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Cadernos de Psicologia Social do Trabalho
versão impressa ISSN 1516-3717
Cad. psicol. soc. trab. vol.21 no.1 São Paulo jan./jun. 2018
https://doi.org/10.11606/issn.1981-0490.v21i1p87-101
DOI: 10.11606/issn.1981-0490.v21i1p87-101
ARTIGOS ORIGINAIS ORIGINAL ARTICLES
Trabalhadoras domésticas: trajetórias, vivências e vida cotidiana
Domestic workers: trajectories, experiences and everyday life
Maria Chalfin CoutinhoI; Geruza Tavares D'AvilaII; Tielly Rosado MadersI; Marcelo MoraisI
IUniversidade Federal de Santa Catarina (Florianópolis, Santa Catarina, Brasil)
IIUniversidade Federal do Rio Grande (Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil)
RESUMO
Em um contexto de mudanças na legislação, com ampliação de direitos no trabalho doméstico, foi desenvolvida uma pesquisa para investigar as práticas e os sentidos produzidos no cotidiano de trabalhadoras domésticas. A pesquisa foi realizada em duas regiões metropolitanas brasileiras: Grande Florianópolis e Baixada Fluminense. A partir dos chamados métodos biográficos, foram entrevistadas 27 trabalhadoras domésticas, mensalistas e diaristas, tendo como instrumentos complementares fotografias e agenda colorida. A análise resultou na identificação de três núcleos de significação: 1) trajetórias educacionais e laborais, 2) vivências no trabalho e 3) gestão da vida cotidiana e trabalho. As trajetórias revelam entrada precoce na vida laboral e baixa escolaridade como fatores que contribuíram para que exercessem o trabalho doméstico remunerado. As vivências foram permeadas por ambiguidades afetivas nas relações com contratantes e familiares, particularmente para as mensalistas. A gestão do cotidiano revela peculiaridades do trabalho de diaristas e mensalistas e capacidade de negociação com uso de astúcias e saberes tácitos. A análise evidencia a articulação entre ambiguidades afetivas e demandas imperativas num cotidiano de trabalho intenso, íntimo e com traços de herança escravagista.
Palavras-chave: Trabalho doméstico, Cotidiano, Emoção, Trajetórias, Vivências.
ABSTRACT
In a context of changes in legislation and with expansion of rights in domestic service, it was made a research to investigate the practices and the meanings produced in the daily lives of domestic workers. The investigation occurred in two Brazilian metropolitan regions: Grande Florianópolis and Baixada Fluminense. Based on biographic methods, 27 domestic workers (housemaids and cleaners) were interviewed, with use of photographs and colorful schedule. In the analysis, three meaning cores were identified: educational and work trajectories, labor experiences and management of daily life and work. The trajectories reveal early entry into working life and low education level as factors that reinforced to perform paid domestic work. The experiences were constituted by emotional ambiguities in relations with employers and families, particularly for the housemaids. The management of daily life reveals peculiarities of housemaids and cleaners work and ability to negotiate with cunning and tacit knowledge. The analysis stresses the articulation between emotional ambiguities and imperative demands in an intense, intimate everyday work life marked by traces of slave heritage.
Keywords: Domestic labor, Everyday life, Emotion, Trajectories, Experiences.
Introdução
Estudos sobre os serviços domésticos revelam o quanto persistem desigualdades de gênero, raça e classe quando se analisa a vida cotidiana das trabalhadoras domésticas, categoria predominantemente feminina1. Em 2015, a população ocupada em serviço doméstico no Brasil correspondia a 6.275.592 pessoas, sendo 5.755.600 mulheres e, destas, 3.747.311 negras (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada [IPEA], 2017). Para Melo e Thomé (2018, p. 174), as mulheres negras não foram contempladas da mesma forma que as brancas no que se refere às leis vagarosamente concedidas pelo Estado brasileiro, isto é, o racismo perdura na sociedades brasileira contemporânea e continua delineando as relações sociais e o mercado de trabalho.
Com a tramitação e sequente aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 72 (2013), a chamada PEC das Domésticas, em abril de 2013, a temática do serviço doméstico foi alvo de extenso debate no Brasil. Por meio dessa PEC e de legislação complementar posterior, a categoria das domésticas, frequentemente invisibilizada, adquiriu direitos trabalhistas equiparáveis aos de outras categorias de trabalhadores. Nesse contexto, desenvolvemos uma pesquisa2 com o objetivo de investigar as práticas e os sentidos produzidos no cotidiano de trabalhadoras domésticas. O foco da pesquisa foram trabalhadoras domésticas, mensalistas e diaristas, residentes em dois campos: Grande Florianópolis (GF) e Baixada Fluminense (BF)3. Quando se analisa o trabalho de mulheres atuantes no serviço doméstico, evidencia-se o quanto as relações com os contratantes e seus familiares pautam suas atividades laborais e as negociações cotidianas. Para Brites e Picanço (2014), as relações entre patroas e empregadas são marcadas pela "ambiguidade afetiva"4, em especial quando o trabalho doméstico envolve o cuidado de crianças. O foco nos afetos ou emoções que atravessam o cotidiano do serviço doméstico possibilita complexificar as análises para além dos indicadores contextuais dessa atividade.
Para situar a complexidade da temática proposta, iniciamos o presente texto com uma breve revisão sobre trabalho doméstico remunerado: suas origens e o contexto brasileiro e, em seguida, apontamos as ambiguidades afetivas que atravessam a vida cotidiana das trabalhadoras domésticas. A seguir apresentamos o percurso metodológico da pesquisa e, após, seus resultados, iniciando com uma breve caracterização das participantes seguida dos três núcleos de análise: trajetórias educacionais e laborais; vivências no trabalho; e gestão da vida cotidiana e trabalho. Por fim, tecemos algumas considerações para destacar as racionalidades e as emoções presentes no cotidiano do trabalho doméstico.
Trabalho doméstico no Brasil: origens, contexto e ambiguidades afetivas
A compreensão do trabalho doméstico no Brasil requer a consideração das articulações entre as categorias trabalho e gênero desde uma perspectiva histórica, em especial no que diz respeito às desigualdades sociais entre homens e mulheres. Ao investigar a inserção ocupacional de homens e mulheres em diferentes países no contexto do "capitalismo patriarcal" ou de uma sociedade na qual os homens dominam e oprimem as mulheres, Hirata (2018) conclui que:
a posição das mulheres e dos homens na hierarquia social, em termos de repartição do trabalho doméstico, de hierarquia profissional ou de representação política não é a mesma nas sociedades contemporâneas. O paradoxo dessa desigualdade persiste, a despeito do fato de que as mulheres têm níveis de educação superiores aos dos homens, em quase todos os níveis de escolaridade e em praticamente todos os países industrializados (Hirata, 2018, pp. 18-19).
A persistência dessas desigualdades ao longo do tempo pode ser compreendida a partir do conceito de divisão sexual do trabalho. De acordo com Kergoat (2009) essa divisão "decorre das relações sociais de sexo", "é historicamente adaptada a cada sociedade" e "tem dois princípios organizadores: o da separação (existem trabalhos de homens e outros de mulheres) e o da hierarquização (um trabalho de homem 'vale' mais do que um de mulher)" (p. 67). Assim, na visão da autora, as práticas decorrentes da divisão sexual do trabalho resultam de relações sociais e, portanto, não são imutáveis, mas a permanência dos princípios implica práticas diferenciadas para homens e mulheres, sendo as executadas pelos primeiros mais valorizadas do que as das mulheres. Decorre daí que, apesar da "significativa ampliação da presença feminina no trabalho remunerado, as construções hierárquicas das relações entre os sexos permanecem e ainda se expressam por meio da divisão sexual do trabalho na esfera profissional e doméstica" (Tosta, 2016, p. 18).
A valorização desigual do trabalho de homens e mulheres implica, de acordo com Tosta (2016), pensar para além do trabalho produtivo assalariado, ou seja, requer analisar o trabalho reprodutivo. Para a autora, "a articulação entre trabalho produtivo e reprodutivo torna-se fundamental para compreender as relações de trabalho como um todo" (Tosta, 2016, p. 21). Historicamente coube às mulheres o exercício das atividades de reprodução da vida, seja no cuidado de suas próprias famílias ou das de outros. Essas atividades constituem o trabalho doméstico, o qual, de acordo com Fougeyrollas-Schwebel (2009) é executado gratuitamente, geralmente por mulheres no ambiente doméstico e pode ser definido "como um conjunto de tarefas relacionadas ao cuidado de pessoas e que são executadas no contexto da família" (p. 257).
Ancorada em indicadores sociais de 2014 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Tosta (2016) observa que a realização dos afazeres domésticos por mulheres, em sua maioria com uma jornada semanal de mais que o dobro da dos homens, somada ao tempo de trabalho remunerado, resulta em "uma jornada feminina semanal total de 56,4 horas, superior em quase cinco horas à jornada masculina" (p. 23). Assim, na ausência de políticas públicas ou de mudanças na organização produtiva para facilitar a conciliação entre trabalho remunerado e os afazeres domésticos, as mulheres acabam por delegar essa tarefa a outras mulheres, de sua própria família ou contratadas. Nesse último caso, temos a constituição do emprego doméstico ou prestação de serviços domésticos remunerados.
Na América Latina a prestação de serviços domésticos para outras famílias tem origem na escravidão, situação na qual as escravas eram obrigadas a realizar os afazeres domésticos na casa de seus senhores, caracterizando, de acordo com Teixeira, Saraiva e Carrieri (2015), uma relação de troca (serviços por moradia e alimentação), embora não fossem remuneradas pelo trabalho. Com a abolição da escravatura, o trabalho doméstico se tornou a principal forma de ocupação remunerada para as ex-escravas e passou a se configurar como um serviço doméstico. Ainda que a relação entre as trabalhadoras e os contratantes possa ter se modificado ao longo do tempo, Soratto (2006) enfatiza o quanto a herança escravista fortalece a condição servil das trabalhadoras domésticas, pois a natureza da atividade, reforçada em função do contexto privado em que acontece, implica a disponibilidade permanente para resolver as vontades e emergências não só de uma pessoa, mas de famílias inteiras com seus próprios ritmos, valores e hábitos.
O serviço doméstico é uma ocupação tradicional de mulheres negras de baixa renda e até o ano de 2010 foi a principal ocupação feminina no Brasil, sendo ainda a atividade remunerada de mais de 14% das mulheres ocupadas com 16 anos ou mais, como apontam Melo e Thomé (2018)5. Apesar disso, somente após a aprovação da PEC 72/13 e de sua regulamentação pela Lei Complementar nº 150, de 1 de junho de 2015, as trabalhadoras domésticas adquiriram direitos equiparáveis a outras categorias de trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)6. Entre os direitos incorporados estão: recolhimento obrigatório do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); seguro-desemprego; regulação da jornada de trabalho; salário não inferior ao mínimo nacional; fixação da jornada em 44 horas semanais, com limitação e pagamento de adicional por hora-extra de trabalho noturno; auxílio-creche e pré-escola; 13º salário; multa por demissão sem justa causa; vale-transporte; seguro para acidente de trabalho; entre outros.
Pesquisa realizada pelo IPEA (2017), a partir de indicadores da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) no período de 1995 a 2015, aponta para o aumento da formalização do serviço doméstico: o contingente de trabalhadoras com carteira assinada passou de 17,8% em 1995 para 30,4% em 2015. Além disso, o estudo apontou diferenças consideráveis entre as diferentes regiões do Brasil. As regiões Sul e Sudeste, campos dessa investigação, apresentam o maior índice de trabalhadoras formais. A taxa é de 35% de trabalhadoras registradas, índice superior quando comparado às regiões Norte e Nordeste, que contemplam apenas 20% das trabalhadoras (IPEA, 2017). Outra tendência levantada foi o crescimento do número de trabalhadoras domésticas "diaristas", isto é, aquelas que atuam em mais de um domicílio e sem vínculo formal de trabalho. Em 1995, elas abrangiam 18,3% da categoria e, dez anos depois, em 2015, a taxa atingiu 31,7%. Trata-se, como aponta Costa (2017), de um movimento de diarização do trabalho doméstico remunerado no Brasil nos últimos anos.
Quando se analisa a inserção de mulheres nos serviços domésticos, há que se considerar o locus no qual exercem suas atividades remuneradas atualmente: residências de famílias de extratos médios e altos da população. Para realização do trabalho doméstico nessas residências, Melo e Thomé (2018) estimam que "no interior de cerca de 10 milhões de famílias brasileiras (cerca de 15% das famílias), há sempre uma mulher não integrante da família que realiza tais tarefas" (p. 127). Ao adentrarem o ambiente privado das famílias a quem prestam serviço, as trabalhadoras domésticas defrontam-se com um espaço marcado pelo jogo de interações entre sujeitos provenientes de lugares sociais distintos, "em ambiente desprovido de fronteiras profissionais, onde patroa e empregada são simultaneamente enredadas no jogo de conflitos de gênero e de classe" (Preuss, 1997, p. 54). Ao analisar as relações entre empregadas e empregadoras, Vidal (2012) as caracteriza como uma "amizade entre desiguais" em uma relação marcada pelo paternalismo e pelas trocas afetivas, mesmo que as trabalhadoras ocupem um lugar mais difícil nessas trocas.
Girard-Nunes e Silva (2013) apontam para a relação de confiança que se faz presente até mesmo quando da contratação do serviço doméstico. Para os autores:
a confiança traduz-se na redução dos riscos decorrentes do estabelecimento de uma relação que tanto empregador como empregada percebem ser mais complexa do que a simples venda de serviços, pois implica na convivência em um ambiente perpassado por relações íntimas (Girard-Nunes & Silva, 2013, p. 598).
Na leitura de Brites (2007), as relações estabelecidas no exercício do serviço doméstico são marcadas por ambiguidades entre as patroas e seus familiares e as trabalhadoras domésticas. Tais relações abarcam uma carga afetiva para além da racionalidade que rege contratos formalizados, sobretudo, por serem construídas por meio de laços que envolvem cumplicidade e antagonismo. A autora ainda ressalta que, apesar da grande carga afetiva, as relações entre patroas e empregadas também são permeadas por lugares hierarquizados, evidenciando a situação de subalternidade, herdeira da tradição escravista associada ao trabalho doméstico.
As relações de afeto se entrelaçam com outras "como as relações monetárias, as jurídicas, as desigualdades sociais que fazem com que as afetividades construídas entre as famílias de empregadores e as trabalhadoras domésticas remuneradas sejam complexificadas por meio de tantas dimensões 'contraditórias'" (Monticelli, 2013, p. 79). Essas relações contraditórias são analisadas por Soratto (2006), quando pontua os modos diferenciados de pertencimento requeridos para trabalhar na casa dos outros, pois envolve ser parte integrante da dinâmica familiar e participar desse cotidiano, sem, contudo, tal integração ser vivenciada plenamente. Também, para a autora, nas ligações afetivas estabelecidas nos serviços domésticos, a ambiguidade está presente, sobretudo quando se criam vínculos, sendo necessário investimento emocional aquilatado pelo tempo de convivência entre as partes. Os afetos decorrentes da convivência têm implicações significativas na experiência subjetiva das trabalhadoras domésticas.
Entre as inúmeras possibilidades teóricas para analisar os afetos ou emoções que configuram a experiência subjetiva, optamos pela leitura da Psicologia Histórico-cultural, a partir de Lev S. Vigotsky e de autores contemporâneos dentro dessa vertente. Ao afirmar a "unidade dos processos afectivos e intelectuais", Vigotsky (1934/2007, p. 48), assentado na perspectiva monista de Espinosa, rompe com o dualismo cartesiano e compreende a indissociabilidade entre corpo e mente. É importante destacar, como faz Sawaia (2000), o lugar central ocupado pelas emoções na obra vigotskyana, pois a articulação dialética entre pensamento e emoção se expressa na ideia de que todo pensamento é motivado, isto é, tem uma base afetiva e volitiva. Ao revisitar a obra de Vigotsky, Clot (2006) pontua que para o autor "o conceito e o afeto que são duas faces do pensamento" e, portanto, "não são inimigos que disputam o controle da vida psicológica" (p. 26), contrariando a ideia recorrente da emoção como oposta à racionalidade.
A ideia clássica em História da Psicologia é que a racionalidade progrediria à medida que as emoções regridem. Seria necessário, portanto, eliminar a emoção para chegar ao saber. Isso traz um impasse sobre um ponto muito importante que é o fato de que a atividade de pensar é precisamente colorida pela emoção e mesmo profundamente afetada (Clot, 2006, p. 26).
Tomar como referência uma compreensão de sujeito guiado não apenas pela razão, mas também pela emoção nos permitiu complexificar a análise sobre o cotidiano do trabalho doméstico. Olhar para o cotidiano como lugar das "vivências humanas" (Martins, 2018) nos possibilitou ampliar nossa compreensão sobre as práticas diárias das trabalhadoras domésticas, pois, como sugerem Sato e Oliveira (2008), "Os trabalhadores procuram gerenciar o dia-a-dia de trabalho segundo a interpretação de regras, segundo suas próprias avaliações e buscam resolver os problemas que se apresentam dia após dia" (p. 194). Logo, para apreender as ambiguidades e contradições nas práticas e sentidos produzidos desenhamos um percurso de pesquisa que nos aproximasse das experiências das participantes, a seguir apresentado.
Percurso da pesquisa
A presente investigação se situa no campo dos chamados métodos biográficos. Para Bassi Follari (2014) esses métodos abarcariam modalidades e formas de pesquisa diversas, com tradições teórico-metodológicas variadas, tendo como ponto comum o uso de fontes orais, material pessoal ou biografias para levantamento de informações.
Na investigação aqui apresentada, adotamos o método do relato de vida, tal como propõe Bertaux (2010), que assim denomina seu método para distinguir entre a história vivida por uma pessoa do relato que faz de sua vida. O autor define sua perspectiva de pesquisa como "etnossociológica", situando-a entre a etnografia e a tradição sociológica, entre o particular e o geral, e adota uma dimensão histórica, pois: "Todo fenômeno social se insere no movimento histórico geral de transformação das sociedades" (Berteaux, 2010, p. 16, tradução nossa).
O levantamento de informações7 foi efetivado por meio de duas entrevistas com cada participante, aliadas ao uso de fotografias e de agenda colorida. Na primeira entrevista, pautada em um roteiro organizado em campos temáticos, as participantes discorreram sobre suas histórias de vida e trabalho e, ao final, foram convidadas a produzirem imagens sobre seu cotidiano de trabalho, por meio de uma câmera digital disponibilizada pelas pesquisadoras. Na segunda entrevista as participantes preencheram suas atividades rotineiras e ocasionais â discriminadas por meio de cores variadas, num formulário contendo os dias da semana divididos por horas, semelhante à forma utilizada por Borges e Coutinho (2018) em sua pesquisa. Logo, o diálogo se estabeleceu a partir das duas produções das participantes: as imagens materializadas pelas fotografias e a agenda colorida. Na produção de material fotográfico, as participantes trouxeram o enquadre do próprio olhar sobre os espaços percorridos no contexto laboral e com a agenda colorida foi possível conhecer os usos do tempo das participantes no cotidiano de trabalho remunerado e não remunerado.
Desse modo, na GF foram entrevistadas 22 trabalhadoras, sendo dez diaristas e 12 mensalistas. Na BF foram entrevistadas cinco trabalhadoras, sendo três diaristas e duas mensalistas. De forma complementar, foram entrevistadas duas representantes da Federação Nacional das Trabalhadoras domésticas (Fenatrad), em cada uma das regiões investigadas. Todas as entrevistas gravadas em áudio foram transcritas e, após, isso analisadas por meio de procedimento inspirado na proposta dos Núcleos de Significação (Aguiar & Ozella, 2006; 2013; Aguiar, Soares & Machado, 2015), considerando as especificidades da pesquisa efetivada, em especial, o grande volume do material coletado.
Essa análise implicou a leitura atenta e repetida das transcrições das entrevistas de cada participante, num processo de aglutinação em três etapas: pré-indicadores, indicadores e núcleos. Em diálogo com o referencial teórico da pesquisa, foi possível identificar três grandes núcleos: trajetórias educacionais e laborais; vivências no trabalho; e gestão da vida cotidiana e trabalho. A seguir vamos apresentar e discutir os resultados da pesquisa, iniciando com a caraterização dos/as participantes. Depois, cada núcleo será apresentado separadamente, embora seja importante destacar a articulação entre eles.
Vida cotidiana de trabalhadoras domésticas
Caracterização das participantes
Antes de apresentar o perfil das participantes, cabe observar que a clássica divisão entre atuar como diarista ou mensalista se torna mais difusa quando se analisa a vida cotidiana de quem trabalha no serviço doméstico. Assim, para fins dessa pesquisa, consideramos como mensalista a trabalhadora doméstica que possuía vínculo formal de trabalho (carteira assinada) e remuneração regular, mesmo que também exercesse outras atividades como a faxina em residências alternadas; e consideramos como diaristas as entrevistadas que não tinham vínculo formal de trabalho e atuavam em mais de uma residência.
Quase a totalidade do grupo, com exceção de um diarista, é composta por mulheres, corroborando pesquisas e estatísticas que destacam o caráter feminino do trabalho doméstico (Girard-Nunes & Silva, 2013; Melo & Thomé, 2018). Dados publicados no relatório Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça â 1995 a 2015 (IPEA, 2017) revelam que em 20 anos o percentual de mulheres ocupadas no mercado de trabalho como doméstica remunerada passou de 17,3% para 14,3%. Mesmo com a leve queda no contingente de mulheres ocupadas com serviço doméstico, quando se analisa o vínculo empregatício, observa-se que 71,6% delas trabalhavam sem carteira assinada. Os homens, nessa mesma atividade, eram 57,7% sem carteira assinada.
Quanto ao perfil etário das entrevistadas na presente pesquisa, observou-se que na GF elas têm em média 43 anos de idade, a mais jovem entrevistada com 20 e a de mais idade com 63 anos. Na BF a média de idade foi de 52 anos: partindo da entrevistada de menor idade, 39 anos, e atingindo o teto de 69 anos de idade. Esse perfil etário é compatível com a análise Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese, 2017) a partir de dados entre 2012 e 2017, ao evidenciar o envelhecimento da categoria das trabalhadoras domésticas em três capitais e no Distrito Federal. No período analisado houve um expressivo crescimento da parcela de mulheres com 40 anos ou mais, com destaque para as mulheres com mais de 50 anos de idade.
No que se refere à escolaridade, observam-se níveis variados entre as participantes, desde ensino fundamental incompleto até superior completo. Predominam os níveis educacionais mais baixos, com 15, mais da metade das 27 entrevistadas, com até o ensino fundamental completo. Destaca-se a presença de três entrevistadas com ensino superior completo, duas têm menos de 35 anos de idade, sendo uma mensalista e outra diarista.
Quando se analisa a composição familiar das participantes da GF, predominam as casadas ou com união estável (13 entrevistadas). A maioria, 17 participantes, têm filhos, entretanto boa parte desses filhos têm idades acima de 14 anos, apenas sete entrevistadas têm filhos abaixo dessa idade, o que pode sugerir maior dispêndio de tempo no cuidado da prole. Cabe colocar ser o trabalho doméstico não remunerado em suas próprias residências uma presença cotidiana na vida de todas as entrevistadas, com exceção do único homem. Além do trabalho doméstico remunerado exercido pelas entrevistadas, na GF, oito delas relataram exercer outras atividades remuneradas para complemento de renda, em geral atividades vinculadas ao trabalho doméstico, como no caso de mensalistas que também fazem diárias de faxina. A maioria se declara responsável por sua subsistência, sozinhas ou em compartilhamento com o marido. No caso das entrevistadas no RJ, apenas uma é casada, as demais declararam-se solteiras, sendo uma divorciada e outra viúva; todas elas têm filhos maiores de dez anos e subsidiam seus próprios custos ou da família. Por outro lado, algumas têm netos e/ou bisnetos e, eventualmente, auxiliam no cuidado. Apenas uma das entrevistadas, a diarista casada, compartilha as despesas com o marido.
A renda média mensal declarada pelas trabalhadoras domésticas foi de aproximadamente R$ R$ 1530 â médias aproximadas na GF de R$ 1.550 enquanto na BF, R$ 1518. Considerando as duas regiões, as diaristas entrevistadas receberam em média R$ 1680 (médias aproximadas na GF de R$ 1.826 e na BF, R$ 1400), enquanto as mensalistas receberam R$ 1390, aproximadamente (sendo R$ 1.342,00 na GF e R$ 1690 na BF). Entre os anos de nossa pesquisa, 2013 e 2016, o salário mínimo (SM) brasileiro variou na seguinte sequência: R$ 678,00; R$ 724,00; R$ 788,00 (IDoméstica, 2019) e R$ 880,00. Assim, observamos que as diaristas na GF atingem a média de dois SM e ganham mais que as mensalistas nessa região, o que também é descrito pela PED (Dieese, 2017) no ano de 2017. Na BF, as mensalistas recebem quase dois SM, portanto, mais que as diaristas nas duas regiões, mas cabe esclarecer que as mensalistas da BF possuem outras fontes de renda.
Trajetórias educacionais e laborais
A análise das trajetórias das trabalhadoras domésticas buscou compreender as relações entre o social e o individual, uma vez que ambos se constroem mutuamente ao longo da vida das trabalhadoras, deixando evidentes marcas dos percursos educacionais e laborais, cujas articulações também estão imbricadas quando da inserção laboral (D'Avila & Coutinho, 2017). Dessa forma, ao relatarem suas trajetórias, as entrevistadas contam histórias de percursos escolares muitas vezes interrompidos pela necessidade de trabalhar ainda muito jovens ou por migrações em busca de trabalho ou para acompanhar a família, seja sua família de origem ou seu núcleo familiar formado.
A maioria das entrevistadas (17 participantes) reside em uma cidade diferente da de sua origem e ressalta que espera uma trajetória diferente para os seus filhos. A inserção no trabalho doméstico, muitas vezes precoce, é relatada, em geral, de modo naturalizado, como algo considerado inerente à condição de mulher, conforme o princípio da separação relatado por Kergoat (2009). São exemplos os discursos de Rebeca e Fernanda8:
a gente já ajudava a mãe, lavava roupa pra ela, passava (Rebeca, mensalista, 49 anos).
Comigo são sete, tem dois meninos e cinco meninas . . . . As irmãs, tudo tão fazendo a mesma coisa que eu faço . . . minha mãe sempre trabalhou no sítio, em casa mesmo, negócio de roça . . . . Negócio de lenha, madeira, carvão essas coisas que eles fazem lá [referindo-se ao pai e aos irmãos] (Fernanda, mensalista, 45 anos).
O trabalho doméstico destacou-se como uma ou, muitas vezes, única opção de sustento diante do acesso a outras possibilidades de inserção laboral, como colocou Maria:
Escolhi não. Fui obrigada. Por que aonde vão pessoas sem estudos? Qual a profissão que a pessoa tem? Eu só fiz até o segundo ano só. Entendeu? Quer dizer, eu não tive opção (Maria9, mensalista residente, 69 anos).
Assim, as trabalhadoras expressam em seus discursos o quanto a baixa escolaridade é um fator determinante em suas inserções no mercado de trabalho:
porque eu não tenho estudo, né? Daí era o único que eu poderia trabalhar, né? (Lete, mensalista, 36 anos).
Teixeira et al. (2015) também consideraram a baixa escolaridade das empregadas domésticas entrevistadas em sua pesquisa um aspecto preponderante para a hierarquização profissional e social da referida categoria. Quando tratam de suas expectativas em relação ao trabalho, observa-se, particularmente para as mais velhas e com menor escolaridade, a dificuldade em vislumbrarem outras possibilidades, apontando para um recorte geracional. Em relação aos filhos, revelam expectativas de outras ocupações menos desgastantes e a possibilidade de finalizarem os estudos. Chama atenção o caso de Amanda, uma das entrevistadas que possui ensino superior completo:
E justamente como desempregada, não conhecia ninguém na cidade né?! Aí eu disse: ficar com o chapéu na mão, ficar pedindo calcinha, sutiã, a calça jeans, o tênis para as filhas, não dá, né. Mandei currículo, mandei, mandei, mandei, cansei. Aí cansei, porque com a idade, infelizmente existe preconceito com a idade (Amanda, diarista e ex-professora, 63 anos).
As participantes do RJ referiram diversos fatores que as levaram a exercer o trabalho doméstico, como a inserção precoce no trabalho e, ao mesmo tempo, a baixa escolaridade, as migrações. No caso da mensalista residente, apesar de não ter mencionado um projeto laboral mais organizado, ela reporta o cuidado com seus quatro filhos, tentando possibilitar-lhes uma vida diferente da sua, ou seja, isso pode ser entendido como um projeto já alcançado pela entrevistada. Também chama atenção no discurso de Maria uma distinção entre trabalho de mulheres e de homens, tendo em vista que seu filho e netos não atuam na área de serviços domésticos ou de limpeza, conforme permanece a divisão sexual do trabalho (Hirata, 2018; Kergoat, 2009).
Nesse núcleo foi possível identificar aspectos relevantes que configuram não só as trajetórias de trabalho das entrevistadas, como também a entrada precoce no mercado de trabalho e o nível de escolarização enquanto fator decisivo que possibilita diferentes inserções ocupacionais, mas também a expectativa de que seus sucessores tenham a possibilidade de estudar e aumentem as chances de ingresso em diferentes ocupações, em busca de condições de trabalho menos precárias. Um recorte geracional também foi identificado entre as entrevistadas mais velhas, como fator decisivo de privação ou saída do mercado de trabalho doméstico.
Vivências no trabalho
Baseada em Vigotsky e Toassa (2011), Martins (2018) aponta que as vivências podem ser compreendidas enquanto uma unidade entre os afetos, pensamentos e ações de um sujeito em relação ininterrupta com a conjuntura da vida cotidiana. Isto é, as vivências constituem-se enquanto "unidades personalidade-meio", dialética permanente do ser social, entre o particular e o genérico, entre si e o mundo que habita (Vigotski, 1925/1999, p. 231).
A análise das vivências no trabalho doméstico revela o quanto este, mesmo sendo considerado desgastante e, não raro, humilhante, é valorizado, uma vez que propicia sustento material e, consequentemente, autonomia financeira às mulheres trabalhadoras, bem como pelas relações estabelecidas com as patroas e familiares. Embora o não se configure como uma escolha para a maioria, algumas ressaltam as vantagens desse tipo de atividade em relação a outras experiências de trabalho remunerado, seja pela própria possibilidade de receber uma remuneração, como trouxe Emília, seja pela flexibilidade de horários, particularmente as diaristas:
Eu estou bem onde eu estou, porque a gente vai e tem o teu dinheiro. Então tu paga isso, paga aquilo, é gratificante (Emília, diarista, 53 anos).
Tu te mata de trabalhar numa empresa e quando tu sair e tu pedir tuas contas e perder tudo? Mil vezes trabalhar de faxina (Rosa, diarista, 46 anos).
Os vínculos que se estabelecem entre a trabalhadora e os contratantes são característicos do serviço doméstico e permitem o estabelecimento de relações de confiança. A confiança foi destacada enquanto característica fundamental não só nas relações de trabalho, mas no acesso e permanência nele, pois a atuação no ambiente privado de famílias torna a relação extremamente próxima e, como apontaram Girard-Nunes e Silva (2013), não se trata, somente, de uma "simples venda de serviços" (p. 598).
Luciana, mensalista entrevistada, remete a essa relação de confiança com a patroa ao mencionar que:
ela deixa carteira, dinheiro, então é isso assim ó, digo é essa confiança de um lado e de outro. Ela tem a confiança de deixar tudo que é dela ali, que ela sabe que eu não vou mexer, e a confiança dela ter me deixado na casa dela, né (Luciana, mensalista, 50 anos).
O estreitamento e fortalecimento de vínculo passam, muitas vezes, por uma relação de grande cumplicidade e fortes afetos compartilhados entre as trabalhadoras e seus contratantes. É importante ressaltar que no caso das mensalistas, cujo convívio com os contratantes é mais estreito e regular, essas relações se intensificam, em especial quando envolvem o cuidado de crianças ou outros dependentes, potencializando a construção de um sistema de "ambiguidade afetiva" (Brites, 2007; Brites & Picanço, 2014), como identificado na fala a seguir:
às vezes eu falo que vou embora e eles: "não, não", eu sei que vai ser muito difícil pra ela, arrumar uma pessoa, né? (Júlia, mensalista, 24 anos).
A tomada de decisões acerca da vida pessoal e ocupacional das entrevistadas está, muitas vezes, balizada pelos fortes vínculos construídos com seus contratantes, pelas contradições que constituem suas vivências nessa relação entre "desiguais" (Vidal, 2012).
No caso da BF chama a atenção o caso da única mensalista residente entrevistada, cujo convívio com os membros da unidade familiar, todos homens, propicia uma série de atividades diversificadas, até mesmo o cuidado de seu patrão idoso, por exemplo. Ademais, os relatos das participantes também fazem referência a situações de humilhação, as quais reiteram uma condição de servidão tributária da herança escravista, como coloca Soratto (2006). Entretanto, algumas falas revelam que nem sempre as trabalhadoras aceitam essa condição, como foi evidenciado por Severina:
Eu já não trabalho pra gente chique porque eu não gosto de ser humilhada não. Se for pessoa chata demais eu também não vou. Só vou uma vez só e não vou nunca mais (Severina, diarista, 52 anos).
Nesse núcleo foi possível compreender que as vivências, tal como Martins (2018) menciona, englobam características peculiares. No caso do trabalho doméstico, particularmente das mensalistas, cuja convivência com os contratantes é constante, as trabalhadoras revelam vivências contraditórias tanto aquelas permeadas por bons afetos, com relações de cumplicidade e confiança, como as situações de humilhação, associadas aos afetos tristes.
Gestão da vida cotidiana e trabalho
O cotidiano é compreendido aqui como o palco das vivências humanas, onde a vida de todo dia acontece entrelaçada em sentimentos, pensamentos e relações dos sujeitos com seu meio. Ao focarmos a gestão da vida cotidiana e trabalho, tomamos como referência, tal como propõem Sato e Oliveira (2008), o universo de regras definidas e relações de poder hierárquicas em que ocorre uma existência negociada entre todos envolvidos no cotidiano. Para tanto, os autores se assentam na concepção de Michel de Certeau (2009), em especial quando ele considera as ações astuciosas ou arte do fraco para fazer frente a situações que não domina.
A gestão da vida cotidiana pelas entrevistadas requer habilidade e destreza para conciliar um sem número de tarefas, bem como capacidade de negociação com as suas contratantes. As trabalhadoras realizam atividades variadas, organizadas ao longo da jornada ou da semana, e estas sempre articuladas com demandas urgentes e instantâneas. Foram valorizadas as possibilidades de estabelecer regras próprias com certa autonomia, bem como descritas astúcias para dar conta da sobrecarga de trabalho físico e emocional. Parte das participantes exerce outras atividades remuneradas, como as mensalistas que também fazem faxina, venda de produtos, entre outras. Todas exercem o trabalho doméstico em suas residências ou na residência de dependentes, caracterizando a clássica dupla jornada de trabalho das mulheres. No caso de Márcia, ela "ajuda" sua vizinha no final de semana:
Dia de sábado, depois que eu largo daqui, aí eu fico com duas criancinhas, porque a mãe deles trabalha. Aí é conhecida, então a gente já tem aquela amizade, assim. Aí eu fico com eles pra ela poder ir trabalhar (Márcia, mensalista, 53 anos).
Assim, para a maioria das entrevistadas, a maior parte do tempo livre é destinado ao trabalho doméstico não remunerado e, no pouco tempo restante, descansam ou fazem alguma atividade de lazer. Na BF, as participantes relataram um grande dispêndio de tempo para o deslocamento entre suas residências e as unidades familiares em que trabalham ou já trabalharam, conforme explica Beth:
Eu vou de ônibus e o tempo é entre três horas a três horas e meia. Ida e volta (Beth, diarista, 47 anos).
Esse tempo de deslocamento, considerando a RM do RJ (Sebrae/RJ, 2015), provoca alterações em suas rotinas, como, por exemplo, a necessidade de acordar mais cedo para acessar o transporte público (ônibus, trem e/ou metrô) e, por outro lado, pensar no retorno às suas residências, que também contempla lidar com os frequentes episódios de violência na capital fluminense. Além disso, conforme Léia, há utilização de mais de dois ônibus, dependendo do lugar de destino:
Daqui pra [zona norte da capital] dois [ônibus]. E daqui pra [município da BF] três. E se eu for de moto eu pego um ônibus, que ele me deixa no ponto e eu vou de ônibus até a casa dela (Léia, diarista, 39 anos).
Para além das similaridades, foi também possível observar peculiaridades que diferenciam o cotidiano de trabalho de mensalistas e diaristas. Em relação ao trabalho doméstico remunerado das mensalistas, percebeu-se que existe uma maior variedade de tarefas a serem executadas do que as diaristas, muitas vezes simultaneamente, e flexibilidade maior no que diz respeito à organização e realização dessas atividades, como aponta Márcia:
Tem horas que eu faço mais rápido. Tem horas que eu demoro mais. Tem horas que a gente se atrapalha um pouquinho, mas fica tudo bem . . . . A gente quer fazer o serviço pra acabar logo aí acaba se enrolando (Márcia, mensalista, 53 anos).
Além da responsabilidade pela limpeza e organização das residências, as mensalistas também são responsáveis por tarefas como: fazer compras, cuidar de plantas e animais, lavar e passar roupas, cozinhar etc. Beth explica as diferenças entre as duas modalidades:
Quando a patroa pede para organizar o guarda-roupa, porque ela vai junto, né. A faxineira não mexe em armários sem a presença da patroa. É isso. É organizar tudo. Lavar cozinhas, banheiros. Do teto ao chão, entendeu? Que é diferente da doméstica, né?! Que a doméstica ela faz uma limpeza leve. Ela varre, passa pano. A diarista, não. Ela limpa pesado. Ela limpa com produtos pesados, né, X14, cloro (Beth).
Assim, as mensalistas trabalham, em geral, de segunda a sexta-feira na mesma residência e, portanto, podem organizar o trabalho como acham melhor, dividindo tarefas nos dias da semana, a partir do ritmo da família e das demandas e negociações com cada empregador. Ademais, o cuidado de pessoas das famílias contratantes, eventualmente idosos, mas principalmente de crianças é um aspecto relevante do trabalho das mensalistas, o que traz fortes implicações para as vivências dessas trabalhadoras e um cotidiano de trabalho intensificado:
Um dia eu passo roupa, outro dia limpava os vidros, outros dias limpava a cozinha, geral, assim, geladeira, outro dia lavava o canil, que o canil é bem grande (Margarida, mensalista, 30 anos).
Por outro lado, quando os membros da família estão ausentes, a carga do trabalho e a organização se tornam mais simples, como destaca Júlia ou, ainda que alguém esteja em casa, este "não perturba" (Severina) a realização do trabalho.
No caso da BF, uma das mensalistas trabalha como residente no apartamento de seus três patrões, todos homens, uma vez que acompanha a família há mais de três décadas, suas patroas já faleceram. Essa trabalhadora tem uma relação muito próxima com seus patrões â avô, filho e um neto. Ela cuida das roupas, das plantas, da alimentação, das compras para a casa, serve a comida, cuida do idoso e, eventualmente, tem a ajuda de uma diarista para a faxina mais pesada. Seu lugar na casa dos patrões é naquilo que poderíamos chamar de "quarto de empregada"(Brites, 2007). Márcia, mensalista atualmente, conta que já trabalhou como residente em outro momento de sua vida afirma:
Trabalhei três meses. Lá no [zona oeste da capital]. De frente a praia . . . . Dormia. Vinha final de semana, mas é muito ruim dormir no serviço . . . . Mas é sempre bom a gente estar junto podendo dormir em casa (Márcia).
Teixeira et al. (2015) questionam o lugar das trabalhadoras domésticas, concluindo certa "simbiose simbólica" em relação às casas em que trabalham e às casas consideradas como seus "cantinhos", seja de descanso, refúgio ou realizações. Já as diaristas trabalham em várias residências e tendem a apresentar relações de trabalho menos pautadas pelos atravessamentos afetivos, uma vez que não têm contato próximo e não prestam atividades de cuidado frequentes. Como geralmente não precisam cumprir horário, o tempo despendido para o trabalho depende diretamente da velocidade com que realizam suas faxinas, liberando-as do trabalho para poder partir para outra residência. Elas possuem rotinas mais fixas e geralmente preestabelecidas:
Eu tenho um padrão, assim, de limpeza . . . . Eu começo pelo banheiro, depois eu vou pras janelas â que é o serviço mais pesado. Dificilmente eu fujo dessa rotina (Charles, diarista, 31 anos).
Embora variem de locais de trabalho, conseguem gerir com mais autonomia sua rotina de trabalho, pois não são tão interrompidas por demandas não previstas como as mensalistas e mantêm o foco no seu trabalho de faxina, a chamada "limpeza pesada", particularmente desgastante.
Então eu não tenho rotina, porque muda a dinâmica, muda a estratégia e sempre com o olho no relógio, porque eu sei um banheiro bem, hiper, hiper limpinho, com o espelho brilhando são 45 minutos, hiper, brilhando . . . . eu cuido também pra não fazer tudo do mesmo jeito (Amanda).
Por fim, esse núcleo possibilitou compreender que a gestão do cotidiano no serviço doméstico é bastante heterogênea e vinculada a diversos fatores, como: as diferentes modalidades (mensalistas e diaristas); o tamanho e características da residência e da própria família; as necessidades diferenciadas, como cuidado de animais, crianças, idosos, preparo de alimentos e outras atividades. Podemos identificar que, como ponto comum, são cotidianos robustos que exigem decisões a todo momento, pautadas não só nas negociações com os contratantes, mas também no saber tácito e nas astúcias das trabalhadoras. Teixeira et al. (2015) consideram as empregadas domésticas como gestoras, uma vez que "são mulheres que cotidianamente desenvolvem estratégias e táticas de sobrevivência no trabalho" (p. 162).
Considerações finais
A naturalização do trabalho doméstico enquanto atividade feminina perdura nas sociedades atuais e pôde ser identificada tanto pela persistência de uma significativa porcentagem de mulheres nesta ocupação quanto pela dupla jornada de trabalho das mulheres, que continuam responsáveis por todas as atividades de limpeza, cuidado, preparo de alimentos e demais funções de manutenção dos lares.
Sobre as trajetórias educacionais e laborais, os achados explicitam o que já vem sendo apontado como comum nesta categoria de trabalhadoras, como: o abandono dos estudos para a ajuda em casa com o trabalho doméstico remunerado ou não, a impossibilidade de inserção em outras ocupações em função da baixa escolaridade e a expectativa de que os filhos possam estudar e garantir um trabalho e condições de vida menos precários. Outro aspecto importante acerca disso é que, mesmo que o trabalho doméstico possa não se constituir propriamente em uma escolha e se configure como desgastante, ele consiste em uma opção de algum modo vantajosa, uma vez que proporciona uma autonomia financeira que lhes possibilita organizar suas vidas.
Em relação às vivências das trabalhadoras, cabe destacar o quanto são atravessadas por ambiguidades afetivas, particularmente no caso das mensalistas, cujos vínculos com os contratantes e seus familiares são mais intensos. A análise dos modos como as trabalhadoras gerem suas vidas cotidianas revelou o quanto precisam dar conta de várias tarefas ao mesmo tempo, em jornadas de trabalho doméstico, remunerado e não remunerado, que se multiplicam. Entre essas tarefas predominam aquelas que implicam o cuidado do outro, as quais guardam relação com atributos considerados femininos. A análise das experiências dessas trabalhadoras revela o quanto se articulam razão e emoção em seus cotidianos de trabalho. Olhar para a questão da afetividade permite visibilizar as relações entre patroas e empregadas, que ocorrem na intimidade das residências das primeiras e reverberam em modos singulares de vivenciar uma relação hierárquica, pautada numa herança escravista e permeada por emoções.
Os resultados dessa pesquisa revelam o quanto as atividades necessárias à manutenção da vida humana e social continuam sendo de responsabilidade das mulheres e, desse modo, contribuem para a reprodução da "desigualdade sexo/gênero e a subalternidade feminina" (Brites, 2013, p. 424), o que aponta para a urgência da fomentação de políticas públicas e setoriais de cuidado, como creches públicas e escolas em tempo integral, que possam reverter, pelo menos em parte, a sobrecarga que repousa tradicionalmente sobre os ombros femininos.
Concluímos apontando para a necessidade de mais pesquisas sobre o trabalho doméstico no contexto das recentes transformações no cenário do trabalho no Brasil, como a reforma trabalhista que alterou direitos estabelecidos na CLT, para compreender o quanto as trabalhadoras domésticas foram afetadas por essas mudanças, justamente quando recentemente haviam conquistado alguma paridade com outros trabalhadores.
De outra parte, gostaríamos de destacar a importância de projetos de pesquisa e intervenção no campo da Psicologia Social do Trabalho voltados para atividades tradicionais, como o trabalho doméstico, mas frequentemente invisibilizadas. Para finalizar, observamos que ao longo do processo de investigação tivemos algumas oportunidades, por meio de mostras e rodas de conversa, para devolução dos resultados para as trabalhadoras domésticas, participantes ou não do estudo, bem como tivemos contato com representantes sindicais. O desdobramento dessas atividades em projetos acadêmicos mais duradouros poderia se constituir em uma forma de contribuição para as ações coletivas dessas trabalhadoras.
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Endereço para correspondência
mariachacout@gmail.com
geruzad@yahoo.com.br
tiellypsi@gmail.com
madmrs@yahoo.com
Recebido em: 30/10/2018
Avaliado em: 21/01/2019
Aprovado em: 14/02/2019
1 Adotaremos ao longo do texto o termo "trabalhadoras domésticas" para nos referirmos às participantes da pesquisa, ainda que um trabalhador do sexo masculino tenha participado da presente investigação, como será mencionado oportunamente.
2 Trata-se da pesquisa "Práticas e produção de sentidos no cotidiano de trabalho", contemplada pela chamada Universal 14/2013 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) com auxílio financeiro e bolsas de pesquisa.
3 A GF é considerada Região Metropolitana (RM) do estado de Santa Catarina desde 2010 e inclui 9 municípios, somando 7.465,7 km² e representando 14% da população estadual (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada [IPEA], ; Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento [PNUD] & Fundação João Pinheiro [FJP], 2017). Já o polissêmico termo Baixada Fluminense (BF) corresponde a RM do estado do Rio de Janeiro e incluí 13 municípios (Rocha, 2013). A partir de dados do último Censo, o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado do Rio do Janeiro ([Sebrae/RJ], 2015) informa que a região da BF tem área total de 2.807 km², a qual apresenta a maior densidade demográfica do estado, representando em torno de 23% da população total.
4 Tal conceito é apresentado por Brites (2007) a partir do trabalho de Donna Goldstein.
5 As autoras se ancoram em dados do CENSO de 2010 e da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios de 2015, realizadas pelo IBGE.
6 Foge ao escopo deste texto discutir as modificações significativas na legislação trabalhista brasileira com a aprovação, em julho de 2017, da chamada Reforma Trabalhista (Lei Federal nº 13.467, de 13 de julho de 2017) e seus impactos no mercado de trabalho.
7 O projeto de pesquisa foi avaliado e aprovado por Comitê de Ética nas duas universidades onde a investigação foi realizada.
8 Os nomes das participantes são fictícios e foram autoatribuídos no momento da entrevista.
9 No caso da única mensalista residente participante de nossa pesquisa, Maria permanecia no apartamento dos patrões de segunda a sexta-feira, salvo algumas ocasiões, residindo no "quarto da empregada" situado ao lado da cozinha e da área de serviço do apartamento. Na sexta-feira ao final do expediente ela voltava para sua casa, num município da região metropolitana, onde mora sozinha, e retornava para o trabalho na segunda-feira pela manhã.