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Acta Comportamentalia

versão impressa ISSN 0188-8145

Acta comport. vol.19 no.2 Guadalajara  2011

 

 

Jogo na terapia comportamental em grupo de crianças com TDAH

 

Use of games in behavioral group therapy for children with ADHD

 

 

Fabiana Tintori1; Diana Ferroni Bast; Márcia da Rocha Pitta

Clínicas Integradas (CLIN)

 

 


RESUMO

Num quadro característico de TDAH, observam-se Déficits e excessos comportamentais importantes e que interferem no funcionamento global da criança. Diante disso, o terapeuta pode utilizar os jogos de mesa em um contexto grupal em que contingências podem ser planejadas para se obter aquisições comportamentais como: controle por regras; desenvolver repertório de autocontrole; desenvolver repertório social; aumentar a auto-estima; desenvolver repertório de atenção; aprender comportamentos de organização; desenvolver repertório acadêmico e cognitivo. A utilização de jogo num contexto em grupo propicia a exposição direta das crianças a situações de interação social num contexto protegido, auxilia na manutenção de comportamentos desejáveis e possibilita ao terapeuta manejar adequadamente habilidades sociais. No presente trabalho são descritos o papel dos jogos e a forma como são utilizados, partindo-se de uma perspectiva em grupo de uma população específi ca de crianças com diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

Palavras chave: Terapia comportamental; psicoterapia de grupo, crianças; jogos e brinquedos, TDAH


ABSTRACT

As a part of Attention deficit/ Hyperactivity Disorder (ADHD) features, signifi cantly behavioral deficits and excesses can interfere in child's overall functioning. Games can be used on behavioral group therapy with this specifi c population of children diagnosed with ADHD through playing situations. In this context, contingencies may be planned to obtain some behavioral developments: following rules, self control, social skills, self-esteem, increase stimulus control, organization, problem solving skills, academic skills and other important abilities. The role of the games and how it can be used to develop these behavioral abilities are described in this article, as well as how therapist can plan reinforcement contingencies to maintain the child's behavior and develop their social skills. This article contains the role of games and how they are used. It is a group perspective of a specifi c children`s population diagnosed with ADHD.

Keywords: Behavior therapy; psychotherapy, group; children; play and playthings; ADHD.


 

 

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV-TR, APA, 2002) utiliza a terminologia Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) para sistematizar comportamentos de desatenção, impulsividade ou desinibição e excesso comportamental. Nos critérios diagnósticos apresentados pelo DSM-IV-TR (APA, 2002), essas características devem ocorrer por mais de seis meses, são observadas pela primeira vez por volta dos sete anos e permanecem durante o desenvolvimento da criança, comprometendo sua atuação diária e podendo causar sérios prejuízos no desenvolvimento psicossocial, cognitivo e acadêmico. Estes Déficits podem aparecer em uma idade precoce (antes dos sete anos) e tendem a se apresentar nos diversos ambientes que a criança freqüenta ao longo do tempo (Waschbusch, Kipp & Pelham, 1998).

Segundo Barkley (2006), o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade seria resultante de uma disfunção cerebral, principalmente na região anterior do lobo frontal, responsável por Déficits cognitivos das funções executivas. Essas alterações infl uenciam na capacidade de planejar e antecipar conseqüências, de controlar impulsos, de iniciar uma ação, de modifi car as estratégias a partir dos resultados obtidos, de verifi car a validade da ação e da falta de motivação para iniciar e manter-se atento à realização das tarefas. Dessa forma, a difi culdade de inibição da resposta impulsiva seria um comprometimento cognitivo importante presente no TDAH.

Em termos comportamentais, as características do TDAH expressam-se claramente em comportamentos comuns presentes no repertório comportamental da criança como o de responder a uma pergunta sem esperar a vez, falar quando não é solicitado, dar respostas inadequadas ou incorretas, passar ao tópico seguinte sem terminar o anterior, construindo anotações confusas e inacabadas, de interromper a fala das pessoas em ocasião imprópria (Pardini & Fite, 2010; Gallardo-Paúls, Gimeno-Martinez, & Moreno-Campos, 2010).

Além da difi culdade de controle do impulso, prejuízos atencionais são também observados nesta patologia. Caracterizam-se como Dificuldades de selecionar os estímulos relevantes da situação, o que poderia se relacionar com a facilidade para se distrair com estímulos de menor importância e concorrentes do ambiente. Observa-se ainda difi culdade de sustentar a atenção por período prolongado de tempo, falta de habilidade de fi car atento a atividades que requerem longos períodos de realização, como leitura de parágrafos longos (Ek, Westerlund, Holmberg, & Fernell, 2010; Hechtman, 2005).

Outro padrão comportamental existente nessas crianças é o de desorganização no planejamento da vida em geral (Araújo, 2003; Artigas-Pallares, 2003; Diamond, 2000; Farré; Gol & Jarus, 2005; Narbona, 2001; Kadesjo, 2001; Piek & Hay, 1999): com freqüência perdem e danifi cam os materiais escolares, perdem data de entrega de tarefas devido à difi culdade para se organizarem no tempo.

Além de difi culdade no âmbito escolar, apresentam comprometimentos na área social decorrentes dos sintomas primários do TDAH, como mencionado acima (Ek, Westerlund, Holmberg, & Fernell, 2010). Os excessos e Déficits comportamentais difi cultam a convivência com outras crianças e com adultos (Hechtman , 2005; Gol & Jarus, 2005; Weiss & Weiss, 2002), que freqüentemente se mostram irritados com a agitação e o barulho que elas podem apresentar, reagem de forma punitiva não só a este aspecto como também à criança em geral, afastando-se dela (Barkley, 2006).

Quanto ao tratamento, os medicamentos estimulantes são recomendados para o tratamento de TDAH e podem atuar bioquimicamente alterando a predisposição do organismo de agir de forma impulsiva e/ou agressiva (O'Callaghan, Reitman, Northup, Hupp, & Murphy, 2003). No entanto, os agentes farmacológicos não promovem diretamente a aquisição de habilidades sociais, nem outras habilidades úteis para o dia-a-dia, como por exemplo, resolução de problemas (Thienemann, 2005) e, recentemente, sua eficácia está sendo questionada por alguns pesquisadores como Koester, Becker, Kilian, Ferget e Wieinmann (2009).

O tratamento padronizado (Barkley, 2006; Chronis e cols., 2004; Waschbusch et al, 1998; Weiss & Weiss, 2002) é a combinação de intervenções comportamentais que poderiam envolver psicoeducação, treino parental no manejo de habilidades sociais, intervenções feitas na sala de aula, manejo de contingências, treino de habilidades sociais, dentre outras; e medicamentos estimulantes, sendo que em alguns casos, a depender da gravidade, a terapia comportamental poderia ser recomendada sem medicamentos (American Academy of Pediactrics).

Apesar de serem escassos na literatura estudos comparando a eficácia de tratamentos comportamentais grupais versus individuais em TDAH, Thienemann (2005) defende que a terapia em grupo pode ter resultados superiores aos da terapia individual. De acordo com o autor, os participantes muitas vezes se sentem diferentes das demais pessoas em uma comunidade ou família e, nessa situação, podem compartilhar experiências, sentimentos e vivências semelhantes. Além disso, o autor considera a terapia em grupo vantajosa em termos de desenvolvimento, pois permite que as atividades sejam estruturadas para crianças ou adolescentes com idades semelhantes.

A favor da terapia em grupo, pesquisas (Bramhan et al, 2009; Pelham, 2001; Waschbusch et al.,1998) apontam que este tratamento tem sido bastante eficaz no manejo de TDAH, além de ser uma alternativa economicamente viável para os clientes (Weiss & Weiss, 2002).

Waschbusch et al (1998) chamam a atenção dos especialistas para que não se percam de vista as diferenças individuais no tratamento, pois enquanto as estatísticas mostram que 60-80% das crianças com TDAH apresentam uma resposta positiva ao uso de medicamentos em muitas áreas da vida, outras 20-40% não mostram nenhuma mudança ou mostram piora. Da mesma forma, o uso de um roteiro padronizado no tratamento pode fazer com que se perca a funcionalidade da emissão de certos comportamentos durante a sessão e ocorra a substituição de sintomas (Banaco, 1999). Finalmente, Waschbusch et al (1998) alertam também que antes de qualquer tomada de decisões em relação ao tratamento, é importante que se verifique se poderá ocorrer a generalização do tratamento de TDAH nos diferentes aspectos da vida da criança.

 

A UTILIZAÇÃO DOS JOGOS DE MESA NA TERAPIA COMPORTAMENTAL INFANTIL DE CRIANÇAS COM DIAGNÓSTICO DE TDAH

O atendimento infantil na perspectiva analítico-comportamental utiliza atividades lúdicas como ferramenta de intervenção importante, visto que o repertório comportamental da criança ainda é restrito para que possa se benefi ciar de uma terapia puramente verbal (Guerreras, Bueno & Silvares, 2000; Silvares, 2001; Regra, 2000).

A interação e participação das crianças nos jogos pode ser uma fonte de reforçamento em si mesma visto que através da brincadeira a criança se relaciona com o ambiente externo, agindo sobre o meio e sofrendo as conseqüências de sua ação (Guerreras, Bueno & Silvares, 2000).

Em uma situação de jogo, a criança se expõe a estímulos variados e aprende a se comportar de forma diferenciada frente às estimulações, conforme as regras e as contingências envolvidas (Gadelha e Menezes, 2004; Guerreras, Bueno & Silvares, 2000; Soares, Moura & Prebianchi, 2003). Além disso, a situação de jogo conduzida pelo profi ssional dá a possibilidade do terapeuta observar e analisar os comportamentos envolvidos na interação das crianças entre si e de suas participações no jogo, identifi car as variáveis das quais os comportamentos são função e direcionar os procedimentos apropriados ao manejo das contingências envolvidas (Gadelha e Menezes, 2004; Guerreras, Bueno & Silvares, 2000; Regra, 2000; Silvares, 2001; Soares, Moura & Prebianchi, 2003).

Foi somente a partir da década de 1940 que a inserção de jogos estruturados surgiu dentro da modalidade de terapia infantil (Knell, 1995). Até então, utilizava-se na prática clínica o brincar espontâneo, ainda muito usado nos dias atuais. Em distintos tipos de atendimento, seja individual ou em grupo, jogar caracteriza-se como uma atividade estruturada na medida em que regras, normas, instruções e exceções são estabelecidas.

No presente trabalho serão descritos o papel dos jogos de mesa e a forma como são utilizados, partindo- se de uma perspectiva em grupo a uma população específi ca de crianças com diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

Diante de um quadro característico de TDAH, no qual se observam Déficits e excessos comportamentais importantes, que interferem no funcionamento global da criança, planejam-se contingências na situação de jogo de mesa para que seja possível obter aquisições comportamentais como: controle por regras, desenvolvimento de repertório de autocontrole, desenvolvimento de repertório de atenção, ampliação de repertório social, melhoria da auto-estima, aquisição de comportamentos de organização e desenvolvimento de repertórios acadêmico e cognitivo.

 

O PAPEL DO JOGO COM GRUPOS DE CRIANÇAS COM DIAGNÓSTICO DE TDAH

Utilizados terapeuticamente, os jogos de mesa podem exercer diferentes papéis. Diante da situação do brincar em grupo utilizando jogos é possível avaliar o repertório comportamental da criança na interação com o terapeuta e com as demais crianças (situação muito próxima da real), já que é na relação da criança com o meio que os comportamentos-problema da vida cotidiana são emitidos e podem ser melhor trabalhados (Guerrelhas, Bueno & Silvares, 2000). O contato da criança com o jogo proporciona também o acesso a sentimentos e outros comportamentos encobertos, na medida em que ao jogar a criança expressa o que sente e o que pensa (Macedo, Pitty & Passos, 2000).

O caráter lúdico dos jogos permite o desenvolvimento de boa relação interpessoal entre terapeutacriança e criança-criança, contribuindo para que habilidades motoras, cognitivas, sociais e acadêmicas, muitas vezes deficitárias, sejam desenvolvidas mediante um ambiente reforçador (Shives, 2007). Além disso, o jogo pode ser utilizado como uma fonte de reforçamento na situação de terapia, na medida em que é usado como uma conseqüência positiva diante de comportamentos desejáveis emitidos pela criança. Deste modo, ao emitir um comportamento desejável pouco freqüente em seu repertório, como o de permanecer sentado durante a atividade, por exemplo, poderá receber como conseqüência desse comportamento o direito de escolher o próximo jogo.

A situação de jogo no contexto de grupo propicia a exposição direta das crianças a situações de interação social, possibilitando ao terapeuta visualizar os fatores que infl uenciam e mantém os comportamentos da criança e manejar adequadamente habilidades sociais num contexto protegido e quase natural, já que o comportamento de brincar é comum entre as crianças em diversos ambientes (Guerreras, Bueno e Silvares, 2000). Além disso, o jogar em grupo possibilita que a criança aja diretamente sobre o comportamento das outras crianças, modifi cando-os (Ferraz, 2005). Tendo em vista que crianças com tal diagnóstico podem apresentar prejuízos nas interações sociais, os comportamentos importantes para o estabelecimento de um bom relacionamento interpessoal que podem ser instalados na situação de jogo são: contato visual adequado, oferecer ajuda para guardar os materiais e arrumar o ambiente terapêutico, ajudar ou pedir ajuda ao amigo quando encontrar Dificuldades, pedir para escolher o jogo, pedir permissão para pegar ou manusear materiais da sala de terapia, manusear adequadamente os materiais, responder verbalmente ao amigo ou terapeuta quando for solicitado, perguntar quando não entende instruções ou regras estabelecidas, falar somente quando outra pessoa não estiver falando, falar em tom de voz adequado, fazer somente comentários positivos em relação a si mesmo e aos demais, aprender a ceder, aprender a reclamar e exercer direitos assertivamente.

Ao entrar em contato com as regras do jogo a criança tem a oportunidade de aprender a seguir regras em uma situação concreta. Dentre os comportamentos de seguimento de regras que podem ser observados a partir da situação de jogo estão: o comportamento de engajar-se em atividades propostas pelo terapeuta frente a instruções dadas, o de aguardar a vez para jogar e o de atender a solicitação dada na situação.

Além destas regras, outras são elaboradas juntamente com as crianças no início do processo terapêutico e que envolvem o desenvolvimento de habilidades sociais e cognitivas para o enfrentamento de situações desafi adoras (Ferraz, 2005). Estas regras são também utilizadas para promover a avaliação e auto-avaliação do desempenho de cada criança. Na sala de terapia ficam afixadas em lugar visível, visando o acesso às regras pelas próprias crianças e pelo terapeuta. Algumas sugestões de regras podem ser desenvolvidas, como: errar pode, desistir nunca; falar somente quando outra pessoa não estiver falando; falar baixo; não fazer comentários sobre o comportamento de outras crianças da sessão, que as coloquem em situação desfavorável; esperar a vez; elogiar o amigo; resolver impasses de relacionamento de forma não agressiva.

No início, provavelmente, o comportamento de seguir regras é instalado e mantido utilizando-se conseqüências sociais e arbitrárias planejadas pelo terapeuta (ex. elogios pareados a confeitos de chocolate e a pontos extras no jogo, por exemplo), mas na medida em que a criança entra em contato com as conseqüências naturais reforçadoras, o comportamento adquirido também pode ficar sob controle dessas conseqüências naturais (ver Catania, 1999, p. 279). Consequentemente, a criança pode aprender comportamentos escassos no seu repertório, fundamentais para um bom desempenho em diversas atividades que venham a desenvolver. Por exemplo, uma criança que freqüentemente tem um desempenho ruim em jogos porque na maioria das vezes fala junto com terapeuta ou colega que está explicando o jogo, pode vir a ter um desempenho melhor do que o habitual quando segue a regra de "esperar a vez para falar", não só em função de conseqüências arbitrárias, mas porque também entrou em contato com as conseqüências naturais do jogo (ex. aprendeu as possibilidades do jogo e pode fazer melhor suas escolhas dentro dessas possibilidades).

A situação de jogo propicia ainda o desenvolvimento de repertório atencional, dentro do qual estão comportamentos como o de focar a atenção em estímulo discriminativo relevante, de manter a atenção por mais tempo, de continuar uma tarefa mesmo com interrupções e de continuar uma tarefa mesmo com estimulação concorrente frente a estímulos relevantes. Na situação de jogo trabalha-se com tais comportamentos o tempo todo, na medida em que sem os mesmos não é possível desempenhar-se adequadamente e obter resultados favoráveis no final das partidas.

Além disso, trabalha-se com comportamentos de organização como arrumar os materiais do jogo de forma eficaz sobre a mesa para garantir melhor desempenho e começar um novo jogo somente quando o material do anterior já estiver guardado.

Os temas e assuntos abordados no jogo podem propiciar à criança o aprendizado de conteúdos abstratos e de entrar em contato com novo conhecimento, desenvolvendo o repertório cognitivo e acadêmico. O jogo também pode aproximar a criança de conteúdos escolares (matemática, história, geografi a, português) ao ser apresentado com níveis graduais de dificuldade. A intervenção realizada pelo terapeuta modela habilidades importantes no repertório comportamental para aquisição destes conteúdos. Por meio dos desafios propostos pelos jogos, o terapeuta tem a oportunidade de desenvolver habilidades de enfrentamento, ao mostrar à criança que o mais importante na situação de jogo não é a vitória, mas a persistência na resolução do desafio e superação das dificuldades. E mais, que para ganhar é preciso emitir comportamentos desejáveis durante a situação de jogo e nunca desistir do desafio. Assim, ganhar não é questão de sorte, e perder e errar fazem parte do processo de jogar (Ferraz, 2005; Aguilar & Valle, 2005). Desta forma, o terapeuta cria condições que podem favorecer a criança a perceber que a maneira como ela se comporta está relacionada às conseqüências que terá.

Essa exposição a conteúdos desafiantes no contexto de jogo abre caminhos para que o terapeuta possa modifi car o autoconceito da criança, muitas vezes prejudicado, pela história de punição ao qual pode ter sido exposta. Esta modifi cação é possibilitada pelo fato de a criança entrar em contato com conteúdos escolares de forma gradual por intermédio de uma atividade lúdica (jogo), na presença de um adulto que não pune os seus comportamentos, incentivando-o constantemente a buscar alternativas para resolver as Dificuldades, sem desistir (Macedo, Pitty & Passos, 2000). Assim, uma vez restabelecido o conceito positivo sobre si mesma, a criança passa novamente a entrar em contato com tais conteúdos, por perceber que esse contato pode ser prazeroso e não gerar punição como antes, caso a criança tenha tido seu autoconceito prejudicado.

Logo, o trabalho com jogos dá à criança a oportunidade de se comportar e de organizar as contingências em vigor na medida em que aumenta a probabilidade de ela relacionar o seu comportamento à conseqüência obtida. Durante a execução do jogo, o comportamento da criança é permanentemente descrito pelo terapeuta ao relacioná-lo com a devida conseqüência. Assim, ao relacionar o bom desempenho da criança no jogo a comportamentos como manter a atenção a estímulo relevante, planejar e desenvolver estratégias antes de fazer jogadas aleatórias, permanecer sentado ou esperar a sua vez de jogar, o terapeuta mostra à criança, mais uma vez, que a maneira como ela se comporta está diretamente relacionada às conseqüências que terá, envolvendo a criança diretamente na identifi cação de variáveis de controle do seu próprio comportamento.

Além disso, uma vez utilizado para planejar um ambiente propício ao desenvolvimento de habilidades, os jogos favorecem também a aplicação de estratégias comportamentais tais como modelação, modelagem, feedback positivo e ensaios comportamentais (Ferraz, 2005). Assim, comportamentos como baixo autocontrole, baixo controle por regras, baixa auto-estima, baixa tolerância à frustração e excessos comportamentais (como movimentos e vocalizações em alta freqüência) diminuem de freqüência e novos comportamentos que tem a probabilidade de gerar mais reforço positivo do que punição são instalados.

Outra vantagem que o contexto de terapia comportamental em grupo com jogos propicia é a semelhança das habilidades e comportamentos modelados que também são exigidos nos demais âmbitos de vida da criança (escola, social) (Guerrelhas, Bueno & Silvares, 2000). Conseqüentemente, essa semelhança aumentaria a probabilidade dos comportamentos modelados na terapia serem generalizados para outros ambientes da criança.

Diante desta perspectiva, pesquisas mostram a importância do jogo em terapia (Bayat, 2008; Diaz & Lieberman; 2010; Filaccio, 2009; Lawver & Blankenship, 2008; Liles & Packman; 2009; Thiennemann, 2005; Millard & Cook, 2010; Reddy, 2010) e o seu papel em auxiliar a criança a estabelecer novas relações com os colegas, com adultos (terapeuta), com a situação de atividade e com os conteúdos pedagógicos às quais é exposta, na medida em que aprende a se comportar de forma diferenciada frente ao novo ambiente e pode generalizar tal atuação para os demais ambientes de sua vida (Ferraz, 2005; Gadelha & Menezes, 2004; Thiennemann, 2005; Regra, 2000; Silvares, 2001).

 

REQUISITOS PARA UMA SITUAÇÃO DE JOGO

Estabelecer objetivos para utilização do jogo

Antes de escolher qualquer jogo o terapeuta deve ter clareza dos objetivos de cada jogo que dispõe na sala de terapia. Diante disso, deverá selecionar o jogo de acordo com as características das crianças pertencentes ao grupo (mencionadas anteriormente) e com os objetivos que pretende alcançar com tais crianças na situação de terapia.

Materiais utilizados

Os materiais prontos, ou seja, jogos que são ou já foram comercializados, podem ser utilizados conforme estipula o jogo ou adaptados pelo terapeuta a fim de trabalhar conteúdos e objetivos específicos. É de extrema importância a organização prévia do material para que não haja interferência no ritmo da sessão.

Adaptações e modificações

As modificações e adaptações sofridas por muitos jogos utilizados no trabalho são realizadas pelo terapeuta com dois intuitos, o de simplificar a execução do jogo e o de proporcionar situações mais desafi adoras (Macedo, Pitty & Passos, 2000). Tais modificações variam de acordo com a evolução das crianças. Desta forma, inicia-se sempre com jogos de nível de difi culdade pequeno e gradualmente aumenta-se o nível de difi culdade, atentando-se sempre para as habilidades das crianças e pré-requisitos das atividades propostas.

Tempo de realização dos jogos

Outro requisito importante para escolha do jogo envolve o tempo que o mesmo requer para ser executado. O terapeuta deve levar em consideração o tempo necessário para a realização da atividade (desenvolvimento do jogo) e o tempo total da sessão, contando sempre com os imprevistos que podem ocorrer, como excesso de perguntas por parte das crianças, por exemplo.

Espaço físico

Um espaço físico adequado é muito importante quando se pretende trabalhar com grupos de crianças, em especial com crianças com diagnóstico de TDAH. A sala deve ser ampla para que conforte o número médio de cinco crianças; mesas e cadeiras suficientespara acomodar de forma apropriada todas as crianças e com localização estratégica para possibilitar deslocamento fácil; conter material pedagógico, quadro branco, quadro de metal e jogos organizados em armário específico, nunca disposto na mesa de trabalho. Considerando as características principais de crianças com diagnóstico de TDAH, um espaço físico não organizado desta forma difi cultaria o trabalho e alcance dos objetivos. A mesa de trabalho livre, somente com o material a ser utilizado, dá à criança um modelo de organização escasso em seu repertório; a boa acomodação em cadeiras individuais dá a possibilidade de cobrar a permanência na cadeira durante toda a sessão; o armário estruturado na sala de terapia propicia a escolha imediata do próximo jogo à criança que obtiver este benefício pelos comportamentos apresentados; e a acomodação estratégica dos móveis dá a oportunidade do terapeuta se movimentar rapidamente em direção ao quadro branco, ao quadro de metal, aos jogos ou mesmo às crianças.

Habilidade do terapeuta

No trabalho com crianças, de modo geral, a relação entre terapeuta e cliente (crianças) assume grande importância no estabelecimento de procedimentos e no alcance dos objetivos propostos. No caso de crianças com diagnóstico de TDAH, uma boa relação terapêutica passa a ser a condição básica para que qualquer trabalho seja desenvolvido, visto que tais crianças, muitas vezes, sofreram signifi cativa história de punição ao longo dos diferentes ambientes pelos quais passaram (Ferraz, 2005; Hubner & Marinotti, 2004).

Muitas destas crianças, assim como as crianças com Dificuldades de aprendizagem, apresentam défi - cits importantes em relação à leitura, escrita e cálculos matemáticos e assim, entrar em contato com conteúdos escolares pode passar a ser aversivo. Uma postura acolhedora do terapeuta, aliada à utilização de recursos lúdicos como os jogos, torna-se mais favorável ao contato com estes conteúdos e, conseqüentemente, ao desenvolvimento de repertório escolar.

Visto que segundo Hubner e Marinotti (2004), muitas destas crianças foram submetidas a esquemas inconsistentes de consequenciação, é imprescindível ao terapeuta uma postura encorajadora diante dos desafi os e oferecimento constante de reconhecimento diante dos pequenos progressos. A expressão de sentimentos positivos em relação às crianças e contato físico adequado também facilita o trabalho. Porém, o estabelecimento de limites claros se mostra importante já que muitas destas crianças apresentam problemas com limites no seguimento de instruções e comportamentos de esquiva de atividades que requerem habilidades (Ferraz, 2005).

Além disso, o terapeuta comportamental deve ter conhecimento teórico acerca de técnicas e princípios da análise do comportamento a fim de conduzir o trabalho de forma eficiente.

 

ETAPAS ENVOLVIDAS NA SITUAÇÃO DE JOGO

Organização do material na mesa de trabalho

Cabe ao terapeuta pegar o material, direcioná-lo à mesa, bem como organizá-lo, dispondo as peças sobre a mesma. Isso também deve ocorrer durante a situação de jogo no qual o terapeuta deve comandar a execução da atividade.

Em grupos de crianças com diagnóstico de TDAH é comum observar a ocorrência de comportamento de manuseio do material sem a permissão do terapeuta no momento em que o mesmo retira o material da caixa dispondo-o sobre a mesa. Cabe ao terapeuta promover o desenvolvimento de repertório de autocontrole, como por exemplo, na situação imediata de dirigir as mãos em direção ao material a intervenção realizada se dá no sentido da criança controlar as mãos até que receba a instrução de manuseio. Pede-se, assim, para que a criança mantenha as mãos no colo auxiliando-a no controle do comportamento impulsivo emitido frente ao estímulo material.

Outra tarefa do terapeuta relacionada à organização refere-se ao fato dele instalar comportamentos de organização escassos no repertório de crianças com TDAH. Durante a execução do jogo, tais crianças tendem a dispor o material de forma aleatória, espalhado pela mesa, muitas vezes em direções opostas. Neste sentido, o terapeuta pode organizar tal material para dar modelo para a criança de organização e mostrar que organizar o material auxilia no desempenho do jogo e conseqüentemente no resultado final. Durante a troca de jogos, o terapeuta também deve organizar o material da mesa e guardá-lo antes de dispor de outro jogo.

Aprender as regras do jogo

Cabe ao terapeuta apresentar as regras do jogo a ser utilizado, visto que o aprendizado das regras é condição básica para o jogo acontecer. A apresentação das regras pode ocorrer de algumas formas. O terapeuta pode apresentar as regras básicas verbalmente e, em seguida, iniciar a situação de jogo para que a criança exercite concretamente tais regras. Há também a opção de montar o quadro de regras com as próprias crianças, perguntando-lhes quais são as regras de determinado jogo que elas conhecem. Quando o jogo possui muitas regras ou regras complexas para determinado grupo, o terapeuta pode ainda apresentar as regras separadamente, na medida em que a cada partida introduz uma nova regra até que todas as regras sejam aprendidas. (Macedo, Pitty & Passos, 2000). Tudo isso dependerá do grupo em questão. De forma geral, nos grupos de crianças com diagnóstico de TDAH trabalhados é feita a apresentação das regras verbalmente e, em seguida, inicia-se o jogo para que a criança coloque em prática as regras aprendidas.

Além das regras impostas na situação de jogo, há regras que vigoram durante a sessão terapêutica como um todo, e que permeiam a situação de jogo também (já descritas anteriormente). Tais regras são válidas durante toda a sessão: na conversa inicial, durante a execução de jogos e no final da sessão quando o terapeuta faz as reavaliações necessárias.

A execução dos jogos

Quando o material de trabalho do terapeuta baseia-se na utilização de jogos como recurso lúdico, há alguns critérios que devem ser rigorosamente levados em conta para que o trabalho não se perca pelo meio do caminho.

Um deles refere-se ao nível de difi culdade dos jogos. Muitas crianças que recebem diagnóstico de TDAH apresentam Dificuldades importantes que não podem ser desprezadas em momento algum do processo. Assim, cabe ao terapeuta planejar um ambiente no qual os desempenhos mais simples vão se tornando complexos de forma gradual e sendo consequenciados positivamente à medida que ocorrem. As exigências vão aumentando de acordo com os progressos nas habilidades adquiridas (Ferraz, 2005). O terapeuta é quem fará esta graduação a partir das modificações efetuadas nos materiais originais dos jogos.

Por se tratar de crianças com repertório atencional prejudicado tendem a cometer muitas falhas, o que pode contribuir para o comprometimento da auto-estima das mesmas. Então, passam a se esquivar de atividades com caráter desafi ador para evitar erros e conseqüências negativas. Assim sendo, frente aos erros cometidos durante a execução do jogo o terapeuta deverá dar conseqüências amenas para os erros e analisará com as crianças o que pode estar ocasionando tais erros, levantando alternativas para evitar a sua ocorrência. Desta forma, o objetivo principal do terapeuta é o de reverter o comportamento de esquiva, que pode estar presente no repertório.

Apesar de ser indesejável às crianças, as experiências de fracasso e frustração ao obter um resultado negativo no jogo são materiais de trabalho importantes ao terapeuta, na medida em que será a partir destas experiências que poderá ensinar as crianças que fracassar ou errar fazem parte do jogo e do processo de aprendizagem. Porém, não se elege no jogo apenas um vencedor. Todos são considerados vencedores visto que o terapeuta classifi ca-os de acordo com posições (primeiro lugar) e isso acontece até o último jogador. Logo, vencedores não são aqueles que ganham em primeiro lugar, mas os que persistem até o final da atividade. Valorizam-se, assim, comportamentos de buscar soluções, ou seja, o esforço e o empenho na execução da atividade, e não só os resultados obtidos, além de mostrar que o mais importante não é ganhar o jogo, mas permanecer até o final na tentativa de um bom resultado (Ferraz, 2005).

Além disso, outra regra estabelecida e cumprida pelo terapeuta refere-se ao fato de que a conquista destas posições pode ser colocada em risco caso as crianças não as consiga manter e que, para manter, é preciso permanecer sentado mesmo que já tenha vencido, esperar o amigo terminar a atividade e não dar a resposta para ele (amigo). Com isso, amplia-se o repertório de autocontrole.

Ainda durante a execução do jogo, alguns procedimentos são aplicados a fim trabalhar os Déficits e excessos comportamentais apresentados pelas crianças. Um procedimento muito utilizado é o reforçamento diferencial de outro comportamento incompatível com o comportamento-problema. Na terapia pode-se aplicar tal procedimento conseqüenciando-se positivamente todos os comportamentos desejáveis emitidos pelas crianças, provocando o efeito de diminuição de frequência dos comportamentos indesejáveis (Regra, 2004). Pelo fato do trabalho ser realizado em grupos tal procedimento é muito eficiente, já que muitos comportamentos são emitidos, adequados e inadequados, facilitando a aplicação do referido procedimento.

Um exemplo da utilização do procedimento acima citado se dá quando na situação de jogo o terapeuta conseqüencia positivamente o comportamento de uma criança que permanece sentada durante o jogo, enquanto ignora o comportamento de outra criança que, no mesmo momento, perambula pela sala de terapia.

A modelagem é outro procedimento empregado para produzir respostas que não são emitidas ou ocorrem em um nível operante baixo, devido à sua complexidade (Catania, 1999). A resposta que se quer instalar no repertório do indivíduo, nesse procedimento, ocorre a partir da "modifi cação gradual de alguma propriedade do responder pelo reforço diferencial de aproximações sucessivas a uma classe operante alvo" (Catania, 1999; para conferir exemplos clínicos desse procedimento, ver Regra, 2004).

Outro procedimento utilizado é o de modelação, que pode ser defi nido como um processo de aprendizagem pelo qual os indivíduos aprendem comportamentos novos ou modificam os antigos por meio da observação de um modelo. Desta forma, aumenta-se a probabilidade das respostas imitadas serem reforçadas pelas mesmas conseqüências que reforçam o comportamento do modelo (Catania, 1999; para exemplos clínicos, ver Derdik & Groeberman, 2004). Na terapia, os comportamentos do terapeuta e os comportamentos desencadeados na situação de grupo podem servir de modelo para outras crianças do mesmo grupo e, assim, são consequenciados positivamente sempre que ocorrem. Como exemplos, pode-se citar os comportamentos de não se falar quando outra pessoa estiver falando e não manipular materiais na sala de terapia sem a devida permissão.

Construção de Situações-Problema

Durante todo o contexto de jogo o terapeuta trabalha com situações-problema, definidas como situações desafi adoras e de impasse apresentadas às crianças que visam gerar questionamentos e têm como conseqüência a busca de soluções plausíveis (Macedo, Pìtty e Passos, 2000). São situações que podem ser elaboradas pelo terapeuta ou propostas pelo jogo. Podem ser geradas a partir de questionamentos ou pedidos de justifi cativa feitos pelo terapeuta acerca de determinada jogada efetuada, na qual se desafi a a criança a descrever o que a levou a jogar daquela forma e a pensar outras jogadas possíveis para a mesma situação.

Diante de situações-problema, o terapeuta dirige a atenção da criança a observar e analisar aspectos que ele considera importantes. Têm como objetivo principal que a criança atente ao comportamento de jogar, questionando-a na medida em que prevê a conseqüência do mesmo, tornando desta forma o fator sorte e as jogadas de ensaio e erro menos relevantes; além de proporcionar ao terapeuta o acesso a comportamentos encobertos da criança. Trata-se de uma forma diferenciada de trabalhar com jogos, e que permite a relação direta do jogo com atividades escolares (Macedo, Pìtty & Passos, 2000).

Análise do comportamento de jogar

Durante o trabalho realizado com crianças com diagnóstico de TDAH, o terapeuta busca, a todo o momento, fazer uma análise do comportamento da criança na sessão a fim de sinalizar para ela a maneira como se comporta e as conseqüências que produz frente a estes comportamentos. Isso é necessário, visto que estas crianças apresentam comportamentos de impulsividade, desatenção e hiperatividade, na maioria das vezes, não percebidos por elas mesmas, o que pode ocasionar conseqüências aversivas em muitos momentos nos diversos ambientes pelas quais transitam, sem que haja o entendimento dos motivos de tais conseqüências.

Esta análise ocorre do início ao fim da sessão de terapia, desde a escolha do jogo e a instrução do terapeuta para jogar, o próprio comportamento de jogar, os resultados fi nais da partida e por fim um resumo de como cada criança se comportou durante toda a sessão. Tal análise baseia-se no conjunto de regras montado com as crianças, que permanece afixado na sala de terapia (descritos anteriormente) e de outros comportamentos que se deseja extinguir ou instalar no repertório, especificados acima.

Para tal análise podem ser utilizadas conseqüências arbitrárias, em esquema variável de reforçamento, para consequenciar as respostas das crianças de modo mais imediato, já que se supõe que isto facilite o relacionamento desta criança com as conseqüências estabelecidas. Num mural de metal podem ser anexadas folhas individuais (uma para cada criança) nas quais está impressa a fi gura de um gráfico e desenhos contextuais de fundo (chão, nuvem). No eixo Y, estão sinalizadas categorias numéricas que correspondem ao nível de altitude do avião de zero (chão) a dez (nuvens), e no eixo X a passagem do tempo da sessão, assim como mostra a Figura 1.

 

 

O procedimento funciona da seguinte maneira: todas as crianças iniciam a sessão com os respectivos aviões (desenhos de aviões imantados para deslocar sobre o mural metálico) posicionados na base do gráfico. À medida que a sessão avança os aviões são permanentemente deslocados sobre o gráfico de acordo com o comportamento de cada criança. Frente a comportamentos desejáveis (como o de permanecer sentado, esperar a sua vez para jogar, por exemplo) o avião tende a subir e frente a comportamentos indesejáveis (levantar-se durante a realização do jogo, jogar na vez do outro, por exemplo) o avião permanece no lugar. Tal deslocamento ocorre, via de regra, de 10 em 10 minutos, porém é possível deslocar os aviões mesmo fora destes intervalos caso o terapeuta perceba que há necessidade. Um exemplo de tal excepcionalidade pode ocorrer durante a realização das jogadas, quando ainda não se passaram os 10 minutos estabelecidos para o deslocamento dos aviões e uma dada criança se levanta para mexer em materiais que não dizem respeito ao jogo. Nesta situação, o terapeuta eleva os aviões das outras crianças, mantendo o avião da referida criança parado.

O objetivo final é o deslocamento do avião até as nuvens (nível 10). Ao final da sessão, depois de registrados e avaliados os comportamentos emitidos pelas crianças em relação ao percurso de cada avião, são fornecidos reforçadores artifi ciais (confeitos de chocolate, por exemplo) pareados a reforçadores sociais (elogios), ambos proporcionais ao deslocamento final do avião. Tais registros acerca dos estágios atingidos pelo avião durante a sessão são retirados e fi cam em poder do terapeuta, a fim de fornecer a evolução de cada criança ao longo das sessões (monitoramento).

Opta-se pela criação de tal método pela difi culdade de manejar estas crianças, que pelas características próprias do transtorno muitas vezes não atentam para as verbalizações do terapeuta e nem percebem a forma como se comportam. Com os aviões, a todo o momento, as crianças podem olhar para o quadro e comparar o deslocamento de seu avião com o dos demais colegas. Em alguns momentos há questionamentos por parte deles próprios no sentido de quererem saber por que o avião de um está mais abaixo do que o do outro. Neste momento, o terapeuta mais uma vez descreve as contingências em vigor e justifi ca o deslocamento, pedindo ajuda às crianças, a fim de reforçar a relação entre a emissão de comportamentos e as conseqüências que terá. Além disso, esse procedimento auxilia na consequenciação imediata dos comportamentos, condição fundamental para o trabalho com essa população.

Durante a execução do jogo o terapeuta analisa com as crianças as possibilidades de resolução dos problemas propostos pelo jogo deixando que a própria criança opte por uma dada alternativa de escolha e sofra as conseqüências desta escolha. Cabe ao terapeuta analisar também os comportamentos emitidos durante o momento de resolução, ou seja, se a criança permanece na atividade, se está sentada e prestando atenção, se ela persiste nos desafios propostos apesar das Dificuldades. Crianças em início de processo terapêutico, que requerem um suporte maior por parte do terapeuta, beneficiam-se muito deste tipo de análise devido à difi culdade que encontram em perceber as diferentes possibilidades de resolução de um mesmo desafio e da difi culdade de perceber a forma como se comporta e as conseqüências positivas das quais é possível usufruir ao emitir comportamentos desejáveis. Cabe ainda ressaltar que o trabalho com jogos, aqui descrito, prioriza as habilidades de cada criança particularmente, respeitando-se as diferenças individuais e, desta forma, os desempenhos de cada criança são comparados com ela mesma.

Ao final da partida, o terapeuta identifi ca juntamente com as crianças as contingências que vigoraram durante a execução do jogo ao analisar os resultados obtidos por cada um, relacionando estes desempenhos com os comportamentos emitidos durante o jogo. Assim, esclarece porque determinada criança obteve o primeiro lugar, porque outra obteve o segundo e assim por diante. Com isso, pretende-se mostrar às crianças que, para conseguir um bom resultado em desafios propostos por jogos ou mesmo na escola, é necessário emitir comportamentos desejáveis como o de permanecer sentado, o de focar a atenção à atividade, persistir e não desistir em momento algum, pensar antes de responder, organizar o material, entre outros.

 

CONCLUSÃO

Os jogos constituem um rico material de trabalho no processo terapêutico com crianças, em especial aquelas com diagnóstico de TDAH. Quando bem direcionados e adaptados às características do grupo em questão representam potentes aliados no manejo de comportamentos-problema.

 

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Received: July 30, 2010;
Accepted: December 20, 2010

 

 

1)Autor responsável: Fabiana Tintori. Endereço para correspondência: Av. Angélica, 1761, conj. 114, Higienópolis, São Paulo – SP CEP: 01227-200, tel. (11) 3214.2953. Endereço eletrônico: fabi_tintori@terra.com.br