ser ajustado. Os procedimentos realizados em sala de aula e/ou os ganhos em ambiente terapêutico devem ser implementados em uma variedade de ambientes sempre que possível (em casa, na comunidade, no parquinho) para que as conquistas sejam generalizadas. E, para que as estratégias planejadas sejam efetivas, é fundamental que a criança seja estimulada a ter autonomia dentro de suas possibilidades e que se sinta motivada.
Replicar experiências anteriores ou enquadrar crianças em soluções pré-moldadas podem ser estratégias pouco eficientes. O mediador deverá ser capaz de criar condições favoráveis e eficazes para que as capacidades da criança possam ser exploradas ao máximo, não no sentido de eliminar problemas, mas sim de aproveitar as situações e experiências que possam facilitar e incrementar o desenvolvimento e a aprendizagem da mesma.
O ajuste dos materiais, das propostas e do ambiente pode ser muitas vezes essencial para o bom andamento da escolarização formal. Prevenir situações estressantes ou intervir no momento certo pode ser determinante para o investimento que aquele aluno fará em suas aprendizagens e relações. Quando uma criança com dificuldades sociais é exposta a estímulos sem a devida intervenção, por exemplo, pode se tornar ansiosa e tensa por causa da saturação de informações que podem lhe parecer sem função. Pode não conseguir se organizar para aprender, desestruturando a si própria como também sua sala de aula, comprometendo o desenvolvimento da turma como um todo. Do mesmo modo uma criança com dificuldades importantes na motricidade fina e escrita pode se recusar a realizar algumas tarefas e apresentar birra ou comportamentos não esperados diante de grande quantidade de cópia em tarefa de sala de aula.
Apesar da figura do mediador ser considerada uma adaptação no espaço pedagógico, portanto garantido pela lei, não existe muita clareza quanto o papel e as atribuições deste profissional, o que pode dificultar que a criança obtenha esse benefício. Para que fiquem claros os objetivos e funções deste profissional tão importante, trabalhos científicos sobre este tema precisam ser desenvolvidos. Um dos próximos desafios também está na regulamentação dessas ações e capacitação sistemática e didática dos profissionais, para que possam se desenvolver de uma forma responsável, sem correr o risco de cair no descrédito com condutas inadequadas e ações genéricas.
É relevante dizer, mais uma vez, que todos os envolvidos na inclusão (escola, família, professores, terapeutas e mediadores) precisam trabalhar em consonância, a fim de suprir a necessidade educativa daquela criança, favorecendo a conquista dos objetivos traçados por toda equipe.
Este artigo não tem a pretensão de esclarecer todas as questões que envolvem a mediação escolar, mas se apresentar como um ponto de partida para futuras experiências e reflexões, tendo em vista que a bibliografia no assunto ainda é incipiente, especialmente no português.
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Correspondência:
Renata Mousinho
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E-mail: renatamousinho@ufrj.br
Artigo recebido: 1/2/2010
Aprovado: 13/4/2010
Trabalho realizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ.