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Contextos Clínicos

versão impressa ISSN 1983-3482

Contextos Clínic vol.4 no.2 São Leopoldo dez. 2011

https://doi.org/10.4013/ctc.2011.42.07 

ARTIGOS

 

Perfil de pacientes atendidos através da terapia cognitivo-comportamental em uma clínica-escola

 

Profile of patients in cognitive behavior-therapy

 

 

Marcela Bortolini; Juliana da Rosa Pureza; Ilana Andretta; Margareth da Silva Oliveira

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Av. Ipiranga, 6681, 90619-900, Porto Alegre, RS, Brasil. bortolini.marcela@gmail.com, julianapureza@yahoo.com.br, ilana.andretta@gmail.com, marga@pucrs.br

 

 


RESUMO

Centenas de milhões de pessoas em todo o mundo sofrem devido ao aparecimento de transtornos mentais. Investigar as características sociodemográficas e clínicas dos pacientes atendidos nos serviços de psicologia é reportado pela literatura como uma medida que possibilita o reconhecimento de demandas e, a partir disso, ocorre um melhor atendimento nesses locais. Entretanto, são poucos os estudos que descrevem essas características de pacientes na Terapia Cognitivo Comportamental (TCC). O presente estudo teve como objetivo descrever a prevalência de transtornos psicológicos e as características sociodemográficas e clínicas dos pacientes atendidos na TCC. Foram analisados os dados de 92 prontuários de pacientes atendidos em uma clínica-escola da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). O perfil encontrado incluiu mulheres, estudantes, solteiras, com Ensino Médio completo e apresentando transtorno de humor. Esse perfil foi similar ao reportado pela literatura em estudos com esse tipo de serviço. Identificar esse perfil é fundamental para o desenvolvimento de estratégias terapêuticas específicas para essa modalidade de terapia.

Palavras-chave: perfil de saúde, terapia cognitiva, psicopatologia.


ABSTRACT

Hundreds of millions of people in the world population suffer from the onset of mental disorders. Investigate the socio-demographic and clinical characteristics of patients seen by psychology services is reported in the literature as a measure that allows the recognition of claims, creating a bet er service on these locals. However, there are few studies that describe these characteristics of patients in the Cognitive Behavioral Therapy (CBT). This study aimed to describe the prevalence of psychological disorders and the socio-demographic and clinical characteristics of patients atended in CBT. It was analyzed data from 92 files from patients enrolled in a training clinic at Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). The profile found included women, students, single, with complete high school and presenting Mood Disorder. This profile was similar to that reported in the literature in studies of this kind of service. Identifying this profile is fundamental for the development of specific therapeutic strategies for this form of therapy.

Key words: health profile, cognitive behavioral therapy, psychopathology.


 

 

Introdução

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), centenas de milhões de pessoas no mundo são afetadas por transtornos mentais (Funk e Ivbijaro, 2008). A OMS estima que 154 milhões de pessoas sofram de depressão, 25 milhões, de esquizofrenia, 91 milhões afetam-se por transtornos por uso de álcool e 15 milhões, por uso de drogas (Funk e Ivbijaro, 2008). A incidência de pessoas que desenvolvem transtornos mentais no mundo, no período de 1 ano, varia de 4 a 26%. Um estudo internacional, realizado em 14 países com 60 mil adultos, observou que a taxa de presença anual de qualquer transtorno psiquiátrico se encontra por volta de 20% (Demyttenaere et al., 2004). Essa variabilidade pode ser justificada não apenas pelas dificuldades encontradas na definição de diagnósticos como ainda devido à influência que esses diagnósticos sofrem de informações decorrentes de estigmas e discriminações sociais.

Diante dessa prevalência dos transtornos mentais, é essencial investigar alguns dados que permeiam o processo terapêutico, entre eles as características da clientela, a fim de verificar as reais necessidades do público que busca atendimento psicológico (Salinas e Santos, 2002). Na área da psicologia, observa-se um constante interesse no desenvolvimento de pesquisas voltadas para a caracterização dos serviços e das demandas presentes nas clínicas-escola (Peres et al., 2004). A clínica-escola oferece atendimento gratuito ou semi-gratuito para a comunidade, caracterizando-se por ser um local no qual o estudante ou o profissional em formação recebe treinamento e orientação no formato de supervisões dos atendimentos clínicos, com a finalidade de capacitá-lo para a prática e a reflexão. A importância social dessas instituições baseia-se no fato de que boa parte das pessoas que procuram auxílio não terem condições econômicas para buscar outras formas de atendimento, havendo uma maior demanda do que o auxílio disponível (Enéas et al., 2000).

Pesquisas em clínicas-escola descrevem que a caracterização da clientela divide-se em dois perfis característicos: o primeiro perfil é caracterizado por crianças e adolescentes em idade escolar e com idades entre 6 e 15 anos, do sexo masculino, encaminhados devido ao insucesso escolar. E o segundo perfil caracteriza-se por mulheres adultas, jovens, solteiras que procuram serviço psicológico por dificuldades de relacionamento e afetivas (Campezzato e Tiellet, 2007). Características comuns dessas instituições também são os altos índices de pacientes que abandonaram o tratamento, que se situam entre 30 e 60% (Lhullier, 2002). Salinas e Gorayeb (2002) expõem a necessidade da diminuição do tempo de espera desses pacientes, recomendando o atendimento imediato de triagem com o intuito de acolher o paciente e responsabilizá-lo por sua própria demanda. Esses autores apontam ainda que as causas das desistências têm sido atribuídas à própria organização da instituição, tais como tempo de espera para a realização da triagem e o período de espera entre a triagem e o início do atendimento, entre outros fatores (Güntert et al., 2000).

Dentre os diferentes referenciais teóricos presentes nas clínicas-escola de psicologia, a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) revela-se um modelo adequado para o atendimento por sua abordagem terapêutica diretiva, breve, além da quantidade de técnicas e estratégias de intervenções disponíveis (Friedberg e McClure, 2006). A TCC teve seu surgimento iniciado com protocolos de tratamento para a depressão, porém a prática e a pesquisa clínica na TCC mostraram que atualmente essa modalidade de terapia abrange diversas patologias psiquiátricas, além de ser recomendada para o tratamento de muitos distúrbios psicológicos e psiquiátricos (Beck, 1997; Knapp e Beck, 2008). Atualmente, são poucos os estudos que descrevem essas características de pacientes atendidos na TCC. A compreensão do perfil do paciente atendido em TCC permitirá a construção de práticas terapêuticas específicas para essa população, aumentando a adesão dos pacientes ao processo terapêutico. Moura et al. (2008) referem que estudos de caracterização possibilitam aos terapeutas justificar e fundamentar suas práticas preventivas em dados empíricos que ajudam na condução das intervenções. Romaro e Capitão (2003) também mencionam que o primeiro passo nas clínicas-escola é caracterizar sua clientela para, após, formular estratégias a fim de oferecer serviços adequados à população que busca esse tipo de serviço.

Apesar de diversos estudos controlados buscarem avaliar a eficácia da TCC, poucas são as pesquisas que discorrem sobre a prevalência de transtornos psicológicos e as características da população atendida nesse tipo de terapia. Dessa forma, o presente estudo tem como objetivo descrever a prevalência

Perfil de pacientes atendidos através da terapia cognitivo-comportamental em uma clínica-escola de transtornos psicológicos e as características sociodemográficas e clínicas dos pacientes que realizaram atendimento em TCC em uma clínica-escola.

 

Método

O método utilizado no estudo foi um levantamento retrospectivo e quantitativo. A amostra foi composta pela análise de 92 prontuários de participantes que foram indicados para psicoterapia breve individual em Terapia Cognitivo Comportamental no Serviço de Atendimento e Pesquisa em Psicologia, no período de janeiro de 2006 até julho de 2009. Foram utilizados os dados arquivados desses pacientes, sendo que todos já haviam finalizado o tratamento durante a etapa de coleta de dados. Cabe mencionar que o referencial cognitivo-comportamental dessa clínica-escola destina seus atendimentos a adolescentes, adultos e idosos.

Quando chegaram ao serviço, os participantes realizaram uma triagem e foram encaminhados para uma das seguintes modalidades de terapia oferecidas no local: terapia psicanalítica, terapia humanista e terapia cognitivo-comportamental. Os pacientes indicados para a TCC apresentavam uma demanda indicada para o tratamento nessa abordagem, como depressão, suicídio, transtornos de ansiedade e fobias, síndrome do pânico, transtornos de personalidade, abuso de substâncias, entre outras demandas (Beck, 1997; Knapp e Beck, 2008). Todos os participantes incluídos na amostra assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido padrão do serviço, permitindo que os dados de seus atendimentos fossem utilizados em atividades de pesquisa. Os atendimentos foram realizados semanalmente, com duração de 1 hora e conduzidos por estagiários. Todos os atendimentos foram realizados por estagiários e registrados em forma de relato ou dialogada, e fez-se uso de uma entrevista semiestruturada baseada nos critérios do DSMIV-TR (APA, 2002), tendo sido supervisionados por um supervisor local.

No processo de triagem é preenchida uma ficha de dados sociodemográficos padrão, que inclui informações gerais sobre os pacientes. Nessa ficha, também foram anotados os dados de frequência do atendimento. Dentre as informações contidas nas fichas, foram utilizados os seguintes dados para essa pesquisa: sexo, idade, escolaridade, estado civil, ocupação profissional, renda, número de filhos, data da triagem, realização ou não de psicodiagnóstico, data do primeiro atendimento, número de sessões e número de faltas. Outras informações sobre os atendimentos dos pacientes, como diagnóstico, histórico de internação psiquiátrica e abandono de tratamento, foram retiradas do material relatado e dialogado dos atendimentos. Os dados que se referem à desistência dos pacientes também foram analisados, e a definição de abandono utilizada neste estudo foi de, após pelo menos um encontro com o terapeuta, o paciente não comparecer às consultas agendadas e não retornar para dar continuidade ao tratamento, apesar de ter sido convidado a fazê-lo. Essa definição foi baseada no estudo de Luk et al. (2001).

Após coleta dos dados, foi construído um banco de dados contemplando as variáveis da pesquisa mencionadas anteriormente. Os dados foram tratados e analisados por meio da estatística descritiva. Essa análise consistiu em descrever as características gerais da amostra com relação às variáveis sociodemográficas e clínicas (tempo em lista de espera - período compreendido entre a triagem e o primeiro atendimento -, realização prévia de psicodiagnóstico e internação, número de sessões, número de faltas e diagnóstico) no que tange à média, desvios-padrão e frequência de dados categoriais ou ordinais.

 

Resultados

A amostra do presente estudo foi composta pela análise de 92 prontuários de sujeitos com idade média de 29,4 anos (DP=14,47), com idade mínima de 13 e máxima de 71. No que diz respeito ao sexo, 67,4% (n=62) eram do sexo feminino, com idade mínima de 13 e máxima de 71, e 32,6% (n=30) do sexo masculino, com idade mínima de 13 e máxima de

67. A média da renda dos participantes foi de R$ 717,60 (DP=708,32), equivalente a 1 e 2 salários mínimos. Com relação à faixa etária, os participantes foram divididos em adolescentes (de 12 a 18 anos), adultos (de 19 a 59 anos) e idosos (a partir de 60 anos). A Tabela 1 ilustra a distribuição da amostra em relação às características sociodemográficas para variáveis categorizadas.

Com relação à prevalência de transtornos psicológicos encontrada, observa-se na Tabela 2 a distribuição da amostra analisada, tendo como instrumento de avaliação uma entrevista clínica baseada no DSM-IV-TR (APA, 2002). Com o objetivo de facilitar a análise dos resultados, os transtornos psicológicos menos prevalentes foram agrupados em outros transtornos de Eixo I e outros transtornos de Eixo II. Dentre esses, estiveram presentes transtornos sexuais (n=1), transtorno da alimentação (n=2), transtorno relacionados a substâncias (n=4), transtornos psicóticos (n=1), transtornos de déficit de atenção e hiperatividade (n=1), transtornos de personalidade (n=2) e transtorno da primeira infância (n=1).

No que diz respeito às variáveis clínicas relativas ao atendimento realizado, foram analisados o tempo em lista de espera, a realização prévia de psicodiagnóstico e internação, o número de sessões e o número de faltas. Encontrou-se que a maioria dos pacientes não relatou internação psiquiátrica (n=90), realização prévia de psicodiagnóstico (n=90) e nem atendimento psicoterápico anterior ao atendimento (n=66). Para descartar um possível viés nos resultados devido à variabilidade dos dados, bem como identificar a medida de tendência central da amostra, foi calculada também a mediana do número de sessões realizadas, de faltas e de tempo em lista de espera. Os pacientes dessa amostra tiveram uma média de 13,72 (DP=10,13) sessões realizadas e uma mediana equivalente a 12 sessões. Em relação às faltas durante o atendimento a amostra total teve uma média de 3,23 (DP=2,77) faltas e mediana equivalente a 3 faltas durante o atendimento. Com relação ao tempo em lista de espera, os pacientes dessa amostra permaneceram com uma média de 101,41 dias em lista de espera (DP=92,72), apresentando uma mediana equivalente a 89 sessões.

Dos 92 prontuários de pacientes incluídos na amostra, 41 abandonaram o tratamento, totalizando uma taxa de abandono de 44,5% da amostra. Com o objetivo de uma análise mais apurada desse resultado, a variável abandono foi avaliada a partir da divisão dos pacientes com base nos grupos de transtornos psicológicos encontrados. Destes, 23,91% (n=22) apresentaram transtorno de humor, 8,70% (n=8) apresentaram transtorno de ansiedade, 8,70% (n=8) não apresentaram nenhum transtorno classificado e 3,26% (n=3) apresentaram outro transtorno de Eixo I e II. No que se refere à faixa etária dos pacientes que abandonaram o tratamento, a maioria (n=28; 68,29%) eram adultos, seguidos por adolescentes (n=10; 24,39%) e idosos (n=03; 7,31%).

 

Discussão

A clientela atendida por estagiários na Terapia Cognitivo-Comportamental da clínica-escola estudada teve prevalência de mulheres com faixa etária entre 19 e 59 anos. Essa mesma prevalência de pacientes adultos do sexo feminino é similar à encontrada em outros estudos empíricos em clínicas-escola de psicologia (Carvalho e Telles, 2001; Enéas et al., 2000). Bozon (2004) aponta que a falta de procura da clientela masculina pelos serviços de psicologia é decorrente das características patriarcais da cultura, que contribuem para a visão da doença como uma fragilidade que os homens não reconhecem como pertencentes a si mesmos. Essa visão de Bozon (2004) sugere que o homem cuida menos de si e busca menos os serviços de auxílio à saúde, o que poderia explicar a baixa prevalência de clientela masculina neste e em outros estudos similares.

Em relação à escolaridade da amostra, foi verificada a prevalência do Ensino Médio completo, seguido pelo Ensino Médio incompleto e Ensino Superior incompleto. Enéas et al. (2000) expõem que o grau de escolaridade das pessoas atendidas em instituições reflete o local em que ocorre a prestação de serviço. Verificando essa relação, cabe citar o estudo de Villwock et al. (2007) realizado em uma clínica-escola, que tem um forte vínculo com comunidades mais carentes socioeconomicamente, em que 82% dos adultos tinham pelo menos o Ensino Fundamental completo. Cabe referir que a clínica-escola do presente estudo localiza-se na universidade cujas redondezas são caracterizadas por comunidades de classe média baixa e mais carente economicamente. Além da localização, outro aspecto que pode ter contribuído para a clínica-escola atrair essa população específica é o baixo custo do serviço prestado. Assim como a escolaridade poderia estar associada à localização, a ocupação prevalente também pode ter associação a esse fato no presente estudo.

Encontrou-se como ocupação prevalente estudantes, seguidos por pessoas com emprego e, em seguida, donas de casa. No estudo de Santos et al. (1993), houve a predominância de estudantes (33% da amostra) de 18 a 22 anos de idade, seguida pela presença de donas de casa (5% da amostra). A prevalência de donas de casa (8,7%) no presente estudo foi semelhante à deste último referido. Essa incidência nos serviços de psicologia pode ser justificada, segundo D'Affonseca (2005), pela dona de casa possuir níveis inferiores de autoestima e de saúde, assim como a presença de crenças de fracasso pessoal quando comparadas a mulheres que trabalham fora de casa. Em relação ao estado civil, verificou-se que a maioria da clientela era solteira, o que corrobora a literatura desse tipo de atendimento (Enéas e Faleiros, 2001).

Sobre a prevalência de transtornos psicológicos, a depressão, juntamente com outros transtornos de humor, vem sendo considerada um dos maiores problemas para os serviços de saúde mundiais (Spek, 2007). Na amostra pesquisada, 35,48% dos pacientes apresentaram algum transtorno de humor, estando dentro do intervalo encontrado na literatura no que diz respeito à prevalência de transtornos de humor na população, que pode chegar até 45,5% (Figueiredo et al., 2010). Todavia, existe na literatura uma enorme variabilidade no que diz respeito à prevalência de transtornos de humor na população. Essa variabilidade pode ser encontrada inclusive em estudos brasileiros sobre o tema (Almeida et al., 1997; Andrade et al., 2002), sugerindo que ainda não existe um consenso com relação à prevalência de transtornos de humor.

No que se refere aos transtornos de ansiedade, Mochcovitch et al. (2010) apontam que esses ainda são os transtornos psicológicos mais comuns de todos os transtornos psiquiátricos encontrados. Neste estudo, os transtornos de ansiedade estavam presentes em 26,88% dos pacientes atendidos, uma porcentagem que está acima do encontrado em outros estudos brasileiros que buscam identificar a prevalência de transtornos psicológicos no Brasil, nos quais a presença de transtorno de ansiedade na vida é em torno de 12,5% (Almeida et al., 1997; Andrade et al., 2002; Castillo et al., 2000). Apesar da taxa elevada de pacientes com transtornos de ansiedade neste estudo, ainda assim os transtornos mais prevalentes foram os transtornos de humor. Isso pode ter ocorrido pelo fato de que os transtornos de humor podem gerar prejuízos graves, como risco de suicídio e incapacitação severa, tornando-os assim mais propensos à procura de tratamento nos serviços de saúde.

A taxa de abandono observada nesse estudo (44,5%) foi similar ao reportado pela literatura clássica sobre abandono terapêutico (Wierzbicki e Pekarik, 1993) bem como em estudos recentes nessa modalidade de atendimento (Bados et al., 2007; Lhullier, 2002). Um dos fatores que pode ter contribuído para o abandono de pacientes deste estudo é o tempo permanecido em lista de espera. A média de dias em lista de espera desta amostra foi elevada se comparado com o tempo de atendimento propriamente dito (estimado pela média de sessões realizadas), além de apresentar uma grande variabilidade (M=101,41; DP=92,72). Salinas e Gorayeb (2002) expõem a necessidade da diminuição do tempo de espera desses pacientes, visto que essa variável tem sido apontada na literatura sobre o tema como uma das causas das desistências de atendimentos em clínicas-escola (Güntert et al., 2000). Salinas e Gorayeb (2002) sugerem que essas instituições ofereçam para os pacientes outros tipos de intervenções enquanto estes se encontram na lista de espera para o atendimento, como orientações, grupos de acolhimento, grupos de pais, entre outras estratégias.

Uma limitação encontrada neste estudo foi o delineamento retrospectivo utilizado, o que impediu a possibilidade de manipulação de outras variáveis desta para pesquisa. Ainda existem poucos estudos na literatura que buscam identificar a prevalência de transtornos psicológicos e as características da população que busca atendimentos em TCC nas clínicas-escola. Para complementar os resultados encontrados neste estudo é fundamental que sejam desenvolvidas mais pesquisas acerca do tema, utilizando tanto delineamentos experimentais como amostras variadas e mais homogêneas. Identificar o perfil dos pacientes que buscam esse tipo de tratamento é fundamental para o desenvolvimento de estratégias terapêuticas para essa população, aumentando a eficácia dos tratamentos cognitivo-comportamentais e produzindo uma maior qualidade de atendimento para os pacientes nessa modalidade de terapia.

 

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Submetido: 30/05/2011
Aceito: 05/09/2011

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