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Revista Psicologia Política

versão On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.22 no.54 São Paulo maio/ago. 2022

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Participação sociopolítica nos conselhos municipais de meio ambiente em Canela e São Francisco de Paula/RS

 

Sociopolitical involvement in city environmental councils of Canela and São Francisco de Paula/RS

 

Participación sociopolítica en los consejos ambientales municipales de Canela y São Francisco de Paula/RS

 

 

Vicente Alenir da SilvaI; Maristela da RosaII; Patrícia BinkowskiIII

IGraduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Especialista em Gestão Pública Municipal pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Servidor Público municipal da Prefeitura de São Francisco de Paula/RS. vicente.cursoeconomia@gmail.com
IITecnóloga em Gestão Ambiental e Especialista em Educação para a Sustentabilidade pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS). Fiscal Sanitária da Prefeitura Municipal de Canela/RS. marisdarosa@gmail.com
IIIEngenheira agrônoma pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Mestra e Doutora pelo Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS). Professora Adjunta na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS) e no Programa de Pós-graduação em Ambiente e Sustentabilidade (PPGAS). Líder do Grupo de Pesquisa Observatório de Política e Ambiente (ObservaCampos). patricia-binkowski@uergs.edu.br

 

 


RESUMO

Os Conselhos Municipais de Meio Ambiente (CMMA) foram instituídos com a finalidade de assessorar o poder executivo nas questões relativas ao meio ambiente e ser um fórum para as tomadas de decisões. Nesses conselhos, a participação política e a representatividade são importantes e a sua observância é essencial para que sejam discutidas efetivamente suas pautas. O objetivo deste artigo é analisar a participação sociopolítica nos CMMA dos municípios de Canela e São Francisco de Paula, Rio Grande do Sul. As análises foram realizadas com base em dados de pesquisa bibliográfica e documental, no período de 2013 a 2017. Concluiu-se que a participação sociopolítica, em ambas as instâncias deliberativas, ainda é precária, tendo como entraves a disparidade de representatividade e a não atuação efetiva dos conselheiros. Porém, entende-se como fundamental a constituição dos CMMA nos dois municípios, evidenciando as lutas ambientais e o caráter democrático e transformador destes espaços.

Palavras-chave: Representatividade; Política; Democracia; Legislação Ambiental; Questão ambiental.


ABSTRACT

The Municipal Environmental Councils (CMMA) were created with the aim of advising the executive branch on issues related to the environment and serving as a forum for decision-making. In these councils, political involvement and representation are important and their observance is essential so that their agendas are effectively discussed. The aim of this article is to analyze the sociopolitical involvement in the CMMA of the municipalities of Canela and São Francisco de Paula, Rio Grande do Sul. The analyzes were carried out based on data from bibliographic and documentary research, from 2013 to 2017. It was concluded that sociopolitical involvement, in both deliberative instances, is still precarious, having as obstacles the disparity of representativeness and non-action effectiveness of the advisers. However, it is understood as fundamental the constitution of the CMMA in the two municipalities, highlighting the environmental struggles and the democratic and transforming character of these spaces.

Keywords: Representativeness; Politics; Democracy; Environmental legislation; Environmental issue.


RESUMEN

Los Consejos Ambientales Municipales (CMMA) fueron creados con el objetivo de asesorar al Poder Ejecutivo en temas relacionados con el medio ambiente y servir como foro para la toma de decisiones. En estos consejos la participación y representación política es importante y su observancia es fundamental para que sus agendas sean efectivamente discutidas. El objetivo de este artículo es analizar la participación sociopolítica en el CMMA en los municipios de Canela y São Francisco de Paula, Rio Grande do Sul. Los análisis se realizaron con base en datos de investigaciones bibliográficas y documentales, de 2013 a 2017. Se concluyó que la participación sociopolítica, en ambas instancias deliberativas, es aún precaria, teniendo como obstáculos la disparidad de la representatividad y la efectividad de la no acción de los asesores. Sin embargo, se entiende como fundamental la constitución de los CMMA en los dos municipios, destacando las luchas ambientales y el carácter democrático y transformador de estos espacios.

Palabras clave: Representatividad; Política; Democracia; Legislación ambiental; Problema ambiental.


 

 

Introdução

É na esfera municipal que os problemas ambientais se tornam mais intensos, onde confrontos em relação a eles são mais radicais, portanto, são nesses locais onde os conflitos devem receber tratamento necessário através dos mecanismos disponíveis de política e de gestão ambiental (Castro et al., 1998). Dessa forma, cada município deve se preocupar em apresentar uma esfera representativa, onde possam ser discutidas propostas que harmonizem desenvolvimento e meio ambiente. Esses espaços são denominados de Conselhos.

Os Conselhos são fruto de lutas e pressão da sociedade civil e estão inscritos na Constituição de 1988 na qualidade de instrumentos de expressão, representação e participação da população. Com a Constituição Federal de 1988 criaram-se, do ponto de vista legal, as condições para a instituição dos Conselhos (Gohn, 2006, 2011). Os Conselhos Municipais de Meio Ambiente (CMMA), por exemplo, foram instituídos com a finalidade de assessorar o poder executivo municipal nas questões relativas ao meio ambiente e também de ser um fórum para se tomar decisões, tendo caráter deliberativo, consultivo e normativo (Ministério do Meio Ambiente, 2018).

O município de Canela, Rio Grande do Sul (RS) instituiu através da Lei Municipal nº 1.621, em 1998, o seu Conselho Municipal de Meio Ambiente (COMDEMA) com caráter consultivo e, em 1999, a Lei Municipal nº 1.677 o alterou para consultivo e deliberativo. O município de São Francisco de Paula também no RS instituiu, em 2001, o Conselho Municipal de Meio Ambiente (COMUMA), através da Lei Municipal nº 1.825, de 27 novembro de 2001, tendo sido esta lei de criação alterada algumas vezes, estando atualmente em vigor a Lei Municipal nº 2.609, de 13 de maio de 2009, em cujo seu artigo 1º está expresso o caráter consultivo e deliberativo e composição paritária.

Os municípios de Canela e São Francisco de Paula1 estão localizados na região nordeste do estado do RS, estando distantes aproximadamente 36 quilômetros um do outro. A ligação rodoviária entre os municípios se faz pela rodovia estadual RS-235. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2017a), Canela tem uma população de 43.062 habitantes; e sua área territorial ocupa 253,772 km2. São Francisco de Paula tem uma população de 21.679 habitantes e a sua área territorial é de 3.264,49 km2 (IBGE, 2017b). A escolha de Canela e São Francisco de Paula é intencional, em função dos dois primeiros autores deste artigo trabalharem na gestão pública destes municípios e, por conseguinte, terem experiência na área ambiental.

Segundo Ricardo Abramovay (2001) inexistem estudos sobre o tema "Conselhos" que não enfatize a precariedade da participação social nestas organizações e a sua submissão a poderes locais dominantes. Por outro lado, é praticamente consenso o reconhecimento do poder de transformação política que os Conselhos permitem (Abramovay, 2001). Marcela Nunes et al. (2012) relatam que a bibliografia específica ao tema "Conselhos Municipais de Meio Ambiente" é bastante limitada e existem mais publicações referentes a outros conselhos setoriais, como os da área da saúde.

Portanto, neste artigo buscou-se analisar a atuação dos CMMA de Canela e São Francisco de Paula, localizados no Rio Grande do Sul, no período de 2013 a 2017. O objetivo principal foi verificar o processo de participação sociopolítica nestes conselhos e analisar a representatividade das entidades/setores que os compõem. Além disso, teve-se o intuito de responder a seguinte questão: a atuação dos Conselhos municipais de meio ambiente em Canela e São Francisco de Paula está realmente atendendo às questões ambientais, ou seja, tem sido um fórum de tomada de decisões e participação sociopolítica do ponto de vista ambiental?

 

Os Conselhos Municipais de Meio Ambiente no Brasil

No Brasil, a estruturação da gestão ambiental ocorreu com a Lei Federal n° 6.938, de 31 de agosto de 1981, que estabeleceu a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) que introduziu, pela primeira vez, mecanismos de gestão colegiada e participativa, com a criação do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) (Cezare, 2009). A PNMA criou também o Cadastro de Defesa Ambiental (CDA) e o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) (Cezare, 2009). Conforme esta lei, o SISNAMA é constituído pelos órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e pelas Fundações instituídas pelo poder público, que são responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental.

Entre os órgãos locais que constituem o SISNAMA, estão os Conselhos Municipais de Meio Ambiente. Para Nunes et al. (2012), os CMMA são instâncias onde a sociedade civil organizada pode participar do processo decisório. Os conselhos são compostos por representantes da sociedade civil e do poder público, que se encontram para debater e encontrar soluções para o uso sustentável dos recursos naturais (Ministério do Meio Ambiente, 2018). Os CMMA devem ser locais onde ocorram o exercício da democracia, a educação para a cidadania e o convívio entre setores da sociedade com interesses diferentes e até conflitantes. Para Juliana Cezare (2009), a criação dos CMMA deve ser entendida como instrumento de articulação entre os diversos atores sociais, que fortalece a união entre os envolvidos e melhora a qualidade das decisões, visando sempre um fim comum ideal.

Quanto à composição dos Conselhos, Ana Teixeira (2005) diz que um Conselho deve ter composição paritária, ou seja, a mesma quantidade de representantes do poder público e da sociedade civil. A divisão pode ser metade por metade, constituindo o modelo bipartite, ou pode ser constituído por um terço de representantes do poder público e dois terços de representantes da sociedade civil organizada. Embora nem sempre ocorra, um Conselho deve ter caráter consultivo e deliberativo, pois em muitos casos os Conselhos são constituídos sob o caráter apenas consultivo, situação em que apenas são consultados pelo poder executivo, sem ter poder de decisão.

Para que os Conselhos se efetivem como instrumentos da participação política, é necessário garantir sua autonomia em relação ao poder executivo. Para que isso ocorra é necessário fazer esforços: (a) representatividades paritárias; (b) os representantes da sociedade civil deverão representar diversos setores específicos desta sociedade, com eleição de forma democrática, devendo a escolha do presidente, ocorrer por meio de indicação pela maioria dos conselheiros, mas nunca indicada por qualquer administrador público; (c) os conselheiros devem ter o devido conhecimento de aspectos políticos e técnicos sobre os temas que influenciam na tomada de decisões; entre outros.

Do total de 5.570 municípios brasileiros, 3.784 desses municípios possuíam CMMA instituídos em 2013, representando assim um percentual de 68% (IBGE, 2013). Desses Conselhos, 92% eram formados com constituição paritária, ou seja, quantidades iguais entre representantes do poder público e sociedade civil. Os dados do IBGE (2013) mostram também que no mesmo ano 81% dos Conselhos constituídos no país eram de caráter consultivo, 85% de caráter deliberativo e 48% possuíam caráter fiscalizador. A participação política ativa pode ser observada através do seguinte: dos 3.784 conselhos existentes, apenas 2.873 realizaram reunião nos últimos doze meses da data do levantamento, o que representa 76%.

Em 2013, do total de 497 municípios no Rio Grande do Sul, 483 possuíam CMMA instituídos, representando um percentual de 97%. Esses Conselhos apresentavam as seguintes características: 89% com constituição paritária, 73% com caráter consultivo, 90% com caráter deliberativo, 35% com caráter normativo; 43% com caráter fiscalizador; e apenas 401 Conselhos realizaram reuniões nos últimos doze meses (IBGE, 2013).

Conforme Maria da Glória Gohn (2011), vários teóricos fundamentaram o sentido atribuído à participação, porém foi Jean-Jacques Rosseau o teórico por excelência da participação.

Sua teoria política, considera a participação individual direta de cada cidadão no processo de tomada de decisões de uma comunidade e a vê como um modo de, simultaneamente, proteger os interesses privados e assegurar um bom governo. Segundo sua doutrina sobre a 'Vontade Geral', uma pessoa só pode ser verdadeiramente um cidadão quando quer o bem geral, e não o seu bem particular. (Gohn, 2011, pp. 24-25)

Alberto Melucci (1996, p. 306) orienta-nos a levar em conta diferentes conteúdos para definir participação: "(a) primeiro que quem participa buscando seus objetivos se identifica com os interesses gerais de um sistema dominante, legitimando-o; e (b) segundo que a participação se dá em um contexto competitivo de interação estratégica e com o objetivo de exercer algum grau de influência na distribuição de poder em benefício de um grupo específico."

Os Conselhos gestores podem ser considerados como instrumentos de expressão, representação e participação com potencial de transformação política, que possibilitam à população o acesso aos espaços onde se tomam as decisões políticas (Gohn, 2000). Quanto à tipologia, Maria Gohn (2011) aponta três tipos de participação política: (a) presencial: o indivíduo apresenta comportamento passivo; (b) ativação: o indivíduo desenvolve atividades que lhe foram delegadas; (c) participação (propriamente dita): o indivíduo contribui para decisões políticas.

Gohn (2011, p. 95) acredita que "os Conselhos criam condições para um sistema de vigilância sobre a gestão pública e implicam numa maior cobrança de prestação de contas do poder executivo, principalmente no nível municipal". Garantir a participação da comunidade na formulação e implementação de políticas públicas é um desafio ainda a ser enfrentado pelas gestões ambientais locais.

Para Gohn (2011) existem paradigmas a serem superados, pois na concepção liberal não ficam ausentes vícios que explicam a constituição de redes clientelísticas e prestígio político, sendo presente o princípio da delegação de um poder de representação, não importando a forma como foi constituída a representação. A operacionalização não plena dos Conselhos ocorre devido à ausência de tradição participativa da sociedade civil; à falta ou até inexistência de exercício prático, devido à sua curta trajetória de vida; e ao desconhecimento por parte da maioria da população (Gohn, 2011).

Sobre a criação e implementação dos Conselhos gestores Gohn (2011) destaca três questões: (a) a representatividade qualitativa dos diferentes seguimentos territoriais, sociais e de forças políticas da sociedade organizada; (b) o percentual paritário entre membros do governo e da sociedade civil; e (c) o problema da capacitação dos conselheiros, principalmente aqueles oriundos da sociedade. A mesma autora enfatiza que o problema da representatividade e o da paridade são cruciais e devem ser melhores definidos nos Conselhos, de uma forma geral. Os problemas decorrem da inexistência de critérios que garantam a efetiva igualdade entre os participantes. Para não coincidir com o mandato dos dirigentes do poder público e para que não fiquem acoplados aos períodos dos mandatos eleitorais, alguns analistas têm sugerido que a renovação do mandato dos conselheiros seja parcial. Não há estruturas jurídicas que garantam o amparo legal e obriguem o poder executivo a acatar as decisões dos conselheiros, principalmente quando as decisões venham de encontro a interesses dominantes, por conseguinte o fato dos conselhos serem de caráter deliberativo não garante sua efetiva implementação (Gohn, 2011).

Quanto ao problema da disparidade, mencionada por Gohn, esta não é apenas numérica, mas, sobretudo recai nas condições de igualdade no acesso às informações e disponibilidade de tempo. A autora chama a atenção para o fato que a disparidade é muito grande nas condições de participação entre os membros de um Conselho que são representantes do poder público e os que são representantes da sociedade civil organizada, pois os primeiros geralmente já trabalham durante o período normal e remunerado de trabalho no qual atuam como conselheiro, têm acesso aos dados e às informações; e têm a infraestrutura e o suporte administrativo necessários. Os representantes do poder público têm o que os representantes da sociedade civil organizada não têm. Faltam cursos para a capacitação de conselheiros; estes cursos possibilitariam uma participação qualificada. É necessária uma capacitação ampla, que dê a possibilidade a todos os membros uma visão geral da administração pública e da política (Gohn, 2011).

 

Os Conselhos Municipais de Meio Ambiente de Canela e São Francisco de Paula

Para a elaboração deste artigo foi realizada pesquisa bibliográfica e documental, utilizando-se como base leis, decretos, portarias, atas de reuniões, resoluções e pareceres dos CMMA de Canela e São Francisco de Paula. A pesquisa foi realizada levando-se em consideração o período de 2013 a 2017, para ser possível analisar diferentes composições dos Conselhos.

 

Canela - COMDEMA

Canela teve seu Conselho Municipal de Meio Ambiente (COMDEMA) instituído pela Lei Municipal nº 1.621, de 10 de dezembro de 1998, que o definia como órgão consultivo de cooperação governamental com a finalidade de auxiliar a administração municipal na orientação, planejamento, interpretação e julgamento de matéria de sua competência. Em 1999, a Lei Municipal nº 1.677 alterou o caráter do conselho, passando para deliberativo. Um ano depois, em 2000, o Decreto Municipal nº 1.852 aprovou o regimento interno do COMDEMA. No ano de 2003, a Lei Municipal nº 1.969, de 15 de abril de 2003, revogou a Lei Municipal nº 1.621, de 1998, mantendo o caráter de órgão consultivo, deliberativo e de cooperação governamental, com as mesmas finalidades descritas na lei revogada e com composição bipartite.

O COMDEMA tem sua composição definida no artigo 3º da Lei Municipal nº 1.969/2003. De acordo com esta lei, 23 entidades fazem parte do Conselho, sendo 09 representantes do poder público e 14 representantes da sociedade civil, distribuídas conforme Figura 1.

O mandato dos conselheiros é de dois anos, permitida a recondução. De forma geral, a grande maioria dos membros do Conselho possui curso superior e curso técnico. As entidades da sociedade civil no COMDEMA estão representadas principalmente por técnicos e em sua maioria biólogos, arquitetos, engenheiros e administradores. Se por um lado isto pode ser positivo para análise de processos de licenciamentos ou recursos de infrações ambientais, por outro pode haver certo constrangimento de alguns representantes por não se equiparar a esse nível de conhecimento técnico, ou ainda não motivar a participação de novos representantes.

A participação da população na formulação das políticas ambientais locais através dos Conselhos deve ser ampla. Esta participação é fundamental para a legitimidade e o alcance dos objetivos das mesmas. Contudo, se verifica que são comuns os questionamentos sobre a garantia da participação democrática e os interesses pessoais, políticos e econômicos envolvidos nesses conselhos, principalmente no que tange à esfera municipal. Tamara Crantschaninov et al. (2011) afirmam que os cidadãos se tornam limitados em sua capacidade de participação, caso não obtenham acesso à informação, o que também pode ser indicado pela dificuldade da população em frequentar reuniões relacionadas a decisões de políticas públicas.

A portaria de nomeação dos membros do COMDEMA, referente ao período de 2013 a 2014, trouxe 09 representantes do poder público e 13 representantes da sociedade civil. Observou-se que 07 das entidades previstas na lei não estavam compondo o Conselho neste período: 01 representante do poder público e 06 da sociedade civil. Porém havia 05 novas entidades da sociedade civil representadas na composição do Conselho: Secretaria Municipal da Saúde; Castelli Escola Superior de Hotelaria; Sindicato do Papel, Papelão e Cortiça do Estado do Rio Grande do Sul (SIMPASUL); Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Canela (SINDIRURAL) e Universidade Monã. Estas entidades tiveram participação e representação somente nesta gestão. Para inserir estas entidades na sua formação, o Conselho observou o disposto no § 1° do art. 3° da Lei nº 1.969/2003 que diz: "É assegurado o ingresso de outros representantes da sociedade civil, desde que possuam finalidades afins, reconhecidas como tais e após prévia aprovação do COMDEMA.".

Nos anos de 2015 a 2016 estiveram representadas no COMDEMA 16 entidades, sendo 09 do poder público e 07 da sociedade civil: Secretário Municipal de Meio Ambiente; Secretaria Municipal do Meio Ambiente; Secretaria Municipal de Obras; Secretaria Municipal de Educação e Cultura; Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER); Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE); Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN); Patrulha Ambiental da Brigada Militar (PATRAM); Floresta Nacional (FLONA/IBAMA); Associação Comercial e Industrial de Canela (ACIC); Associação Ecológica Canela - Planalto das Araucárias (ASSECAN); Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB); Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); Rotary Club; Fundação MOÃ; Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA). Notou-se que nesta gestão havia um número ímpar de entidades representando o poder público. Levando-se em consideração o que diz Gohn (2011) sobre as vantagens que os representantes do poder público têm em relação aos da sociedade civil, observou-se disparidade na representatividade, no referido período, em comparação à representação do poder público.

A Portaria nº 382, de 02 de fevereiro de 2017 definiu os conselheiros e as respectivas entidades a comporem o COMDEMA na gestão 2017/2018, sendo 07 representantes do poder público e 07 da sociedade civil: Secretaria Municipal de Meio Ambiente; Secretaria Municipal do Meio Ambiente; Secretaria Municipal de Obras; Secretaria Municipal de Educação e Cultura; Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN); Patrulha Ambiental da Brigada Militar (PATRAM); Floresta nacional (FLONA/IBAMA); Associação Comercial e Industrial de Canela (ACIC); Associação Ecológica Canela - Planalto das Araucárias (ASSECAN); Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB); Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); Rotary Club; Fundação MOÃ; Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA). Verificou-se que alguns membros se mantiveram no Conselho ao longo das três gestões; no entanto, uma curiosidade chamou a atenção: os membros que se mantiveram passaram a representar diferentes entidades em cada gestão. Um deles foi coordenador por duas gestões seguidas, representando duas entidades: SIMPASUL e Fundação Moã. Alguns destes representantes são autônomos que prestam serviços de consultoria e licenciamento ambiental no município.

Constatou-se que a lei de criação do COMDEMA em Canela não garantiu paridade entre os representantes do poder público e sociedade civil. Durante as três gestões analisadas ocorreram disparidades, pois na primeira havia maior número de representantes da sociedade civil, na segunda maior número de representantes do poder público e, somente na terceira foi constatada paridade, com 07 representantes da sociedade civil e 07 do poder público. Embora não tenha previsibilidade na lei de criação, é quase consenso que quando não há paridade, a representatividade fica prejudicada. Salienta-se que a literatura a respeito nos mostra que a maioria dos estudos afirmam que o critério de composição paritária nos Conselhos deve ser sempre atendido (Gohn, 2006; Cezare, 2009).

No período de análise de 2013 a 2017, o COMDEMA desempenhou parte de suas competências descritas na Lei Municipal nº 1.969/2003 ao criar resoluções normas, critérios e padrões relativos ao controle e manutenção da qualidade do meio ambiente, necessários para auxiliar o setor de licenciamento ambiental e também promoveu maior organização do próprio Conselho ao criar câmaras técnicas e juntas para cuidar de diferentes competências do Conselho. Foram emitidas 07 resoluções que dispõem sobre enquadramento e licenciamento ambiental das atividades e serviços de: movimentação de solo, terraplanagem e escavação, coleta, transporte ou armazenamento de resíduos da construção civil, alterações na lista de atividades de impacto local para o licenciamento, criação da Junta de Administração, regulamento para análises, pareceres sobre uso dos recursos do Fundo Municipal de Meio Ambiente (FMMA) e criação da Câmara Técnica de Controle e Qualidade Ambiental (CTQA).

Nesse mesmo período também foi possível verificar alguns fatos que reforçam a falta de engajamento em relação às participações dos conselheiros no COMDEMA como, por exemplo, a falta de um regimento interno; a não realização de uma eleição para assumir a junta de administração do FMMA; a falta de definição e regulamentação referente à periodicidade das eleições da junta do FMMA; falta de definição e regulamentação da tramitação para aprovação de projetos com uso de recursos do fundo; e falta de definição e regulamentação da tramitação para as deliberações da CTQA. A Lei Municipal nº 1.969/2003 deveria ter sido alterada, pois atualmente nela constam entidades que não fazem mais parte do Conselho ou que já nem existem mais, como também falta de clareza quanto ao quórum que deve ser atingido nas reuniões.

Em 2017 a Câmara de Julgamento Ambiental de Segunda Instância do COMDEMA trazia entre seus membros 02 técnicos (autônomos) que trabalham na área de assessoria ambiental e que, coincidentemente, são os responsáveis técnicos e/ou prestam assessoria aos autuados, inclusive na instrução dos recursos dos autos de infração. Estes técnicos são representantes da OAB e do CREA.

Na primeira e única reunião desta Câmara, que ocorreu em 2017, entre os processos analisados, havia um no qual a representante da OAB era a responsável técnica do autuado no processo, inclusive ela havia elaborado o próprio recurso apresentado no COMDEMA. No entanto, a representante da OAB não se fez presente na reunião de julgamento do caso. Entre os processos que estão aguardando análise no COMDEMA existem 02 na mesma situação, onde o representante do CREA no COMDEMA é o responsável técnico pelos licenciamentos de 02 empresas e o responsável pela instrução do recurso nos autos de infração.

 

São Francisco de Paula - COMUMA

O Conselho Municipal de Meio Ambiente (COMUMA) de São Francisco de Paula/RS foi criado pela Lei Municipal nº 1.825, em 27 de novembro de 2001, não sendo definido nesta lei o seu caráter. As duas alterações seguintes do dispositivo legal anterior ainda não tinham definido o caráter do COMUMA, só saindo esta definição com a atual Lei de nº 2.609, de 13 de maio de 2009, cujo seu artigo 1º consta o caráter consultivo e deliberativo, de composição paritária entre poder público e a sociedade civil.

A composição do COMUMA de São Francisco de Paula é definida pelo art. 3º da Lei de nº 2.609, sendo 14 membros titulares e 14 suplentes, obedecendo a distribuição paritária entre o poder público e a sociedade civil organizada, conforme Figura 2.

Para o biênio 2013/2014, os representantes foram nomeados pelo Decreto Municipal nº 976, de 05 de dezembro de 2012, sendo 05 representantes do poder público: Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente; Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto; Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS); Secretaria Estadual do Meio Ambiente; e Escola Estadual de Ensino Fundamental Monsenhor Armando Teixeira; e 04 da sociedade civil: Sindicato Rural de São Francisco de Paula (empregadores rurais); Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Francisco de Paula; CITE-78; ACI (Decreto Municipal nº 976, 2012). Estes eram os que estavam previstos na lei de criação, porém foi incluído um representante da Cooperativa dos Produtores da Agricultura Familiar e de Consumidores de São Francisco de Paula (COOPAF Serrana), sem ter a previsibilidade em lei.

Observou-se que a composição prevista para o biênio 2013/2014 não atendeu a previsão de composição prevista na lei vigente, não incluindo os 05 representantes da sociedade civil. A lei vigente de criação determina que o tempo de mandato dos conselheiros deva ser de 2 anos e que é permitida apenas uma recondução, porém conforme a análise dos decretos de nomeação verificou-se que em um período não foi cumprido o prazo de 2 anos, como também não foi cumprida a determinação de apenas uma recondução, pois se verificou que os mesmos representantes se repetiram em mais de um mandato.

Quanto à composição dos representantes no COMUMA, chamou a atenção ao verificar-se a constituição do Conselho, a presença de apenas uma escola estadual de ensino fundamental e não haver assento também para as demais escolas, inclusive as que compunham a rede municipal. As escolas deveriam ser uma das prioridades a compor o COMUMA, pois são elas que difundem as questões relacionadas à educação ambiental.

Através da leitura das atas das reuniões do COMUMA, um fato chamou a atenção na reunião realizada em julho do ano de 2013, quando um dos representantes foi excluído de analisar o processo de um determinado licenciamento ambiental, fato que acabou por evidenciar estratégias ilegítimas frente à participação efetiva do Conselho em relação aos temas ambientais do município. Outra reunião considerada polêmica, ao analisar-se as atas do COMUMA foi a de maio de 2014, quando se discutiu a autorização concedida pela Secretaria Municipal de Proteção Ambiental (SEMPA) para construção de um prédio de 04 andares, às margens do Lago Bernardo, sem o conhecimento do COMUMA. Tal processo não poderia ter sido autorizado pela SEMPA, em função de questões legais referentes à Área de Proteção Permanente (APP). O COMUMA deveria ser o espaço indicado para este tema ser discutido e analisado. Este Conselho, por meio de seus representantes, deveria ter vez e voz ativa e trazer para as discussões todas as implicações ambientais que resultariam uma construção de um edifício de 04 andares em uma área de proteção ambiental. O prédio em questão estaria localizado na APP do Lago São Bernardo (raio de 30 metros). Como comentado anteriormente, a "constituição de redes clientelísticas" (Gohn, 2011) nos setores públicos pode ser um dos fatores que fragilizam o processo de tomada de decisões nos Conselhos de meio ambiente.

Os representantes para o biênio 2015/2016 foram nomeados pelo Decreto Municipal nº 1.287, de 18 de dezembro de 2014, sendo nomeados 04 representantes do poder público e 06 da sociedade civil organizada. Os nomeados do poder público foram os seguintes: Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente; Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento; UERGS; Secretaria Estadual do Meio Ambiente. Da sociedade civil organizada: Sindicato Rural de São Francisco de Paula (empregadores rurais); EMATER e CITE-78. E nomeados os representantes a seguir, cujas representações não estavam previstas no decreto vigente (Decreto Municipal nº 1.278, 2014): COOPAF Serrana; Associação Ecológica Portal do Sol (ASSEPS); Associação dos Tecnólogos em Desenvolvimento Rural do Rio Grande do Sul (ATDR/RS).

Observou-se que a composição prevista para o biênio 2015/2016, além de não atender ao requisito da paridade, não atendeu também à composição prevista na lei vigente. Nesse caso, a representatividade é colocada em xeque ao verificar-se que vários setores que não estavam representados não puderam opinar e tampouco participar das pautas discutidas durante esse período, ou seja, setores da sociedade deixaram de participar de momentos cruciais relacionados à questão ambiental municipal. No entanto, para ter uma resposta do por que tais entidades não estavam representadas, seria necessário realizar entrevistas com as representações do COMUMA e esta seria uma fase posterior desta investigação.

Os atuais representantes, mandato para o biênio 2017/2018, foram nomeados via Decreto Municipal nº 1.475, de 14 de dezembro de 2016, sendo 04 representantes do poder público e 07 representantes da sociedade civil. Os nomeados do poder público foram os seguintes: Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente; Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento; UERGS e Secretaria Estadual do Meio Ambiente. Os nomeados da sociedade civil organizada: Organização Não Governamental Fundação Projeto Terra; Sindicato Rural de São Francisco de Paula (empregadores rurais); EMATER e CITE-78; sendo incluídos os seguintes representantes, cujas representações não estavam previstas no decreto vigente (Decreto Municipal nº 1.475, 2016): COOPAF Serrana; ASSEPS e ATDR/RS.

Pela análise das designações dos representantes para os três mandatos citados anteriormente foi recorrente a indicação dos conselheiros em desconformidade com as normas estabelecidas na legislação vigente. Em relação à participação sociopolítica se verifica que o princípio da paridade não foi observado na maioria dos decretos de nomeação. Sabe-se que a composição paritária em Conselhos é requisito essencial para garantir a igualdade na participação sociopolítica (Cezare, 2009; Gohn, 2011; Ministério do Meio Ambiente, 2018).

O artigo 2º da Lei Municipal nº 2.609, de 13 de maio de 2009 elenca 17 incisos, sendo todos sobre as competências do COMUMA. Salienta-se alguns deles: promover e colaborar na execução de programas de proteção ambiental no município; propor e acompanhar programas de educação ambiental; analisar e opinar sobre a gestão dos resíduos sólidos no município; acompanhar, controlar e deliberar sobre processos de licenciamento ambiental no município, entre outros. Mesmo tendo esta previsibilidade legal, não foram encontradas muitas evidências do cumprimento das competências do Conselho. Entre os anos de 2013 a 2017 encontrou-se o registro de apenas 03 resoluções, sendo 02 delas sobre a liberação de recursos do Fundo Municipal de Defesa do Meio Ambiente (FUNDEMA) e apenas 01 sobre autorização à Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade2 licenciar atividade de incorporação de resíduo em solo agrícola (Resolução nº 01, 2016; Resolução nº 01 e nº 03 de 2017). No mesmo período foram emitidos apenas 02 pareceres - Parecer nº 01 e nº 02 de 2015, sendo que o primeiro enfocava sobre a liberação de construções no entorno do Lago São Bernardo e o segundo sobre uma permuta de área pertencente à municipalidade por outra que deveria ser APP, cujo objetivo era um projeto de construção civil. Neste último, pôde-se verificar um melhor embasamento técnico na decisão do Conselho.

Da análise documental das reuniões, somente numa minoria foi possível verificar debates fundamentados em conhecimentos técnicos ambientais, inclusive não foi constatada nenhuma câmara técnica em atuação. Gohn (2011) chama a atenção em seu livro intitulado "Conselhos Gestores e Participação Sociopolítica" como é recorrente a necessidade de cursos e capacitação para a formação de representantes de Conselhos gestores. Os Conselhos gestores são espaços de aprendizagem, de negociação, do exercício do diálogo e de fortalecimento da cidadania, ressaltando-se ainda que, para que os Conselhos sejam ativos e possuam um caráter transformador é imprescindível que haja qualidade na participação (Gohn, 2001).

Mesmo a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade tendo uma grande demanda, não foram encontrados pareceres emitidos pelo COMUMA ou por alguma câmara técnica que se referissem à licenciamentos ambientais. Embora tenha a previsibilidade legal, expressa no inciso XVIII do art. 2º da Lei Municipal nº 2.609 de 13 de maio de 2009, que determina como uma das competências do COMUMA: "Acompanhar, controlar e deliberar sobre processos de licenciamento ambiental e o monitoramento de atividades potencialmente geradoras de degradação ambiental" (Lei Municipal nº 2.609, 2009). Questionada, a referida Secretaria respondeu que pela demanda de aproximadamente 600 licenciamentos anuais, seria inviável deliberar em Conselho, havendo somente uma reunião mensal.

 

Considerações finais

Neste artigo analisou-se como ocorre a participação sociopolítica em dois Conselhos Municipais de Meio Ambiente, um no município de Canela e outro em São Francisco de Paula, respectivamente, denominados COMDEMA e COMUMA. Os Conselhos são espaços de participação e decisão que devem ser ocupados, de forma paritária, pela sociedade. Porém, há diferenças importantes observadas em relação à participação sociopolítica entre os representantes do poder público e os da sociedade civil nestes Conselhos. Enquanto os representantes do poder público possuem maior acesso a informações e estão mais habituados com termos técnicos e a legislação ambiental, em função de seus cargos, por outro lado, os representantes da sociedade civil, muitas vezes, por não estarem familiarizados com os termos técnicos e com a legislação ambiental, sentem-se despreparados ou intimidados, o que causa pouca adesão ou mesmo desistências por parte da sociedade civil nas representações destes Conselhos.

No que se refere à representação da sociedade civil, o COMDEMA apresentou uma formação melhor qualificada para desempenhar as funções no Conselho, já que seus representantes possuíam maior conhecimento sobre a legislação e termos técnicos, ao contrário do observado no Conselho de São Francisco de Paula, no qual se verificou que a maioria dos membros não tinha experiência na participação de Conselhos. No COMDEMA observou-se a presença de técnicos da área ambiental, da arquitetura e do direito entre os representantes da sociedade civil, mas que atuavam tanto como representação da sociedade civil quanto do poder público. Assim, por vezes, no mesmo processo tais representantes atuavam no Conselho defendendo interesses de clientes da iniciativa privada. Isto é corroborado pelo fato de que não há um regimento interno no COMDEMA, que estabeleça critérios que separem interesses comuns da sociedade dos privados. No mínimo esta situação coloca em xeque a ética dos representantes das entidades nestes espaços socioparticipativos, como comenta Jean-Jacques Rousseau (1762) quando afirma que uma pessoa só pode ser verdadeiramente um cidadão quando quer o bem geral, e não o seu bem particular.

É comum verificar que alguns empreendedores acreditam ser vantajoso contratar profissionais da área de assessoria ambiental para representar suas entidades nos Conselhos, visto que prestariam assessoria "defendendo-as" durante um processo ambiental. No entanto, esta prática não visa à proteção ambiental e sim aos interesses particulares de determinados empreendimentos, sejam eles originados de propostas públicas ou privadas. No entanto, na legislação de Canela não consta nenhuma norma que impeça estes profissionais de fazerem parte do COMDEMA, ficando assim as decisões do próprio Conselho à mercê da ética, moral e bom senso dos seus membros, em aceitar ou não, tal conduta.

É urgente a necessidade de que as gestões municipais dos dois municípios realizem formação e capacitação dos conselheiros do COMDEMA e COMUMA, com intuito de qualificá-los e permitir a todos uma visão geral de suas atribuições, possibilitando-lhes maior equilíbrio nas performances de atuação. Por fim, entende-se ter sido fundamental a constituição dos Conselhos de meio ambiente nos dois municípios, dando início aos processos de participação sociopolítica, evidenciando lutas ambientais e o caráter democrático e transformador que devem conter estes espaços.

 

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Submissão: 09/10/19
Aceite: 28/04/20

 

 

1 Cabe salientar que este artigo foi realizado no âmbito da disciplina eletiva Psicologia Política, Ação Pública e Mudança Social do curso de Mestrado Profissional em Ambiente e Sustentabilidade da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS).
2 A partir da gestão municipal 2017-2020, a denominação mudou para Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade.

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