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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.13 no.1 Rio de Janeiro jun. 2010

 

ARTIGOS

 

Atuação do Psicólogo em Hemodiálise

 

The Psychologist in Hemodialysis

 

 

Paula Pereira Werneck de Freitas; Mayla Cosmo

Pontificia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A insuficiência renal crônica é considerada um grave problema de saúde pública no mundo. No presente estudo, as conseqüências desta doença são abordadas a partir do tratamento hemodialítico e do papel do psicólogo nesse tratamento. Aspectos emocionais dos portadores de doença renal são discutidos baseados na revisão bibliográfica e na experiência em uma clínica destinada a esse grupo de pacientes. Objetivou-se ressaltar a função do psicólogo como parte integrante da equipe de saúde e como este trabalho é de extrema importância para melhor adaptação, aceitação e bem-estar do paciente.

Palavras-chave: Doença renal crônica; Atendimento psicológico; Psicologia da saúde.


ABSTRACT

The chronic renal failure is considered a serious public health problem in the world. In this study, the consequences of this disease is approached from the hemodialysis treatment and from the role of the psychologist in this treatment. Emotional aspects of the renal patients are discussed based on the literature review and on the work experience in a renal disease clinic. The objective is to highlight the role of the psychologist as part of the health team and the importance of this work for a better adaptation, acceptance and well-being of the patient.

Keywords: Chronic renal failure; Psychological approach; Health psychology.


 

 

Introdução

A doença renal compromete, progressivamente, o metabolismo e a vida celular de todos os órgãos do corpo e constitui, atualmente, um significativo problema médico e de saúde pública, já que, a cada ano, cresce, consideravelmente, a taxa de indivíduos que passam a conviver com a doença. Tal enfermidade tem como característica uma progressiva e irreversível redução da função dos rins, o que gera um desenvolvimento de crise urêmica causando no paciente irritação gástrica, perda de peso, diarréia, vômitos, apatia, entre outros.

Os portadores de doença renal começam o seu percurso de tratamento já cientes da irreversibilidade de sua doença e, ao longo deste, se deparam com uma série de perdas. Essas vão além da função do rim e incluem, além de questões sociais e econômicas, uma série de conflitos emocionais.

Com base em pesquisa da Sociedade Brasileira de Nefrologia, o número de pacientes em tratamento dialítico mais do que dobrou nos últimos oito anos. No ano de 2000, o número de pacientes era de aproximadamente 42.000 no Brasil; pesquisa recente (Censo SBN) mostra que em 2008 esse número chega próximo aos 90.000 doentes em tratamento. O número estimado de pacientes novos a cada ano é de 26.1771.

Devido à tamanha incidência, é de extrema importância um estudo sobre as necessidades desse grupo de pacientes, sobre a eficácia dos tratamentos e qualificação de profissionais a fim de possibilitar melhorias na qualidade de vida. Portanto, o objetivo deste estudo é discutir sobre a importância do papel do psicólogo na equipe de saúde de hemodiálise, em que tantos sentimentos, não só de pacientes como também dos profissionais, estão em jogo.

 

A Doença Renal Crônica

A doença renal crônica, ou insuficiência renal crônica (IRC), é o resultado de lesões renais irreversíveis. Tal doença é considerada um grave problema de saúde pública, justificado por seu alto índice de morbidade e mortalidade e, também, por seu impacto negativo sobre a qualidade de vida.

As ameaças da doença crônica referem-se diretamente à vida do paciente, ao medo da morte, à relação com a integridade corporal e à sua autonomia.

 

Aspectos médicos

O rim, órgão principal do aparelho urinário, tem diferentes e importantes funções para o organismo tais como: a filtragem do sangue para a eliminação de resíduos tóxicos excedentes ao organismo, a regulação da produção de glóbulos brancos e formação dos ossos, a regulação da pressão arterial sanguínea e controle do equilíbrio químico e líquido do organismo2.

O rim não saudável pode apresentar uma série de sinais patológicos, sintomas e doenças. Seu comprometimento pode ocorrer de maneira rápida ou lenta e progressiva até a fase mais grave, de perda total de sua função. Uma classificação em estágios (de 0 a 5, de menos para mais grave) auxilia na compreensão da gravidade da doença, da comorbidade e da necessidade de substituição renal (por diálise ou transplante).

É importante ressaltar que no quadro da doença renal, mesmo com a opção do transplante, o paciente está sujeito a um controle medicamentoso por toda a vida.

 

Tratamento

O tratamento mais comum para os pacientes portadores de insuficiência renal crônica é a submissão a programas de hemodiálise recorrentes – geralmente realizados em três sessões semanais, com duração de 4 horas cada.

A hemodiálise é um procedimento que limpa e filtra o sangue, controla a pressão arterial e ajuda o corpo a manter o equilíbrio de substâncias químicas como o sódio, o potássio e cloretos. O processo consiste na circulação do sangue fora do organismo, através do acesso vascular.

A rotina da hemodiálise é uma prática que tem várias implicações que vão além da doença e incluem, para o paciente, questões emocionais, sociais, econômicas e familiares. Há ainda o fato de que o tempo de tratamento é indefinido e, na maior parte dos casos, é definitivo.

É um tratamento doloroso e em sua dinâmica, é monótono e limitado, além de interferir na questão da privacidade e do próprio espaço. O paciente convive com outros pacientes no momento da sessão, tendo cada um desses históricos e valores diferentes, e até mesmo diferenciadas alterações de humor - fatores que podem vir a causar algum desconforto e aborrecimentos.

A complexidade da doença crônica pode constituir uma situação extremamente estressante, conforme ressaltam Averasturi e Almeyda (1992). Para as autoras, uma definição generalizada de situação estressante seria aquela em que o sujeito não tem recursos para enfrentá-la, está além de sua capacidade e vontade. O tratamento da doença renal crônica pode implicar um estresse adicional já que exige alterações significativas na vida pessoal, na alimentação, nas rotinas medicamentosas e, principalmente, porque cria novas relações de dependência.

A dependência da máquina de hemodiálise e sujeição à equipe médica geram diferentes sentimentos, singulares para cada paciente. Para alguns a resposta é mais favorável, com a aceitação dos inconvenientes do tratamento; outros assumem uma excessiva dependência e há, ainda, aqueles que se “rebelam” contra a enfermidade e o tratamento – infringem a dieta e negam a gravidade da doença e sua irreversibilidade. A “rebeldia” interfere negativamente no próprio curso da doença, já que a responsabilidade sobre esta é importante para o bem-estar emocional do paciente e também para aderência e cooperação ao tratamento.

Uma alternativa para a doença renal é o transplante de rim. Este seria a substituição do rim inativo por um rim saudável, proveniente de um doador compatível. A grande dificuldade para sua realização reside no doador, já que muitos pacientes têm medo de submeter algum familiar ao procedimento cirúrgico e, também, porque a lista de espera para o doador por morte cerebral pode durar muitos anos.

O paciente renal crônico precisa também controlar - de forma rígida - sua alimentação, que sofre restrições em função da necessidade de reduzir significativamente a ingestão de alimentos que contenham fósforo, potássio e sal e, principalmente, líquidos.

Ter o conhecimento de todas essas restrições e limitações que envolvem a rotina da doença renal crônica pode comprometer a aderência ao tratamento. A adesão significa aceitar a terapêutica proposta e seguí-la de acordo com as solicitações médicas. A característica do tratamento, os aspectos emocionais de confiança com a equipe e variáveis econômicas são fatores que influenciam esta adesão (Resende, Santos, Souza & Marques, 2007).

 

O Paciente Renal

Uma nova construção psíquica e social

De acordo com Adam e Herzlich (2001), a doença não é somente um conjunto de sintomas; ela é um fenômeno significativo, constitui um transtorno que pode vir a ameaçar ou a alterar completamente a vida do doente.

Claudine Herzlich (op.cit.) pesquisou, dentro das representações sociais de saúde e doença, que o conceito de saúde é elaborado a partir do sentimento de bem-estar físico e psicológico, da possibilidade de realizar atividades e de um relacionamento harmônico com os outros; ou seja, sempre baseado nas relações da pessoa com seu meio social. O estudo defende que:

“O doente viverá a doença como ‘destrutiva’ se, a partir da interrupção da atividade provocada pela mesma, que se acompanha tanto da destruição dos laços com os outros como perdas diversas em suas capacidades e em seus papéis, ele não conseguir visualizar nenhuma possibilidade de reconstruir sua identidade (...)” (Adam e Herzlich, 2001, p. 78).

De acordo com essa mesma idéia, Jane Russo (2006) escreve:

“Ao sofrimento físico provocado por uma doença se acrescenta o sofrimento moral da pessoa que vê seu funcionamento no mundo comprometido: um homem que não consegue cumprir com seu papel de provedor da família, uma mãe que não consegue cuidar apropriadamente dos filhos, um trabalhador que não consegue realizar o que dele é esperado” (p. 190).

RUSSO (2006) chama a atenção para a doença nessa dimensão social e cita também a existência de uma “causa moral” (p.190). Para a autora, há outro tipo de sofrimento do paciente devido a muitas doenças estarem associadas a uma “falta moral” (op.cit.) –, desleixo com a saúde, excessos, modo de vida desregrado, vida sedentária –, comportamentos passíveis de condenação moral por assumirem um caráter de responsabilidade pela doença. Esses fatores podem levar o paciente a se sentir culpado por ter a doença.

São muito particulares as representações sociais construídas por cada sujeito acerca de sua enfermidade, seja ela crônica ou não, porém aquilo que se perde, a partir do diagnóstico, sempre será fator relevante para as novas construções.

Os portadores de doença renal têm um caminho marcado por perdas que vão além da perda da função do rim; eles perdem parte da sua energia cotidiana e de sua capacidade física, algo que fica constatado a cada nova cicatriz das fístulas, dos cateteres e dos exames.

Desde o momento do diagnóstico, o paciente renal se depara com uma série de questões que põem em evidência sua problemática pessoal, familiar: muitos acabam por perder seus empregos e, também, laços com seus grupos sociais. Lima, Mendonça Filho & Diniz (1994) ressaltam que o diagnóstico da doença renal não oferece expectativa de cura ou a devolução do estado de saúde. Pelo contrário, por sua cronicidade, marca a entrada definitiva no mundo dos doentes.

 

Um ser mortal e limitado

O convívio com a terapêutica, a máquina e o tratamento assumem, para o paciente, uma importância vital e traz características especiais à afetividade e ao comportamento individuais. Diante da doença, o sujeito sofre perda de sua liberdade e de autocontrole, o que faz com que toda a sua vida se altere. Ele se descobre diante da finitude, vê-se ameaçado com a possibilidade de destruição de sua existência e toma consciência de que é um ser mortal.

De fato, a doença e a morte encontram-se no centro de nossa existência, sendo algo inerente à vida e às condições humanas porém, quando o sujeito se depara com a enfermidade, dá-se conta de sua fragilidade.

Na insuficiência renal crônica, essa fragilidade é constantemente reafirmada, o sujeito vê seu corpo sendo esfacelado e tem a morte à sua volta constantemente. Ele se depara com a difícil realidade de que não tem poder sobre o próprio corpo e de que está sujeito a males e doenças, independente de sua própria vontade.

De acordo com pesquisa de Reis, Guirardello& Campos (2008), entre as demandas do paciente em hemodiálise aparecem aguçadas uma ausência de perspectiva quanto ao futuro e uma visão da morte como sendo uma possibilidade iminente – pensamentos que podem interferir na busca para uma melhor qualidade de vida

A capacidade de cada paciente em enfrentar a sua própria enfermidade e de compreender a importância dos cuidados com a saúde depende dos recursos pessoais:

... O enfrentamento que põe em prática o sujeito diante de qualquer tipo de estresse (...), parece estar associado, em grande escala, com a presença dos chamados recursos pessoais que possui o paciente (Averasturi & Almeyda, 1992, p. 57-58, grifo das autoras, tradução livre).

Pacientes renais crônicos podem tornar-se pessoas extremamente pessimistas, desanimadas e até mesmo agressivas no convívio com os familiares e com a equipe que os assistem. Muitas vezes há um desespero muito grande em um novo paciente, mas que pode ser necessário para uma ressignificação de sua vida dali em diante.

Há uma influência da personalidade pré-mórbida na adaptação ao tratamento. Pacientes, em geral dependentes antes da doença, podem assumir uma regressão acentuada, com mecanismos de defesa primitivos; pacientes mais maduros apresentam uma melhor adaptação e preservam parte de sua independência nos demais setores da vida.

O paciente renal encontra-se vulnerável, havendo nele um processo de incapacitação e de medos. Somado a isso, há uma significativa mudança na vida sexual desse grupo de pacientes, em razão de causas orgânicas – por exemplo, efeitos da uremia na espermatogênese –, e fatores psicológicos, pois a conduta sexual está diretamente relacionada ao bem estar físico e mental.

Diniz e Schor (2006), em suas pesquisas, levantam que a maioria dos estudos sobre a qualidade de vida em pacientes renais crônicos tem identificado a depressão como principal fator psíquico presente. Dado este completamente justificável por todas as perdas e crises enfrentadas por esses pacientes, além da própria uremia que pode produzir sintomas depressivos.

Para o paciente renal, a depressão pode significar a perda da confiança na eficácia do tratamento e, mais gravemente, levar o paciente a não aceitar viver nas condições impostas pelo tratamento acabando por abandoná-lo, o que pode levar ao suicídio.

Resende et al. (2007) ressaltam que há distintas formas para lidar-se com as adversidades da doença e do tratamento; o sofrimento é muito particular, mas existe nele uma possibilidade de tirar lições e repensar valores, dando um novo sentido à vida.

Pensando em todos esses fatores, é importante garantir que o paciente tenha espaço para depositar seus sentimentos e questionamentos diante da doença. É necessário que a equipe de saúde seja capaz de ajudá-lo a enfrentar e a elaborar toda a sua problemática.

 

A Equipe Multidisciplinar

Em uma clínica ou hospital é o modelo médico que influencia a conduta dos profissionais que formam a equipe de saúde. Nesse modelo, o paciente, de acordo com Russo (2007), é despido de tudo aquilo que marca sua singularidade para ser examinado e tratado. Aborda-se o orgânico, a doença; porém, o que o paciente sente e pensa a respeito do tratamento é deixado para segundo plano ou muitas vezes nem mesmo é considerado relevante.

Com o avanço das pesquisas cada vez mais específicas do funcionamento do corpo humano surgiu a figura do especialista, dedicado a determinada parte do corpo: o médico não mais acompanha o histórico de saúde e da doença do sujeito e sua família. Adicionado a isso, o avanço na tecnologia médica substituiu a comunicação verbal por máquinas que estabelecem diagnósticos.

Devemos reconhecer que o avanço tecnológico e as investigações minuciosas da anatomia puderam contribuir para grandes soluções e eficácia para a Medicina, principalmente no fator tempo, porém perde-se na construção de vínculo e confiança com o médico, passando a ser uma relação impessoal. A neutralidade médica, nesse ponto, confronta-se com as necessidades dos sujeitos que procuram a ajuda do médico.

A relação médico/paciente é constantemente permeada por fantasias, medos e expectativas; o paciente espera que os profissionais de saúde que o acompanham possam lhe garantir ajuda, compreensão e esclarecimentos. Essa pode ser uma relação com muita tensão, já que as ações dos médicos são impregnadas de sentimentos que podem ser úteis ou prejudiciais ao doente. Lima, Mendonça Filho e Diniz (1994) chamam a atenção para o fato de que o médico pode vir a ser para o paciente aquele que proíbe, o impede de fazer suas vontades e que limita o seu prazer.

O atendimento mecânico e impessoal permite ao médico defender-se da angústia causada pela exposição da fragilidade humana e da possibilidade de morte. E toda equipe está sujeita a esse mecanismo de distanciamento.

O paciente, de acordo com RUSSO (2007), é despido de tudo aquilo que marca sua singularidade para ser examinado e tratado. Esse paciente pode ficar a mercê de um atendimento automático, não só por parte do médico, mas também pelos enfermeiros e psicólogos que não particularizam o atendimento, e assim não podem ouvir o paciente.

Toda a equipe de saúde deve ser responsável por lidar com a dimensão do sofrimento do paciente, pois os desejos do indivíduo também são direcionados não só ao médico como também aos demais profissionais em um ambiente multidisciplinar.

O modo como o paciente encara sua própria enfermidade, principalmente quando crônica, pode dificultar sua comunicação com os profissionais de saúde e gerar comportamentos ambivalentes.

Para esse tipo de paciente, é muito importante sentir-se amparado por uma equipe integrada. Sendo uma enfermidade com uma evolução longa, dolorosa e traumática, exige uma equipe interdisciplinar treinada para prestar assistência total e que priorize a comunicação entre profissionais – enfermeiros, nefrologistas, nutricionistas, assistentes sociais e psicólogos – sobre todos os procedimentos com o paciente. Profissionais que possam explicar e também que saibam ouvir o paciente.

 

O psicólogo inserido na equipe

O papel do psicólogo como parte da equipe de saúde é, primeiramente, o de identificar o indivíduo por de trás dos sintomas - entendê-lo em suas vivências, medos e ansiedades, seu contexto de vida, sua percepção de si mesmo e da doença.

A investigação sobre o paciente é fundamental para poder ajudá-lo. Ela deve constituir em observar o comportamento do paciente, questionar sua forma de ser e pensar antes e posterior à doença, seus desejos, projetos de vida e conhecimento do diagnóstico. De acordo com Leão (1994), o psicólogo hospitalar tem uma função ativa e real que corresponde a informações da realidade prática, não puramente interpretativa.

É importante saber que o paciente está vivendo um momento de vida muito difícil, cercado de dúvidas e angústias, e que cada um tem uma maneira particular de vivenciar uma situação de fatalidade.

Pacientes em hemodiálise fazem parte de um grupo bem específico entre os portadores de doenças crônicas. Tal grupo de pacientes mobiliza determinados mecanismos de defesa em função da adaptação à doença e isso pode gerar um empobrecimento da personalidade – o paciente vê-se incapaz de adaptar-se a novas situações e de manter relações de interesse sobre o mundo externo.

Ao longo de sua existência, o indivíduo constrói-se através das interações com o meio e, a partir disso, forma padrões de comportamento que incluem alguns mecanismos de defesa. Porém, tais mecanismos podem fracassar diante de conflitos conscientes ou inconscientes, gerando uma grande quota de ansiedade e/ou depressão.

O psicólogo precisará ser sensível diante de tais reações e defesas e, principalmente, deve ter a função de respeitar as dificuldades do paciente e estar preparado para ajudar o sujeito na compreensão de si mesmo como doente, da irreversibilidade da doença e de sua própria finitude.

Diante de tantos conflitos, é extremamente necessário que o paciente sinta confiança para deixar emergir suas ansiedades e medos, através do estabelecimento de uma aliança terapêutica. Quanto mais amadurecido e integrado com sua própria vida, melhor este paciente enfrentará sua doença.

É função do psicólogo compreender os fenômenos intrínsecos das relações, conhecer as reações do paciente, orientar familiares e profissionais. É esse profissional que, desprovido de tecnologia, tem como instrumento a palavra e a escuta.

Estabelecido o vínculo entre paciente e psicólogo, este último poderá fazer um trabalho que vise estimular as capacidades do paciente para se adaptar. A adaptação dependerá de uma visão mais positiva de seus potenciais; de metas que deem mais significado à vida; do estabelecimento de relações de confiança e da construção de uma possível autonomia. A psicoterapia deve ser essa via de acesso.

O paciente não deve estar à parte de sua própria realidade e, principalmente, não deve ser estimulado a abstrair as implicações de uma doença crônica. Para isso deve ter em mente os conhecimentos de como levar o tratamento.

A capacidade de manter uma atitude cooperativa diante das dificuldades impostas pela doença exige condições individuais de força interior. O paciente portador de doença renal necessita que essa força seja estimulada por um ambiente de acolhimento compatível com suas expectativas.

É de fundamental importância a presença do psicólogo que possa, junto à equipe, incentivar nos indivíduos o desenvolvimento de suas capacidades, propiciando uma maior interação e incentivando, igualmente, uma nova visão sobre a própria enfermidade, além de promover mais qualidade de vida, traduzida em saúde.

 

Considerações Finais

Com o presente trabalho, foram observados alguns aspectos decorrentes da realidade da doença crônica renal e as etapas que o doente percorre a partir do seu diagnóstico.

Por ser uma doença marcada por fragilidades e limitações, exige uma nova construção psíquica por parte de seu portador e uma capacidade de adaptação e aderência a todas as exigências do tratamento.

As características do tratamento hemodialítico a que esse paciente é submetido, devem basear-se em um bom relacionamento e um bom vínculo entre a equipe de saúde e o paciente, já que a confiança gera para esse último mais segurança diante dos seus medos e uma melhor compreensão de si como doente.

O conhecimento da doença e a participação ativa no tratamento são fundamentais para o equilíbrio emocional do paciente e para a qualidade das etapas a serem cumpridas. É importante que toda a equipe e, particularmente, o psicólogo possam ouvir e atender as escolhas do paciente – que lhe são de direito –, e que permaneçam presentes. O sentimento de poder ter algum controle sobre o tratamento e a doença favorece a segurança e a confiança do paciente em si mesmo.

A presença do psicólogo na equipe de saúde é de extrema relevância para ajudar os pacientes renais crônicos na aceitação da irreversibilidade de sua doença, para uma melhor assistência quanto aos conflitos de dependência e independência e, principalmente, na recuperação de uma possível estabilidade emocional dos pacientes, fatores fundamentais para o sucesso terapêutico.

É necessário que esse profissional tenha em mente que é possível resgatar um sentido de vida para o paciente, mesmo frente às principais dificuldades e sofrimentos. O trabalho do psicólogo como parte da equipe de saúde deve ser promovido não só na reestruturação psíquica do paciente, mas também na manutenção do tratamento.

Para o alcance dos objetivos terapêuticos, deve-se acrescentar um aprimoramento técnico e teórico dos profissionais, mantendo-se a sabedoria de que o paciente é quem melhor pode fornecer informações sobre si mesmo. Ou seja, entender que a equipe está em constante processo de aprendizado.

Conclui-se que a presença do psicólogo no trabalho com portadores de doença renal é extremamente necessária para garantir um atendimento mais humanizado, que reconheça a singularidade de cada paciente, compreenda a fragilidade submetida pela doença crônica e que faça emergir – dentro dos recursos pessoais de cada paciente - a capacidade de ressignificação da própria vida. Mais saúde apesar da doença.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Paula Pereira Werneck de Freitas
E-mail: paulawerneck@hotmail.com
Mayla Cosmo
E-mail: mayla.cosmo@oi.com.br

 

 

1 Censo Geral 2008 – Site: www.sbn.org.br/CENSO/2008/censoSBN2008.pdf
2 Informações da Sociedade Brasileira de Nefrologia: http://www.sbn.org.br

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