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Revista Psicopedagogia
versão impressa ISSN 0103-8486
Rev. psicopedag. vol.31 no.94 São Paulo 2014
ARTIGO DE REVISÃO
Psicopedagogia em contextos hospitalares e da saúde: três décadas de publicações na revista psicopedagogia
Psychopedagogy in health and hospital contexts: three decades of publications in revista psicopedagogia
Marisa Irene Siqueira Castanho
Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pelo Instituto de Psicologia da USP. Docente e pesquisadora do Programa de pós-graduação stricto sensu em Psicologia Educacional do Centro Universitário FIEO - Osasco, SP, Brasil.
RESUMO
Este estudo teve como objetivo identificar possibilidades, avanços e evolução da participação da Psicopedagogia e do psicopedagogo em contextos hospitalares e da saúde. Considerou-se a relevância da pesquisa em sintonia com o atual momento de expansão do campo de atuação da Psicopedagogia. Optou-se pela análise de publicações da Revista Psicopedagogia por se tratar de periódico indexado e que vem ininterruptamente se dedicando às publicações na área da Psicopedagogia,desde 1982. Foram selecionados 19 textos do período 1982-2012 por meio de descritores específicos vinculados ao assunto. Os resultados apresentaram baixa incidência de publicações sobre o tema pesquisado, correspondendo a 2,7% dos trabalhos publicados no período, sendo 0,7% da década 1982-1991; 5,3% de 1992-2001 e 1,9% de 2002-2012. Por meio da análise de conteúdo os textos foram organizados por categorias de atendimento: 7(36,8%) referiam-se à contribuição da Psicopedagogia nas internações hospitalares; 5 (26,3%), à participação da Psicopedagogia nos Ambulatórios de Psiquiatria, Neurologia e Fonoaudiologia no tratamento de distúrbios de aprendizagem; 4 (21,1%) tratavam teoricamente da importância da parceria entre Psicopedagogia e Pediatria na prevenção das dificuldades de aprendizagem; 2 (10,5%) configuravam-se como revisões históricas da presença da Psicopedagogia nesses contextos e 1 (5,3%) referia-se à participação em comunidade terapêutica de dependentes químicos. Considera-se a importância dos resultados não pelo número de trabalhos, mas pela diversidade de possibilidades de participação do psicopedagogo em equipes interdisciplinares na avaliação e intervenção em processos de aprendizagem nesses contextos, o que merece debate aprofundado, em busca de sistematizações e teorizações.
Unitermos: Serviços de saúde. Transtornos de aprendizagem. Revista Psicopedagogia. Publicações Periódicas como Assunto.
SUMMARY
The study aimed to identify possibilities, advances and developments in psychopedagogy and psychopedagogist participation in hospital and health contexts. It was considered the relevance of research in line with the current moment of expansion of the field of Psychopedagogy. We opted for the analysis of publications of the Revista Psicopedagogia for it was an indexed journal and since 1982, with no interruption, it has been publishing in the psychopedagogy area. There were selected 19 texts of the period 1982-2012 by means of specific descriptors related to the subject. The results showed low incidence of publications on the theme researched, corresponding to 2.7% of all works published in the period, being: 0.7% from 1982-1991; 5.3% from 1992-2001 and 1.9% from 2002-2012. By analyzing the content, texts were organized by categories of service: 7 (36.8%) of them referred to the contribution of Psychopedagogy in hospitalizations; 5 (26.3%), to the participation of Psychopedagogy in Psychiatric Clinics, Neurology, Speech-language Pathology in treating learning disorders; 4 (21.1%) treated theoretically the importance of the partnership between Psychopedagogy and Pediatrics in the prevention of learning difficulties; 2 (10.5%) configured as historical revisions of the presence of the psychopedagogy in these contexts and 1 (5.3%) referred to the participation in drug addicts therapeutic community. It is considered the importance of the results, not the number of works, but the diversity of opportunities for psychopedagogist participation in interdisciplinary teams in the evaluation and intervention in learning processes in these contexts, what deserves an in-depth debate in search on systematizing and theorizing.
Keywords: Health Services. Learning Disorders. Revista Psicopedagogia. Periodicals as Topic.
INTRODUÇÃO
A Psicopedagogia, considerando-se a caracterização de seu objeto de estudo, os processos de aprendizagem e as dificuldades dele decorrentes têm tradicionalmente encontrado espaço de atuação tanto nos contextos clínicos como institucionais, em processo de construção de sua própria identidade a partir da prática dos profissionais da área. Com isso inscreve-se como um campo de conhecimento e da prática por meio de uma construção que não é a priori, mas que se constitui pela ação de seus próprios profissionais, ao responderem às diversas demandas por aprendizagem nos variados espaços e contextos de atuação, fazendo-se, assim, protagonistas de sua história1-4.
No âmbito hospitalar e da saúde, no contexto brasileiro, as experiências estão dispersas e ainda há uma insuficiência de teorias e estudos, quando comparados à realidade de outros países. França, Argentina, Estados Unidos, entre outros, têm de longa data o desenvolvimento de um corpo teórico e prático alicerçando experiências significativas, em pelo menos duas diferentes modalidades de inserção do psicopedagogo nos serviços de saúde: nos ambulatórios psiquiátricos, psicológicos e neurológicos em contextos hospitalares no atendimento da demanda de crianças e adolescentes com dificuldades de adaptação escolar e de aprendizagem; nos serviços hospitalares em geral, no acompanhamento de crianças hospitalizadas, no atendimento em brinquedotecas ou nas classes hospitalares, com a finalidade de minimizar o sofrimento da criança ou adolescente pelo isolamento e afastamento da escola5,6.
O atendimento psicológico e psicopedagógico de crianças e adolescentes com dificuldades de aprendizagem e fracasso escolar, nos ambulatórios hospitalares vinculados às áreas da Neurologia e Psiquiatria, remonta aos anos 1960 na Argentina7-9. Em suas origens na França, a Psicopedagogia surgiu justamente na área da saúde, como especialidade profissional em equipes médico-psicopedagógicas nos centros ambulatoriais de saúde nos arredores de Paris9. É esse modelo médico-assistencial que tem em sua base a formação teórica e prática que se generalizou na Argentina, trazendo algumas vantagens, segundo a autora, no que tange ao intercâmbio de saberes e significantes frente a um problema complexo, que responde à multicausalidade que, em geral, caracteriza os transtornos do desenvolvimento, da adaptação escolar e da aprendizagem9.
A Psicopedagogia no Brasil, fortemente marcada por essa visão clínica e médica do tratamento do fracasso escolar, teve esses serviços ambulatoriais para atendimento médico-assistencial dos distúrbios de aprendizagem da criança e do adolescente, implantados a partir da década de 1970, a exemplo do Centro de Referência da Infância e Adolescência (CRIA) do Departamento de Psiquiatria da Unifesp10, criado em 1976; do Ambulatório de Neuro-Dificuldades de Aprendizagem, do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas11, implantado no ano de 1985; e do Serviço de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de Porto Alegre12, criado em 1995. Esses são apenas alguns exemplos, julgando-se que faltam publicações que auxiliem nas tentativas de se traçar um histórico desses serviços, bem como da sistematização dos avanços dessa modalidade de atendimento que conta com o psicopedagogo nas equipes multiprofissionais.
As experiências referentes à criação das classes hospitalares para crianças com problemas de saúde ou hospitalizadas também têm origem na França, em 1935, quando Henri Sellier inaugurou a primeira escola para crianças desadaptadas nos arredores de Paris, experiência que teve em sequência outras iniciativas ao longo da Segunda Guerra e em outros países da Europa e nos Estados Unidos para a assistência de crianças em institutos especiais e em hospitais13,14. No Brasil, encontra-se referência a uma primeira classe hospitalar na cidade do Rio de Janeiro, em um hospital público infantil, o Hospital Menino Jesus, em 19505,13. No entanto, só a partir de documentos oficiais, como a Lei no 8069/90 - o Estatuto da Criança e do Adolescente - e a Resolução no 41/95 - a Lei dos Direitos das Crianças e Jovens Hospitalizados - é que o número de classes hospitalares no país começa a ser ampliado, garantindo o direito de atendimento pedagógico no hospital às crianças impedidas de frequentar a escola, por motivos de tratamento hospitalar14.
Outras iniciativas da inserção do trabalho psicopedagógico no âmbito institucional da saúde na realidade brasileira remontam à década de 1980, com experiências significativas nos cursos de formação de psicopedagogos, como o do Instituto Sedes Sapientiae, por meio da inserção de estagiários com supervisão no espaço do Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer (GRAAC)5.
Essas e outras experiências confirmam a ampliação da atuação do psicopedagogo em diferentes contextos, inclui sua participação nos espaços da saúde, o que implica em formação adequada para essa atuação, desenvolvimento de postura, competência técnica e ética, na construção de uma identidade que se pauta pela delimitação de sua atuação junto aos demais profissionais que integram as equipes de atendimento.
A partir do exposto, considerou-se oportuno o desenvolvimento de uma pesquisa bibliográfica documental, cujos resultados poderiam ajudar a responder a algumas questões básicas: O que tem sido publicado em periódicos indexados nacionais a respeito dos avanços e evolução do atendimento psicopedagógico hospitalar e da saúde? Como se define o papel do psicopedagogo nos contextos de saúde? Que objetivos orientam sua prática? Que bases teóricas e metodológicas subsidiam sua ação? Como acontece o trabalho junto às equipes de saúde? Os objetivos deste trabalho foram: identificar as possibilidades de atuação do psicopedagogo no ambiente hospitalar e da saúde, os avanços e a evolução da Psicopedagogia no âmbito hospitalar e da saúde, a partir de publicações em periódico indexado.
Pretende-se contribuir para a sistematização desse corpo de conhecimento teórico e prático da Psicopedagogia nos contextos da saúde, entendendo que as pesquisas do estado da arte têm por finalidade a busca e organização de informações, no caso, nas publicações em artigos científicos, de relatos de pesquisas e de experiências, o que pode ser considerada uma amostra do que fazem os profissionais quando da atuação no campo. A esse respeito, cabe uma ressalva, com respaldo em Witter15: "[...] no discurso impresso se tem o produto e não o processo que levou à elaboração do mesmo, e nem sempre é possível a partir dele detectar aspectos considerados cruciais para a análise pretendida". Mesmo assim, entende-se o valor que tem a recuperação da informação e seu registro histórico, como contribuição para o caráter cumulativo da construção do conhecimento em qualquer área de estudo.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A escolha da Revista Psicopedagogia se justifica por sua importância como instrumento de divulgação da Psicopedagogia a partir de 1982, constituindo-se durante anos na única fonte divulgadora de conhecimento na área16 e pela continuidade ininterrupta ao longo de mais de 30 anos. Utilizaram-se os seguintes descritores para a busca: psicopedagogia hospitalar; psicopedagogia na saúde; atendimento psicopedagógico hospitalar contidos nos títulos, resumos (ou nos textos na íntegra) e palavras-chave (ou unitermos).
Por um procedimento de análise de conteúdo, os dados foram organizados em quadros, tabelas e gráficos sob os seguintes aspectos: 1) Distribuição total das produções no período analisado e a cada dez anos, nos subperíodos: 1982 a 1991; 1992 a 2001; 2002 a 2012; 2) Distribuição das produções de acordo com as modalidades: - trabalho psicopedagógico em um ambulatório de Psicopedagogia inserido no contexto hospitalar, voltado especificamente para o diagnóstico e tratamento de crianças e adolescentes com dificuldades de aprendizagem (modalidade terapêutica); - trabalho psicopedagógico inserido em hospital geral (pediatria, hemato-oncologia, nefrologia, unidades neonatais, etc) na prevenção de problemas de aprendizagem decorrentes de períodos longos de internação; 3) Distribuição dos trabalhos sobre o tema a partir da identificação da instituição, setor do atendimento e áreas envolvidas; 4) Identificação dos autores, nacionais ou estrangeiros, formação, instituições que representam.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Desde a primeira edição em agosto de 1982 até a última de 2012, foram publicadas 90 edições, das quais foram selecionados 697 artigos para leitura, em diversas modalidades, como: artigos originários de apresentação em conferências e mesas redondas, relatos de experiência, artigos de revisão, artigos de colaboração nacional (Tabela 1).
Foram localizados 19 artigos que abordavam a temática da psicopedagogia no contexto hospitalar e da saúde, representando em todo o período analisado apenas 2,7% das publicações examinadas. Ao se observar as duas colunas que apresentam os valores percentuais na Tabela 1, constata-se que a década de 1992-2001 detém 5,3% dessa produção, significativamente superior à média de 2,7%; a década de 2002-2012 apresenta um percentual de 1,9%, portanto, abaixo da média e a de 1982-1991, significativamente inferior à média, com 0,7%.
A partir da leitura dos resumos e textos na íntegra, os mesmos foram agrupados por categorias temáticas, considerando-se as áreas de atendimento (Tabela 2).
Dos 19 artigos analisados, 7 (36,8%) referiram-se ao trabalho psicopedagógico inserido no hospital geral, em unidades como da oncologia, da pediatria, de doenças hematológicas, de queimados e outros, no acompanhamento de crianças ao longo de seus períodos de internação. Incluíram-se nesses textos as referências às classes hospitalares; 5 (26,3%) artigos referiram-se à modalidade de atendimento psicopedagógico em ambulatórios junto às equipes de Psiquiatria da Infância e Adolescência, de Neurologia, e de Fonoaudiologia no diagnóstico e tratamento dos distúrbios de aprendizagem; 4 (21,1%) apresentaram discussões sobre a importância da participação da Psicopedagogia na parceria com o médico pediatra para o diagnóstico precoce e a prevenção das dificuldades de aprendizagem; 2 (10,5%) constituíram-se como histórico e panorama dos serviços psicopedagógicos no contexto hospitalar e da saúde, um da década de 1982-1991 referia-se ao contexto da Argentina, o outro, da década 2002-2012, referia-se aos serviços implantados no Brasil; um único texto, representando 5,3% dos artigos analisados, referiu-se a uma experiência de participação do psicopedagogo em comunidade terapêutica de atendimento a dependentes químicos.
Um levantamento das instituições de saúde onde os serviços se desenvolviam possibilitou constatar referências a contextos hospitalares e da saúde em âmbito nacional em 14 artigos; um artigo fazia referência a contextos e serviços da saúde na Argentina e, em dois artigos não havia especificação. A Figura 1 apresenta a distribuição dos artigos, considerando-se o total em números absolutos, por instituição de saúde nas quais os serviços figuravam.
Destaca-se a Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP, com experiências relatadas em três diferentes setores: o Setor de Oncologia Pediátrica, do Departamento de Pediatria, com a participação do psicopedagogo no acompanhamento de crianças na internação; o Ambulatório de Gastropediatria, com a participação do psicopedagogo em equipe multidisciplinar de saúde, para o estabelecimento de possíveis correlações entre problemas nutricionais e dificuldades de aprendizagem; o Centro Paulista de Neuropsicologia - Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Infantil - CPN/NANI, com o desenvolvimento de protocolo psicopedagógico de avaliação interdisciplinar de crianças com lesão cerebral.
O Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da USP se destaca com dois artigos, um referente ao histórico de atendimento no Projeto Brinquedoteca do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência - SEPIA-HC-FMUSP e outro, um texto teórico sobre a educação e a prevenção na saúde de adolescentes, da Unidade de Adolescentes do Instituto da Criança do HC-FMUSP. O Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto se apresenta com dois textos, um sobre a participação do psicopedagogo na hospitalização infantil em Unidade de Emergência de Queimados, e outro sobre a intervenção psicopedagógica na dificuldade de aprendizagem no Departamento de Neurologia, Psiquiatria e Psicologia Médica da FMRP-USP.
O atendimento psicopedagógico em Setor Pediátrico da Casa de Misericórdia de Cornélio Procópio - PR foi relatado em dois artigos, um no alívio do estresse da criança hospitalizada e outro no atendimento em enfermaria pediátrica. Dois artigos traziam um mapeamento e histórico da presença da Psicopedagogia em diferentes contextos hospitalares e serviços de saúde no Brasil; e um trazia um histórico, desde a década de 1960, da participação do psicopedagogo em contextos hospitalares de Psicologia e Psicopatologia na realidade argentina. Dois textos teóricos tratavam da importância da associação da Pediatria com a Psicopedagogia na prevenção de dificuldades de aprendizagem, sem especificar instituições. Tratava-se de dois textos também de autores argentinos.
Por último, quatro trabalhos referiam-se a instituições de saúde na realidade brasileira: um apresentava a experiência de inserção do psicopedagogo em classes hospitalares do Hospital do Servidor Público Estadual em São Paulo (HSPE); um referia-se à participação do psicopedagogo no atendimento de crianças e adolescentes pacientes de doenças hemato-oncológicas, com baixo rendimento escolar, em setor de oncologia do Hospital da Criança Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre - RS; dois tratavam do atendimento em ambulatórios de saúde no atendimento dos distúrbios de aprendizagem: um do Ambulatório de Neurologia e Distúrbios de Aprendizagem da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp-SP e outro do Núcleo de Estudo e Coordenação das Ações para a Saúde do Adolescente do Hospital de Clínicas da Universidade de Goiás - GO.
A leitura dos dados da Figura 1 possibilita deduzir que, se de um lado, o número de artigos é pouco relevante quando comparado ao total de artigos publicados no período analisado, o mesmo não se pode dizer da diversidade de situações de atendimento na área da saúde com serviços estruturados e equipes interdisciplinares, constituídas com contribuições dos psicopedagogos tanto na avaliação/intervenção como na prevenção dos problemas de aprendizagem de crianças e adolescentes.
A identificação das áreas e níveis de formação dos autores e coautores dos artigos analisados possibilita afirmar que se evidencia nos trabalhos examinados uma perspectiva interdisciplinar com potencial para a busca de ações integradas nas práticas de cuidados na interface entre o biológico, o psicológico, o social, o pedagógico, no atendimento das demandas dos sujeitos, em especial crianças e adolescentes, em contextos da saúde. A Tabela 3 apresenta a distribuição dos autores e coautores por áreas e níveis de formação.
Quanto à graduação, quatro áreas são informadas: 12 autores/coautores inscrevem-se na Pedagogia; 6 na Psicologia; 3 na área Médica, Pediatria/Neuropediatria e 1 em Licenciatura não especificada. Quanto a cursos de especialização, 19 autores informaram formação em cursos de Psicopedagogia, 2 em Neuropsicologia, 1 em Psicanálise e 1 em Arteterapia. Um número significativo informa formação em nível de pós-graduação stricto sensu, sendo 4 com Mestrado em Psicologia Escolar/Educacional ou Psicologia da Educação; 3 com Mestrado em Educação; 1 com Mestrado em Distúrbios do Desenvolvimento; 1 com Mestrado em Desenvolvimento Humano e 1 com Mestrado em Educação e Saúde da Infância e Adolescência; 5 com doutorados, sendo 2 não especificados, 1 em Psicologia, 1 em Medicina e 1 em Educação. Por fim, uma livre docência em área não especificada. Como conjunto, os autores e coautores são profissionais que atuam nos departamentos e serviços de saúde, médicos (pediatras, neurologistas, psiquiatras, gastroclínicos, oncologistas ou outros), psicólogos, psicopedagogos, educadores; muitos atuam como docentes, orientadores e supervisores de alunos em formação em cursos de pós-graduação integrados aos departamentos médicos ou de programas que têm parceria para a inserção do psicopedagogo nas equipes interdisciplinares.
Em outras palavras, pode-se afirmar que se encontrou no conjunto das publicações analisadas, o que Matos & Pires17 afirmam em relação à perspectiva da atuação interdisciplinar como possível solução para a fragmentação dos saberes, que comprometem a visão global daqueles que buscam cuidados de saúde. Na visão dos autores, "a perspectiva interdisciplinar tem potencial para compreender melhor a multidimensionalidade do objeto de trabalho em saúde e para proporcionar melhores resultados no trabalho". Entende-se que os processos de aprendizagem transitam na interface da saúde e da educação e, portanto, merecem ser cuidados como parte inerente do desenvolvimento pleno e integral da pessoa, em especial aquela atendida nos contextos da saúde.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Algumas reflexões decorrem dos resultados do levantamento realizado. A primeira refere-se à questão conceitual relativa ao objeto de interesse da Psicopedagogia de cuja clareza decorre a possibilidade de construção da identidade do psicopedagogo. Nos artigos cuja modalidade é a da inserção da Psicopedagogia em ambulatórios das várias especialidades da saúde no contexto hospitalar, há uma tendência em justificar a relevância da atuação do psicopedagogo relacionando-a à humanização da saúde e minimização do sofrimento que decorre das internações. Seria esse o papel da Psicopedagogia? Em parte, sim, no entanto, isso não define sua competência específica, uma vez que essa prerrogativa como atitude compete a todos os profissionais que atuam junto às pessoas hospitalizadas, visando à minimização de sofrimento que decorre da experiência de internação. Poucos são os trabalhos que definem a atuação da Psicopedagogia, nos casos de internação, como a de análise e intervenção frente aos processos de aprendizagem e às dificuldades de aprendizagem que decorreriam dos longos períodos de afastamento do convívio social e familiar e escolar, em consonância com seu objeto de estudo.
Vale, também, ressaltar os trabalhos que abordam a parceria da Psicopedagogia no atendimento pedagógico das classes hospitalares, os quais sinalizam a contribuição do psicopedagogo junto aos professores de classe hospitalar no planejamento das atividades e na formação continuada. Esse papel, embora possível, deve ser revestido de um cuidado para que não se coloque o psicopedagogo em uma posição de detentor de um suposto saber que faltaria ao professor por prováveis lacunas de sua formação para atuar frente a esses novos espaços de aprendizagem, o das classes hospitalares.
A segunda reflexão decorre do número significativo de artigos que se referem à prática especializada em ambulatórios de Neuropsicologia, Psiquiatria, Fonoaudiologia na avaliação psicopedagógica de distúrbios de aprendizagem. Esse resultado parece indicar um papel claramente definido da Psicopedagogia, que encontra respaldo para sua inserção em equipes interdisciplinares da saúde. Ressalta-se que, ao se manter preservado esse lugar, confirma-se a tendência de conservação de uma leitura clínica e médica das dificuldades de aprendizagem com riscos de patologização e atendimento médico-assistencial dos distúrbios de aprendizagem da criança e do adolescente. Resta saber quais as ações sociais frente à escola e à família decorreriam de tal prática.
A terceira e última questão refere-se ao número reduzido de artigos na temática pesquisada e que aparecem em uma ordenação crescente da primeira para a segunda década e decrescente da segunda para a terceira. Ao que parece, o contexto hospitalar e da saúde ainda não aparece como um campo emergente na atuação do psicopedagogo, o que não significa que não haja espaço aí nesses contextos para a participação e contribuição desse profissional. A continuidade de pesquisas nessa direção poderia responder, num futuro próximo, aos reais desdobramentos e avanços na inserção da Psicopedagogia nos contextos hospitalares e da saúde.
As lacunas apontadas neste estudo sugerem a necessidade de consolidação e reconhecimento desses espaços para a atuação do psicopedagogo, com definições claras de seu papel, ligadas a objetivos de atenção à saúde e à educação da criança e do adolescente. Sugerem, ainda, a continuidade no desenvolvimento e na criação de modelos que confirmem uma maior operatividade às ações diagnósticas e de intervenção que integrem os aspectos afetivos e emocionais, cognitivos e sociais-relacionais em nível institucional, na garantia das aprendizagens e circulação dos conhecimentos. Por fim, os achados deste estudo sugerem a necessidade de, a partir de familiarização com os ambientes da saúde, suas rotinas e demandas, identificar as possibilidades de ação em parcerias com os demais profissionais envolvidos no atendimento, incluindo a família e a escola.
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Endereço para correspondência:
Marisa Irene Siqueira Castanho
Programa de Pós-Graduação em Psicologia Educacional
Centro Universitário Fieo - UNIFIEO - SP
Av. Franz Voegeli, 300 Vila Yara
Osasco, SP, Brasil
CEP 060020-190
E-mail: marisa.irene@unifieo.br
Artigo recebido: 26/1/2014
Aprovado: 5/3/2014
Nota da autora: Esta pesquisa teve início em disciplina ministrada por mim no segundo semestre de 2011: "Psicopedagogia e Saúde: Políticas Públicas, Planejamento e Ação Multidisciplinar" do Curso de Pós-Graduação lato sensu em Psicopedagogia Hospitalar do Centro Universitário Fieo - UNIFIEO, e contou com a participação das alunas Alana Cristina de Alencar Silva Bilar, Bianca Crozatti Rodrigues, Karina da Costa, Priscila Sanches, Roberta Vezetiv, Roseli Alves Martins, Rosemeire Correa Barone, Rosilene da Silva e Tatiane Rocha de Sousa, e que resultou na apresentação do Pôster intitulado: "A Psicopedagogia no contexto hospitalar: Um estudo das publicações da Revista Psicopedagogia", no III Simpósio Nacional de Psicopedagogia, realizado em parceria com UNIFIEO, em novembro de 2011. Os resultados e as análises da pesquisa original foram ampliados e aprofundados para esta publicação.
Trabalho realizado no Centro Universitário FIEO - Osasco, SP, Brasil.