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Revista da SPAGESP

versão impressa ISSN 1677-2970

Rev. SPAGESP vol.12 no.2 Ribeirão Preto dez. 2011

 

ARTIGOS

 

Um curta-metragem, diversas histórias na formação de psicólogos clínicos: o caso "Pular"

 

A short film, several histories of the educational background and training of clinical psychologists: the case of "Bounding"

 

Un corto-metraje, diversas historias en la formación de psicólogos clínicos: el caso "Brincando"

 

 

Tales Vilela Santeiro 1

Universidade Federal de Goiás, Jataí, GO

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A atividade de formação de psicólogos clínicos pressupõe, entre diversas ferramentas pedagógicas, o uso de filmes como ilustrativos de aspectos de teorias e práticas psicológicas. O curta-metragem "Pular/Bounding", produzido pela Disney/Pixar (2003), é utilizado como recurso formativo em três momentos, em um Curso de Psicologia de Instituição Pública de Ensino, que contempla como uma de suas Ênfases Curriculares os processos clínicos: (1) Psicologia da Personalidade, componente curricular (CC) do 5º período, para trabalho sobre teorias de personalidade; (2) Tópicos Especiais em Psicologia e Processos Clínicos, CC do 9º período, para trabalho sobre avaliação psicológica em processos clínicos focais; e (3) Estágio Supervisionado, CC do 9º período, para trabalho de reflexão sobre atendimentos clínicos focais em contexto comunitário. Ilustrações das metodologias e das experiências dos estudantes-espectadores são feitas. A orientação teórica subjacente a todas as atividades é a psicanalítica.

Palavras-chave: Cinema; Filme; Psicanálise; Psicologia Clínica; Avaliação psicológica.


ABSTRACT

The educational background and training activity of clinical psychologists presupposes, among several pedagogical tools, the use of films for illustrative aspects of psychological theories and practices. "Bounding'", which is a short film produced by Disney/Pixar (2003), is used as an educational resource within three phases in a Psychology Course of a Public University that contemplates the clinical processes as one of its Curriculum Emphases: (1) Personality Psychology, curricular component (CC) of the 5th period, working on personality theories; (2) Special Topics in Psychology and Clinical Processes, CC of the 9th period, working on psychological assessment in focal clinical processes; and (3) Supervised Training, CC of the 9th period, working on reflection upon focal clinical treatment in community context. Illustrations of the spectator-students' methodologies and experiences are made. The theoretical orientation underlying all the activities is psychoanalytical.

Keywords: Cinema; Films; Psychoanalysis; Clinical Psychology; Assessment.


RESUMEN

La actividad de formación de psicólogos clínicos presupone, entre diversas herramientas pedagógicas, el uso de películas como ilustrativos de aspectos de teorías y practicas psicológicas. El corto-metraje "Brincando/Bounding", producido por Disney/Pixar (2003), es utilizado como recurso formativo en tres momentos, en el Curso de Psicología de una Institución Pública de Enseñanza, que contempla como uno de sus Énfasis Curriculares los procesos clínicos: 1) Psicología de la Personalidad, asignatura (A) del 5º período, para trabajo sobre teorías de la personalidad ; 2) Tópicos especiales en Psicología y Procesos Clínicos, A de 9º período, para trabajo sobre evaluación psicológica en procesos clínicos focales; y 3) Práctica Supervisada, A de 9º período, para trabajo de reflexión sobre atendimientos clínicos focales, en contexto comunitario. La orientación teórica subyacente a todas las actividades es psicoanalítica.

Palabras clave: Película; Psicoanalice; Cinema; Psicología Clínica; Evaluación psicológica.


 

 

Movies touch our hearts, and awaken our vision, and change the way we
see things. They take us to other places. They open doors and minds.
Movies are the memories of our lifetime. We need to keep them alive.

(SCORSESE, 2011).

FILMES COMO POSSIBILIDADES NO PROCESSO DE FORMAÇÃO EM PSICOLOGIA CLÍNICA 2, 3

A atividade de formação de psicólogos clínicos 4 pressupõe, entre diversas estratégias pedagógicas disponíveis, o uso de filmes como ilustrativos de aspectos de teorias e práticas psicológicas. Esse uso se atrela às condições de trabalho do professor, que transitam entre as econômicas, as institucionais e as pessoais. Estas três condições se complementam e são interdependentes umas em relação às outras e, inclusive, podem caracterizar o docente como facilitador ou inibidor da criatividade de seus estudantes na sala de aula (SANTEIRO; SANTEIRO; ANDRADE, 2004). Elas são capazes, portanto, de ser desmembradas apenas do ponto de vista didático.

Nessa acepção, as condições econômicas são entendidas como aquelas fundamentalmente relacionadas à remuneração do educador e ao poder aquisitivo que dela decorre. Frequentar exibições de cinema, montar uma videoteca ou alugar filmes para serem utilizados na sala de aula, requerem disponibilidade financeira, e não somente um "querer" e/ou um "planejamento didático-pedagógico".

Além do quesito econômico, as condições institucionais são aquelas dependentes, no geral, das estruturas físicas e tecnológicas das instituições de educação superior, o que inclui a existência de uma videoteca abrangente, de equipamentos audiovisuais necessários à projeção de filmes, bem como de recursos humanos para operacionalizar o uso dessa estrutura, ao ponto de o docente contar efetivamente com ela. Por essa via, a primeira condição apontada - a econômica - poderia ser, no mínimo, parcialmente suplantada.

Entre as condições pessoais do professor, a referência é feita às características de personalidade, de formação cultural e de prática acadêmica no processo de ensino-aprendizagem, as quais serão detalhadas a partir de agora. As características de personalidade conglomeram aspectos cognitivos, como inteligência, criatividade e memória, e os afetivos, que são entendidos como os estreitamente ligados ao humor ou à sua falta, aos padrões de relacionamento que o educador estabelece em sala de aula.

A formação cultural, por sua vez, mantém estreito vínculo com a formação universitária, portanto, com o arcabouço de leituras próprias de sua área de graduação e com o quanto o educador usufrui, ou potencialmente pode usufruir, de outras expressões artísticas e científicas disponibilizadas pela cultura na qual está inserido, sendo o Cinema apenas uma das possibilidades que lhe é constituinte.

O quesito prática acadêmica procura ressaltar as experiências profissionais estabelecidas e conquistadas ao longo do tempo, no convívio com os diversos sujeitos acadêmicos e dentro das instituições de ensino superior. Esse é o fundamento que permite ao docente transitar pelas estratégias pedagógicas (ANASTASIOU; ALVES, 2003) e inserir filmes como recursos admissíveis no cotidiano dos processos de ensino e aprendizagem (STEDILE, 2008).

Apesar de ser de conhecimento que a linguagem do cinema se trata de recurso bastante utilizado por professores nos cursos de graduação em Psicologia, as publicações específicas sobre "como" esse uso é efetivado têm sido constatadas como parcas na realidade brasileira e, mais ainda, no que diz respeito à formação de psicólogos clínicos. O que se observa com frequência é que psicanalistas escrevem sobre filmes (por exemplo, BARBOSA; RIVERA, 2006; CERQUEIRA FILHO, 2006; MEYER, 2010); relações diretas sobre o que estes teriam a contribuir para a formação de seus pares são dedutíveis, porém não necessariamente ficam esclarecidas ao olhar do acadêmico em processo de formação em Psicologia.

A falta de publicações específicas sobre o uso da linguagem fílmica na formação desses profissionais se explica por uma tradição que relaciona a formação do psicanalista como amparada no conhecido "tripé" - constituído por atividades de estudo teórico, psicoterapia pessoal e prática supervisionada de atendimentos (SARAIVA; NUNES, 2007; ZASLAVSKY; NUNES; EIZIRIK, 2003). Esse é um modelo de formação instituído desde os primeiros momentos dessa escola de pensamento (ROUDINESCO; PLON, 1998) e os filmes seriam, assim, cabíveis em atividades de estudo teórico e como elucidativos de aspectos da clínica psicanalítica, em contexto de supervisão, embora seja de conhecimento que são mais utilizados no primeiro caso. Como exemplo, não é incomum que praticantes/estudantes de Psicanálise realizem seminários, palestras e congressos em que filmes são eleitos como estudos de caso.

Nessa direção, o espaço da sala de aula e de formação em Psicologia é um daqueles em que o uso de diversas linguagens artísticas, incluindo o das imagens em movimento, é útil para alavancar objetivos didático-pedagógicos. Esse efeito ocorre, basicamente, porque os filmes podem mediar a comunicação experimentada entre professores e estudantes. E no caso específico da formação em Psicologia Clínica, a experiência emocional disparada por um filme mostra-se de valia, para que diálogos possam ser gerados a partir dela e para que possa haver aproximação "afetiva" por parte daquele que constrói o próprio conhecimento para além de aproximações puramente "racionais" que usualmente marcam o cotidiano acadêmico. Essas aproximações seriam esclarecidas quando manifestações humanas, que poderiam soar distantes de certa realidade educacional, fazem-se "presença na tela", o que por sua vez permite estabelecimento de diálogos dos mais diversos teores. Por exemplo, expressões psicopatológicas de alterações de humor e de comportamento vistas em personagens, tidas como "não pertencentes" à realidade dos espectadores, passaria a figurá-la a partir de uma expressão artística. Esse processo, ainda que em última instância num sentido apenas metafórico, desfruta de uma função "ampliadora de realidades" (SANTEIRO; SANTEIRO, no prelo).

A falta de sistematização de experiências sobre o uso de filmes na formação em Psicologia Clínica, a despeito do uso que deles se faz, e o consequente não publicar das mesmas pode denotar usos inadequados da linguagem fílmica em sala de aula, por parte do professor: como tapa-buraco, como estratégia de enrolação, como pertencendo a um quadro de dificuldade em repensar outras estratégias complementares, para ressaltar as fragilidades e defeitos da produção e, por fim, não os discutindo ou integrando-os aos assuntos de determinada aula (NAPOLITANO, 2009).

Resguardadas essas observações sobre os filmes como possíveis no processo de formação em Psicologia Clínica, o objetivo deste trabalho é relatar a experiência sobre como o curta-metragem "Pular/Bounding'", produzido pela Disney/Pixar (LUCKEY, 2003), é utilizado como estratégia de ensino em um Curso de Psicologia de Instituição Pública de Ensino, que contempla como uma de suas Ênfases Curriculares os Processos Clínicos (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS-UFG, 2007).

 

O CURTA-METRAGEM "PULAR" COMO ESTRATÉGIA NO PROCESSO DE ENSINAGEM

"Pular" é um filme dirigido ao público infantil que retrata a história de um carneiro vaidoso e saltitante, orgulhoso de sua felpuda lã. Ele é habitante de um cenário ensolarado e colorido, o que pode ser considerado um sinalizador de sua adaptação a este ambiente, como isenta de conflitos. Num certo momento, ocorre um evento que o entristece profundamente e leva-o a rever-se diante da vida que leva. Após esse mal-estar vivido, surge um segundo personagem que se dispõe a estabelecer diálogo com o carneiro e, assim, auxilia-o a recuperar-se do mal-estar que o entristece.

O curta-metragem em relato ocupa-se, assim, da trajetória do carneiro. Ele pode abastecer discussões sobre alterações na personalidade e que são decorrentes do evento estressor vivido, quanto a oscilações no humor e no padrão geral de comportamento, com respeito à análise do ambiente comunitário onde ele vive e sobre "como" seria o processo de avaliação do carneiro, acaso estivesse envolvido numa psicoterapia. Nesse sentido, em complemento ao especificado anteriormente, este trabalho ilustra o uso de "Pular" para estudo de teorias e técnicas de orientação psicanalítica, em três contextos de formação. Contudo, por questões espaciais, haverá detalhamento de apenas um deles, sendo o leitor convidado a extrapolar essa limitação e a flexibilizá-lo mentalmente:

(1) Psicologia da Personalidade, componente curricular do 5º período letivo, para trabalho sobre teorias de personalidade, em cuja Ementa se lê: "História do conceito de personalidade. Personalidade e Cultura: concepção do aparelho psíquico na abordagem freudiana (...)." (UFG, 2007, p. 53).

(2) Tópicos Especiais em Psicologia e Processos Clínicos I, componente curricular do 9º período letivo, para trabalho sobre avaliação psicológica em processos clínicos focais, que prevê na Ementa: "Disciplina de conteúdo variável. Desenvolvimento e aprofundamento de questões relativas à ênfase" (UFG, 2007, p. 61). Neste caso, a Ementa foi definida do seguinte modo pelo professor responsável: "Processos clínicos de orientação psicanalítica, seus fundamentos, objetivos, problemas, contextos e modos de trabalho, formas de avaliação de processos e de resultados terapêuticos".

(3) Estágio Supervisionado I – Processos Psicossociais, componente curricular do 9º período letivo, para trabalho de reflexão sobre atendimentos clínicos focais em contexto comunitário, cuja Ementa contempla: "Análise dos processos vivenciados na prática do psicólogo no campo de estágio em diferentes instituições e na comunidade. Ênfase no projeto de atividades que propõe intervenção, por meio da identificação e diferenciação dos processos e das relações produzidas." (UFG, 2007, p. 61).

Agora que as diretrizes pedagógicas e os momentos letivos foram expostos, um Plano de Aula será detalhado como modelo, considerando o segundo contexto acima (Tópicos Especiais...), e também serão acrescidos relatos de dois discentes, produzidos entre a 1ª e a 4ª Etapas trabalhadas com o filme e que serão expostas a seguir. Vale observar que em momento posterior ao desenvolvimento desta atividade, os estudantes autorizaram o uso do material, para fins de publicação.

 

PLANO DA AULA SOBRE AVALIAÇÃO EM PROCESSO DE PSICOTERAPIA DE ORIENTAÇÃO PSICANALÍTICA

Período letivo sugerido: conforme detalhado no item (2) acima, 9º período. Entretanto, alterações no Plano permitiriam o uso do filme junto a estudantes situados em quaisquer períodos anteriores.

Requisitos acadêmicos mínimos: formação básica em teorias psicanalíticas e/ou em teorias sobre processos de avaliação psicológica com orientação psicanalítica.

Objetivo geral: estabelecer norteadores de avaliação do paciente num processo de psicoterapia psicanalítica, incluindo planejá-lo e focalizá-lo, tendo o curta-metragem "Pular" (LUCKEY, 2003) como estratégia de ensino complementar.

Objetivos específicos: competências e habilidades a serem desenvolvidas no grupo de estudantes (selecionadas das DCN (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2011)): (a) analisar o campo de atuação profissional e seus desafios contemporâneos; (b) identificar e analisar necessidades de natureza psicológica, diagnosticar, elaborar projetos, planejar e agir de forma coerente com referenciais teóricos e características da população-alvo; (c) avaliar fenômenos humanos de ordem cognitiva, comportamental e afetiva em diferentes contextos; e (d) realizar diagnóstico e avaliação de processos psicológicos de indivíduos, de grupos e de organizações.

Objetivos secundários: subsidiar o desenvolvimento de atividades em estágios com ênfase curricular em processos clínicos.

Duração: 100 minutos, sendo aproximadamente 50 minutos reservados para a projeção do filme e os aproximados 50 minutos restantes para discussão e exposição de aspectos da teoria e da técnica de avaliação no contexto da psicoterapia psicanalítica (o tempo de duração do filme, que totaliza quatro minutos e 40 segundos, favorece o sustento de atenção dos estudantes e o desenvolvimento da atividade num mesmo dia de aula).

Recursos: equipamentos para leitura de DVD e para projeção do filme (microcomputador e datashow, ou aparelho de DVD e TV), papel e caneta/lápis para os estudantes tomarem nota das observações.

Procedimentos: Da 1ª a 4ª etapas seguintes, o professor deve se atentar para três orientações gerais: (1) Projetar o filme sem o recurso do áudio, com o objetivo de valorizar os aspectos não-verbais da relação entre os personagens e a estratégia de observação; (2) A descrição do carneiro a ser solicitada não deve ser dirigida, sendo que cada estudante a redige do modo como percebe/deseja; (3) No momento de solicitar as descrições do carneiro, da 1ª a 4ª etapas, ressaltar a necessidade de não haver diálogos entre os pares, como modo de favorecer uma escrita reflexiva.

1ª etapa: projeção do filme, desde o início até a chegada do tosquiador (a projeção do filme deve ser suspensa antes da chegada do veículo). Levantar questões sobre o cordeiro: Quem é ele? Descreva-o.

Relato de L.: "O carneiro demonstra ser alegre e simpático. Parece gostar de si mesmo e ter uma boa autoestima. Tem muitos amigos".

Relato de H.: "Um ser pomposo, aparentemente feliz, revestido de narcisismo e exerce certa liderança sobre os que estão a sua volta".

2ª etapa: levantar questões sobre o cordeiro após a tosa até a chegada do lebrílope (a projeção do filme deve ser suspensa antes da chegada do lebrílope): Quem é ele após a tosa? Descreva-o.

Relato de L.: "Com o corte de sua lã, tornou-se triste e envergonhado, não gostando de sua própria imagem. Isolou-se em sua tristeza, perdeu os amigos".

Relato de H.: "Ao perder o objeto que lhe garantia pompa, torna-se um ser triste, deprimido que se esconde daqueles que anteriormente ele tinha prazer em mostrar sua aparência".

3ª etapa: levantar questões sobre o cordeiro, durante o diálogo com o lebrílope (a projeção do filme deve ser suspensa ao final do diálogo; o "diálogo" pode ser colocado como uma situação terapêutica): Quem é ele durante o diálogo? Descreva-o.

Relato de L.: "Durante a intervenção ouve o relato de sua história, verbalizado por ele em forma de queixa, onde relatou as suas perdas e tristezas. O ‘terapeuta' trabalha com ele a sua aceitação da sua nova forma, pois, apesar de perder o pêlo, ele ainda continua sendo um carneiro, podendo fazer tudo o que fazia antes".

Relato de H.: "A partir do processo psicoterápico consegue elaborar melhor sua perda e tem uma reação egóica, de modo que percebe que apesar da perda pode explorar suas potencialidades".

4ª etapa: levantar questões sobre o cordeiro, após o diálogo com o lebrílope (a projeção do filme deve ser suspensa no final do filme): Quem é ele após o diálogo? Descreva-o.

Relato de L.: "Após a intervenção e apesar de estar sem pêlo, o carneiro continua fazendo o que fazia quando tinha pêlo. Aceita, então, sua nova forma, tornando-se novamente alegre e conquistando os amigos novamente pela pessoa que é. O seu repertório foi ampliado, de modo que passou a enxergar a situação de outra forma, tornando-se mais hábil socialmente, entendo que os seus valores anteriores foram modificados".

Relato de H.: "Fora da terapia, após a alta, sente-se forte e pomposo como antes. Com a repetição do problema que outrora o havia deixado deprimido, sua reação foi diferente da primeira, pois agora teve condições de superar a perda sem maiores dificuldades".

5ª etapa: discussão compartilhada das observações/escritas sobre o filme.

6ª etapa: verificação de leituras prévias feitas pelos estudantes - tempestade cerebral, conforme Anastasiou e Alves (2003) -, sobre o conteúdo de avaliação (a partir das verbalizações, levantar tópicos sobre avaliação, com o intuito de eventualmente complementar e/ou relembrar discussões ocorridas em aulas anteriores, conforme sugestões a seguir).

Sugestões de tópicos sobre avaliação do paciente (KEIDANN; DAL ZOT, 2005; YOSHIDA; ENÉAS, 2007):

• Entrevistas iniciais.

• Motivação.

• Transferência e contratransferência.

• Diagnóstico psicodinâmico: identificação; fatores desencadeantes: crises vitais ou acidentais; conflito atual; adaptação prévia, força do ego e relações objetais; exame mental e presença de sintomas; e capacidade para estabelecer aliança terapêutica.

• Indicações e contraindicações para uma psicoterapia psicanalítica.

Sugestões de tópicos sobre planejamento da psicoterapia (IANKILEVICH, 2005; YOSHIDA; ENÉAS, 2007):

• Coadunado com o processo de avaliação.

• Processo dinâmico.

• Relação com diagnóstico psicodinâmico.

• Relação com os objetivos da psicoterapia.

• Relação com manejo da psicoterapia.

• Estabelecimento de prognóstico.

• Por que planejar?

Sugestões de tópicos sobre focalização da psicoterapia (VALÉRIO, 2005; YOSHIDA; ENÉAS, 2007):

• Coadunada com os processos de avaliação e de planejamento.

• Como é estabelecida?

• Condições que a favorecem.

• Concordância do paciente.

• Relação entre foco e conflito.

• Fatores desencadeantes: crise vital ou acidental.

7ª etapa: projeção do filme, na íntegra (com o recurso do áudio, e eventual discussão complementar (o que dependerá do fator "tempo").

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As etapas explanadas foram pensadas de modo que o estudante possa viver a situação exposta no filme, passo a passo. As experiências docentes do Autor têm demonstrado que, a despeito de ser uma película voltada ao público infantil, "Pular" tem efeitos pedagógicos vantajosos junto aos universitários.

Apesar de não ter havido detalhamento de outros momentos letivos nos quais o filme pode ser utilizado como mediador nos processos de ensino e aprendizagem, é necessário que o professor flexibilize esta ferramenta, o que, naturalmente, deveria ocorrer no uso de outras quaisquer: ao público alvo, às ementas e às ênfases curriculares previstas nos projetos pedagógicos. No caso relatado, os objetivos careceram de revisão e adequação a cada um dos três contextos nos quais "Pular" foi utilizado. Para discussão sobre teorias da personalidade na visão psicanalítica, a bibliografia de apoio era específica quanto a esta necessidade e o foco das discussões era, assim, a personalidade do carneiro. Por sua vez, no momento de usá-lo nas atividades de supervisão de estágio em processos psicossociais, o entorno social e o modo como o carneiro se inseria e se relacionava com ele determinou o sentido das conversas.

Em meio às questões técnicas subjacentes neste relato, o uso de "Pular" como estratégia de ensinagem tem evocado, nos "adultos jovens" que o assistem, encantamento e diversão semelhante ao observado em crianças, fortalecendo sua apropriação como instrumento que também pode fomentar aspectos lúdicos na sala de aula. Nesta medida, acredita-se que as relações entre os acadêmicos que compartilham as percepções sobre "o carneiro" se fortalecem e, todos, visivelmente, usufruem de prazer. Não se sabe, ao final das contas, distinguir se esse produto advém de analisarem o personagem do filme ou simplesmente de estarem juntos e exercitarem os papéis profissionais para os quais têm se graduado.

As discussões da atividade, instaladas entre a 5ª e a 7ª etapas, geram diálogos estabelecidos coletivamente entre espectadores e professor. Por conseguinte, a aprendizagem de ambos pode consolidar-se em outros níveis, distintos daqueles que eventualmente puderam ser obtidos unicamente pelo estudante - na oportunidade de refletir e escrever - ou pelo docente - na ocasião de planejar a aula. Por esse caminho, os relatos dos discentes L. e H. permitem concretizar parte dos efeitos do uso desta estratégia pedagógica. Ancoradas nestes últimos, as conversações grupais requerem maior parte do tempo dos envolvidos nelas para que, de fato, "Pular" permita o alcance dos objetivos pedagógicos desejados.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Endereço para correspondência
Tales Vilela Santeiro
E-mail: talessanteiro@hotmail.com

Recebido em 12/09/2011.
1ª Revisão em 29/09/2011.
Aceite Final em 30/09/2011.

 

 

1 Tales Vilela Santeiro é Professor Adjunto do Curso de Psicologia da Universidade Federal de Goiás, Campus de Jataí (GO). Graduado em Psicologia pela Universidade de Franca, é Mestre e Doutor em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. E-mail: talessanteiro@hotmail.com.
2 O resumo deste trabalho foi originalmente publicado nos Anais do VIII Encontro Nacional da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia, ocorrido em Goiânia, entre 7 e 10 de setembro de 2011.
3 Este texto foi revisado seguindo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor no Brasil a partir de 1º de janeiro de 2009.
4 Neste texto, as alusões feitas a psicólogos clínicos são referentes àqueles que seguem a orientação psicanalítica. E aquelas feitas aos psicanalistas ou aos psicoterapeutas são indistintas, porque designam tanto os psicanalistas quanto os psicoterapeutas de orientação psicanalítica.