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Revista Psicopedagogia

versão impressa ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.30 no.91 São Paulo  2013

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Identificação do desempenho acadêmico e comportamental de crianças com dificuldade de aprendizagem para participação em um programa de consultoria

 

Identification of academic and behavioral performance of children with learning difficulties to participate in a consultation program

 

 

Andréa Carla MachadoI; Maria Amelia AlmeidaII

IDoutoranda em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e University of Georgia (UGA), E.U.A. Bolsista FAPESP
IIProfessora Doutora Titular do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos, SP, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A consultoria colaborativa configura-se como um modelo de colaboração entre o professor regente e profissional da educação especial, onde nessa parceria promove assistência aos professores do ensino regular e serviços indiretos para os alunos com necessidades. Nessa perspectiva, as dificuldades acentuadas de aprendizagem relacionadas a leitura, escrita e matemática têm sido de grande interesse para a Educação Especial, pois problemas nessa área podem afetar a inclusão social e, consequentemente, produzir impacto negativo no aluno e no seu comportamento. Nessa direção, a consultoria colaborativa torna-se relevante para auxiliar nesse processo. Assim, o presente estudo objetivou identificar o desempenho acadêmico e comportamental de crianças com dificuldade de aprendizagem para participação em um programa de consultoria colaborativa. Participaram desse estudo quatro crianças pertencentes ao quinto ano do ensino fundamental, de ambos os gêneros, com média de 10 anos de idade (DP = 0,52), com dificuldade de aprendizagem, bem como de comportamento, pertencentes à escola pública municipal de uma cidade do interior paulista. Para verificar o desempenho das crianças foram utilizados os instrumentos: Teste do Desempenho Escolar (TDE) e Escala de avaliação do comportamento infantil para o professor (EACI-P). Os dados foram analisados de acordo com os critérios específicos de cada instrumento e aplicada análise descritiva. Os resultados evidenciaram que as crianças apresentaram resultados no desempenho escolar aquém para sua faixa etária e escolaridade, e também obtiveram escores anormais nas variáveis referentes ao comportamento. Tais resultados demonstraram que é necessário o investimento em protocolos de identificação tanto para o desempenho acadêmico como para os comportamentos observados em sala de aula, pois ambas as variáveis estão presentes no processo de aprendizagem. Dessa forma, as crianças compuseram o quadro de alunos que participaram do programa de consultoria colaborativa.

Unitermos: Transtornos de aprendizagem. Comportamento. Instituições acadêmicas.


ABSTRACT

Collaborative consultation appears as a model of collaboration between the professional teacher and special education, where in this partnership promotes assistance to regular education teachers and indirect services to students with needs. In this perspective, the sharp learning difficulties related to reading, writing and mathematics have been of great interest to special education because problems in this area can affect the social inclusion and, therefore, produce a negative impact on student and in their behavior. In this direction, the collaborative consultation becomes relevant to assist in this process. Thus, the present study aimed to identify the behavioral and academic performance of children with learning difficulties to participate in a program of collaborative consulting. This study participated in four children belonging to the fifth year of elementary school, of both genders, with an average of 10 years of age (DP = 0, 52) with learning disability, as well as behavior, belonging to municipal public school, an inner city. To check the performance of the children were used instruments: T-test of school performance and EACI-P-child behavior assessment Scale for the teacher. The data were analyzed according to the specific criteria of each instrument and applied descriptive analysis. The results showed that children presented results in school performance short for their age group and educational level, and also had abnormal scores on variables of interest for behavior. These results demonstrated that investment is required in identifying both protocols to academic performance, as well as to the behavior observed in the classroom, because both variables are present in the learning process. In this way, children composed the table of students who participated in the program collaborative consultation.

Keywords: Learning disorders. Behavior. Schools.


 

 

INTRODUÇÃO

A consultoria colaborativa é o trabalho conjunto, onde tanto o consultor (profissional) quanto o consultado (professor regular) compartilham saberes com vistas ao desenvolvimento de uma solução no contexto escolar. Talvez recursos como a consultoria colaborativa só sejam absolutamente compreendidos com uma futura mudança de filosofia em atenção a dificuldades de aprendizagem e comportamento, onde os paradigmas sejam outros e a inclusão possa ser favorecida com recursos e suporte que a tornem definitivamente parte da educação regular. Porém, até que isso aconteça, não é possível continuar desfavorecendo crianças e jovens dos seus direitos de educação, desenvolvimento saudável, igualdade de oportunidade e convivência social1.

Nessa direção, as dificuldades relacionadas a leitura, escrita e matemática têm sido de grande interesse para a Educação Especial, pois problemas nessa área podem afetar a inclusão social e, consequentemente, produzir impacto negativo no aluno e no seu comportamento. Tais aspectos podem produzir grande impacto negativo no desempenho escolar, ocasionando dificuldades de aprendizagem2.

No entanto, as dificuldades de leitura e escrita não deixaram de ser alvo de pesquisas e debates na literatura nacional3. Adicionalmente, com o avanço das pesquisas, as especificidades da aritmética foram sendo também reconhecidas e lançando-se nova luz sobre as questões de avaliação, de ensino, de reabilitação e de prevenção das dificuldades na aprendizagem da aritmética. Na avaliação dessas dificuldades, é fundamental discriminar quando se trata de uma dificuldade natural, que pode ser superada mais ou menos rapidamente, ou quando se trata de uma dificuldade secundária a outros transtornos, tais como problemas sensoriais, neurológicos, emocionais, sociais e/ou educacionais4,5.

Vem-se estabelecendo estudos sobre a dificuldade de aprendizagem, na relação ao código escrito e da matemática, pela aquisição gradual do domínio de redes complexas de conceitos, símbolos e termos dessas duas áreas.

É consensual aceitar que o leitor aprendiz também tem que automatizar o componente "decodificação" baseando-se na fixação das regras que presidem a correspondência grafema-fonema, chegando ao reconhecimento das palavras. Com a idade e a experiência vão sendo adquiridos automatismos, pelo que os leitores passam a reconhecer as palavras diretamente por meio da via visual6.

O processo de aprendizagem da aritmética é semelhante, dado que a primeira tarefa que o aprendiz tem que desempenhar envolve a aquisição de fatos básicos de aritmética. Esse processo de aquisição caracteriza-se por transição de estratégias de procedimentos reconstrutivos, para crescente memorização e automatização de fatos aritméticos.

O aprendiz em aritmética apoia-se, inicialmente, em estratégias de processamento para resolver problemas, assim como a leitura, na matemática, a criança com a idade e o aumento da competência passa a usar a retenção direta de fatos aritméticos frequentes, continuando a usar estratégias de processamento7.

Jitendra et al.8 verificaram que crianças com prejuízos na leitura e na escrita apresentavam problemas em aritmética no nível de tabelas, operações básicas e valor de localização. No mesmo estudo, os autores referiram que a matemática apresenta desafios verbais a todos os alunos, mas principalmente àqueles que têm dificuldades específicas em leitura, na medida em que, tal como nessa disciplina, a Matemática se apoia fortemente na capacidade de compreender e usar símbolos escritos. E, após fazer o levantamento das dificuldades mais evidentes em que ocorrem, associados problemas em leitura e em matemática, esses autores conseguiram caracterizar os sujeitos, evidenciando os cinco tipos de categorias:

  • existe, em ambos os grupos, diferença significativa entre a capacidade de processamento da linguagem escrita e o nível de inteligência;
  • ao nível da expressão escrita, as dificuldades são as mesmas;
  • ambos os grupos fazem confusão entre esquerdo e direito, apresentam dificuldades de sequenciação e de contagem na ordem inversa;
  • revelam ambos os grupos reduzida capacidade de memória de curto prazo, e;
  • apresentam muitas dificuldades na compreensão de tabelas.

Jacob & Loureiro9 salientam que o fato da criança apresentar dificuldade de aprendizagem não pode ser considerado um problema isolado, tendo em vista que o fracasso escolar interfere no desenvolvimento afetivo e compromete processos intrapsíquicos, relacionados à formação da personalidade da criança, acarretando também problemas comportamentais, como já mencionado. Por isso, é necessário proporcionar cuidados especiais a essa criança.

Um dos pressupostos que auxiliam na emissão de comportamentos adequados nas crianças é a competência social e o repertório positivo de comportamento. Entende-se por competência social qualificação, proficiência do desempenho social e se refere à capacidade do indivíduo de organizar pensamentos, sentimentos e ações em função de seus objetivos e valores, articulando-os às demandas imediatas e mediatas do ambiente e repertório positivo de comportamento competências que facilitam a iniciação e a manutenção de relacionamentos sociais que resultam em ajustamento escolar e familiar satisfatório2.

Pesquisas avaliando a relação entre competência acadêmica e problemas de comportamento, por meio da comparação de grupos de crianças, com e sem dificuldades de aprendizagem2, demonstraram que alunos com dificuldades de aprendizagem apresentavam maiores déficits em interações sociais.

Os resultados das investigações de comparação de grupos2,10 sugerem que a promoção da competência social das crianças pode favorecer o desempenho acadêmico. Essa hipótese foi testada mais diretamente em um estudo, no qual se promoveu o desenvolvimento do repertório de alguns comportamentos, por meio de um programa de Treinamento em Habilidades comportamentais, avaliando-se a competência acadêmica e social das crianças no pré-teste e no pós-teste11. Os resultados demonstraram que a promoção do repertório social teve como efeito um aumento do desempenho acadêmico.

Assim, estudos sobre as relações entre essas variáveis são particularmente necessários e relevantes em nosso país, devido à gravidade do baixo desempenho escolar no Brasil11 e à necessidade do uso de medidas para a prevenção e redução das dificuldades de aprendizagem vinculadas a problemas de comportamentos12.

Nessa direção, descobriu-se que o manejo eficiente da sala de aula contribui para aprendizagem na escola. As estratégias de manejo da sala de aula não devem ser negligenciadas, mas uma prioridade do planejamento de estratégias práticas para o ensino inclusivo13.

Assim, o objetivo do presente estudo foi identificar o desempenho acadêmico e comportamental de crianças com dificuldade de aprendizagem para participação em um programa de consultoria colaborativa, bem como identificar alguns aspectos pertinentes entre esses domínios.

 

MÉTODO

Participaram deste estudo, quatro crianças com idade média de 10 anos (DP = 0,52), uma do gênero feminino e três do gênero masculino, que cursavam o 5º ano do ensino fundamental, matriculadas em uma escola municipal de uma cidade do interior do Estado de São Paulo. As crianças participantes foram indicadas, descritas pelas suas professoras regentes como apresentando dificuldades acadêmicas de leitura, escrita e matemática e também problemas comportamentais:

  • Criança 1 (C1): gênero masculino, 9 anos e 6 meses de idade. Segundo a sua professora, a criança apresentava dificuldade na leitura e na escrita, falta de atenção e comportamento desafiante.
  • Criança 2 (C2): gênero masculino, 9 anos e 2 meses de idade. Apresentava, de acordo com indicação da professora, dificuldade em leitura, escrita e matemática, mostrava-se interessado, mas comportamento apático.
  • Criança 3 (C3): gênero masculino, 10 anos e 6 meses de idade. Segundo a professora, apresentava defasagem na linguagem oral (transtorno fonológico), dificuldade na escrita e matemática. Compreensão e interpretação deficitárias devido à atenção e à inquietação motora.
  • Criança 4 (C4): gênero feminino, 10 anos e 1 mês de idade. Gêmea univitelina (irmã sem dificuldade). De acordo com os aspectos apontados pela professora, a criança apresentava dificuldade na leitura, escrita, matemática, além de apatia e timidez, dificultando na interação.

O local de desenvolvimento da presente pesquisa foi as dependências da escola dos participantes, cuja sala tinha espaço físico amplo, arejado e não apresentava problemas acústicos. As sessões de investigação foram realizadas em período contraturno em relação ao período de permanência da criança na escola, cuja duração foi de uma hora para realização de um instrumento referente ao desempenho acadêmico aplicado pela pesquisadora, pois o outro instrumento foi respondido pelas próprias professoras em tempo livre.

Houve anuência dos cuidados para esta publicação, por meio da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido e também aprovado pelo Comitê de Ética para Seres Humanos da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), nas exigências contidas na Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, com o protocolo número CAAE - 4246.0.000.135-10, sob o Número 414/2010.

Instrumentos

A Escala de Avaliação do Comportamento Infantil para o Professor (EACI-P)14 é um instrumento de fácil aplicação ou preenchimento pelo professor, que fornece uma estimativa do funcionamento da criança na escola em relação a cinco dimensões diferentes de comportamento, são elas: Fator I - hiperatividade/problemas de conduta; Fator II - funcionamento independente/socialização positiva; Fator III - inatenção; Fator IV - neuroticismo/ansiedade e Fator V - socialização negativa. A natureza simples do instrumento torna desnecessário qualquer treinamento específico quanto à testagem. A EACI-P é pontuada de acordo com uma escala do tipo Likert, segundo a qual a resposta nenhum=0, pouco=1, razoável=2 e muito=3. Os escores baseados nos fatores da EACI-P são obtidos somando-se resultados de cada um dos itens que compõem cada um dos fatores da escala. O somatório dos itens de cada fator representa o resultado da criança naquele fator. Esse resultado é então utilizado para a obtenção do escore padronizado referindo-se a tabelas para sexo e grupo etário da criança. Há que se frisar que o percentil 90 de um conjunto de dados se refere ao valor que supera 90% das medidas. Assim, os resultados brutos que se situem acima do corte são considerados anormais, à exceção do resultado bruto no Fator II (funcionamento independente/socialização positiva), que é considerado anormal se inferior ao percentil 90.

São sintomas avaliados pelo instrumento conforme os seus cinco fatores/dimensões citados:

  • Fator I - Hiperatividade/Problema conduta: constantemente se mexe (mesmo sentado); emite sons ou ruídos constantemente; pedido tem que ser imediatamente atendido (facilmente frustrável); irrequieto, hiperativo, excitável, impulsivo, mal humorado; perturba colegas; provoca confusões; humor muda drasticamente com rapidez; matreiro, se faz de esperto, destrutivo, mente, tem explosões de raiva, comportamento imprevisível; desafiador, atrevido, excessiva exigência de atenção; provoca outras crianças ou interfere com as suas atividades; teimoso, sempre mudando de atividade, grita em sala; dificuldade em esperar a sua vez, sempre correndo ou pulando, frequentemente responde antes que se complete a pergunta; tem dificuldade em brincar quieto, fala excessivamente, frequentemente interrompe ou se intromete nas atividades dos outros; frequentemente perde objetos de uso na escola e em casa (ex: brinquedos, livros); participa das tarefas que envolvem perigo sem considerar as possíveis consequências, tenta envolver o outro em confusão, começa briga sem nenhum motivo, ridiculariza outro de modo malicioso.
  • Fator II - Funcionamento Independente/Socialização Positiva: trabalha de forma independente, persiste em tarefas por um bom tempo, completa deveres com pouca assistência; segue instruções simples corretamente; funciona bem em sala de aula, executa corretamente uma sequência de instruções, comporta-se bem com os colegas; comunicação verbal clara e concatenada, comunicação verbal não correta, compreende normas e regras sociais; sabe fazer novos amigos, enfrenta situações confiantes.
  • Fator III - Inatenção: desatento, não termina o que começa, dificuldades em se concentrar nos deveres escolares; dificuldades em se fixar em uma brincadeira ou jogo; dificuldades em organizar suas atividades e deveres; muitas vezes parece não prestar atenção ao que está sendo dito a ele.
  • Fator IV - Neurotismo/Ansiedade: extremamente sensível; extremamente sério ou triste; chora com frequência e facilidade; isola-se das outras crianças; submisso, tímido e medroso.
  • Fator V - Socialização Negativa: parece não ser aceito pelo grupo; não tem espírito esportivo; parece não ter liderança; não se relaciona bem com o sexo oposto; não se relaciona bem com a criança do mesmo sexo.

O Teste de Desempenho Escolar (TDE)15 é um instrumento psicométrico brasileiro que avalia as capacidades básicas para o desempenho escolar, nas áreas de escrita, aritmética e leitura. Para as séries avaliadas, tem-se a seguinte classificação para a pontuação de acertos: 3ª série Total (EBT): Superior 113; Médio 102-112 e Inferior a 101 e 4ª série Total (EBT): Superior 32; Médio 112-121 e Inferior 111. O TDE16, que possui normas brasileiras. é composto por três subtestes: a) escrita (nome próprio e ditado de 34 palavras contextualizadas em frases); b) aritmética (solução oral de três problemas e cálculo escrito de 35 operações aritméticas); e c) leitura (reconhecimento de 70 palavras isoladas). Os subtestes de escrita e de aritmética foram aplicados em grupo, por classe escolar. O subteste de leitura foi aplicado individualmente.

Cabe ressaltar o presente texto não objetiva descrever o programa de consultoria colaborativa, somente levantar as necessidades acadêmicas e comportamentais das crianças com dificuldades de aprendizagem, apontando suas associações, para que fossem encaminhadas para tal programa.

Análise dos dados

Os dados foram analisados de forma descritiva, considerando a pontuação obtida em cada instrumento, como, por exemplo, no TDE os resultados foram analisados de acordo com o esperado para cada série, segundo o manual do teste, resultando nas classificações inferior, médio e superior, em cada subteste e no total (soma da pontuação obtida nos subtestes), bem como no EACI-P, os dados também foram analisados e classificados de acordo com as tabelas para corte de sexo e idade, e obtidas suas pontuações.

 

RESULTADOS

Para melhor visualização, os dados encontrados estão descritos, individualmente, por criança, configurando-se como importantes dados qualitativos sobre o desempenho acadêmico e comportamental, e também em duas figuras representando os resultados das pontuações no TDE e na EACI-P.

Na Figura 1, verificamos que, no Fator I, relacionado à hiperatividade e problemas de conduta, o aluno C1 obteve um resultado acima do corte de sexo e idade, o que evidencia apresentar elementos favoráveis referentes a essa conduta, ocasionando possíveis prejuízos acadêmicos, já as outras crianças C2, C3 e C4 apresentaram nesse fator uma pontuação abaixo do corte. No Fator II, referente a funcionamento independente e socialização, todas as crianças avaliadas obtiveram pontuação acima do corte, somente C4 apresentou resultado equivalente ao corte de sexo e idade. Na variável de inatenção, também todas as crianças ficaram com resultados acima do corte, novamente somente C4 obteve pontuação abaixo. No fator relacionado a neurotismo e ansiedade, C2, C3 e C4 apresentaram valores maiores do que o corte para as suas idades e sexo, somente C1 obteve média abaixo do corte. Na última variável, referente a socialização negativa, somente C1 obteve resultado equiparado ao corte, os outros participantes C2, C3 e C4 apresentaram pontuação abaixo.

Na Tabela 1, podemos verificar a classificação e o resultado do TDE dos participantes C1, C2, C3 e C4. É importante salientar que todas as crianças obtiveram a classificação inferior denominada pelo teste, ou seja, todos os participantes apresentaram resultados aquém para sua idade e escolaridade. No entanto, os resultados obtidos entre as crianças foram diversificados e as pontuações totais também variaram de 27 a 88 pontos. Ressaltamos que C2 obteve a menor pontuação em escrita e C4 a menor em matemática e leitura.

 

DISCUSSÃO

As crianças com dificuldade de aprendizagem na matemática, leitura e escrita não formam um grupo homogêneo, pois o conhecimento matemático é constituído de vários componentes. Na visão de Mazzocco17, os obstáculos a essa compreensão têm origem tanto na complexidade da matemática (como, por exemplo, na integração de diferentes sistemas simbólicos) como nos seus correlatos cognitivos: linguagem, atenção, percepção visuoespacial, memória de trabalho, memória de longo prazo, enfim, o funcionamento neuropsicológico como um todo. Assim, a literatura comentada corrobora os resultados encontrados nessa pesquisa.

A maior parte dos problemas na aprendizagem da aritmética17 decorre de falhas nas noções fundamentais de quantidade, grandeza e extensão. Essas noções, construídas dos dois aos seis anos de idade, aproximadamente, resultam do desenvolvimento perceptivo, linguístico e de fatores culturais, e incidem sobre a elaboração da noção de número, que, por sua vez, sustenta todas as aquisições quantitativas e lógicas posteriores18,19. Frequentemente, na escola, essas habilidades não são reconhecidas, nem valorizadas, e as crianças são introduzidas nos cálculos mecanicamente, o que pode justificar o desempenho das crianças participantes dessa pesquisa, pois os resultados obtidos estão aquém da idade e escolaridade. Nessa perspectiva, urge novas formas de ensino relacionadas à matemática, bem como de identificação e monitoramento dessas dificuldades.

Os estudos18,20,21 têm apontado três características principais, que independem de diferenças culturais e curriculares, encontradas nas crianças com problemas na aritmética: 1) dificuldades na memória de longo prazo (armazenamento e recuperação dos fatos básicos); 2) compreensão imatura dos princípios da contagem; e 3) dificuldades na representação visuoespacial da informação quantitativa, incidindo na elaboração do senso numérico. Além disso, as crianças confundem numerais com escritas semelhantes, alteram a direção na resolução de algoritmos e falham nas tarefas que requerem o manejo da reta numérica.

De todos esses processos, o que mais tem sido pesquisado é a memória de trabalho ou memória operacional, cujo modelo proposto por Baddeley22 define como a capacidade humana de manter informações da memória imediata, estocadas temporariamente, durante uma tarefa cognitiva, tal como a leitura de um texto ou a resolução de um problema matemático, por exemplo. Os quatro componentes da memória de trabalho são fundamentais na aprendizagem da matemática e deficiências na memória de trabalho comprometem a representação e manipulação de informações nos sistemas de linguagem e visuoespaciais18,22. Os resultados encontrados na presente pesquisa vêm ao encontro da literatura comentada anteriormente, pois na tarefa do TDE de escrita: ditado de palavras isoladas houve prejuízo no armazenamento de fonemas, os quais são a forma sonora de representação das letras, ou seja, verificou-se uma pobre memória para construção das palavras.

Considerando os estudos sobre as habilidades de leitura e matemática18-21, compararam grupos de crianças com dificuldade na matemática, com e sem dificuldades na leitura. Um estudo23 identificou diferentes perfis funcionais de crianças: 1) com dificuldade na leitura e na matemática (DL/DM); 2) com dificuldade somente na matemática (DM) e 3) com dificuldade somente na leitura (DL).

As dificuldades na leitura e na aritmética têm em comum déficits importantes no senso numérico, incluindo processamento numérico e aritmética básica. As crianças que apresentaram dificuldades na noção de número, nos procedimentos de contagem e nas operações aritméticas apresentaram também desempenho abaixo da média da idade e escolaridade em leitura, pois as crianças têm entraves tanto nas habilidades verbais como nas não-verbais18,21.

Pareceu-nos, então, que seria correto afirmar que, um tipo adequado de instrução específica e orientada a partir de modelos explicativos das dificuldades no campo da aprendizagem da leitura deveria resultar em melhoria significativa no nível das competências em matemática e vice-versa.

As dificuldades comportamentais associadas a dificuldades de aprendizagem neste estudo se mostraram importante, pois os problemas da área do comportamento apresentados pelas crianças com queixa de dificuldade de aprendizagem referem-se, em geral, a aspectos internos, como preocupação, fechamento ou solidão, irritabilidade e insegurança, mas também, principalmente, a outros aspectos, como intenção, hiperatividade e problemas de conduta, e ansiedade. Estudos têm sugerido a presença de manifestações emocionais e comportamentais desadaptadas, quando da associação dificuldades de aprendizagem e fatores afetivos1,12, encontraram que crianças com atraso escolar, buscaram assistência psicológica, denotaram um empobrecimento na sua capacidade produtiva e comprometimentos associados à estruturação do comportamento, bem como autoimagem negativa com intensos sentimentos de inferioridade e menos valia, o que pudemos observar nos resultados obtidos dessa pesquisa.

Sugere-se, posteriormente, um estudo com número maior de participantes e que abordasse o modelo colaborativo, o qual poderia ocorrer de forma interventiva e que fosse observada na sua finalização a efetividade na correlação entre a área acadêmica e comportamental, contribuindo para o desenvolvimento de estudos iniciais, de caracterização como esse.

Na revisão de literatura compilada, observamos a ênfase na relação entre desempenho acadêmico e problemas de comportamento. No entanto, a contribuição deste estudo vem na direção de salientar a importância desses aspectos serem levantados por professores no contexto escolar por instrumentos de fácil aplicação e simples análise, bem como, a partir dos levantamentos operacionalizados por esses instrumentos, formular programas de intervenção que venham atingir e contribuir para o desenvolvimento de alunos com queixas de dificuldade de aprendizagem.

 

CONCLUSÃO

O presente trabalho teve como objetivo identificar o desempenho acadêmico e comportamental de crianças com dificuldade de aprendizagem e associações entre problemas de comportamento e variáveis associativas que determinaram tal desempenho para eleger participação em um programa de consultoria colaborativa.

Assim, com base nos resultados obtidos neste estudo, pode-se concluir que o desempenho das crianças com queixas de dificuldade de aprendizagem foi inferior tanto nas variáveis referentes ao comportamento como nas tarefas acadêmicas observadas no TDE (matemática, leitura e escrita). Esse fato evidenciou uma relação entre as áreas aqui estudadas; as crianças que apresentaram comprometimento em inatenção, hiperatividade ou socialização, também demonstraram baixos índices nos aspectos acadêmicos explorados.

Dessa forma, as crianças compuseram o quadro de alunos que participaram do programa de consultoria colaborativa, pois obtiveram resultados aquém da idade e escolaridade nas variáveis estudadas. Sendo assim, é mister salientar a importância de eleger critérios de identificação para a participação de alunos em programas de intervenção.

 

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Endereço para correspondência:
Andréa Carla Machado
Rua Rui Barbosa, 416 - Centro
Neves Paulista, SP, Brasil - CEP 15120-000
E-mail: decamachado@gmail.com

Artigo recebido: 8/2/2013
Aprovado: 5/4/2013

 

 

Este trabalho é parte da tese de doutorado em andamento desenvolvida pela primeira autora e orientada pela segunda no Programa de Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos, UFSCar, SP com apoio financeiro da agência de fomento FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil.