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Reverso
versão impressa ISSN 0102-7395
Reverso vol.37 no.70 Belo Horizonte jun. 2015
EDITORIAL
Por que escrevemos?
Poetas, escritores, compositores, escultores, pintores – seja em verso, seja em prosa, em claves e colcheias, na matéria bruta ou em tintas sobre a superfície nua –, cada um se expressa na linguagem própria do seu ofício e se faz partilhar na emoção que desperta. Essas são formas de escrita que tocam marcas singulares, imperceptíveis mas indeléveis naqueles que delas fruem.
Se é assim, o que se pode compartilhar dessas formas de escrita? Talvez seja somente o arrepio de cada um ao se sentir tocado nas suas marcas próprias, e a percepção de que o outro – o próximo – foi tocado em si mesmo. Talvez seja esta a forma possível de compartilhar o fruir da arte: reconhecer a pura diferença entre cada sujeito e a extimidade das suas marcas singulares.
A arte visa cativar aqueles que passam à sua volta. Diferentemente da linguagem do artista, o dizer do analista não objetiva cativar o analisando, mas toca no mesmo ponto que a arte evoca. Em certa medida, o artista e o analista se assemelham porque podem evocar o desejo ao tocar no objeto a, na sua vertente de causa de desejo.
Psicanalistas escrevemos talvez porque somos tocados tanto pela vida quanto pela teoria. O sofrimento das pessoas que nos procuram produz enigmas que nos desafiam. São enigmas que nos aproximam do lugar da falta e nos levam a percorrer os corredores do edifício da psicanálise, que tem características próprias. Como é obra apoiada sobre fundações sólidas, o construto teórico psicanalítico pode ser ampliado, pois mantém abertas suas portas para que o saber possa circular e frutificar. Por se tratar de um saber que inclui um não-saber, a psicanálise possibilita diferentes olhares, saídas, escritas.
A Reverso 70 traz em suas páginas os artigos de autores instigados por temas diversos, que vão da teoria à clínica, da dança ao texto poético. E inclui a resenha da nova biografia de Freud, escrita por Elisabeth Roudinesco, que será lançada em breve no Brasil. A vida do S1 da psicanálise – Sigmund Freud – recebe uma nova versão, a partir de um novo olhar.
De Portugal recebemos um texto inovador na escrita competente e leve do psicanalista José Martinho, Ph.D em filosofia e psicologia, e presidente da Antena do Campo Freudiano. José Martinho contribui para esta edição com um artigo de peso. A ele nossos agradecimentos.
A equipe da Reverso agradece a todos os autores que nos enviaram seus artigos para publicação, privilegiando a revista e o CPMG com sua escolha. Agradece também a Thiago Mendes pela cessão da sua obra denominada O infiltrado, bonita, lúdica e desconcertante, para figurar na capa desta edição.
A citação nas páginas internas da Reverso é de Thomas Mann, escritor alemão que recebeu o prêmio Nobel de literatura em 1929. Em seu ensaio A posição de Freud na moderna história das ideias ele presta homenagem ao criador da psicanálise. A citação consta na página 176 do livro Freud com os escritores.1 Dessa mesma obra se extrai o dizer:
Se o pensamento freudiano subsiste como obra, é pela força de suas descobertas intelectuais e por habitar poeticamente a língua (MANGO; PONTALIS, 2013, p. 23).
De volta ao começo, pode-se atrever a concluir que aquilo que a vida toca no fazer e no fruir da arte também toca na psicanálise. Vale sempre lembrar que o fazer psicanalítico possibilita que cada um encontre a saída pessoal mais estética para fruir da vida com maior leveza. 8
Olímpia Helena Costa Couto
Editora