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Revista Psicologia Política
versão On-line ISSN 2175-1390
Rev. psicol. polít. vol.21 no.52 São Paulo set./dez. 2021
DOSSIÊ BIOPOLÍTICAS E COVID-19
Psicologia e ciência: protagonismo negro e indígena na Covid-19
Psychology and science: black and indigenous protagonism in Covid-19
Psicología y ciencia: protagonismo negro e indígena en el Covid-19
Regina Marques de Souza Oliveira
Estágio pós-doutoral em Saúde Mental da População Negra e Diáspora Africana pelo Instituto dos Mundos Africanos em Paris da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (IMAF/ EHESS - Paris). Mestre e Doutora em Psicologia Social pela PUC/SP. Psicanalista. Supervisora Clínica e Professora na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - Centro de Ciências da Saúde e no Mestrado em Relações Étnicas e Contemporaneidade da UESB/Jequié/BA. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Cruz das Almas/BA, Brasil. E-mail: regina@ufrb.edu.br
RESUMO
Os modos de compreender a ciência na contemporaneidade esbarram nas formas de engajamento social. O classicismo científico abstém-se de realizar a interpretação histórica da realidade, reduzindo a reflexão e banalizando o fundamental. Ao mesmo tempo, negros e indígenas, grupos historicamente desprezados, assumem protagonismos importantes e elevam suas vozes não somente na sociedade em geral, mas também nos ambientes acadêmicos. Porém, estes redutos são coniventes com a exclusão e invisibilidade dos corpos científicos negros e indígenas. Na pandemia, circunstância letal para a humanidade, observações da psicologia enquanto disciplina científica interdisciplinar ao campo da saúde são importantes para reavaliar o modelo de engajamento político que desejamos em situações de tragédias e genocídios de certos grupos humanos que compõe a sociedade brasileira.
Palavras-chave: Ciência; Psicologia; Saúde; Populações negro-indígenas.
ABSTRACT
The ways of understanding science in contemporary times collide with forms of social engagement. Scientific classicism refrains from carrying out the historical interpretation of reality, reducing reflection and trivializing the fundamental. At the same time, blacks and indigenous peoples, historically despised groups, assume important roles and raise their voices not only in society in general, but also in academic environments. However, these strongholds are conniving with the exclusion and invisibility of black and indigenous scientific bodies. In the pandemic, a lethal circumstance for humanity, observations of psychology as an interdisciplinary scientific discipline in the field of health are important to reassess the model of political engagement that we want in situations of tragedies and genocides of certain human groups that make up Brazilian society.
Keywords: Science; Psychology; Health; Black-indigenous populations.
RESUMEN
Las formas de entender la ciencia en la contemporaneidad chocan con las formas de compromiso social. El clasicismo científico se abstiene de realizar la interpretación histórica de la realidad, reduciendo la reflexión y banalizando lo fundamental. Al mismo tiempo, negros e indígenas, grupos históricamente despreciados, asumen roles importantes y alzan su voz no solo en la sociedad en general, sino también en los ambientes académicos. Sin embargo, estos bastiones están en connivencia con la exclusión e invisibilidad de los cuerpos científicos negros e indígenas. En la pandemia, circunstancia letal para la humanidad, las observaciones desde la psicología como disciplina científica interdisciplinaria en el campo de la salud son importantes para revaluar el modelo de compromiso político que queremos en situaciones de tragedias y genocidios de determinados grupos humanos que componen la sociedad brasileña.
Palabras clave: Ciencia; Psicología; Salud; Poblaciones negras-indígenas.
Introdução
No nordeste brasileiro decisões na contra mão da população negra e indígena nos obrigam a rever comportamentos institucionalizados que ferem a possibilidade de emancipação humana a partir do edifício tecnológico e epistemológico da ciência.
Este texto visa chamar a atenção para fatos graves que vem acontecendo por parte da academia científica em reiterar o apagamento das populações negras e indígenas. Esperamos que faça eco aos pesquisadores que foram invisibilizados, mas também alcance o papel real de fazer ciência. Uma ciência diversa que defenda os corpos negros e indígenas que estão sendo mortos nas cidades e florestas pela covid 19. E favoreçam a ampliação de suas vozes, quando elas se colocam próximos de nós que "fazemos e construímos a ciência".
Neste artigo procuraremos abordar as razões de um cientificismo que se organiza em circunstâncias de extrema vulnerabilidade humana, na qual a interpretação histórica deveria ser a direção mestra dos fazeres da tecnociência. No entanto, conforme discussões que apresentaremos, esta direção acaba por ser obliterada, a partir de movimentos que reproduzem, em plena pandemia, um classicismo científico que originou as estruturas de pesquisas no estado nacional.
Analisaremos alguns fatos corriqueiros no processo de articulação científica de centros de produção de pesquisa no nordeste brasileiro, considerando duas indicativas tecno-científicas de lideranças militantes e intelectuais negra e indígena. Consideraremos estes episódios "corriqueiros", como fatos históricos a serem observados no constructo da lógica da consideração da ciência e o seu papel neste tempo e neste mundo - lugar, tempo e espaço e avaliaremos, a partir da lógica da construção e vinculação científica no Brasil pelas vias da história da psicologia e as suas relações, formas de engendramentos históricos e sociais, com as populações brasileiras negra e indígena. Obviamente, faremos esta análise a partir de passagens díspares e não sequenciais na conduta da ciência psicológica no Brasil.
Este tratamento nos possibilita refletir o espelho em que se miram as ciências, de modo geral, no Brasil e na contemporaneidade; alertando, no entanto, que no caso da psicologia, saídas importantes de emancipação das redes de cooptação convencional e clássica da reprodução dos paradigmas ocidentais - ou eurocêntricos - da ciência, se inscrevem a partir de lideranças militantes e intelectuais importantes. Ensejando novos paradigmas para o processo de construção epistemológica de uma ciência brasileira que se importe com suas bases mais genuínas em termos históricos, temporais e territoriais. No caso, uma ciência para as Américas e para os brasileiros, no tempo histórico que nos emerge na contemporaneidade.
Os agravos em saúde na covid 19 nos obriga observar este olhar, na perspectiva histórica, psicológica e política, no qual se direcionam os fazeres científicos e as escolhas daqueles que produzem ou reproduzem as geométricas do poder tecno-científico.
Fatos "corriqueiros": a ciência na contramão das populações negras e indígenas
Consideramos que a partir de fatos históricos é possível perceber as formas de vinculações sociais que as instituições inscrevem no seu fazer cotidiano.
No nordeste brasileiro, o escravismo é uma marca presente. Principalmente no interior dos territórios, que segregados da população central do Estado Nacional, sempre está às voltas com necessidades de toda ordem. A invisibilidade das populações negras e indígenas são notórias inclusive nos ambientes acadêmicos de produção científica e tecnológica recentemente instalados em regiões interioranas do Brasil, no processo de interiorização das universidades públicas brasileiras.
Acertadamente, investir em equipamentos científicos nestes territórios é medida importante, salutar e geradora de desenvolvimento local, regional e nacional.
A ciência, espera-se, transforma seu entorno, e as universidades, igualmente, devem possuir as condições reflexivas de tomadas de decisão que favoreçam reflexões profundas com criatividade e originalidade para o efetivo alcance do conhecimento para a sociedade. Isto porque a ciência é também uma instituição, e como tal, deve agir em prol do desenvolvimento social coletivo.
No entanto seu edifício é complexo, e seus interesses também. Pautado pelos poderes de grupos que nem sempre alinham-se com as demandas sociais de modo mais comprometido e efetivo. Assim já nos dizia Sartre: os homens casam-se com o seu tempo, e portanto não devem trai-lo (Sartre, 1994).
Nestes tempos de pandemia, esta verdade deve ser emblemática na relação do fazer cientifico e a busca de melhores arranjos em saúde para a população mundial. Principalmente as mais sofridas como negros, quilombolas e indígenas, no caso dos maiores índices de mortes pela covid 19.
Milton Santos, contemporâneo a Sartre também nos apresenta as tensões e conflitos que as universidades - institutos de ciência - costumam organizar. Revelando que a vontade de poder e tecnicismo acaba muitas vezes por suprimir o entendimento abrangente da realidade. Segundo ele, um grave obstáculo a consideração sensível da realidade é a presença na universidade de uma gestão técnica e racionalizada, que reproduz uma visão mercantil, avassaladora e pragmática a qual revela-se como o melhor passaporte para os postos de comando (Santos, 1998, p. 25). Este caráter impregnante na ciência, revela sua perversão no tocante as tomadas de decisões que convergem para o atendimento às populações negras indígenas e quilombolas na covid 19, conforme observamos alguns fatos cotidianos do fazer institucional científico nas universidades brasileiras.
"Em nome do cientificismo, comportamentos pragmáticos e raciocínios técnicos, que atropelam os esforços de entendimento abrangente da realidade são impostos e premiados, em uma universidade de resultados" (Santos, 1998, p. 26). Nega-se a história de populações negras, indígenas e quilombolas, as quais são ainda tratadas como apêndice do conhecimento científico, figurando ora como sujeitos a serem investigados, ora como agentes políticos aos quais a "ciência" precisa atender e subalternizados à lógica de uma empiria de laboratório que escamoteia as ações e protagonismos científicos e de conhecimentos que estes povos, ao longo de suas vivências no cotidiano de seu território secularmente vulnerabilizado e por vezes dele destituído, aprendeu a criar meios tecnológicos de realizar o enfrentamento do mundo.
Muitos protagonistas negros, indígenas e quilombolas estiveram lutando antes da constituição de 1988 por direitos, por cidadania, por respeitabilidade ao seu território e a propriedade legítima dele. Também nas ciências estas populações a partir deste século tem realizado no interior da academia científica estudos que favorecem diretamente suas populações, alargando as possibilidades técnico científicas a partir de epistemologias negras, quilombolas e indígenas. Novos paradigmas no processo de construção da ciência, são emblematizados por protagonistas negros, indígenas e quilombolas, que alteram as relações no interior dos centros e institutos de pesquisa brasileiros.
É o caso de universidades e centros de ensino em saúde na região do nordeste brasileiro a partir da interiorização das universidades públicas federais. O acesso e permanência destes protagonistas a partir de políticas de ações afirmativas contribuem largamente para o processo de desenvolvimento científico a partir de novos paradigmas, realizados por negros, indígenas e quilombolas que assume postura de militância intelectual, rompendo com modelos eurocêntricos de "neutralidade científica", engajando-se em uma ciência que promova o acesso as técnicas de cuidados em saúde para estas populações.
Neste artigo observamos como a lógica científica que nega a existência de corpos negros e indígenas no interior da universidade brasileira, se alia a uma historicidade do passado colonial e escravista do Brasil, reiterando e produzindo negativas a esta população, no covid 19 tem demonstrado arranjos tecnológicos expressivos no combate à doença e protagonizado escritos científicos que difundidos com velocidade em redes comunitárias de apoio direto ao acolhimento destes povos e seus martírios, genocídios - no caso de negros e quilombolas - e extermínio - no caso dos indígenas, são impedidos, justamente por isso, pela velocidade da difusão da informação por meios técnicos comunicacionais de caráter não científico, são impedidos de serem reconhecidos como conhecimentos sofisticadamente científicos em livros, revistas e periódicos notadamente do campo da saúde em universidades do nordeste brasileiro.
Fatos como estes aconteceram em uma universidade do interior do estado da Bahia. Por ocasião da edição de um e-book sobre saúde e a covid 191.
Em que pese a viabilidade da ação emergencial diante da pandemia, publicações científicas, periódicos, enfim, dois textos de cientistas do campo da saúde, reconhecidos nos ambientes em que atuam - e para além dos espaços específicos em que atuam - como protagonistas da ciência, foram rejeitados pela comissão cientifica do e-book Covid 19 em um centro de ciências da saúde no nordeste brasileiro.
Entre tantos textos que poderiam ser avaliados como não viáveis para publicação, salientou-se nos pareceres que eram textos relevantes, considerando sobretudo o cenário atual vivenciado, entretanto, para sua publicação eram rejeitados pois haviam sido publicados. A rejeição ocorreu pela simples constatação da publicação em outro veículo, não atentando-se para o fato de que foram textos publicados posteriormente ao envio ao e-book, o qual não mencionava a necessidade de recepção de textos inéditos em seu edital chamada para publicação.
Os textos haviam sido publicados em sites de apoio a comunidade negra e quilombola, associação de anemia falciforme e explicava para estas populações formas práticas de como organizar a vida do portador de anemia falciforme e sua família aos cnegras, mulheres negras, no combate à doença se tornara mais adiante no Programa Nacional de Triagem Neouidados frente a covid 19. Como evitar agravantes e promover o cuidado em saúde destas pessoas. Um site específico para portadores de anemia falciforme escrito por uma militante intelectual engajada, que promoveu, inclusive a aprovação de legislação em saúde que torna obrigatório no ano de 1997 no município de São Paulo, que o teste do pezinho investigue também logo ao nascer o portador da anemia falciforme ou do traço falciforme para fins de tratamento precoce, entre outras doenças e agravos que podem ser imediatamente tratados para melhores condições de vida e saúde2. Esta legislação e movimento social que emblematizou a luta de lideranças negras, mulheres negras, no combate à doença se tornara mais adiante no Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN) instituído pela Portaria nº 822, de 6 de junho de 2001, do Ministério da Saúde3. Um dos protocolos mais importantes de prevenção, atenção e promoção à saúde no Estado Brasileiro.
A crítica social se inscreve aos modos de pensar e organizar a ciência e a sua difusão científica como um privilégio de poucos, e nos redutos inacessíveis as classes populares, que desenvolvem conhecimentos e saberes que a "ciência" reconhece apenas a partir de sua morosidade instrumental frente a interpretação social e histórica da realidade.
A aceleração contemporânea impôs novos ritmos ao deslocamento dos corpos e ao transporte das ideias, mas também acrescentou novos itens à história... A aceleração contemporânea é, por isso mesmo, um resultado também da banalização da invenção, do perecimento prematuro dos engenhos e de sua sucessão alucinante. São na verdade, acelerações superpostas, concomitantes, as que hoje assistimos. Daí a sensação de um presente que foge. (Santos, 1998, p. 30)
Sim, o presente nos foge, no caso da covid 19, quando a interpretação histórica da ciência erra na consideração dos passos que as comunidades negras e indígenas tem avançado na produção e difusão de seus conhecimentos arduamente organizados e transmitidos para os seus: aqueles que deveras sofrem com a banalização da ciência, burguesa, mercantil, colonizada, que serve a propósitos específicos. Engajada no modismo da soberba do poder analítico frente as misérias que assolam o mundo e na precariedade com que servem aos preteridos desde sempre: sim, a ciência é dispare, exclusivista, vaidosa e comprometida em geral com os 'mais' iguais; ou seja, aqueles que lhes financiam. E, nesta lógica mercadológica e capitalista, reduto de classes, porque haveria de ser diferente? Afinal, há muito, ela foi assim. Para não dizer que sempre foi.
Neste protagonismo distinto dos fazeres de uma ciência protocolar das academias ditas científicas, encontram-se pari passo, o protagonismo negro-indígena e quilombola. Adentrando um pouco mais nas dimensões específicas do fato "corriqueiro" das decisões de comissões científicas e publicações científicas sobre covid 19, notamos a presença negra feminina da doutora em Saúde e Desenvolvimento na Região Centro-Oeste (UFMS) Berenice Kikuchi. Em sua trajetória ela protagonizou ações que resultaram na organização social das pessoas com anemia falciforme e a primeira legislação a incluir a anemia falciforme no Sistema Único de Saúde. A Lei n. 12.352/97 da cidade de São Paulo tornou-se referência para a formulação de políticas públicas em vários municípios e estados da federação. Contribuindo para a implementação pelo Ministério da Saúde do Programa Nacional de Triagem Neonatal por meio da portaria GM n. 822/2001 com inclusão do diagnóstico presuntivo da anemia falciforme. Conhecido popularmente como "teste do pezinho" possibilita que recém-nascidos, na primeira semana de vida sejam diagnosticados com acesso garantido a serviços especializados e ao suporte as famílias oferecidas pelas associações de anemia falciforme. E este avanço técnico científico deve-se a lideranças sociais e movimento de mulheres negras pela saúde, como foi e é o caso da Dra. Berenice. Ela é a responsável direta da aprovação desta legislação de vanguarda no estado brasileiro, que revoluciona também o Brasil no contexto do mundo. Berenice Kikuchi com sua ação veloz, como no protagonismo e diligência com que escreveu o texto para o e-book e o difundiu em suas redes de populações negras com anemia falciforme, se coloca a frente das necessidades de nossos tempos na emergência da covid 19, favorecendo a abertura de acesso a desenvolvimentos impares no campo da saúde humana, para populações preteridas socialmente.
O mesmo fato aconteceu com texto também recusado, "corriqueiramente" com artigo que versava sobre a etnia indígena Xukuru-Kariri e suas práticas de cuidados em saúde e saúde mental no enfrentamento da covid 19. O texto, de autoria de uma liderança indígena juntamente com um cientista do campo psicológico (professor doutor) de uma universidade do nordeste brasileiro, foi preterido, como informamos inicialmente. O pretexto de recusa versava também sobre a não originalidade do trabalho.
De fato, o trabalho havia sido publicado não na íntegra, mais como um desdobramento da pesquisa enviada ao e-book Covid 19, de um centro de ciências da saúde no nordeste brasileiro. Ele foi publicado no jornal da agência francesa Le monde Diplomatique e a finalidade, para os autores - liderança indígena vinculada a APOIME (Articulação dos Povos e Organização Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo) e professor de universidade pública nordestina, favorecem a abertura de acesso a desenvolvimentos ímpares no campo da saúde humana, para populações secularmente preteridas socialmente.
No protagonismo negro e indígena, a produção de conhecimentos para a cura destas populações é trilhada no caminho de uma ciência de qualidade, que é veloz e está instada no diálogo com as bases populacionais, com os movimentos sociais e se engaja organicamente no combate de desigualdades através da ciência e sua rápida difusão para salvaguarda de extrema vulnerabilidade em que estas populações se encontram tragicamente.
O entendimento largo do mundo, conforme o que aprendemos de Santos (1994), nos faz compreender que as vozes das lideranças indígenas e negras não poderiam deixar de serem incluídos ao e-book técnico científico de um centro de ciências da saúde do nordeste brasileiro. Além da chamada edital ao e-book Covid 19 não exigir textos plenamente originais ambos os textos são valiosíssimos para a dimensão técnica científica e para as lutas dos movimentos e lideranças sociais étnicas no cenário brasileiro e do mundo: indígenas e negros. Seriam sem dúvida, originais para o público científico e de pesquisadores e comunidades negras e indígenas do Brasil e de contextos leitores da língua portuguesa.
A ciência e o profundo entendimento do mundo, necessita ser capaz de realizar a precisa interpretação da história. A fim de que seja capaz de solidarizar-se com os sofrimentos e a busca de soluções para as populações humanas e historicamente desprezadas no contexto do Brasil e do mundo.
É preciso que a ciência seja capaz de perceber a história, libertar-se de paradoxos que preterem os fatos que evidenciam as sociedades mundiais e orientar seu espírito na observação do tempo e do espaço partir de conceitos que possibilitam conexão com nossa época e os fatos históricos conceituais que lhe são prioritariamente pertinentes, como se demonstra hoje, conforme dados sobre a prevalência das mortes de negros, indígenas e quilombolas e adoecimentos pela covid 19 no Brasil.
Esse tempo de paradoxos altera a percepção da História e desorienta os espíritos, abrindo terreno para o reino da metáfora de que hoje se valem os discursos recentes sobre o tempo e o espaço. Falta, certamente, agora, aceitar o desafio conceitual. A aceleração contemporânea tem de ser vista como um momento coerente da História. Para entende-la, é necessário e urgente reconstruir, no espirito, os elementos que formam a nossa época e a distinguem de outras. (Santos, 1998, p. 31)
O protagonismo veloz de lideranças negras e indígenas no diálogo com a academia e no interior dela produzem movimentos conceituais que cumprem com a ética política de seus tempos. A percepção da historicidade da covid 19 e seus agravos observam a temporalidade e espacialidade do território humano vital destes povos. Portanto, a difusão de técnicas de combate em veículos não científicos é de profunda capacidade conectiva e interseccional com estes tempos, com nossa época. Fixando-nos na coerência do espírito engajado no amadurecimento de uma ciência que atende as necessidades e emergências deste tempo e das populações martirizadas neste enquadre temporal.
A ciência conta sua história (na psicologia)
A ciência no Brasil possui vinculação histórico social com bases europeias. Assim como a educação colonial e pós colonial referendava-se a partir de princípios eurocêntricos, o fazer científico também estava assentado neste mesmo paradigma geográfico, cultural e tecnológico.
No referente a psicologia, o que se passou no território brasileiro foi justamente o interesse pelos jesuítas de exercerem domínio sobre a população aqui presente: os indígenas. Este interesse visava conhecer, compreender e desenvolver uma psicologia que fosse útil para os interesses da colônia portuguesa e as doutrinas religiosas católicas.
As primeiras notícias sobre psicologia preocupavam-se com técnicas de persuasão de "selvagens", adaptação ao ambiente, diferenças raciais, aculturação, controle político e aplicação do conhecimento psicológico à prática médica (Antunes, 2015 p. 18).
Os jesuítas, Companhia de Jesus, foram de expressiva influência na fundação da psicologia no Brasil e promoveram forte relação entre a psicologia incipiente no Brasil e a metrópole portuguesa.
A articulação entre o pensamento psicológico produzido no Brasil e os interesses metropolitanos destaca-se em muitos dos conteúdos das obras estudadas ... a preocupação com os índios, sobretudo no que diz respeito ao trabalho e à aculturação. ... o controle ou "cura" das emoções que, ... sugere a busca de soluções para problemas enfrentados pela colônia. (Antunes, 2015, p. 21)
Observa-se que as necessidades da empresa colonial necessitava difundir uma educação que promovesse a ordem moral. Os indígenas deveriam servir aos interesses de um domínio do território brasileiro. O papel da educação difundida pelos jesuítas e a catequização católica serviram de apoio forte e efetivo para a tentativa de extermínio e genocídio premeditado dos povos indígenas. Sendo estes os proprietários do território brasileiro, e possuindo suas próprias concepções de mundo e sociedade, era preciso organizar um sistema de intervenção política e social que atingisse principalmente as dimensões subjetivas da população aqui existente. O vínculo com a territorialidade tanto para os povos de origem africana como para os povos indígenas remete a condição sagrada de pertencimento a condição de pertencimento ao planeta Terra, a "Mãe Terra". A terra é divindade, provedora da vida e de todas coisa vivas e não vivas no planeta.
A relação capitalista e monetária da terra enquanto mercadoria - propriedade - é representativa das culturas não negras, não indígenas. A terra enquanto posse para fins capitais e econômicos serve apenas como mercadoria. E esta condição de organização social é segregacionista, fragmentária da relação do ser humano com a natureza, meio ambiente. É reducionista e é típica, emblemática por excelência, da cultura branca e europeia que funda o mundo ocidental, greco romano. Visão de mundo que pretere o valor comunitário e prioriza oa individualismo e o poder centralizador no qual o humano é destituído da esfera ambiental - natureza, meio ambiente - para ocupar exclusivamente o lugar de gerenciador dos interesses dos objetos - mundo natureza - que compõem o planeta.
Em contrapartida, para indígenas e negros, a terra é corpo extensivo de suas existências. Não há vida sem a relação íntima de pertencimento à terra - ao planeta Terra, à 'Mãe Terra'. É pela Mãe Terra que todos se inclinam para reverenciar a vida. Para o plantio, para a colheita, para a pesca, a caça, o desenvolvimento de instrumentos para a vida - as folhas, os remédios, os banhos, e as energias de integração entre ser humano e natureza em uma integração e conexão unívoca.
Esta ciência e tecnologia inscrita nas civilizações negras e indígenas a partir de uma cosmovisão de mundo presente na vida dos povos da diáspora africana, populações quilombolas, povos de terreiros, povos das florestas, comunidades indígenas e ribeirinhas, fazem parte da vida cotidiana de muitos brasileiros, especialmente no norte e nordeste deste país. Esta ciência sobre a vida e a relação íntima de pertencimento à terra é cultura e etnicidade que não escapam as condições de existência das pessoas originárias de todo território Brasil, assim como de toda as Américas. Estas ciências e protagonismos estão inscritos em nossos corpos, na nossa língua, nos nossos hábitos de vida. Também apresentam-se no protagonismo científico a partir de suas criações epistêmicas originárias, e na contemporaneidade fazem eco e interconectam com estudos apenas agora incipientes na academia científica clássica no estado nacional e internacional.
Na historicidade das América e do Brasil, os indígenas foram os primeiros a serem violados e suas epistemologias e conhecimentos foram negados. Os corpos físicos e corpus psíquicos - epistêmicos - foram massacrados, violentados e escravizados pela hegemonia do colonizador branco europeu.
Na mesma direção foi o projeto colonialista em relação aos africanos vindos sob extrema brutalidade, selvageria e opressão por parte do branco europeu para o território brasileiro. A escravização negra foi perícia calculada, que na catequização dos indígenas, através do apoio jesuíta, favoreceu o desenvol vimento de violências físicas e psíquicas a partir das formulações científicas inaugurais da psicologia. O projeto escravista africano com dificuldade prosperou porque o africano, mesmo resistente a violência escravista, desconhecia a territorialidade geográfica brasileira em todos os sentidos.
Neste aspecto, a fertilidade do projeto escravista, para produção das riquezas capitalistas da metrópole portuguesa foram exitosos. Isto se deu porque o domínio da terra, como mercadoria, propriedade - posse - sempre foi o objetivo primordial do branco europeu com o uso irrestrito da força para o massacre, genocídio e ocupação do território ameríndio ao qual o africano seria violentamente forçado, pela mão do branco agressor, a adaptar-se.
Em termos técnico científicos, a academia das ciências médicas vai inaugurar o debate no Brasil sobre a etnicidade do negro brasileiro.
A partir de 1900, com o médico Raimundo Nina Rodrigues, iniciam-se os estudos sobre o negro no Brasil. Posteriormente teremos Arthur Ramos, Franz Boas e Gilberto Freyre que marcam o contexto dos estudos sobre o negro a partir de perspectiva racializada pautada na inferioridade do negro africano e do escravizado no Brasil como uma "raça" sub-humana, transmutando-se - os estudos - a partir de uma consideração cultural que procurava valorizar as circunstâncias da diferença do africano e do branco brasileiro. Com Gilberto Freyre e o apogeu dos movimentos modernistas no Brasil, decorrentes da 'Semana de 22', a ideia de valorização do caboclo, do indígena e do mestiço favorecem a receptividade de um entendimento harmonioso entre os diferentes povos que constituem a estrutura social brasileira (Consorte,1991, Oliveira, 2018).
São os escritos de Freyre, sobretudo no livro Casa Grande e Senzala, que o 'mito da democracia racial' será difundido em todo contexto do território brasileiro e será a vitrine importante de consideração das formas de sociabilidades entre negros, indígenas e brancos, mas principalmente entre negros e brancos.
Somente em 1950, com o projeto Unesco, a partir do interesse em investigar os conflitos existentes em sociedades formalmente segregadas como os Estados Unidos e a África do Sul e buscar soluções de paz para a sociedade mundial que esta vitrine brasileira - 'o mito da democracia racial' - será investigado por pesquisadores financiados por esta agência. Pesquisadores importantes nas ciências sociais surgirão neste período, contestando as ideias de Freyre. Escolas sociológicas do sudeste - Escola de São Paulo - e do nordeste - Escola da Bahia, serão as correntes de estudos mais destacadas nos resultados do projeto. A conclusão de modo geral é que enquanto paulistas consideram que as diferenças raciais e sociais (renda, classe, economia) entre negros e brancos são existentes e afirmam a presença do racismo nas relações sociais, a escola baiana de sociologia - os pesquisadores financiados pela Unesco - concluem que as diferenças existem, porém elas se dão no nível da divisão de classes, ou seja, os problemas da desigualdade entre negros e brancos no Brasil é decorrente de fatores econômicos, e não propriamente do racismo. Entre paulistas e baianos a concordância é de que a democracia racial no Brasil é um mito (Guimarães, 2005, Oliveira, 2018).
Estamos considerando, que para a ciência psicológica compreender os estudos sobre o negro no Brasil em termos sociológicos é fundamental. Antunes (2015), nos apresenta as relações sociais que emergem da origem da psicologia no contexto brasileiro. No mesmo sentido ela esboça as formas como a ciência psicológica, a partir dos estudos da Liga de Higiene Mental e instituições correlatas estabeleceram uma interpretação racista da sociedade brasileira favorecendo a defesa do embranquecimento da raça brasileira na busca da pureza racial (Antunes, 2015, p. 50)
Embora Juliano Moreira, médico negro e baiano, conteste as ideias de inferioridade intelectual do negro enquanto "raça degenerada" de Nina Rodrigues, e será expressão importante no processo de desenvolvimento de uma saúde mental que acolha a pessoa em sofrimento mental a partir, inclusive de políticas públicas de assistência à saúde mental no Brasil4 (Oda & Dalgalarrondo, 2000, p.179) e portanto da psicologia e psiquiatria - esta principalmente - o projeto de uma ciência da saúde mental e da psicologia que conteste a lógica excludente nunca se efetivou.
Para a psicologia, interessante destacar a presença dos estudos pioneiros de Virginia Leone Bicudo, que escreveu o primeiro estudo sobre relações raciais no Brasil Atitudes raciais de pretos e mulatos em São Paulo (1945/2010). Virgínia foi uma mulher negra, psicanalista bem sucedida e engajada na sociedade paulista. A única mulher, e ainda mulher negra, dentro das discussões do projeto Unesco. Seus textos, sua pesquisa, foi retirada da segunda edição publicada pela Unesco, e a partir disto, os nomes dos homens, e todos brancos, mantiveram-se intocados pela legitimidade dos tempos da ciência sociológica e psicológica brasileira (Gomes, 2013). Considerando que Virginia Leone, era também, além de socióloga, uma eminente psicanalista brasileira na sociedade paulista, sendo a primeira pessoa a possuir trânsito e reconhecimento internacional no âmbito da psicanálise no Brasil. Ela foi a primeira a realizar análise didática nos moldes da Associação Internacional de Psicanálise fundada por Freud em Nuremberg. Viajou pela Europa, realizou estudos em Londres, após ser violentamente atacada por seus colegas - médicos psicanalistas - como charlatã. Seu retorno ao Brasil, no entanto, a despeito das intrigas que viveu, foi triunfal.
Este aspecto destacamos como alguns aspectos de políticas comunitárias de populações negro indígenas e o apagamento e invisibilidade de protagonistas da ciência que em corpos negros e indígenas, na psicologia e nas ciências de modo geral, são descartados como dignos de representarem, em pensamento, o projeto científico brasileiro; que parte necessariamente de uma identidade política hegemonicamente colonialista e escravista.
Se jesuítas e nobres da coroa portuguesa manipulam as condições de vida e pensamento de indígenas brasileiros e posteriormente, o projeto genocida se reproduz com o contingente negro violentamente escravizado pelos brancos europeus, o mesmo projeto parece se inscrever nos modos e formulações da ciência como um todo nos dias atuais. Pois a lógica de produção tecno-cientifica desconsidera as políticas comunitárias, as epistemologias produzidas nos espaços de espontaneidade da vida em sociedade e em emergente sintonia com as necessidades das pessoas.
A ciência, branca como se pretendia5 - e em certo sentido ainda se pretende, procura engajar-se com mãos e corpos semelhantes aos seus: sem proximidade efusiva das comunidades, ainda que referencie que seu projeto é em prol do desenvolvimento das sociedades humanas.
Assim entendemos que ocorreu com Virgínia Leone Bicudo, mulher negra, psicanalista e cientista brasileira. Assim como com Juliano Moreira, negro, nordestino da Bahia, médico, pai da psiquiatria brasileira. Porém, esta lógica instrumental da ciência, perpassa as condições mesmas do fazer ciência no Brasil e nas sociedades mundiais. No apagamento dos saberes e conhecimentos de povos indígenas e negros.
O processo de construção científica, na presença da covid-19 é emblemático nestas inscrições. Pois os movimentos sociais de participação comunitária tem sido efervescentes. No entanto, a ciência formal, ainda parece abstrair a potencialidade destes enredos
Se por um lado temos na ciência um caráter conservador que nega a articulação social e participação engajada dos sujeitos sociais no fazer científico, a exemplo do que se passou com Virgínia no seu modo engajado de produzir ciência e psicanálise - sociologia e psicologia; há redutos que promovem a valorização deste engajamento, e buscam fortalecer a lógica de uma ciência fundada na relação intima entre indivíduo e sociedade, política e ciência psicológica.
Desconsiderando o percurso minucioso da ciência psicológica daremos um salto nos desenvolvimentos epistêmicos para observar processos de desenvolvimento técnico cientifico que favorecem o engajamento social.
A partir deste salto epistemológico no processo de produção da ciência psicológica e as questões afetas a população negra e indígena, vale destacar a presença de intelectuais militantes como Silvia Lane, Salvador Sandoval e Leôncio Camino.
Cada um a seu modo e de lugares teóricos diferentes atuaram de modo a consolidar diferentes formas de pensar e fazer Psicologia Política, formando, de certa maneira, distintas "escolas" de pensamento e prática psicopolítica. (Silva, 2012, p. 417)
Em termos gerais a militância intelectual não foi, nos avanços da ciência psicológica, um problema a ser abstraído. Ao contrário. A partir de Silvia Lane, Escola de São Paulo, a militância e a produção intelectual para uma ciência engajada com os processos de tomada de consciência e transformação da realidade social se inscreveu de modo solidário e engajado.
A partir da produção intelectual militante de Silvia Lane se construiu no Brasil uma Psicologia comprometida social e politicamente, inclusive tendo efeitos sob determinadas correntes clínicas de corte marxista. Ela foi uma presença marcante nas Psicologias Social e comunitária brasileiras. Tendo produzido importantes trabalhos que versavam o tema dos processos de conscientização política, ela também influenciou a psicologia política a partir de uma leitura psicossocial da realidade ... A insistência de Silvia em construir uma práxis que realmente se preocupava com um 'fazer psi' que rompia com a ideia de neutralidade e que assumia a centralidade do exercício cidadão expresso no compromisso social. (Silva, 2012, p. 418)
Nas circunstâncias que vivemos hoje, esse engajamento social e político - ir de mãos dadas com a ciência e com o povo, necessita ser retomado. Muitas são as frustrações que temos observado e vivido com as demandas humanas e fragilidades gerais diante da tragédia que a covid 19 promove nas comuni dades negras, indígenas e quilombolas.
Políticas comunitárias negro indígenas
Na atual conjuntura da covid 19 observamos que os índices de mortes em populações quilombolas é de mais de 60%.
Um estudo da Universidade Federal do Amazonas - UFAM, revela que os estados do Amazonas, Para e Amapá, Rondônia e Maranhão respondem hoje por 63% das mortes causadas pela covid 19 entre populações mocambeiras e quilombolas de todo Brasil. (Diário do Centro do Mundo - DCM, 14 junho de 2020)
No mesmo sentido, comunidades negras em favelas paulistas e do Rio de Janeiro tem enfrentado com grande iniciativa positiva o combate ao Sars-Cov-2. Em Paraisópolis, tem-se destacado a ação comunitária de redes de apoio aos moradores da favela. Vaquinhas online, redes de abastecimento e cestas básicas, controle da doença em familiares a partir de monitoramento constante fazem com que o território da periferia nesta favela tenha uma política de Estado eficiente no controle da propagação do vírus.
As políticas comunitárias tem demonstrando grande poder de organização social, apresentando a capacidade da população negra e periférica de empreender conhecimentos importantes em saúde e educação em saúde para manter-se vivo diante do contexto emergencial e letal da pandemia.
o caso de Paraisópolis torna clara a eficácia de um modelo que combina "iniciativas de atenção básica à saúde, ações voltadas para garantir a segurança alimentar e outras despesas essenciais, com ampla testagem e busca ativa de novos casos e controle dos familiares" e que "poderia ser replicado, como uma política de Estado, em outros territórios vulneráveis" para conter o coronavírus. O líder comunitário de Paraisópolis critica a omissão do Estado com relação às periferias. Segundo ele, mesmo o auxílio emergencial criado pelo governo federal é falho - muitas pessoas da comunidade ainda estariam com o pedido em análise, sem receber nenhuma parcela. "Infelizmente o Estado, quem está no poder, não falou nada sobre políticas públicas para as favelas. Só citavam o comércio, os empresários. Vimos que estávamos à mercê e resolvemos fazer com nossas próprias mãos. ... o governador nem sequer deixou a gente chegar perto da porta, ele não quis nos receber. É um descaso", disse Amorim, liderança comunitária da favela Paraisópolis. (Jornal Nexo, 01/07/2020)
Observa-se que políticas comunitárias são fundamentais para o controle e o combate da covid 19, pois trata-se de infecção letal em territórios de precárias condições sanitárias como são as favelas brasileiras. As lideranças negras e indígenas urgem de ações e direcionamentos que possam favorecer suas estratégias de vida e sobrevivência, pois habitam em territórios de vulnerabilidade, territórios culturalmente distintos dos centros urbanos das metrópoles globais. Com habitações salubres e condições de saneamento básico, água potável e alimentação.
Esta lógica de organização central dos territórios - periferia e centro - é distintivo da segregação racial presente nos espaços das cidades brasileiras, principalmente da capital paulista - como é o caso onde se encontra a favela de Paraisópolis e a maioria das capitais das cidades brasileiras. A segregação racial é a ordem da constituição da organização urbanística das cidades brasileiras em suas capitais. Fica evidenciado que nos locais de maior concentração de renda, equipamentos públicos básicos de saúde, educação, lazer, trabalho, saneamento e linhas de transportes, estão localizados nos perímetros urbanos mais próximos do centro das capitais brasileiras e também no contexto de cidades metrópoles internacionais (Oliveira, 2016).
Neste sentido, as políticas comunitárias organizadas pelas populações negras e indígenas são importantes aportes de considerações científicas. Importante notar que elas fundam-se em sua lógica organizacional, em patamares e paradigmas técno- científicos a fim de produzir conhecimentos que os emancipem de "seu lugar" de desvantagem social. Na interpretação do tempo e da história as populações negra e indígenas combatem e resistem a lógica da barbárie, do desprezo e do descaso, a partir de instrumentos que disseminam saber em prol de sua comunidade, em prol de seus filhos. De modo articulado, veloz e prioritário.
Ações de autocuidado, práticas rituais, usos de chás, banhos com ervas com plantas locais, cuidados com a terra, plantação, agricultura e roçado, bem como atenção especial com mulheres grávidas, bebês, crianças e idosos a partir de medidas profiláticas através de cartilhas explicativas de acesso fácil são medidas simples e importantes de políticas comunitárias que favorecem ações positivas de resistência e combate a covid 19.
Estas foram ações de políticas comunitárias difundidas por lideranças indígenas da etnia das etnias Xukuro-Kariri e Kariri-Xoco de Alagoas, bem como da Associação de Anemia Falciforme do Estado de São Paulo.
A difusão veloz destas informações em meios jornalísticos e informativos não científicos favoreceram de imediato a organização da saúde de populações negras e indígenas no contexto local e regional o contexto da covid 19.
A articulação destas populações negras e indígenas ganhou notoriedade científica, pois adentram aos espaços de produção formal da academia brasileira a partir de profissionais do campo social e da saúde para a resistência e enfrentamentos necessários para sua sobrevivência. E é importante observar que para estas populações não há incoerência entre as emergências da vida e da historicidade atual de nosso tempo, e o processo técnico científico e suas formas de difusão. No entanto, a interpretação do mundo, conforme a lógica emergente da vida, principalmente em contextos de guerras e pandemias, como é o caso em que estas populações vivem constantemente ao longo de vários séculos, não é semelhante a lógica tecno- científica que temos observado em contextos locais do nordeste brasileiro.
A lógica instrumental da ciência: uma identidade politica
A razão possui uma lógica que pode ser instrumental ou interesseira. Além de poder ser argumentativa. Habermas, vai nos posicionar na condição de pensar a ciência enquanto instrumento promotor da lógica argumentativa, que é o diálogo. O diálogo é emancipador e pode promover argumentos capazes de alterar concepções previamente definidas quando o exercício da linguagem e da palavra são inexistentes (Oliveira, 2018)
A razão interesseira, ou razão instrumental, pode estar a serviço do status quo, favorecendo as artimanhas do capitalismo, produzindo uma ciência ou tecnociência interessada no exercício do poder e da dominação, ceifando os redutos de espontaneidade da vida, da emancipação e autonomia de pensamento dos sujeitos humanos.
Neste sentido ocorre a colonização do mundo da vida, que é, nas ideias de J. Habermas (2014), a impossibilidade do devir humano, do protagonismo do sujeito na interpretação da história, de transformar sua vida e do entorno, sendo incapaz de favorecer sua liberdade de pensamento e escolhas conforme as possibilidades históricas que lhe acenam. É o encarceramento da vida e suas possibilidades de devir e utopias (Oliveira, 2021)6.
Neste sentido, podemos pensar que a condição da ciência é em tese, favorecer a descolonização do mundo da vida, promovendo ações emancipatórias, contribuindo com a luta pela igualdade favor da vida e da liberdade humana. Assim como os protagonistas negros e indígenas resistem no Brasil há mais de 500 anos, e esta resistência, a exemplo de Tanawy, Tenório e Berenice Kikuchi, tem evoluído para além de seus territórios comuns, adentrando os espaços acadêmicos formais com pesquisas cientificas que retratam suas necessidades e conhecimentos.
No entanto, ela em geral pode estar corrompida - a ciência - na medida em que privilegia as ideias de grupos centrais de poder, a partir dos interesses políticos de hegemonias específicas que desprezam as necessidades de uma coletividade e favorece grupos em geral privilegiados que fortalecem o acúmulo do capital e não distributivo com a exploração física e o genocídio e extermínio de populações negras e indígenas na historicidade do mundo moderno e contemporâneo.
Em termos gerais o que temos observado nas políticas sociais globais no que tange a pandemia da covid 19 a identidade política da ciência parece ser e estar atrelada a uma lógica instrumental.
Após o lema "fique em casa" nas sociedades globais, tem-se o lema "se puder, fique em casa", com a crescente promoção dos meios de retorno a uma economia de mercado e consumo em dissonância com a letalidade da covid -19.
O protagonismo científico não tem sido capaz de produzir um chamado eficaz para a contenção da preocupação econômica, talvez porque no fundo, a ciência, de certo modo, também sempre agiu conivente com os interesses daqueles que possuem o mercado de capitais financeiros, conforme em algum sentido podemos afirmar, ao menos no caso da psicologia em seus primórdios no Brasil.
O que a psicologia tem a ver com isso?
A ciência, enquanto identidade pode ser processo de transformação. Na ciência, se a entendermos enquanto processo em construção, podemos considerar que um longo caminho a percorrer existe, para que saia da lógica instrumental de sua identidade modelo fomentada pelo capitalismo mercantil - no processo de colonização portuguesa e escravismo no Brasil e no mundo. É possível sua transmutação, sua metamorfose, capaz de alterar a ordem da vida, descolonizando-a, a fim de gerar fontes produtoras de esperança, redutos de espontaneidade argumentativa, dialógica, capaz de aceder a emancipação dos sujeitos humanos e o processo científico de interpretação da história e de seu tempo.
Isto depende do compromisso ético político dos fazeres científicos. Suas vinculações e motivações epistemológicas, seus interesses e compromissos com a população brasileira. As metodologias e conhecimentos que embasam as relações com a historicidade, a contemporaneidade e a territorialidade local, regional, nacional e internacional.
Sob tal aspecto discutir ciência hoje e a letalidade da pandemia covid 19 implica em compreender e desenvolver "metodologias de pesquisas em bases materialistas históricas, concebendo o homem como um ser produzido historicamente, e portanto essencialmente social" (Lane, 2001, p. 09).
No mundo hoje, mais do que nunca, por iminência da morte pela covid 19, é preciso desvelar a identidade política e psíquica (?) da psicologia; pois a questão da identidade é crucial para esta ciência e parece-nos para todas as ciências. Pois ela possibilita observar as ligações e relações dos indivíduos com seus grupos sociais, com seus interesses e as maneiras como se conduzem e direcionam suas ações e comportamentos sociais, individuais e institucionais.
No fazer e processo de produção científica isto é fundamental, e a lógica indivíduo e sociedade, indivíduo, grupo e interesses, são sempre nodais. Nestas circunstâncias, os processos que reproduzem a lógica da mesmice, da barbárie e do massacre aos povos indígenas e negros são coniventes com as amarras do poder colonizador do século XV e vigente na contemporaneidade do século XXI. Este ciclo precisa ser rompido. A coragem de tecer um modelo epistemológico científico que rompa com o tradicionalismo da lógica do poder é o grande e inerente desafio que compete a todos nós assolados pela letalidade do vírus Sars-cov-02.
É preciso coragem de quebrar o modelo tradicional, repleto de demonstrações de erudição ... priorizando o verdadeiro saber que vem da análise da realidade. Coragem de subordinar a teoria ao real, de fazê-lo emergir da ação de pesquisar, sem desconhecer o saber já elaborado ... como um belo exemplo do que vem a ser a práxis como ciência (Lane, 2001, p. 11)
É possível que consigamos na pandemia da covid 19 superar as dicotomias que nos encerram na dificuldade de valorizar a vida daqueles que são historicamente preteridos, mesmo quando atingem as condições formais de estarem próximos aos iguais patamares exigidos pela disciplina metodológica da ciência clássica e tradicional.
A interpretação da história, a coragem de submeter a teoria ao real, à análise da realidade, como disse Lane (2001) sobre o caráter político das pesquisas sobre identidade de Antônio da Costa Ciampa, são lições importantes para o processo ético da ciência psicológica e das ciências interdisciplinares no campo da saúde. Neste sentido, pensar, ser e agir nos requisitos da pandemia da covid 19, é retomar o caráter ético político dos modos de conceber ciência no Brasil e nos territórios esgarçados da América Latina, principalmente no referente ao campo psicológico.
Conclusão: a ancestralidade resiste a necropolítica
Silvia Lane é nossa ancestral na ciência psicológica brasileira e para a América Latina. Antônio da Costa Ciampa também, assim como Salvador Sandoval e Leôncio Camino.
Na historicidade negra indígena e quilombola, a ancestralidade é central na ordem da vida comunitária. É ela que emana a força da transformação e das mudanças, liga o passado ao futuro, a partir das tomadas de decisões no presente e a lucidez profunda para a assertividade diante dos conflitos e tensões que assolam os caminhos da humanidade.
Neste sentido romper com a necropolítica no universo da ciência, é também promover a visibilidade dos corpos negros, indígenas e quilombolas, que na covid 19 são os mais atingidos e vulnerabilizados diante da doença e da morte.
Romper com a necropolítica é o exercício pleno, constante e sem descanso - sem pausa e sem repouso - como nos disse Neusa Santos Souza (1982) - também nossa ancestral da psicologia e psiquiatria negra - que as populações negras, indígenas e quilombolas atravessam, sucumbem e permanecem pelo percurso de suas vidas inteiras e de seus descendentes, incluindo aqueles que ainda estão por vir. Porque virão, sim, como a despeito de toda crença na morte eterna, no extermínio definitivo, este desejo - branco e eurocêntrico, liberal capitalista e norte americano - não se realiza, nunca plenamente.
A plenitude se dá pela vitalidade da presença. Ainda que desgastada, negros, quilombolas e indígenas permanecem. Nas sociedades segregadas de norte a sul nos confins de todos os mundos. A marcha negra, indígena e quilombola emerge. Estamos bem levantados. E não poderia ser diferente. Sim estamos marchando, vivos e ativamente.
Assim como a ciência psicológica. Seus ancestrais ainda estão vivos, a sorrir, nos corredores de nossas universidades. Sim, a sorrir, como nos diz o poeta: "eu pretendo levar a vida" (Cartola), ou deixe a vida me levar (Cais & Meriti, 2018), cantada por Zeca Pagodinho, como os nossos ancestrais.
O grão que se cultiva na terra, ele morre, renasce e produz também a bela árvore, o fruto que é a vida. Isto é a celebração em toda parte (na África) as núpcias da semente e da vida. Em torno desta celebração, deste ritual sagrado da semente que nasce na terra e se torna árvore, e produz bons frutos deu-se a invenção da palavra, da linguagem, dos objetos e das técnicas, cerimonias e rituais, obras de arte, o surgimento das instituições sociais e políticas. O grão - a semente - produz a vida em um desenvolvimento frágil e hostil ao seio do qual a humanidade virá encontrar trabalho e repouso, e vai igualmente proteger a vida. ... Para os africanos a natureza é uma força em si, e nada pode se desenvolver em desacordo com ela. A transformação e a regeneração participam de um conjunto cosmológico cuja função era consolidar cada vez mais o campo das relações entre os humanos e os outros seres vivos com os quais dividimos o mundo (Mbembe, 2015, p. 259)
O sol nascerá, a vida permanece. A maturidade da ciência, e da ciência psicológica transformadora se desenha. Estamos agora, mais conscientes das marchas que nos transformaram enquanto ciência psicológica a favor da transformação da realidade. Como Silvia, Como Baró, como Dobles e como Monteiro.
Apesar de mais conscientes, as lutas da psicologia para uma práxis libertadora ainda precisam ser feitas neste século XXI diante das atrocidades cada vez mais alarmantes nos territórios do mundo. E os legados desta psicologia devem inscrever-se nos espaços acadêmicos que dialogam com os setores sociais, produzindo a crítica a produção do conhecimento de modo engajado e revolucionário como os pioneiros da psicologia política brasileira e da América Latina considerando as escritas epistêmicas e oralidades dos povos negros, da diáspora e indígenas das Américas, rompendo com a apatia conivente com os crimes cometidos contra as diferentes civilizações humanas, invisibilizadas, oprimidas, injustiçadas socialmente. Conforme Silva (2012, p. 418),
A insistência de Silvia em construir uma práxis que realmente se preocupava com um 'fazer psi' que rompia com a ideia de neutralidade e que assumia a centralidade do exercício cidadão expresso no compromisso social, foi a base de uma Psicologia Política comprometida com a realidade e que trilhava a perspectiva libertadora inaugurada por Ignácio Martín-Baró (1985, 1991). Daí nasce uma psicologia social politicamente engajada. Este fazer de Silvia encontrava ressonância em fazeres de outros psicólogos sociais, politólogos e sociólogos latinoamericanos. A escola de Silvia Lane faz coro não só com o pensamento de Ignácio Martín-Baró (El Salvador), mas também com as proposições de Ignácio Dobles (Costa Rica) e Maritza Montero (Venezuela).
Como povos indígenas e negros das Américas, também sabemos, como nossos ancestrais, que podemos lembrar do valor da semente cultivada na terra. Como a Doutora em Medicina, Saúde e Desenvolvimento Berenice Kikuchi, mulher e liderança negra pela saúde na doença falciforme e responsável pelo protagonismo feminino nas legislações que possibilitaram a implementação do exame do pezinho e triagem neonatal no território brasileiro e os indígenas das etnias Xukuru-Kariri e Kariri-Xoco de Alagoas, protagonizados pelos escritos de Tanawy de Souza Tenório e quilombolas do Brasil inteiro e do mundo, pois a razão de suas ciências são pautadas na ancestralidade que defende a natureza. Estes conhecimentos - ciência - foram relegados em publicações científicas porque, como indígenas e negros, priorizaram o sentido da vida e emergência imediata de seus semelhantes viventes. Pela emergência letal da covid 19 divulgaram seus escritos para suas comunidades serem salvaguardadas da tragédia em simultâneo a submissão à lógica da ciência exclusivista e segregacionista. Seus textos, preteridos, representam também a ciência, mesmo que tenham sido impedidos de figurar em e-book técnico científico que ensejou de imediato a organização de seus escritos. Fazendo coro ao clamor de uma irmã da diáspora, que de longe, em ajuda lhe pedia. Apesar da entrada na festa ter sido apartada, a diáspora negra e os povos indígenas continuam em seus princípios.
As formas de conceder os passaportes de legitimidade epistemológica precisam avançar no entendimento científico e a celebração da vida. Nos ensinamentos de uma ciência negra e indígenas a não alienação do sagrado nos emana na forma da semente e no devir que ela singulariza em sua morte para a transmutação da vida.
Compreender este mistério, que os povos indígenas e africanos muito bem experienciam, garante a manutenção da vida e do planeta. Este é o desafio das ciências para o século XXI: aprender com as tradições científicas negras e indígenas, na fidelidade ética e étnica que, sem hesitação, privilegiam a vida.
Desta vez, mais uma vez, não foi possível. Estamos indignados. O silêncio, que é também uma forma de desprezo, bloqueou novamente fronteiras. Mas é sempre possível e permitido, para indígenas e povos pretos, olhar pra traz, refazer o caminho...e ensinar e aprender ainda mais, com o cultivo eterno do grão na terra. Por isso marchamos todos os dias. E se morremos, sabemos que o grão, ainda que morto, germina: "tem que morrer pra germinar" (Gilberto Gil). Por isso somos humanos africanos, negros e indígenas. Cabe à ciência, toda ela, (ainda quase inteiramente branca em suas decisões e desacertos) ter a humildade para tentar aprender - com povos pretos e indígenas - sobre as necessidades do caráter epistemológico nestes tempos de morte e de guerras. Seja hoje, na covid 19, seja para além dela. Em caso de resistirem. Nós resistiremos, como os grãos...Pois nossos corpos, em túmulos, forram hoje, na pandemia da covid 19, todo o interior das terras. Isto não é e não será em vão.
Referências:
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Souza, Neusa Santos (1982). Tornar-se negro. Graal. [ Links ]
Recebido em: 30/09/2020
Aprovado em: 30/08/2021
1 Esta notícia nos é acessível através de contato com a rede que organizou parte da chamada dos pesquisadores no campo da saúde e da psicologia para que oferecessem artigo sobre a covid 19 e as implicações no campo da saúde e saúde mental.
2 Teste do pezinho é aprovado. Folha de São Paulo (Cotidiano, 19/09/1997).
3 Ministério da Saúde. (2016). Triagem neonatal biológica: manual técnico - Secretaria de Atenção à saúde. Brasília, DF.
4 Juliano Moreira foi um homem negro super engajado politicamente na transformação de seu tempo. Talvez por ser filho de uma negra, empregada doméstica, ele teve sensibilidade para protagonizar ações revolucionárias no contexto da psiquiatria brasileira, retirando grades dos hospitais psiquiátricos e abolindo o uso de camisas de força. Preocupou-se inclusive com a formação técnica de enfermeiros, que na época não era atividade específica para o cuidado com as pessoas adoentadas. Instalou a clínica médica nos hospitais, assim como os laboratórios clínicos, capazes de atender as demandas de adoecimento das populações com doenças diferentes das psiquiátricas. No entanto a estatura de seus escritos - traduzidos em diferentes países em que esteve presente - são pouco difundidos por estudiosos da saúde no Brasil.
5 Estamos nos referindo aos enquadres científicos no campo sociológico e histórico nos estudos sobre etnias e raças inaugurados no Brasil em 1900 por Raimundo Nina Rodrigues. Embora no contexto mundial no I Congresso Internacional das Raças, João Batista de Lacerda, médico representante do Brasil e diretor do Museu Nacional do Rio de Janeiro, viajou para Londres a fim de dizer que em breve nossa sociedade seria totalmente mestiça a partir de políticas de branqueamento que alteraria a constituição racial brasileira (Maio, Marcos C. (2006). Raça, ciência e sociedade, p. 09)
6 Oliveira, Regina Marques Souza (2021, no prelo). Psicanálise infantil e relações étnico raciais: saúde mental da população negra. Appris.