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Aletheia
versão impressa ISSN 1413-0394
Aletheia no.38-39 Canoas dez. 2012
ARTIGOS TEÓRICOS
O idoso nas instituições de longa permanência: uma revisão bibliográfica
The elderly in long-stay institutions: a literature review
Ana Cláudia de Oliveira Bentes; Janari da Silva Pedroso; Carlos Alberto Batista Maciel
Universidade Federal do Pará
RESUMO
Este artigo aborda a temática do idoso nas Instituições de Longa Permanência, em face do envelhecimento bem-sucedido e da qualidade de vida. A revisão bibliográfica contempla os artigos entre o período 2006 a 2012 e um artigo de 2001. Consultaram-se as bases de dados da biblioteca virtual em saúde – União Latino-Americana de Entidades de Psicologia-Brasil. A análise identificou duas áreas temáticas de concentração dessas produções: a do idoso institucionalizado e a da família no processo de institucionalização do idoso dependente. Os resultados da revisão indicam que a institucionalização do idoso é uma questão de extenso debate, uma vez que as Instituições de Longa Permanência, por um lado, têm a função de proteger e cuidar; por outro, estabelecem uma adaptação do idoso construída em sentimentos de lembranças e de perdas ao romper com elos familiares e sociais.
Palavras-chave: Idoso, Institucionalização, Qualidade de vida.
ABSTRACT
This article addresses the subject of the elderly in Long-Stay Institutions, in regards to successfully aging and quality of life. The bibliography includes articles published between the years 2006 and 2012, and an article published in 2001; the databases from Virtual Health Library – Latin-American Union Psychology Entities – Brazil. By analyzing the articles, two areas of concentration were identified: the institutionalized elderly; and the process of institutionalization of a dependent elderly by the family. The results indicate that the institutionalization of the elderly is a matter of a broad debate since the Long-Stay Institutions, on one hand, has the function of protecting and caring, and on the other hand, of establishing an adaptation of the elderly built in feelings of memories and losses by breaking family and socialites.
Keywords: Elderly, Institutionalization, Quality of life.
Introdução
A partir dos anos 70 (século XX), com o crescimento populacional de idosos no Brasil, buscou-se uma atenção maior a esta demanda, por meio da criação de políticas públicas para a 3ª idade. Nesse mesmo período, constitui-se o Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (SINPAS), que colabora para ampliação de alguns programas voltados para o idoso, com objetivo de promover sua participação no seu meio social, e em 1994 homologa-se a Política Nacional do Idoso, Lei 8.842/94. Decorrentes destes eventos, Programas, Projetos, Serviços e Ações foram realizados em benefício do idoso (Rodrigues, 2001).
Nesse cenário, novas formas de intervenção na saúde do idoso foram desenvolvidas. Dentre elas, destacam-se os grupos de promoção da saúde, definidos como uma intervenção coletiva e interdisciplinar para o fortalecimento da autonomia, independência na realização das atividades, assim como uma melhor qualidade de vida (Tahan & Carvalho, 2010). A qualidade de vida se apresenta como um conceito dinâmico, arquitetado a partir da descrição e da interpretação das relações dialógicas do indivíduo com seu habitual social, cultural, biológico, psicológico e físico. No campo do envelhecimento está relacionada à manutenção da autonomia, isto é, à medida que o idoso mantém sua capacidade funcional, por meio de atividades de vida diária, a tendência da qualidade de vida torna-se elevada (Galisteu, Facundim, Ribeiro & Soler, 2006).
Com crescente aumento da expectativa de vida do indivíduo, observam-se também reformulações e ampliações no campo das psicologias do desenvolvimento e do envelhecimento, como o estudo da senescência na etapa do desenvolvimento, e a investigação no curso da vida com enfoque nos conceitos de plasticidade humana, multidirecionalidade, multidimensionalidade, resiliência e múltiplas trajetórias, respectivamente, que contribuem para compreensão do ser idoso (Cupertino, Rosa & Ribeiro, 2007). Por conseguinte, surgiram adjetivações sobre o envelhecimento, como saudável, ativo, robusto e bem-sucedido. Identifica-se que além da longevidade fatores individuais, sociais, ambientais, determinantes e modificadores da saúde incluem-se no conceito de envelhecimento bem-sucedido que ultrapassa a objetividade da saúde física, uma vez que é relacionado à percepção pessoal, as possibilidades de adaptação advindas da senescência e das outras condições associadas (Teixeira & Neri, 2008).
Assim, a longevidade é um fato dos tempos atuais que traz consigo a necessidade de adaptação frente às perdas que ocorrem ao longo da vida. O indivíduo é compelido a conviver com o desconhecido após longa trajetória de vida com aqueles com que mantinha laços de amizade e consanguinidade. Adequar-se à realidade da perda, na maior parte das vezes, leva o idoso a procurar as Instituições de Longa Permanência (ILPs) como nova moradia (Bessa & Silva, 2008). Em países desenvolvidos a institucionalização é uma escolha para indivíduos de idade avançada e com dificuldade de se manterem independentes ou para os que necessitam de cuidados médicos. No Brasil, os cuidados aos idosos são prestados pela família e, na falta desta, por amigos e vizinhos; contudo, por não existir programas formais vinculados ao Estado que prestem amparo a idosos que não possuem assistência da família, a institucionalização ainda é a principal opção (Camargos, Rodrigues & Machado, 2011).
As Instituições de Longa Permanência (ILPs) no Brasil, segundo Tomasini e Alves (2007), apresentam uma realidade precária, isto é, estão muito abaixo das condições mínimas para o envelhecimento bem-sucedido. Assim, à medida que as pessoas envelhecem e têm suas capacidades reduzidas à adaptação aos espaços, torna-se uma pressão maior e constante sobre seu comportamento cotidiano. Quando o idoso passa a residir nestas instituições, ele tem uma drástica redução dos ambientes físico e social. Ribeiro e Schutz (2007) pontuam que as Instituições de Longa Permanência (ILPs) são uma modalidade antiga que assiste o idoso fora do seu convívio familiar, traz isolamento, inatividade física e mental, e, por conseguinte uma redução da qualidade de vida. A institucionalização tornou-se uma realidade atual, pois acolhe uma demanda maior de idosos gerada por fatores demográficos, sociais e de saúde.
As Instituições de Longa Permanência (ILPs) apresentam caracteres residenciais destinadas ao domicílio coletivo de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, com a função de integrar a rede de assistência social à rede de assistência à saúde. São definidas como instituições originalmente relacionadas aos asilos que anteriormente atendiam a população carente que necessitava de abrigo. Geralmente são associadas a instituições de saúde, porém são estabelecimentos voltados à moradia, alimentação e vestuário, entretanto os residentes na maioria destas instituições são assistidos em serviços médicos e medicamentoso, ou seja, é uma residência coletiva, que acolhe tanto idosos independentes em situação de ausência de renda ou de família quanto aqueles com dificuldades para gerenciar suas atividades diárias, e na execução de cuidados prolongados (Camarano & Kanso, 2010).
Considera-se que a chegada do idoso nas ILPs parece exigir uma adaptação tecida pelo emaranhamento de sentimentos que produz distância e causa estranheza, que impõe o pensar em solidão, o conformismo, o abandono, assim como a segurança e o compartilhamento mesclados nas lembranças e na realidade advinda das rotinas desses residentes (Creutzberg, Gonçalves & Sobottka, 2008). Assim, o idoso nas ILPs se estabelece, na maioria das vezes, como membro de um grupo que foi privado de seus projetos por encontrar-se afastado da família, da casa, dos amigos, das relações nas quais sua história de vida foi construída. As perdas são muitas, o que justifica a grande incidência de estados depressivos, sentimentos de solidão e limitações das possibilidades de uma vida ativa. Nesse cenário, as ILPs ainda constituem um desafio, pois ao mesmo tempo em que cuidam afastam o idoso de seu convívio familiar (Marin, Miranda, Fabbri, Tinelli, & Storniolo, 2012).
Portanto, o presente artigo aborda a temática do idoso nas ILPs face o envelhecimento bem-sucedido e a qualidade de vida, a revisão bibliográfica apresentase focada especialmente em textos sobre idoso nas ILPs. Foram consultadas as bases de dados da biblioteca virtual em saúde – União Latino-Americana de Entidades de Psicologia – Brasil. A coleta de dados realizou-se a partir do ano de 2006, entretanto, inclui-se um artigo de 2001 sobre uma retrospectiva histórica da implementação da Política Nacional do Idoso. Para a seleção de artigos utilizou-se as palavras-chave: Idoso, Institucionalização, Qualidade de vida. A pesquisa bibliográfica foi estruturada na leitura como a principal técnica, teve a finalidade de identificar as informações e os dados contidos no material selecionado, e analisando-os em sua consistência. A leitura obedeceu aos seguintes passos: Leitura seletiva, procura determinar o material que de fato interessa, relacionando-o diretamente aos objetivos da pesquisa; Leitura reflexiva ou crítica, estudo crítico do material orientado por critérios determinados a partir do ponto de vista do autor da obra, e, finalmente a Leitura interpretativa, para relacionar as ideias expressas na obra com o problema para o qual se busca resposta (Lima & Mioto, 2007). A análise dos dados permitiu elaborar duas áreas temáticas: a primeira descreve a situação do idoso institucionalizado, e a segunda sobre a família no processo da institucionalização do idoso dependente.
Idoso institucionalizado
Dados do Censo de 2010 coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2012) apontam um aumento considerável da população idosa no Brasil, principalmente no que diz respeito aos idosos com idade igual ou superior a 65 anos. Os referidos dados apontam que em 1991 este grupo da sociedade representava 4,8% da população; já em 2000 essa porcentagem aumentou para 5,9% e em 2010 alcança 7,4%. Demandas pertinentes ao idoso e consequentemente ao envelhecimento passam a ser centrais de mais estudos e pesquisas.
O estudo de Batistoni e Namba (2010) descreve a idade cronológica como forma de estruturar os ciclos de vida dos indivíduos e das sociedades em fases distintas. Entretanto, existe um período de transição entre velhos modelos de envelhecer e a construção de novas possibilidades, do ponto de vista individual, que leva o indivíduo a se perceber como tendo uma idade diferente da idade real, que desvirtua, entre outros, seu nível de funcionamento e estilo de vida atual e principalmente sua maior expectativa de vida. Pensa-se que transições do curso de vida não ocorrem de forma única e uniforme, e a idade cronológica como indicador para compreensão do envelhecimento torna-se a cada momento mais complexo, a perspectiva de vida é aumentada e leva os indivíduos a uma percepção mais singular.
Entretanto, com o avançar da idade há uma maior probabilidade de problemas de saúde, dependência na realização das atividades da vida diária, assim como, isolamento e solidão, razões pelas quais Almeida e Rodrigues (2008) pontuam que 46,2% dos idosos independentes adentram as ILPs por sua própria decisão, seguindo-se por parte da família com 30,1%.Além do que Gamburgo e Monteiro (2009) pontuam sobre a mudança no perfil de idosos institucionalizados ocorrida nos últimos anos, isto é, da demanda de idosos pobres e desprovidos de família para uma hegemonia de idosos com incapacidade e dependência física ou cognitiva, morbidades crônicas não transmissíveis e a falta de acesso a serviços de saúde através de convênios de planos de saúde. Reflete-se que a internação numa ILP pode obedecer a causas de ordem individual, social, econômica, de saúde, ou a uma combinação das mesmas.
A designação Instituição de Longa Permanência (ILP) foi legitimada pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), correspondendo "Long Term Care Institution", para substituir a denominação asilo, abrigo, casa de repouso, lar, clínica geriátrica (Creutzberg et al., 2008). Desta forma, reflete-se que as ILPs carregam estereótipo de um lugar de tristeza, abandono, pobreza e decadência, de vez está associada à tentativa de solucionar a problemática das doenças, da pobreza e da mendicância, função herdada dos asilos (Ximenes & Côrte, 2007).
Há uma preocupação com os prejuízos que a institucionalização pode acarretar aos idosos, como a segregação, o tratamento igualitário e simultâneo para todos os residentes e um estado acentuado de controle, cogita-se nas políticas públicas estimular a permanência desses indivíduos junto à família (Tomasini & Alves, 2007). Todavia, estar junto à família necessariamente não significa proteção, pois a negligência e os maus-tratos físicos, psicológicos, emocionais e morais da família contra o idoso não é um fato novo (Porto & Koller, 2006). Ademais, o sentido de família para o idoso, conforme Bessa e Silva (2008), é de um lugar de proteção, aconchego e segurança. Quando a família sai de cena por conflitos ou ausência, o idoso busca adaptar-se a esta nova realidade. Muitas vezes, procura nas ILPs acolhimento e acompanhamento no seu cotidiano durante o envelhecimento. Assim sendo, a família desse idoso passa a ser a própria instituição. Não obstante, a reintegração com o outro, isto é, do longevo com a instituição, acarreta uma significativa complexidade, tendo em conta a singularidade do idoso.
Porém, se por um lado, as Instituições de Longa Permanência contribuem para o acolhimento e assistência ao idoso, por outro, pensa-se acerca de um lugar que o impossibilita de um contato social externo, que proporciona um confinamento social, que o restringe apenas a vida institucionalizada ao romper com os elos familiares e sociais. Esse rompimento, de certa forma, também se constrói na família, quando se delimita o idoso na clausura em sua residência, ou seja, o idoso pode ser no seu próprio lar alguém invisível (Araujo, Coutinho & Santos, 2006).
Neste cotidiano institucional Maia, Londero e Henz (2008) investigam sobre o tempo nas Instituições de Longa Permanência que transcorre de forma lenta. Os autores pontuam a existência de outra lógica do tempo, em que ocorre uma desaceleração, um ritmo específico em passos lentos dos internos. Estes pesquisadores comparam essa versão do tempo controlado como uma câmara lenta, funcionando por congelamento. Ressaltam a política hegemônica do tempo com a finalidade da aceleração máxima, enquanto na velhice há a predominância da desaceleração. Por sua vez, Faleiros e Morano (2009) assinalam que o habitual institucional é caracterizado pela homogeneização, isto é, por uma inalterabilidade das rotinas e no planejamento técnico com uma padronização do modo de vida, enfatizam uma fala comum do idoso o não fazer nada aqui, que implica na ausência de tempo, de espaço e do outro. Como um descompasso entre o que estava sendo realizado dentro do recinto e as atividades concretizadas fora das ILP.
O ambiente institucional, em particular as rotinas rigorosas, pouco motivam o idoso a pensar, a agir e a se comportar com perspectivas de mudanças na qualidade de vida. O perdão é adotado como estratégias de enfrentamento das dificuldades do envelhecimento e da própria institucionalização. Nesse sentido, a institucionalização é vista como um lugar propício à mágoa, enquanto o perdão é visto como uma garantia de bem estar físico e psicológico da pessoa que perdoa. A mágoa apresenta respostas fisiológicas semelhantes àquelas apresentadas em situações negativas de estresse desse idoso, ao reproduzir tais sentimentos dirigidos aos cuidadores, os idosos mostraram-se reféns de sua condição presente, considerando que o intuito de perdoar não se consolida facilmente em ação, portanto torna-se um ato complicador de ser realizado (Leime, Luna, Leite & Rique Neto, 2012).
Sobre os estereótipos negativos, Couto, Koller e Soares (2009) são de opinião que esses contribuem consideravelmente para a manutenção da percepção social negativa e homogênea que se tem acerca do idoso. O preconceito contra idosos pode implicar danos para a sua qualidade de vida, podendo também resultar em perdas para a sociedade. Para os pesquisadores, o termo ageismo, utilizado pela primeira vez em 1969 por Robert Butler, definido como uma forma de intolerância relacionada com a idade, ou seja, qualquer pessoa poderia ser alvo de discriminação pela idade que tem, destacam crianças e idosos como os grupos mais vulneráveis.
Outro ponto a ser argumentado com relação ao idoso institucionalizado, relaciona-se a linguagem como essencial para a continuidade da inserção social do sujeito em processo de envelhecimento. Gamburgo e Monteiro (2009) apontam a linguagem como atividade e instrumento de recuperação, reflexão e compreensão da memória construída socialmente, inscrita nas narrativas da história de vida de cada um. Essas autoras se referem à linguagem como um meio de constituição da memória, da subjetividade e da intersubjetividade nas experiências partilhadas, com a ausência desta o idoso institucionalizado coloca-se em situação de dependência e consequente perda da autonomia.
Destaca-se também a relação de apego do idoso nas ILPs, compreendida por um período complexo que perpassa o abandono e as perdas, gera sentimentos de insegurança e desconforto e, por conseguinte, desamparo potencializado pela distância da família e dos amigos que sempre exerceram papéis de amparo para sua vida. "O apego implica a formação de uma base segura, ou seja, de um sentimento de segurança e conforto que ocorre na presença do outro, a partir da qual o indivíduo explora o mundo" (Basso & Marin, 2010, p.92). Assim, a institucionalização é um desafio para o idoso que precisa ser mais bem entendida pelas ILPs, pela família e pelo próprio idoso, tendo em conta a instituição asilar como moradia e, portanto, o lugar de convivência desse idoso.
Ao entrevistarem dirigentes de Instituições de Longa Permanência na região metropolitana de Porto Alegre, Creutzberget al. (2008) observaram uma preocupação destes em desmistificar o caráter negativo das ILPs e colocaram à disposição da sociedade prestação de serviços, por assim dizer da própria instituição à comunidade, como: trabalhos manuais confeccionados pelos idosos, assim como empréstimos de cadeiras de rodas à comunidade. Cogita-se um movimento interno das ILPs em mudar o caráter assistencialista legado pelos primórdios dos asilos, porém há um ritmo de resistência, trata-se de uma dinâmica interna complexa em que se busca o novo, porém ainda há uma necessidade de perpetuar o antigo com retrocesso (Carvalho & Dias, 2011).
As ILPs permanecem em contraste com uma paisagem de envelhecimento bem-sucedido por representar solidão, conformismo e abandono. Ao reexaminar a vida como aquela intimamente fundada nas relações sociais, as quais se modificam na medida em que se vive mais, pode-se dizer que ser idoso atualmente contribui para desmistificar preconceitos e alterar padrões culturais. A mudança da antiga identidade do idoso institucionalizado a uma atual identificação às Instituições de Longa Permanência requisita desconstruir uma imagem caricaturada por aspectos negativos, como: a caridade, a exclusão e o abandono que caminha a passos lentos.
A família no processo da institucionalização do idoso dependente
Durante a revisão bibliográfica, identificou-se que o processo de institucionalização do idoso é entrelaçado à dinâmica da singularidade desse indivíduo. Assim, para melhor compreender o idoso institucionalizado, foram necessários outros desdobramentos, entre eles a sua relação familiar.
A dependência é resultante de um estado da perda de autonomia física, psíquica ou intelectual, que necessita da assistência de outra pessoa para realizar ações rotineiras da vida. Logo, o grau de dependência determina o tipo de cuidados necessários. Mesmo com a disposição da rede de serviços formais, a família ainda é a principal cuidadora do idoso dependente. Assim, a dependência, pode ser classificada em diferentes níveis: total, grave, moderada, ligeira e independente; o envelhecimento pode ser um fator complicador gerador de uma maior dependência e, neste sentido, a família continua a ser vista como uma instituição significativa para o suporte do idoso; porém, na maioria das vezes, causa um forte impacto na família e na sociedade, torna-se um fator desafiador tanto para o idoso como para família (Araújo, Paúl & Martins, 2011).
A dependência é reforçada como a resultante de perdas funcionais e da relação do idoso com seus parceiros sociais, influenciada por esteriótipos negativos (idoso caracterizado como fragilizado e sem autonomia), e que pode levar à perda de motivação, à solidão e ao desamparo, assim como ao déficit cognitivo e à depressão grave, isto acontece frequentemente com idosos dependentes residentes em Instituições de Longa Permanência. Esses pesquisadores afirmam que há necessidade de uma estratégia de adaptação que pode levar a um envelhecimento bem-sucedido (Coudin e Alexopoulos, 2010).
A construção do afeto, a ajuda mútua e a compreensão são aspectos essenciais para um convívio fortalecido e agradável entre o idoso e família. Contudo, se a convivência entre ambos apresentar turbulências, podem ocorrer desentendimentos e desgastes no relacionamento, assim como, a coabitação simultânea de várias gerações de uma mesma família é mesclada a diferentes visões de mundo e de valores das quais podem surgir conflitos. Portanto, o idoso por ter reduzida flexibilidade a mudanças tem dificuldades na sua adaptação a essa nova realidade de coabitar no mesmo ambiente com pessoas de gerações distintas, o que reforça a dependência do idoso à família (Leite, Battisti, Berlezi & Scheuer, 2008).
Do mesmo modo, o cuidador familiar, em decorrência da exposição prolongada aos diferentes estressores presentes na situação de cuidado, enfrenta uma situação de risco, podendo apresentar problemas de saúde semelhantes aos evidenciados pelo idoso, como: depressão, ansiedade e baixa autoestima. Residir também com o cuidador traz benefícios em um atendimento eficaz e sistemático, mas não intensificar seu papel de cuidador, ocorre uma maior exposição aos efeitos negativos dessa atividade e, consequentemente, a níveis mais elevados de tensão, que provavelmente interferem na dedicação da família para com o idoso (Fernandes & Garcia, 2009).
Em outro estudo, Salgueiro e Lopes (2010) afirmam que a família é um importante apoio ao idoso, estabelecendo-se como parceira das redes formais de apoio social, entretanto, o coabitar e o cuidar de um familiar idoso dependente gera um fator desencadeante de mudanças no sistema familiar, levando-o ao desequilíbrio. Ao analisarem o nível da adaptabilidade real da família, observaram famílias do tipo caótico e a capacidade que o sistema familiar possui para mudar em face de uma crise elevada. Esse tipo de família é considerado não funcional e passível de vir a desenvolver patologias, sobretudo se esta situação for perpetuada no tempo.
Enfatiza-se que na contradição das novas configurações familiares, frente à independência dos idosos que ao morarem sozinhos ou apenas com seus cônjuges, têm a possibilidade de redefinir sua posição e sua capacidade de negociação e participação da vida ativa das famílias. Na maioria das vezes tendem a apoiar os filhos do que o inverso, mesmo não morando no mesmo domicílio. De fato, o envelhecimento bem-sucedido permite que eles sejam fonte de apoio familiar (Teixeira & Rodrigues, 2009).
Atualmente, muitos grupos familiares expressam certa dificuldade em cuidar do idoso por morarem em lugares pequenos que comportam apenas pais e filhos, além de encargos adicionais para um cuidado adequado. Assim, a ILP surge como um lugar em que se constitui uma convivência positiva para o idoso ao oferecer um ambiente de encontro com amigos e companheiros, com pessoas que podem constituir uma nova forma de família (Porto & Koller, 2006).
Como já assinalado, a família encontra-se indisponível para atender adequadamente a demanda do idoso dependente, considerando que o envelhecimento é um fenômeno singular, complexo e atual, portanto que necessita com mais cuidado ser compartilhado pela família e a sociedade, pois na maioria das vezes a atuação da mesma restringe-se ao encaminhamento do longevo as Instituições de Longa Permanência e, nesse processo, o idoso pode encontrar um total desamparo familiar.
Considerações finais
Contextualizar o idoso institucionalizado é repensar as análises aqui colocadas e compreende-lo frente à sua própria institucionalização. Estar institucionalizado é uma questão de extenso debate, por um lado as ILPs com as funções de proteger e cuidar, por outro, o idoso frente às novas adaptações, ambos perpassam momentos de transitoriedade, que também requisitam o reconhecimento de suas demandas e necessidades.
O desgaste, as perdas e os declínios são inevitáveis e desencadeiam desafios adaptativos para o idoso, em particular quando institucionalizado nas ILPs, pois longe das rotinas habituais sente-se perdido no tempo e no espaço, entretanto, esse fenômeno pode também acontecer na sua residência junto à família.
As ILPs ainda carregam uma imagem negativa cristalizada na figura assistencialista, consequentemente, seus residentes podem internalizar essa imagem. Todavia, há um movimento gradual contrário a essa imagem, assim, a construção de um idoso institucionalizado nas ILPs precisa alcançar significados que se articulem de forma concreta e positiva desmistificando a caricatura de desprotegido.
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E-mail: an.bentes@yahoo.com.br
Recebido em dezembro de 2012
Aceito em abril de 2013
Ana Cláudia de Oliveira Bentes: Psicóloga, Especialista em Gerontologia, mestranda de Psicologia Clínica e Social da Universidade Federal do Pará.
Janari da Silva Pedroso: Psicólogo, Doutor em Ciências, professor Adjunto IV da Universidade Federal do Pará.
Carlos Alberto Batista Maciel: Assistente Social, Doutor em Sociologia, professor Adjunto IV da Universidade Federal do Pará.