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Revista Psicopedagogia
versão impressa ISSN 0103-8486
Rev. psicopedag. vol.37 no.114 São Paulo set./dez. 2020
https://doi.org/10.51207/2179-4057.20200031
ARTIGO DE REVISÃO
Mediação em grupo de crianças com dificuldades de aprendizagem: revisão da literatura
Group mediation of children with learning difficulties: Literature review
Debora Luz SquilanteI; Rebeca Soares Principe VizioliII; Carina Cella Panaia MantovaniIII
IAluna do Programa de Aprimoramento Profissional da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (2018-2019), Ribeirão Preto, SP, Brasil
IIAluna do Programa de Aprimoramento Profissional da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (2018-2019), Ribeirão Preto, SP, Brasil
IIISupervisora do Programa de Aprimoramento Profissional da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil
RESUMO
A presente pesquisa teve como objetivo realizar uma revisão bibliográfica, explorando artigos publicados entre os anos de 2008 e 2018 que abordassem a mediação em grupos de crianças com dificuldades de aprendizagem no ambiente escolar e clínico. O levantamento foi realizado nas bases de dados SciELO e Pepsic e na Revista Psicopedagogia. Foram analisadas as principais informações, abordadas em 7 artigos, referentes à mediação grupal realizada por profissionais e dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos estudantes na fase escolar. Os resultados apontaram que a mediação em grupo com crianças, independentemente do contexto no qual estão inseridas, contribui para a superação das dificuldades de aprendizagem. Desse modo, o mediador quando considera o indivíduo como um ser integral alcança uma mediação eficaz, possibilitando mudanças positivas no desenvolvimento.
Unitermos: Dificuldade de Aprendizagem. Mediação Grupal. Aprendizagem Mediada. Psicopedagogia.
ABSTRACT
This research aimed to carry out a bibliographic review, exploring articles published between the years 2008 a 2018 that addressed mediation in groups of children with learning difficulties in the school and clinical environment. The survey was carried out in the databases SciELO and Pepsic, and Revista Psicopedagogia. The main information, covered in 7 articles, related to group mediation performed by professionals and learning difficulties presented by students in the school phase were analysed. The results showed that group mediation in the school phase regardless of the context in which they are inserted, contributes to overcoming learning difficulties. In this way, the mediator when considering the individual as an integral being achieves an effective mediation, enabling positive changes in development.
Keywords: Learning Difficulties. Group Mediation. Mediated Learning. Psychopedagogy.
INTRODUÇÃO
As dificuldades de aprendizagem, o consequente fracasso escolar e as intervenções eficazes têm sido discutidos pela literatura científica. Medeiros & Loureiro1 afirmam que a experiência de fracasso escolar pode contribuir para a vulnerabilidade e risco de desadaptação ao decorrer da idade escolar. As autoras esclarecem que esse fracasso escolar pode afetar a concepção que a criança constrói sobre si mesma, assumindo o estereótipo de "criança que não aprende", o que pode acarretar problemas na fase da adolescência e na vida adulta.
Para Paiva & Azevedo2, as dificuldades de aprendizagem são caracterizadas como sintomas que expressam necessidades que aparecem no mesmo momento histórico em que está ocorrendo a aprendizagem. Os autores relatam que, nestes casos, os indivíduos podem apresentar dificuldades por falta de ferramentas, ou mesmo pela inabilidade de utilizar estas ferramentas para transpor seus bloqueios. Assim, a intervenção psicopedagógica surgiu com a proposta de facilitar o acesso à aprendizagem, auxiliando o indivíduo a encontrar o prazer de aprender2.
Nesse contexto, Bartholomeu et al.3 afirmam que fatores afetivo-motivacionais estão relacionados com o rendimento do aluno e com as manifestações de dificuldades de aprendizagem. Ao considerar o espectro amplo dos processos de ensino e aprendizagem, Ferrão et al.4 ressaltam a possibilidade de os profissionais da área de aprendizagem estruturarem as intervenções baseadas no fator afetivo motivacional da criança com problemas de aprendizagem. O valor afetivo motivacional é identificado através do comportamento exibido por ela em uma situação de mediação, e, a partir disso, as dificuldades podem ser trabalhadas, potencializando a aprendizagem. Diante do exposto, destaca-se a importância de intervir e mediar eficazmente os processos de aprendizagem como forma de favorecê-los.
De acordo com Feuerstein et al.5, a mediação é uma forma de interação intencional com caráter universal, que molda a experiência humana, a partir do convívio entre os indivíduos, acompanhando o desenvolvimento destes. Para os autores, o mediador deve ressaltar os esforços realizados pelas crianças a partir de seus comportamentos, promovendo o encorajamento do indivíduo, que passa a se sentir competente para realizar outras tarefas, ou seja, a mediação torna o conhecimento intrínseco ao indivíduo, permitindo uma mudança estrutural a nível cognitivo e o alcance a níveis motivacionais mais elevados.
Nesse contexto de mediação da aprendizagem, Vygotsky6 enfatiza que o papel dos adultos seria o de ajudar a direcionar e organizar a aprendizagem da criança para que, posteriormente, este indivíduo possa dominá-la e internalizá-la. Considerando que a aprendizagem se dá dentro de um contexto sociocultural e que as relações entre os indivíduos são fundamentais para este processo, pode-se pensar que a prática psicopedagógica em grupo permite múltiplos ganhos para o aprendiz.
Para Pichon-Rivière7, o objetivo dos agrupamentos sociais seria o de adquirir maior segurança e produtividade, tornando possível, através dos vínculos, a convivência e a tarefa em comum. Nessa perspectiva de formação de grupos, Kaplan et al.8 afirmam que grupos com crianças são altamente eficazes para o oferecimento de feedback, apoio e amparo para a construção de relacionamentos socialmente aceitáveis e um comportamento positivo, visto que o que têm em comum é a necessidade de se igualar a seus pares e de serem aceitas por eles. Para melhor compreensão da temática, Levisk9 aponta para a comunicação dentro desse grupo de crianças pode surgir através do jogo, da dramatização, do corpo, e mesmo da ação, uma vez que nem sempre as crianças têm desenvolvida a capacidade de traduzir em palavras os seus sentimentos.
Para Elias & Marturano10, esta experiência de aprendizagem mediada oferece às crianças o aproveitamento de novas experiências de aprendizagem, tornando possível que as mesmas avancem na Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), conceito elaborado por Vygotsky6. Tal conceito é definido como a distância entre o nível de desenvolvimento real, que pode ser considerado como as atividades que a criança realiza de maneira independente, e o nível de desenvolvimento potencial, que é determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes6.
As autoras denominam, em seus estudos, os atendimentos em grupos de "Oficinas de Linguagem" e ressaltam que essa intervenção contribui para a diminuição de tensões emocionais e problemas de comportamento, comuns em crianças com queixas escolares. Estas observações também foram feitas por Squilante et al.11.
Dessa forma, destaca-se que a mediação com foco psicopedagógico em grupos de crianças é eficaz para melhorar o desempenho acadêmico, atenuar problemas de comportamento e de sinais de imaturidade interpessoal, além de contribuir para o aumento da iniciativa e independência na lição de casa10,12,13.
O objetivo deste artigo foi realizar um levantamento categórico de artigos científicos, publicados nos últimos dez anos, que abordassem a mediação da aprendizagem em intervenções psicopedagógicas em grupo de crianças que apresentavam queixas de dificuldades de aprendizagem, nos contextos clínico e escolar. Dessarte, as informações obtidas através da revisão bibliográfica poderiam auxiliar profissionais da educação, psicopedagogos e psicólogos a facilitarem o processo de aprendizagem integrando os aspectos cognitivos, afetivos e sociais dos indivíduos.
MÉTODO
A revisão foi realizada por meio da seleção de artigos científicos nas bases de dados SciELO e Pepsic e na Revista Psicopedagogia.
Foram utilizadas as seguintes palavras-chave: "dificuldade de aprendizagem", "dificuldades de aprendizagem", "psicopedagogia", "mediação grupal", "aprendizagem mediada", "oficina psicopedagógica" e "grupos, aprendizagem, crianças".
Os critérios de inclusão para a elaboração do artigo foram:
a) Artigos publicados nos últimos dez anos, de 2008 a 2018;
b) Artigos publicados somente em língua portuguesa;
c) Artigos completos, disponíveis gratuitamente e on-line;
d) Estudos descritivos ou empíricos.
Os critérios de exclusão foram:
e) Artigos de revisão, reflexões sobre o tema e teóricos;
f) Artigos que não consideram mediação em grupo;
g) Artigos que não consideram mediação com crianças;
Na base de dados SciELO, utilizando a palavra-chave "dificuldade de aprendizagem", foram encontrados 255 artigos, sendo selecionado um artigo de acordo com os critérios de inclusão e exclusão definidos previamente. Com a busca da palavra-chave "dificuldades de aprendizagem", foram encontrados 651 artigos, sendo selecionado apenas um. Com a palavra-chave "psicopedagogia", foram encontrados 18 artigos, porém, nenhum foi selecionado, pois não se enquadravam nos critérios definidos. Com palavra-chave "mediação grupal", não foram encontrados resultados. Com a palavra-chave "aprendizagem mediada", foram encontrados 58 artigos e um artigo foi selecionado. Com a palavra-chave "oficina psicopedagógica", não foram encontrados resultados que estivessem em concordância com os critérios da pesquisa. Nessa mesma base, também foi utilizada a combinação das palavras-chaves "grupos, aprendizagem, crianças", sendo encontrados 36 artigos e selecionado um artigo. Foram selecionados, portanto, quatro artigos nesta base de dados.
Na base de dados Pepsic, com a busca da palavra-chave "dificuldade de aprendizagem", foram encontrados 18 artigos e nenhum selecionado, pois não se enquadravam nos critérios. Com a palavra-chave "dificuldades de aprendizagem", foram encontrados 34 artigos e nenhum selecionado. Com a palavra-chave "psicopedagogia" foram encontrados 114 artigos e um deles foi selecionado. Com a palavra-chave "mediação grupal", foi encontrado um artigo, sendo este selecionado. Com a palavra-chave "aprendizagem mediada", foram encontrados sete artigos e nenhum foi selecionado. Com a palavra-chave "oficina psicopedagógica", não foram encontrados resultados. Com a combinação "grupos, aprendizagem, crianças", foram encontrados 68 artigos, sendo dois de interesse para o estudo, mas que foram excluídos, por serem resultado de busca na mesma base, porém com outras palavras-chave ("mediação grupal" e "psicopedagogia"). Nesta base, foram selecionados, ao total, dois artigos.
Ademais, realizou-se um levantamento em uma revista especializada da área de psicopedagogia "Revista Psicopedagogia". Com a palavra-chave "dificuldade de aprendizagem", foram encontrados 124 artigos, mas nenhum selecionado. Com a palavra-chave "dificuldades de aprendizagem", foram encontrados 124 artigos, mas nenhum selecionado. Com a palavra-chave "psicopedagogia", foram encontrados 157 artigos e nenhum selecionado, pois não se adequaram aos critérios. Com a palavra-chave "mediação grupal", não foram encontrados artigos. Com a palavra-chave "aprendizagem mediada", foram encontrados oito artigos e nenhum foi selecionado. Com a palavra-chave "oficina psicopedagógica", foram encontrados três artigos, sendo selecionado um artigo. Com a combinação "grupos, aprendizagem, crianças", foram encontrados 19 artigos e nenhum foi selecionado. Portanto, nesta base, selecionou-se apenas um artigo.
Abaixo, a tabela para melhor visualização da descrição (Tabela 1).
Portanto, de acordo com os critérios de inclusão e exclusão, foram selecionados um total de quatro artigos na base de dados SciELO, dois artigos na Pepsic e um artigo na Revista Psicopedagogia.
Os dados foram extraídos de materiais com publicações entre os anos de 2008 a 2018, com o intuito de manter os dados atualizados sobre a temática.
RESULTADOS
A partir da análise dos artigos selecionados, pôde-se observar diferentes profissões que desempenharam o papel de agentes mediadores. Em três dos artigos, os agentes mediadores eram psicopedagogos14-16,, em dois dos artigos, a função de mediadores foi exercida por psicólogos17,18, e, em um dos artigos, a agente era professora de escola regular19. Ainda, um dos artigos tinha como agentes mediadores uma dupla composta por uma psicóloga e uma estudante da graduação de Psicologia20.
Com base da totalidade dos artigos estudados, pode-se salientar que um deles aborda a questão de dificuldade de aprendizagem, advinda de questões comportamentais, resultantes de conversa entre os alunos na sala de aula durante as explicações realizadas em sala pela professora17. O estudo de Ramos et al.16 aborda as dificuldades por uma perspectiva de atenção insuficiente apresentada pelos alunos durante as aulas. Ademais, dois dos artigos destacaram queixas referentes à dificuldade das crianças em leitura e escrita14,20.
Ainda, o artigo de Scoz & Luchini15 apontou a queixa das crianças com dificuldade na escrita. Um artigo não especificou quais as dificuldades apontadas no estudo18, enquanto outro artigo focou na atuação da professora diante o grupo de crianças19. Partindo do contexto no qual ocorreu a mediação, pode-se destacar que os artigos de Paraventi et al.17 e o de Campos & Macedo19 abrangem a mediação psicopedagógica dentro de um contexto escolar, enquanto Porcacchia & Barone18 e Sordi et al.20 consideram a mediação em contexto clínico. Sendo assim, pudemos realizar uma pesquisa contextual, partindo desses dois contextos.
Ressalta-se que, em ambos os contextos, os autores apontaram para a eficácia do trabalho em grupo de crianças, desde que haja uma mediação com propósitos previamente estabelecidos.
Os resultados obtidos nesse trabalho de revisão indicaram que a mediação com grupo de crianças foi positiva tanto no contexto clínico quanto no escolar. Destarte, destaca-se que o contexto específico de atendimento não foi o fator determinante para os resultados positivos encontrados nos estudos, mas sim a escolha pela modalidade de grupo, somada a uma mediação adequada de profissionais capacitados14-20. Para compreendermos o motivo pelo qual o contexto não é um fator determinante nos processos de mediação da aprendizagem, recorremos aos autores Papalia et al.13 e Ferrão et al.4.
O desenvolvimento infantil abrange os aspectos físicos, cognitivos e psicossociais, sendo estes indissociáveis no processo de ensino-aprendizagem13. Desse modo, é destacada a importância de identificar os fatores afetivo-motivacionais apresentados pelas crianças com dificuldades de aprendizagem4 considerando-as como um ser integral independente dos contextos em que estão inseridas. Sobre essa perspectiva, a modalidade de grupo se faz efetiva devido ao fato de que as crianças se beneficiam ao realizarem atividades com seus pares13, desde que o mediador considere a amplitude dessas interações e reconheça o seu papel como aquele que possibilita o protagonismo dos mediados.
DISCUSSÃO
As dificuldades de aprendizagem tornaram-se um tema relevante na literatura científica devido aos prejuízos que podem acarretar no percurso desenvolvimental de crianças e adolescentes, como pontuaram Medeiros & Loureiro1. Para a superação dessas dificuldades, é necessário identificar os fatores que influenciam o surgimento e a manutenção das dificuldades e o reconhecimento da importância de uma mediação intencional e de qualidade no contexto clínico e escolar. Diante disso, abordamos, em nossa discussão, o aprofundamento desses dois fatores básicos no enfrentamento de dificuldades de aprendizagem em crianças, com maior atenção à mediação psicopedagógica.
Os autores Paraventi et al.17 discutem em seu artigo que há relação entre aprendizagem e questões comportamentais, e que estas contribuem para o surgimento de dificuldades de aprendizagem na idade escolar. A literatura encontrada também destaca essa relação, mas acrescenta que os problemas de ordem emocional e comportamental transcendem o contexto escolar, podendo influenciar as relações familiares e interpessoais e, nesse sentido, fica evidente que o profissional deve considerar em suas intervenções os fatores afetivo-emocionais como apontaram Medeiros & Loureiro1 e Ferrão et al.4.
Nesse estudo, ficou evidente que as dificuldades de aprendizagem podem ser motivadas por diferentes condições, como atenção insuficiente por parte dos alunos, como apontado por Ramos et al.16, ou atuação do professor, pontuada por Campos & Macedo19. Além disso, as dificuldades podem ser de natureza diversa, como dificuldade de leitura e escrita, apontadas por Sordi et al.20 e Porcacchia & Barone14 ou somente de escrita, como apontado por Scoz & Luchini15.
Esses achados são coerentes com a literatura exposta, que afirma o espectro amplo dos processos de ensino e aprendizagem4, além de esclarecer que há uma associação entre os surgimentos de dificuldades e a falta de ferramentas necessárias para o aprender ou ainda pela inabilidade de utilizá-las, sendo imprescindível compreender o momento histórico em que ocorre a aprendizagem da criança2.
Os artigos selecionados, como citado, apresentaram diferentes profissionais como agentes mediadores, no entanto, independentemente da formação inicial, a relevância da atuação foi a qualidade da mediação14-20. Dentro desse cenário, Campos & Macedo19 mostram a relevância do papel do mediador para manejar questões relacionadas às dificuldades de aprendizagem. Os autores destacam a relevância da teoria da Experiência de Aprendizagem Mediada, assim como as autoras Elias & Marturano10 citadas na literatura, que utilizam essa teoria para oferecer às crianças o aproveitamento de novas experiências de aprendizagem. Os resultados desses autores são compatíveis com resultados encontrados nos artigos de Sordi et al.20 e Porcacchia & Barone14, visto que os atendimentos descritos foram realizados em contexto clínico e na modalidade de atendimento de grupo, buscando os benefícios de uma mediação grupal.
Em contraponto, os outros artigos apresentados no contexto clínico15,16,18 estruturaram os atendimentos em grupo com objetivos específicos, de acordo com a necessidade encontrada na coleta de dado desses pesquisadores. Scoz & Lucchini15 focaram especificamente na habilidade de escrita e a correlação com aspectos subjetivos. Teixeira & Alliprandini18 e Ramos et al.16 formaram grupos de crianças com dificuldades de aprendizagem com o intuito de aprimorar as suas habilidades cognitivas.
Os resultados obtidos nessa revisão indicaram que a mediação com grupo de crianças se difere quanto aos objetivos e finalidades, que são propostas pelos profissionais mediadores, os quais também determinam a modalidade do grupo, podendo ter efeitos positivos quando aplicados em contexto clínico ou escolar, mas somente se os profissionais forem capacitados a realizar a mediação adequada14-20.
Para compreender o conceito de mediação adequada, apontado como fator fundamental nesse estudo, recorre-se aos autores da literatura que esclarecem que o mediador precisa ser um facilitador e ter um perfil específico, já que ele teria que ser capaz de entrar e sair do mundo mágico das crianças e oportunizar o desenvolvimento da autonomia através do relacionamento entre as próprias crianças do grupo8,9,12.
Os autores Paraventi et al.17 reforçam a importância dos aspectos vinculares entre as crianças entre si e entre elas com o mediador dentro da dinâmica grupal, além de ressaltar a importância dessa interação no desenvolvimento de autonomia, comunicação, cooperação e autorregulação. Em concordância com os resultados encontrados, a literatura apresentou trabalhos com grupos de crianças dentro do contexto escolar e no contexto clínico.
Vayer & Roncin12 afirmaram que, no contexto escolar, as experiências e atividades na dinâmica grupal com crianças em idade escolar assumem uma significação própria e permitem que as crianças se tornem autônomas, desenvolvendo a capacidade de autorregulação. No contexto clínico, Elias & Marturano10 pontuaram a importância da intervenção em grupo baseada em princípios da aprendizagem mediada para diminuição de problemas de comportamento associados a baixo rendimento escolar e Squilante et al.11 observaram, a partir dessa intervenção grupal, evolução nas questões pedagógicas, aumento na motivação e engajamento, maior compreensão das regras relacionadas ao atendimento e melhora na capacidade de autorregulação.
Foi citado, nos resultados desta revisão, que os artigos encontrados concordaram que o contexto clínico e escolar não é fator determinante na superação do fracasso escolar, mas sim a qualidade da mediação em grupo. Para compreender os resultados benéficos da intervenção em grupo de crianças, independentemente do contexto, busca-se os estudos de Feuerstein et al.5, que enfatizam que a função do mediador consiste em promover o desenvolvimento de funções cognitivas subjacentes, propiciando uma motivação intrínseca e uma ampliação dos interesses do mediado.
Compara-se a Vygotsky6, que afirma que o adulto seria mediador ao atuar na Zona de Desenvolvimento Proximal do aprendiz, direcionando e organizando os processos de aprendizagem em questão. Para alcançar efetividade nessa modalidade de intervenção, a atuação do mediador precisará ir de encontro com os interesses e possibilidades dos integrantes do grupo, fomentando questionamentos, reflexões e favorecendo o aproveitamento do espaço compartilhado, além de ser capaz de perceber as crianças como seres completos e com a necessidade de cumprirem tarefas desenvolvimentais correspondentes a idade escolar11.
A mediação de grupos de crianças no contexto de dificuldades de aprendizagem exige a capacitação de profissionais que compreendam a amplitude dessa temática. Tais profissionais, que assumem o papel de mediadores, devem reconhecer a abrangência desse papel, tanto em relação aos motivadores das dificuldades de aprendizagem quanto ao esforço necessário para uma mediação intencional e de qualidade. Dessa forma, a intervenção psicopedagógica auxiliará o indivíduo a superar as dificuldades de aprendizagem, promovendo, assim, o desenvolvimento integral de crianças em idade escolar.
CONCLUSÃO
Na literatura encontrada, os autores apontaram que as intervenções frente às dificuldades de aprendizagem possuem um enfoque multidisciplinar e, dentro disso, destacaram a Psicopedagogia e os profissionais pertencentes à área de ensino-aprendizagem.
Neste trabalho, os artigos encontrados apresentaram intervenções em grupo com crianças em idade escolar e com queixas de dificuldades de aprendizagem. Os profissionais responsáveis pela intervenção eram psicólogos, pedagogos e psicopedagogos, semelhante aos achados da literatura.
A análise realizada contribuiu para enfatizar a importância de um agente mediador dentro de um contexto de aprendizagem, principalmente em situações em que os mediados apresentaram dificuldades nesse processo de ensino e aprendizagem. Esse trabalho também destacou a notoriedade da mediação da aprendizagem na obtenção de resultados positivos na formação de vivência grupal, já que, além de intervir em dificuldades escolares, considerou aspectos globais e essenciais na formação de crianças, como os afetivos, cognitivos, comportamentais e vinculares.
Assim, destaca-se a importância do agente mediador intervir de forma contextualizada nas queixas escolares, a fim de desvelar práticas engessadas que podem dificultar o processo de ensino-aprendizagem. Conclui-se que a mediação em grupo de crianças pode ocorrer tanto no contexto clínico como no escolar e, desde que o mediador tenha um propósito estabelecido, os resultados contribuirão para superar queixas de dificuldades de aprendizagem e promover interações sociais adequadas.
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Endereço para correspondência:
Rebeca Soares Principe Vizioli
Rua Magda Perona Frossard, 730/32 - Nova Aliança
Ribeirão Preto, SP, Brasil - CEP 14026-596
E-mail: rebecas_vizioli@yahoo.com.br
Artigo recebido: 2/8/2020
Aprovado: 15/11/2020
Trabalho realizado na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil.
Conflito de interesses: As autoras declaram não haver.