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Revista Psicopedagogia
versão impressa ISSN 0103-8486
Rev. psicopedag. vol.38 no.117 supl.1 São Paulo 2021
https://doi.org/10.51207/2179-4057.20210051
RELATO DE EXPERIÊNCIA
É possível a realização de rodas de conversa on-line? Reflexões sobre a experiência das Rodas/Redes da ABPP PR
Is it possible to carry out on-line conversation circles? Reflections on the experience of ABPP PR Circles/Networks
Simone CarlbergI; Carolina Koschnitzke HorstII; Cristiane Dionysio FelixIII; Danielle Gross de Freitas MascarenhasIV; Maria Cristina Trevizan MontingelliV
IPedagoga, Especialista em Psicopedagogia e em Teoria e Técnica de Grupos Operativos (CEP Ctba/Buenos Aires); Associada Titular da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) e Vitalícia da ABPp PR; Pesquisadora do Grupo Aprendizagem e Conhecimento na Prática Docente da PUC-PR, Curitiba, PR, Brasil
IIPedagoga; Especialista em Psicopedagogia e em Psicomotricidade Relacional. Associada Efetiva da ABPp PR, Curitiba, PR, Brasil
IIIPedagoga; Especialista em Psicopedagogia; Educação Especial e com Formação em Grupo Operativo (CEP Ctba/Buenos Aires); Atua na Educação Especial do Município de São José dos Pinhais/PR desde 1998; Associada Efetiva ABPp, Curitiba, PR, Brasil
IVPedagoga; Especialista em Psicopedagogia; Mestre em Educação; Formação em Coordenação de Grupos; Associada Efetiva ABPp PR, Curitiba, PR, Brasil
VPsicóloga; Especialista em Psicopedagogia; Formação em Intervenções Sistêmicas Pós-Modernas: Educação, Família, Escola e Redes; Coordenadora Educacional; psicóloga e psicopedagoga clínica; Associada Efetiva ABPp PR, Curitiba, PR, Brasil
RESUMO
Este artigo contempla o relato da experiência das quatro edições das Rodas/Redes promovidas em 2020 pela Diretoria da Associação Brasileira de Psicopedagogia, Seção Paraná (ABPp PR), triênio 2020/2022, com o objetivo de descrever as ações e promover reflexões acerca da utilização das rodas de conversa virtuais durante a pandemia como espaço alternativo para as trocas de informações e experiências realizadas. O arcabouço utilizado para a análise dos dados observados e levantados foi a Epistemologia Convergente, uma das bases teórico-práticas da Psicopedagogia no Brasil, com ênfase nas contribuições da Escola de Psicologia Social de Pichon-Rivière. O estudo foi apresentado no XVI Encontro Paranaense de Psicopedagogia, com o tema Janelas do Aprender - Tempo, Espaço e Modalidades, realizado nos dias 18, 19 e 21 de setembro de 2020, e os resultados evidenciaram essa modalidade como uma prática possível de acolhimento, escuta e construções significativas pelos grupos de psicopedagogos e profissionais de áreas afins que participaram das Rodas/Redes.
Unitermos: Aprendizagem. Aprendizagem em Ambiente Virtual. Psicopedagogia no Âmbito Institucional. Rodas de Conversa. Grupos Operativos. Psicopedagogia e Pandemia de COVID-19.
ABSTRACT
This article contemplates the report of the experience of the four editions of the Wheels/Networks promoted in 2020 by the Board of Brazilian Association of Psychopedagogy, Paraná Section (ABPp PR), triennium 2020/2022, with the objective of describing the actions and promoting reflections on the use of virtual conversation wheels during the pandemic as alternative space for exchanging information and experiences. The framework used for the analysis of the observed and collected data was Convergent Epistemology, one of the theoretical-practical bases of Psychopedagogy in Brazil, with emphasis on the contributions of the Pichon-Rivière School of Social Psychology. The study was presented at the XVI Meeting of Psychopedagogy in Paraná, with the theme "Windows of Learning - Time, Space and Modalities", held on September 18, 19 and 21, 2020, and the results showed this modality as a possible welcoming practice, listening and significant constructions by groups of psychopedagogists and professionals from related areas who participated in the Wheels/Networks.
Keywords: Learning. Learning in a Virtual Environment. Psychopedagogy in the Institutional Scope. Wheels of Conversation. Operative Groups. Psychopedagogy and the COVID-19 Pandemic.
INTRODUÇÃO
A partir do momento em que foi decretado o distanciamento social em âmbito nacional, em 18 de março de 2020, em decorrência da pandemia mundial da COVID-19, a Diretoria da Associação Brasileira de Psicopedagogia, Seção Paraná (ABPp PR), passou por um processo de revisão de seu plano de ação anual. Decidiu, então, experimentar oferecer aos psicopedagogos associados e demais interessados, como forma de adaptar algumas práticas presenciais de reflexão, um espaço virtual para promover a escuta e a troca de informações, experiências e preocupações sobre o momento inédito vivido.
Inicialmente, optou-se pela realização de rodas de conversa, sendo seu funcionamento compreendido como a técnica que melhor respondia às intenções do momento. Além disso, considerou-se o fato de a prática ser muito utilizada na Seção Paraná, procurando-se privilegiar a oferta de atividades de formação permanente atreladas ao fazer autêntico psicopedagógico e permitindo-se evidenciar o processo dialógico.
Antes, porém, uma pergunta inquietava a equipe: Uma roda de conversa virtual funcionará da mesma maneira que uma roda de conversa presencial?
A cada edição, num total de quatro, essa pergunta ecoava e colocava-se em um novo lugar de pesquisa e aprofundamento. Ao planejar e executar cada uma delas, a equipe passou a aprimorar sua organização e realização, buscando fazer articulações teórico-práticas que permitissem sistematizar a nova experiência. A passagem da nomenclatura de rodas de conversa, ainda com pressupostos muito semelhantes às rodas presenciais, para Roda/Rede configurou-se como o ponto alto do aprimoramento dos estudos, já que implicou em a equipe desvendar e traçar caminhos inéditos de experiência e análise.
Sobre rodas de conversa
Historicamente, a roda é utilizada como manifestação e forma de convivência grupal em diferentes culturas: as brincadeiras de roda, a roda de capoeira, a roda de chimarrão, a roda em torno da fogueira, a roda de dança, entre outras. Além do formato circular, é comum uma tarefa específica a ser realizada pelo grupo que a compõe: dançar, lutar, conversar, aquecer-se, tomar chimarrão, etc. Todas têm um ritual implícito, ou uma etiqueta social, transmitido de geração em geração, revelado pelas palavras e pelas ações.
Na Psicopedagogia, esse modo de ação grupal é acompanhado de uma técnica específica, possibilitando a reelaboração de informações e a circulação do conhecimento, do olhar, da observação e do afeto.
Uma roda de conversa coordenada com uma atitude psicopedagógica pressupõe uma organização prévia junto a uma equipe de coordenação. Esta, responsável por definir o enquadramento dos elementos fixos da roda (tempo, duração, frequência e outros) e por co-pensar em grupo, oferece uma tarefa objetiva aos participantes, os quais têm de 60 a 90 minutos para construir uma roda centrada na tarefa oferecida. É importante mencionar que, no contexto da ação psicopedagógica em grupo, além da tarefa objetiva, há a mobilização de uma tarefa subjetiva, relativa ao funcionamento e ao modo como os indivíduos vivenciam o grupo.
Segundo Cruz & Barbosa1 (p. 22), as contribuições de Pichon-Rivière apresentam:
[...] conceitos relevantes para se pensar a subjetividade, bem como para exercer uma crítica sobre os fenômenos cotidianos, abordando a dialética entre o intrassubjetivo e o intersubjetivo.
Nas dinâmicas que se criam em torno da tarefa, segundo Pichon-Rivière2 (p. 128), é essencial que a equipe de coordenação atue para:
[...] criar, manter e fomentar a comunicação, chegando esta, através de um desenvolvimento progressivo, a tomar a forma de uma espiral, na qual coincidem didática, aprendizagem, comunicação e operatividade.
Priorizam-se, portanto, intervenções horizontais, de forma que o grupo faça movimentos de aproximação e afastamento da tarefa, amplie o seu grau de pertença, exercite formas de comunicação, permaneça menos tempo em pré-tarefa e consiga ser eficaz na execução da tarefa proposta.
Uma coordenação operativa implica na compreensão do grupo como uma unidade em funcionamento e tem como objetivo a ampliação do grau de autonomia cognitiva, moral e social do grupo e dos indivíduos que o integram.
Outra característica importante das rodas de conversa para a Psicopedagogia é a escolha de tarefas grupais com o maior grau possível de autenticidade. Utilizam-se consignas como instrumento de promover a aprendizagem com sentido, sendo consignas autênticas aquelas que proporcionam resolução em grupo de problemas da vida cotidiana.
MÉTODO
Para responder à pergunta inicial "É possível a realização de rodas de conversa virtuais?", a equipe tentou conhecer a viabilidade da realização das rodas de conversa na modalidade virtual a partir da observação e análise dos encontros.
A plataforma escolhida para a realização das Rodas/Redes foi a Zoom. Optou-se pela não gravação dos encontros, e as observações e a coleta de dados e materiais de pesquisa aconteceram durante a sua realização.
As categorias de análise foram resultado da utilização do Cone Invertido, instrumento de avaliação sistematizado por Pichon-Rivière2. Nele, são apresentados seis vetores de análise que se relacionam entre si e que permitem verificar os fenômenos e movimentos do grupo; por exemplo, como o grupo interage entre si e no contexto em que se encontra a partir das tarefas objetivas e subjetivas oferecidas.
Visca3 sintetiza os vetores de análise do Cone Invertido da seguinte forma:
[...] em poucas palavras, a pertença consiste na sensação de sentir-se parte, a cooperação consiste nas ações com o outro e a pertinência consiste na eficácia com que se realizam as ações. Por outro lado, a comunicação pode ser caracterizada como o processo de intercâmbio de informação, que pode ser entendido desde o ponto de vista da teoria da comunicação ou a partir da teoria psicanalítica etc., a aprendizagem, como a preensão instrumental da realidade e a telé - palavra de origem grega, tomada de Moreno -, como a distância afetiva (positiva-negativa).
Para ampliar a análise, os vetores são divididos em cumulativos (pertencimento, cooperação, pertinência) que, conforme o grau de evolução do grupo em relação à tarefa, podem indicar maior eficácia na sua realização, que é a finalidade do grupo. Do outro lado do cone, encontram-se os vetores qualitativos (comunicação, aprendizagem e telê), que são indicadores de como o grupo vai construir a finalização da tarefa.
A realização da tarefa com maior grau de eficácia traz em si o objetivo maior de um grupo, que é a aprendizagem de todos e entre todos, mantendo a unidade, sem desconsiderar a singularidade dos participantes.
A cada edição das rodas de conversa a equipe reunia-se virtualmente e buscava aplicar a análise das dinâmicas vivenciadas, baseando-se nos vetores do Cone Invertido. Além disso, o material de divulgação nas redes sociais, os grupos de WhatsApp criados para cada edição, as avaliações simbólicas realizadas com os participantes e os registros de cada encontro tornaram-se materiais de investigação complementares.
O conceito de ECRO (Esquema Conceitual Referencial Operativo), de Pichon-Rivière2, foi fundamental para que a equipe de coordenação pudesse conhecer e pesquisar os fenômenos envolvidos no processo das Rodas/Redes. A partir deste conjunto organizado de conceitos universais, esquemas de conhecimento, momento cultural/histórico, tanto da equipe de coordenação como dos participantes, pôde-se investigar dialeticamente os fenômenos observados.
RESULTADOS
Sobre a tarefa objetiva
A escolha das tarefas propostas foi realizada pela equipe, a partir da escuta das necessidades sociais emergentes, a fim de proporcionar o espaço de reflexão necessário ao objetivo. A tarefa de cada Roda/Rede partiu de consignas organizadas com o uso de textos e artigos elaborados e selecionados pela equipe. A coordenadora abriu o encontro com um disparador - leitura de um texto ou apresentação de autoras de um livro - com duração de 10 a 30 minutos. O disparador serve como apoio e referência para a realização da tarefa, assim como "para disparar no grupo o desejo de aprender sobre a tarefa"4.
Em seguida, foi oferecida uma tarefa aos participantes, convidando-os a refletir e fazer colocações sobre suas práticas referentes ao tema abordado. A função da coordenação foi observar e intervir de modo a levar o grupo ao menor grau possível de afastamento da tarefa.
Sobre o enquadramento
A equipe organizou o processo de decisão por meio de conversas e proposições, refletindo em conjunto a partir das observações pelo viés operativo. Na experiência da equipe, a unidade de ação foi garantida, e foi possível avaliar, registrar e compartilhar as reflexões, considerando-se que:
En los procesos virtuales debe prevalecer la comunicación fluida y efectiva, en una atmósfera cálida y con un acompañamiento constante de las actividades que realizan los participantes. Para esto se hace necesario definir un protocolo de comunicación, denominado netiqueta o etiqueta en la red, a efectos de que lo plano que pueda ser la comunicación entre computadoras se favorezca con la cercanía y calidez entre los interlocutores. Todo esto sin perder de vista el aprovechamiento de los recursos tecnológicos disponibles, con la apropiada selección de las bondades de la sociedad del conocimiento.5
Antes das Rodas/Redes, houve a organização para divulgação e inscrições on-line; durante, uma integrante da equipe assumiu o papel de coordenadora e foi responsável por receber os integrantes da edição, apresentar a consigna de abertura, fazer as intervenções, oferecer a consigna para a avaliação simbólica e realizar o encerramento da atividade; após, reuniu-se o material de avaliação simbólica para análise e divulgação.
Sobre a avaliação dinâmica
Ao final de cada Roda/Rede de conversa, houve o momento da avaliação dinâmica simbólica, por meio de consignas, a fim de integrar as trocas e o percurso das tarefas realizadas, bem como o encerramento da própria tarefa.
Um conjunto de palavras foi coletado e transformado com o recurso nuvem de palavras, sendo possível considerar as contribuições do grupo, observar os aspectos subjetivos e traduzir as sínteses realizadas.
Panorama das Rodas/Redes (Quadro 1)
DISCUSSÃO
Em tempos de pandemia de COVID-19, a conjugação do verbo aprender é utilizada intensamente. A proposta inicial da equipe era oferecer uma roda de conversa virtual, partindo do conhecido rumo a novas experiências. No início, observou-se que a circularidade característica da roda não era possível, e foi surgindo o nome rede, mais apropriado à experiência vivida. No segundo encontro, o nome estava em transição: roda/rede. A configuração do ambiente e a composição do grupo formado por participantes de todo o país trouxeram os elementos necessários para a rede que se configurava; e nomeou-se a rede virtual de conversa: Roda/Rede.
A Roda/Rede tem um ambiente educativo diferente: a tela é o espaço, composto por pedaços de cenários individuais, pequenas janelas, que não permitem a percepção de todos os sentidos; vê-se apenas parte da dinâmica corporal dos integrantes, apenas a cabeça; o plano de relação é bidimensional, e os silêncios, tão importantes no processo de aprendizagem grupal, podem ser entendidos como falha técnica. As imagens nem sempre estão nítidas, e a experiência pode levar à aprendizagem de como se apresentar frente a uma câmera, de modo que se perceba uma imagem mais compreensível. Outro fator observado foi a necessidade de direcionamento da atenção constante à tela, devido à limitação do plano fechado.
Arteaga et al.6 (p. 100-1) contribuem, assinalando que:
[...] pero al mismo tiempo que el acceso al conocimiento puede hacerse más amplio, es importante cuidar que el efecto de la virtualización no socave las condiciones socio culturales que nos hacen personas de carne y hueso, con capacidades sensoriales, emocionales y simbólicas que ponemos a disposición de la construcción social y cuyo soporte es la comunicación interpersonal cotidiana real y no precisamente virtual. Las habilidades de comunicación, de resolución de conflictos, la importancia de encarar proyectos cooperativos y colaborativos, pueden estar en peligro si el contacto directo está siendo sustituido por el contacto a través de un monitor o un dispositivo inteligente.
En este sentido, buscar estrategias metodológicas para procesos educativos virtuales que aborden lo mejor de las posibilidades comunicativas, se hace evidente.
A experiência da coordenação virtual que, em posterior análise, foi compondo um novo saber, um novo recurso de ação psicopedagógica em um ambiente educativo virtual.
As perguntas formuladas inicialmente nortearam as reflexões. No entanto, considera-se pertinente diferenciar uma roda de conversa presencial de uma atividade virtual.
Rede pode ter muitos sentidos, mas aqui interessa o conceito de conjunto de computadores e dispositivos conectados uns aos outros, incluindo-se as pessoas que comandam os computadores.
Trata-se de um ambiente educativo que, por enquanto, oferece mais questões que afirmações, algumas descritas a seguir.
Como observar a dinâmica de um grupo virtual?
O primeiro fator a ser observado é a filiação à tarefa. O comprometimento dos participantes foi um dado significativo para a investigação do pertencimento. Os indivíduos demonstram menos engajamento, apoiando-se no anonimato virtual?
O plano bidimensional oferece informações acerca de expressões faciais com olhares dirigidos para diferentes direções, janelas fechadas, com imagens pouco nítidas, que se abrem e se fecham, além de outras possibilidades que impedem a observação da circularidade da dinâmica corporal, mas podem indicar o movimento do grupo em relação à tarefa e ao grau de pertencimento, de cooperação e de qualidade da comunicação.
Como os integrantes dos grupos preparam-se e apresentam-se frente à câmera?
Preparam-se para serem vistos pelos outros? Há uma consciência do impacto da imagem perante um grupo? Qual é o cenário escolhido? Existe uma ética virtual de apresentação em construção? Estes aspectos podem ser elementos de análise: é possível que grupos que se constituem para uma tarefa que inclui mais do que um encontro fortaleçam a importância desses elementos, pois, uma vez que a imagem oferecida para ser vista por muitos permite a entrada, muitas vezes, em um âmbito privado, que expõe e, portanto, confunde-se com o âmbito público. A possibilidade de fortalecimento dos vínculos estabelecidos indica uma melhor circulação dos saberes, resultando num clima afetivo que pode facilitar a realização da tarefa7.
Pela impossibilidade do encontro físico presencial, a imagem parece ter um significado relevante no contexto estudado, e as janelas fechadas indicam que a participação em atividades virtuais assemelha-se à escuta de um rádio, por exemplo, e essa escolha implica em uma atitude passiva de participação, com uma conduta exclusiva de escuta. Este tipo de comunicação, com o grupo dependente de um comunicador-professor, Kesselman (citado por Portilho et al.7, p. 31) descreve como oral:
A comunicação oral seria aquela que indica um alto grau de dependência entre os interlocutores - um sabe e fala, enquanto o outro escuta e executa.
As conexões pela tela encurtam distâncias e promovem o encontro de culturas diferentes, permitindo conhecer e compartilhar um tempo de aproximação. Observou-se que os modos de agir, de vestir-se e de falar também podem ser apreendidos no grupo, com a partilha de relatos, atuações em diferentes espaços, preocupações, angústias, acertos e possibilidades, mostrando a importância do ECRO grupal.
Vincha et al.8 (p. 10) pontuam ainda que:
[...] grupos incentivam o processo de aprendizagem por meio da comunicação e da cooperação entre os participantes, contexto no qual as informações são socializadas e articuladas à experiência, possibilitando reflexões e elaborações. Desse modo, compreende-se que a comunicação interfere na possibilidade de apoio mútuo e na expansão de novos aprendizados.
Como observar a temática de um grupo virtual?
O que é dito pelo grupo por meio de palavras é chamado de temática. É preciso considerar a emissão da palavra, e chama a atenção o fato de haver orientações técnicas para que o administrador (uma das integrantes da equipe) controle os microfones dos participantes, a fim de evitar sons que interfiram na comunicação. Isso contraria o princípio psicopedagógico que contempla o direito de todos ao uso da sua palavra em rodas de conversa. Assim, optou-se pela intervenção psicopedagógica nomeada como vivência do conflito, considerando que o momento é de processo de alfabetização virtual e que cabe aos grupos a autorregulação, como também a cada um o exercício de aprender a participar de uma atividade virtual, buscando uma atitude cooperativa e respeitosa.
Também se constatou que a palavra circulou de uma maneira diferente, pouco ou muito pouco.
Os momentos de silêncio têm outro valor e podem ser interpretados como um aspecto desfavorável ao andamento do trabalho grupal. O fato de cada sujeito estar olhando a si mesmo traz um elemento que pode favorecer ou prejudicar a participação: Eu vejo a mim mesmo enquanto vejo o outro? Eu vejo a mim mesmo como o outro me vê? Como estou na janela? Será esse um impeditivo para a participação?
Como entender o funcionamento de um grupo de aprendizagem virtual?
As adaptações às constantes do enquadramento realizadas revelaram-se em constante processo de aperfeiçoamento. Dar espaço ao sentir e ao ouvir no decorrer da experiência permitiu um passo a mais em cada nova adaptação das edições realizadas.
Refletir sobre o grau de pertença do grupo em relação à tarefa evidencia-se muito desafiador no contexto não presencial. Os vínculos entre os membros do grupo e deles com a tarefa esbarram-se nos limites impostos pelas telas. Dependendo do número de participantes e da plataforma utilizada, é impossível visualizar todos em uma mesma tela.
Em relação à produtividade do grupo e à pertinência aos objetivos da Roda/Rede, também é possível questionar se o modelo on-line no contexto pandêmico favorece ou não o grau de eficácia. Qual é a relação entre grau de pertença e pertinência? Muitas vezes, foi preciso retomar a consigna inicial, buscando-se a pertinência ao tema proposto, mas também se apresentou a necessidade latente de um espaço para trocar informações e experiências, para discutir novas ideias e propostas ao momento atual de pandemia, mostrando-se por meio de falas e do silêncio presente.
Seria possível afirmar que as tarefas subjetivas, que traduzem a dimensão inconsciente do grupo, refletiram fortemente no desenvolvimento de algumas tarefas objetivas, dada a complexidade do momento?
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Da roda de conversa para a Roda/Rede: uma prática possível?
Ao estabelecer conexões e aproximações com outras áreas do conhecimento, no que se refere ao movimento das rodas de conversa no campo educativo e social, encontram-se delineamentos que permitem vislumbrar possibilidades para as Rodas/Redes.
O entendimento de que uma roda, em sua natureza, revela incorporação de processos preexistentes para mobilizar novos elementos das relações sociais emergentes dá espaço para entender que talvez se esteja vivendo os primeiros passos de um novo formato de roda, o qual reverberará nos modos de vida e de interação das próximas gerações.
A função simbólica da roda como espaço de interação de vozes e de produção e ressignificação da cultura através da palavra permite entender que o contexto social dos participantes e os processos internos de funcionamento das rodas estão em constante movimento. Senge (citado por De Lucca et al.9, p. 596) enfatiza a
[...] capacidade de realizar conversas ricas em aprendizados, que equilibrem a indagação e argumentação, em que as pessoas exponham, de forma eficaz, seus próprios pensamentos e estejam abertas à influência dos outros.
Nesse sentido, o ato de compartilhar em roda é o que permite a abertura de espaços para constituição de novas vivências e experiências de mundo. Seria a Roda/Rede uma delas?
Almeja-se que esse relato de experiência psicopedagógica seja uma primeira aproximação à temática das rodas virtuais e ao funcionamento das Rodas/Redes propostas. Apesar de sua prática ter nascido e ganhado lugar diante de uma realidade pandêmica emergencial, pode vir a se configurar como uma alternativa de aproximação do sujeito humano na busca de satisfação de suas necessidades dialógicas, que geram outras necessidades e, assim, sucessivamente.
REFERÊNCIAS
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2. Pichon-Rivière E. O processo grupal. São Paulo: Martins Fontes; 1988. [ Links ]
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Endereço para correspondência:
Simone Carlberg
Rua Colombo, 254 apto. 3
Curitiba, PR, Brasil - CEP 89540-250
E-mail: sicarlberg@hotmail.com
Artigo recebido: 20/8/2021
Aprovado: 20/10/2021
Trabalho realizado na Associação Brasileira de Psicopedagogia - Seção Paraná (ABPp PR), Curitiba, PR, Brasil.
Conflito de interesses: As autoras declaram não haver.