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Acta Comportamentalia

 ISSN 0188-8145

Acta comport. vol.19 no.1 Guadalajara  2011

 

 

Efeitos de atraso e tarefa na resolução de problemas matemáticos em crianças com e sem TDAH

 

Effects of task and delay in solving mathematical problems in children with and without ADHD

 

 

Renata Limongi França Coelho Silva1, I ; Cristiano Coelho2, II; André Vasconcelos Da Silva3, III

I Centro de Educacional de Catalão
II Instituto de Ensino Superior de Brasília
III Universidade Federal de Goiás

 

 


RESUMO

Na análise do comportamento, situações de autocontrole/impulsividade têm sido estudadas por meio de situações de escolha com alternativas que diferem em atraso e magnitude do reforço. Oito crianças foram alocadas em um grupo "com TDAH" e seis em um grupo "sem TDAH". Posteriormente essas crianças foram submetidas a cinco sessões experimentais de resolução de contas de adição e subtração que poderiam ser realizadas conforme uma de duas tarefas. Como em outros estudos sobre os efeitos do atraso em situações de escolha com humanos, a proporção de escolha entre as tarefas não variou sistematicamente com a manipulação do atraso. Por outro lado, para o grupo "com TDAH", observaram-se maiores flutuações na preferência entre as alternativas ao longo das sessões experimentais. Os presentes resultados indicam os cuidados necessários para se afirmar que o TDAH envolve autocontrole quando se utiliza escolhas com atraso, além de discutir os problemas em se utilizar este modelo.

Palavras chave: Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), autocontrole, atraso, escolha, reforço.


ABSTRACT

Attention deficit Hiperactivity Disorder (ADHD) has been related to self-control. In the present study, eight children were allocated to an "ADHD" group, while other six children were allocated to a "non ADHD" group. They were then submitted to fi ve experimental sessions in which they had to solve math problems, according to one of two tasks. As in other studies with humans about effects of delay on choice, relative choice did not vary systematically with delay. Moreover, for the "ADHD" group, there were more fluctuations in preference between alternatives. The present results suggest caution in declaring that ADHD involves selfcontrol when delayed choice is used and open a discussion about the problems involved in using this model.

Keywords: Attention deficit Hiperactivity Disorder (ADHD), self-control, delay, choice, reinforcement


 

 

O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é considerado um dos transtornos psiquiátricos mais comuns da infância e adolescência, causando prejuízos em múltiplas áreas: escolar, social e pessoal (Araújo, 2002; Rohde, Dorneles & Costa, 2006).

Devido à alta incidência desse transtorno (Ribeiro, 2005; Rohde & cols, 2003) muitos profissionais, dentre eles pediatras, psicólogos, neuropediatras e psiquiatras têm desenvolvido estudos sobre o assunto, visando uma definição mais objetiva e formas mais específicas de avaliação. O diagnóstico mais utilizado por esses profissionais baseia-se nos critérios do DSM-IV (APA, 2003) que divide o transtorno em três formas distintas: com predomínio de desatenção, com predomínio de hiperatividade/impulsividade ou a combinação de ambos, sendo que seis ou mais sintomas devem persistir por no mínimo seis meses.

Assim que o diagnóstico é realizado, o tratamento é proposto, podendo incluir terapia e medicação. A terapia comportamental é uma das mais utilizadas por envolver estratégias que auxiliam o paciente a controlar a impulsividade e hiperatividade (Knapp, Rohde, Lyszkowski & Johannpeter, 2002; Mattos, 2005). Dentre as técnicas propostas têm-se aquelas relacionadas ao autocontrole, uma vez que o TDAH é considerado por Barkley (2002) um transtorno do desenvolvimento relacionado ao autocontrole ou ao controle inibitório dos impulsos. Apesar de baseados em modelos teóricos distintos, dois paradigmas experimentais são bastante utilizados no estudo de autocontrole: o de Rachlin (1970) e o de Mischel (Mischel, Shoda & Rodriguez, 1989) que propuseram modelos que envolvem conseqüências atrasadas e magnitudes diferentes que podem contribuir para uma compreensão das possíveis relações entre TDAH e autocontrole.

Tendo em vista a definição de Barkley (2002), na qual o TDAH é definido como um transtorno de desenvolvimento do autocontrole, torna-se importante citar algumas definições de autocontrole, no senso comum e na análise do comportamento, neste último caso centrando-se nos dois paradigmas citados: de autocontrole de Rachlin (1970) e de atraso de gratificações de Mischel (Mischel, Shoda & Rodriguez, 1989), os quais foram tomados no presente trabalho por enfatizarem o atraso das conseqüências ou recompensas.

O termo autocontrole é muito utilizado, tanto no senso comum quanto na análise experimental do comportamento, porém com significados distintos. De acordo com o senso comum autocontrole representa a capacidade de cada indivíduo de manter o equilíbrio emocional, interior, controlar sensações e sentimentos, ser seguro de si e de suas escolhas, dominar impulsos, ou seja, ter autodomínio (Ferreira, 2004).

Skinner (1953/1993) ao utilizar autocontrole refere-se às modificações realizadas pelo próprio indivíduo em seu ambiente a fim de controlar melhor seu próprio comportamento. Essas modificações podem ocorrer diante de diversas situações, inclusive aquelas que possam ser desagradáveis ou confl itantes para o sujeito, sempre visando melhorar o ambiente. Skinner aponta ainda que a resposta controladora interfere nas variáveis que estão relacionadas à probabilidade da resposta controlada, ou seja, diminui a probabilidade da resposta controlada de diferentes formas, como mudança de estímulo, coerção, entre outras.

Paradigma de autocontrole de Rachlin. Para Rachlin, autocontrole pode ser definido como um tipo de comportamento de escolha que pode ser controlado por duas variáveis determinantes: atraso e magnitude do reforço. Descreve então um modelo de escolha no qual relaciona impulsividade com a escolha de um reforçador imediato de menor magnitude e autocontrole com a escolha do reforço com maior atraso e maior magnitude (Hanna & Todorov, 2002; Logue, 1988; Rachlin & Green, 1972).

Ao descrever autocontrole e impulsividade, Rachlin (1970/ 2000) destaca que ambos são comportamentos que podem ser influenciados pelo ambiente e essas influências podem ser identificadas em situações que envolvem magnitude, atraso, qualidade e freqüência do reforço, além de outros fatores. O estudo clássico que merece destaque foi realizado por Rachlin e Green (1972) e utilizou esquemas concorrentes encadeados e teve como sujeitos pombos, em um procedimento conhecido por commitment (comprometimento) que possuía duas etapas. Na primeira, os pombos tinham duas alternativas de respostas, A e B, sendo que ambas levavam a segunda etapa. Caso escolhessem a alternativa A, tinham acesso a condições de estímulo para R1 e R2, sendo que em R1 a quantidade de alimento a que tinham acesso era menor e em R2 a quantidade de alimento era maior, porém após maior período de atraso. Se escolhessem a alternativa B, as condições de estímulo permaneciam presentes apenas para R2. O paradigma de Rachlin é confirmado em estudos à medida que demonstra o quanto a preferência pode ser influenciada por fatores ambientais, ampliando assim sua utilidade na Análise Experimental do Comportamento (Hanna & Todorov, 2002).

Paradigma de atraso de Gratificação de Mischel. Apesar de envolver escolhas, mas com tarefas diferentes das utilizadas em estudos que adotaram o paradigma de Rachlin, o modelo de Mischel investiga as variáveis que interferem no tempo que o indivíduo consegue esperar no paradigma do atraso de gratificações. O paradigma leva, ainda, em consideração aspectos cognitivos, o que leva a entender o termo autocontrole como o adiamento da gratificação imediata e persistência do comportamento direcionado para o alvo em decorrência de conseqüências atrasadas (Mischel, Shoda & Rodriguez, 1989).

Mischel e seu grupo realizaram várias pesquisas utilizando esse paradigma e em uma delas o procedimento utilizado envolveu instruir a criança a ficar em uma sala sozinha, esperando que o experimentador retornasse. Caso a criança conseguisse esperar, teria acesso a uma recompensa maior preferida, mas se tocasse a campainha, o experimentador retornaria à sala antecipadamente e a criança receberia a recompensa preterida (ou menos preferida) (Mischel, Ebbensen & Zeiss, 1972; Mischel, Shoda & Rodriguez, 1989).

Como visava investigar as representações mentais das crianças, as instruções utilizadas por Mischel visavam verificar aspectos cognitivos. Em uma delas solicitava-se que os participantes pensassem nas recompensas de duas maneiras: quente, quando a considerassem estimulante, e frio quando o foco estava em aspectos abstratos, simbólicos, observando-se que as crianças que mantinham pensamentos quentes esperavam menos que as demais (Mischel & Baker, 1975; Mischel, Shoda & Rodriguez, 1989).

O modelo de Mischel possuía as seguintes características: os participantes eram submetidos a apenas uma tentativa, as contingências de espera pelo reforço de maior magnitude podiam ser interrompidas a qualquer momento pelo sujeito e a comparação de diferentes grupos proporcionava a medida do efeito da variável independente (Hanna & Todorov, 2002).

Estudos empíricos. Hanna e Ribeiro (2005) observaram que os estudos que se referem ao autocontrole geralmente são feitos com participantes que apresentam algum tipo de problema de comportamento, como por exemplo, crianças com TDAH e autistas, pois esses costumam apresentar comportamentos mantidos por reforços imediatos e agressividade e os programas aos quais são submetidos aumentam a qualidade de vida dos mesmos. Em casos específicos de sujeitos com TDAH destacam-se características que envolvem a diminuição da capacidade do controle que pode ser identificada na dificuldade de engajamento em tarefas que necessitam de um tempo maior para se realizar.

Neef e seu grupo realizaram várias pesquisas a fim de verificar a influência de diversos aspectos como esforço exigido pela tarefa, preferência e qualidade do reforço em crianças que apresentavam algum tipo de diagnóstico, como impulsividade/hiperatividade ou transtornos emocionais. Um dos estudos (Neef e cols., 2005) comparou doze crianças com diagnóstico de TDAH (divididas em grupo com medicação e sem medicação) com cinco crianças sem TDAH. O critério para escolhas dos participantes, de maneira geral,consistiu em ter consentimento dos pais ou responsáveis e concordar em participar das sessões; de maneira específica: para as crianças com TDAH, receber o diagnóstico de hiperatividade/impulsividade e ter conhecimento básico de habilidades matemática; para as crianças sem TDAH, não ter o diagnóstico positivado.

Todas as sessões utilizavam um laptop com um programa que possibilitava selecionar as especificações de dois conjuntos de problemas matemáticos que podiam ser selecionados pelos estudantes com o mouse. As especificações do programa eram compostas por: tipo de operação – adição, subtração, multiplicação ou divisão; nível de dificuldade dos problemas, esquema de reforço (VI 30 s, VI 60 s e VI 90 s) e hierarquia de preferência, sendo que este envolvia prêmios como pequenos brinquedos, lanches, cupons de tempo extra em atividades de preferência. O programa registrava cada conjunto de problemas, número de pontos obtidos, número de tentativas para resolver cada problema, número de acertos, número de erros e tempo acumulado em cada conjunto de problemas.

As sessões foram realizadas em períodos de três a cinco dias, sendo uma ou duas sessões por dia, com 5 minutos de sessão de prática, seguida por 10 minutos de teste, sendo que o estudante deveria selecionar o conjunto de problemas com o mouse, como mencionado anteriormente. Os resultados foram comparados levando-se em consideração crianças com TDAH que recebiam medicação, crianças com TDAH que não recebiam medicação e crianças sem TDAH. As crianças com TDAH, independentemente da medicação, foram mais influenciadas pelo reforço imediato, enquanto as crianças do grupo sem TDAH foram mais influenciadas pela qualidade de reforço (Neef e cols, 2005).

Neef, Mace e Shade (1993) realizaram dois estudos experimentais para investigar o autocontrole e a impulsividade em situações de escolha, com dois estudantes diagnosticados com problemas emocionais e comportamentais severos. No Estudo I, foi examinada a interação entre razões de reforçamento (igual e diferente) e o atraso ao reforço, ambos em sessões de problemas matemáticos conduzidos em uma pequena sala na própria escola dos participantes. Os alunos foram submetidos a testes de matemática e as sessões experimentais variavam entre três e cinco por semana, sendo cada uma com duração de 10 min, nas quais dois conjuntos com problemas idênticos eram disponibilizados (verde e amarelo).

Durante a execução da tarefa o estudante poderia errar ou acertar a tarefa proposta. Caso a resposta estivesse correta, o reforço (moedas) era disponibilizado em intervalos variados concorrentes (VI 60 s e VI 120 s para um participante e VI 30 s e VI 120 s para outro participante), mas se a resposta estivesse errada, um X era marcado no cartão pelo experimentador. No Experimento II, o método foi igual ao do Experimento I, porém o atraso e o acesso ao reforço e a qualidade do reforço associada ao esquema concorrente variava de acordo com a condição experimental em vigor.

Os resultados do primeiro experimento foram semelhantes aos do segundo, demonstrando impulsividade quando a alternativa de resposta era associada a atrasos diferentes para o acesso ao reforço, sugerindo então análises funcionais mais detalhadas para o tipo de contingência reforçadora que mantém o comportamento, pois isso permitiria avaliar a sensibilidade individual em diferentes dimensões de reforço.

Neef e Lutz (2001) realizaram um experimento utilizando computador para avaliar respostas diferenciais para reforço, razão, qualidade, atraso e esforço de respostas em efeito de escolhas em 11 crianças com problemas emocionais e comportamentais. O experimento era composto por seis sessões experimentais, na qual o estudante poderia escolher entre sucessivos pares de problemas matemáticos ao tocar a tela e em seguida selecionava o problema que era mostrado individualmente na tela. Quanto aos novos problemas, apareciam na tela nas seguintes situações: quando a resposta dada estava correta, quando o participante respondia de forma incorreta por três vezes consecutivas ou quando não tinha a iniciativa de responder por 10 s. Como resultado observou-se que a escolha de cada estudante foi diferencialmente influenciada por um ou mais reforços ou dimensões de respostas, devido a dimensões individuais, porém as crianças diagnosticadas com TDAH mostraram respostas diferenciais para os reforços imediatos.

Outro estudo de Neef, Bicard e Endo (2001) teve como participantes três crianças diagnosticadas com TDAH e avaliou a combinação da manipulação de dimensões de reforço e atraso para promover o desenvolvimento do auto-controle. O estudo foi conduzido de três a cinco dias por semana e o procedimento utilizado continha 5 min de sessão prática seguido por 10 min de teste em um computador com software que mostrava cores diferentes de problemas, itens que poderiam ser comprados na loja com os pontos ganhos nas sessões e relógio com o tempo gasto para resolver os problemas. Durante as sessões o participante poderia acertar ou errar o problema disponibilizado na tela. Caso acertasse a resposta ou caso o tempo passasse antes de o estudante colocar a resposta na tela apareciam dois novos problemas, mas se errasse a resposta aparecia na tela tente novamente e o mesmo problema era repetido. Esse estudo trabalhou com razão, qualidade, imediaticidade e esforço, sendo que a variável dependente era representada pela porcentagem de tempo dispensado no respectivo conjunto de problemas. O resultado demonstrou que a escolha dos três estudantes foi mais influenciada pela imediaticidade do reforço, refl etindo impulsividade, e quando feito o treino de autocontrole o reforço imediato competia com outras dimensões: alta razão e qualidade do reforço.

Ribeiro (2005) expôs 32 crianças (16 que atenderam aos critérios diagnósticos de TDAH e 16 que não atenderam àqueles critérios) a um procedimento de escolha entre duas alternativas no qual uma das alternativas apresentava uma quantia fixa de R$1000,00 a ser recebida com atraso (Exp. 1) ou probabilidade (Exp. 2) e a outra apresentava uma quantia imediata que era aumentada ou diminuída a cada tentativa. Um dos objetivos da autora foi comparar a taxa de desconto entre crianças com e sem TDAH de quantias atrasadas ou prováveis. No Experimento 1, os atrasos foram manipulados de 1 dia a 2 anos em cinco condições. No Experimento 2, foram utilizadas porcentagens que variaram de 10% a 90%. A autora observou que a taxa de desconto das crianças com TDAH foi maior com atraso, mas ambos os grupos foram semelhantes no Experimento 2 com probabilidade, dado que foi interpretado como função do controle exercido por uma roleta inserida após a escolha da alternativa com ganho provável.

Por meio dos estudos citados é possível perceber que enquanto os indivíduos com diagnóstico de TDAH tendem a escolher pela imediaticidade do reforço, o que se define como impulsividade, os indivíduos sem diagnóstico de TDAH, possuem uma escolha variada, com alguns preferindo a alternativa mais atrasada com maior magnitude ou qualidade, e alguns preferindo a alternativa mais imediata.

Tendo em vista a importância de pesquisas que avaliem as condições que favorecem a aprendizagem de sujeitos diagnosticados com TDAH, o presente estudo justifica-se por observar que a preferência por alternativas menos atrasadas com apenas um par de VI ou de atraso não garante o mesmo padrão para outros pares. Assim, uma preferência por uma alternativa menos atrasada (ou com menor VI) que é interpretada como impulsividade não garante que essa preferência seja observada com outros pares de atrasos (ou VIs). Dessa forma é possível se avaliar que, se a criança com TDAH é mais "impulsiva" deve então ter mais sensibilidade à variação do atraso. Além disso, diante dos dados sobre os efeitos de esforço (ou dificuldade da tarefa), uma tarefa "mais divertida" poderia levar ao aumento da escolha pela alternativa mais atrasada. Objetiva-se, portanto, investigar o efeito do tipo de tarefa na resolução de problemas matemáticos e verificar os efeitos do atraso na preferência pelas diferentes tarefas, por meio de uma manipulação paramétrica dos valores dos atrasos de reforços.

Para tanto participaram dois grupos de crianças, para os quais aplicou-se o Teste de Matrizes Progressivas Coloridas de Raven- Escala Especial (Angelini & cols, 1999), para avaliar a inteligência e assim excluir qualquer tipo de transtorno que pudesse ser confundido com TDAH; a Escala de TDAH (Benczik, 2000), que foi entregue aos professores e que juntamente com a entrevista realizada com os pais confirmaria o diagnóstico de TDAH, destacando que de acordo com o DSM IV (APA, 2003) para receber o diagnóstico os comportamentos de quem possui o transtorno devem ser observados em no mínimo dois lugares diferentes (casa e escola).

 

MÉTODO

Participantes

Participaram do estudo 14 crianças, matriculadas em escolas particulares de Goiânia- Goiás, com idades variando entre 7 e 11 anos, sendo que oito atenderam aos critérios de TDAH (transtorno de Déficit de atenção e hiperatividade), de acordo com a escala de TDAH de Benczik (2000), preenchida por uma professora responsável, e confirmados através de uma entrevista realizada com os pais sobre a ocorrência dos comportamentos mencionados no transtorno e descritos no DSM IV (APA, 2003).

Os critérios que permitiram a inclusão do participante no estudo foram: (a) possuir habilidades matemáticas básicas (reconhecer números de zero a nove e resolver operações de adição e subtração envolvendo números de zero a nove), (b) apresentar resultados superiores a 60 no item Déficit de atenção e superiores a 45 no item hiperatividade, respectivamente, na Escala de TDAH (Benczik, 2000), no caso de crianças com TDAH, (c) apresentar resultados abaixo de 60 nos itens Déficit de atenção e hiperatividade na Escala de TDAH (Benczik, 2000), no caso do grupo sem TDAH, (d) apresentar percentil superior a 26 no Teste Matrizes Progressivas Coloridas de Raven – Escala Especial (Angelini & cols., 1999), (e) apresentar o termo de consentimento devidamente preenchido pelos pais ou responsáveis.

Local

A coleta de dados foi realizada em cada uma das duas escolas que permitiram a realização do estudo, denominadas de Escola A e Escola B. Em ambas as escolas o local utilizado era bem ventilado e iluminado artificialmente. Na escola A, participaram dez crianças e a sala cedida correspondia à coordenação que possuía: mesa, mesa pequena para as crianças, dois armários, janela com persiana. Já na escola B, participaram quatro crianças e a sala era a que os próprios alunos utilizavam durante a aula e possuía dez mesas pequenas, quadro negro, janela, ventilador, um armário de metal.

As duas escolas mencionadas garantiram a privacidade dos participantes e da pesquisadora durante o experimento, e apesar do barulho externo, referente à movimentação dos alunos, esse aparentemente não interferiu na tarefa. A visualização dos reforçadores foi garantida, pois a disposição do notebook e dos reforçadores foi a mesma em ambas as escolas, sendo que em uma das mesas da sala ficava o notebook e em outra mesa foram disponibilizados os reforçadores de forma que os participantes pudessem visualizar o conteúdo assim que entrassem na sala.

Material e Equipamento

Para esse estudo foram utilizados: mesas, cadeiras, oito recipientes plásticos quadrados que armazenaram os reforços utilizados (balas, chocolates, carrinhos, adesivos, borrachas, prendedores de cabelo, lápis, canetas coloridas, chaveiros) e um notebook.

O notebook estava acompanhado por um mouse de duas teclas e um software, denominado Escolha Matemática, desenvolvido especificamente para o experimento. Usando-se o software foram programados diferentes problemas matemáticos envolvendo adição e subtração. O software permitia o registro de: nome do participante, nome do experimentador, data da sessão, nome do protocolo, instruções, atrasos em cada alternativa, número de repetições permitidas por operação, timeout, programação de escolhas forçadas e de diferentes critérios de encerramento, exibição de contadores na tela, reforçadores para troca, registro do horário final da sessão, respostas em cada alternativa, latência média de escolha e reforçadores trocados por pontos.

Procedimento

Inicialmente foram contactacdas as diretorias das escolas para verificar a possibilidade de realizar a pesquisa, explicando detalhadamente todo o processo e relevância do assunto. Após os devidos esclarecimentos os termos de consentimento foram entregues para que os pais preenchessem e o professor responsável por cada aluno recebeu a Escala de TDAH (Benczik, 2000), que foi preenchida de acordo com a observação do mesmo.

Antes de iniciar o experimento todos os participantes foram submetidos ao Teste Matrizes Progressivas Coloridas de Raven – Escala Especial (Angelini & cols., 1999), para garantir o diagnóstico diferencial e posteriormente iniciaram-se os encontros para coletas de dados.

O primeiro encontro foi dividido em três momentos, o primeiro para a avaliação de conhecimentos considerados básicos na pesquisa, operações de soma e subtração; o segundo, com duração média de 10 min, realizado no próprio notebook e com o objetivo de familiarizar os participantes com a tarefa e com o uso do mouse; o terceiro momento compreendeu a primeira sessão experimental.

Após o segundo momento do primeiro encontro o participante recebia uma instrução geral, escrita na tela do computador, que explicava como deveria se comportar na situação experimental. A explicação indicava que a criança participaria de um jogo que envolveria problemas de adição e subtração e que o objetivo era ganhar o maior número de pontos possíveis, sendo que cada resposta correta equivaleria a um ponto. Todos os pontos podiam ser trocados ao final da sessão por itens que estavam dispostos em recipientes transparentes que possibilitavam a visualização de seu conteúdo. Todas as sessões experimentais foram individuais e com a presença do experimentador, sendo que participante e experimentador não poderiam conversar.

Cada sessão experimental era composta por três elos: elo inicial, elo secundário e elo final. No elo inicial aparecia uma tela com uma pergunta na parte superior, como por exemplo: "Quais números que somados resultam em 9?" e logo abaixo dois estímulos semelhantes a um quadrado, sendo um na lateral esquerda, com fundo azul e nuvens e outro na lateral direita, apenas com a cor branca. Embaixo de cada quadrado havia o registro do número de pontos obtidos em cada escolha (retângulo do lado direito e retângulo do lado esquerdo).

Ao tocar em A ou em B, iniciava-se o elo secundário. Caso escolhesse a letra A, era apresentada uma segunda tela com números coloridos que se movimentavam na tela do notebook sem parar, caindo da parte superior à inferior. Havia uma música de fundo e os cliques sobre os números produziam um feedback sonoro. A criança deveria clicar em dois números que somados ou subtraídos, formavam o resultado solicitado no elo inicial. Após clicar em determinado número este ficava parado e os outros continuavam se movendo até que dois números fossem escolhidos. A alternativa A foi chamada de composição livre.

Se a escolha fosse pela letra B na tela apareciam operações "formais" pré-estabelecidas como: 5 e 5, 8 e 4, 3 e 3. Aqui a criança deveria apenas clicar em cima da opção que julgasse correta. A alternativa B foi chamada de composição fixa (formal).

O elo final tinha início com o atraso, conforme discriminado na Tabela 1. Na primeira sessão experimental caso o participante clicasse na opção A (quadrado com nuvens) ou B (quadrado em branco), teria o atraso no reforço de 30 s em qualquer uma das opções (A e B). Na segunda sessão o atraso foi de 60 s, caso clicasse na opção A, e de 1 s, caso clicasse na opção B. Na sessão três o atraso foi de 1 s quando a opção A era escolhida e 60 s quando a opção B era escolhida. Na quarta sessão o atraso foi de 45 s em A e 15 s em B e na última sessão (quinta), o atraso foi de 15 s em A e 45 s em B.

 

 

Enquanto o participante aguardava o atraso, a tela ficava branca, independentemente da escolha do participante ter sido em A ou B. Após o atraso no quadrado A ou B, quando a resposta estava errada era utilizado um procedimento de correção, de forma que na próxima tentativa era apresentado o mesmo problema. Nesse caso o participante era exposto no máximo a três tentativas com a apresentação de um mesmo estímulo-problema. Quando a resposta estava correta, aparecia na tela a palavra CORRETO e pessoas coloridas mexendo os braços, além do som de aplausos, quando a escolha havia sido pelo quadrado A e a palavra CORRETO em uma tela branca, com o som de um bipe, quando a escolha havia sido pelo quadrado B.

Para garantir que o sujeito tivesse contato com as duas alternativas (A e B) e a partir daí emitisse suas respostas, nos primeiros quatro problemas as escolhas eram forçadas, ou seja, duas vezes a opção A e duas vezes a opção B, em ordem aleatória e sinalizados.

O encerramento de cada sessão ocorria de três formas e em todas elas apareciam na tela do computador as palavras FIM DA SESSÃO: a) Quando 18 equações eram realizadas, b) Quando havia dez erros ou c) Quando o tempo despendido atingia 20 min.

Após um clique com o mouse na tela ilustrada acima o participante tinha acesso à lista de reforçadores com os respectivos valores e o total de pontos obtidos e a troca dos reforçadores era efetuada.

 

Resultados

Para investigar os objetivos do presente estudo foi aplicada a escala de Benczik (2000) e o Teste Matrizes Progressivas Coloridas de Raven - Escala Especial (Angelini & cols., 1999) em 14 crianças, as quais foram separadas em dois grupos denominados com TDAH e sem TDAH conforme a pontuação na escala (ver Tabela 2), além da entrevista realizada com os pais para confirmar o diagnóstico conforme Tabela 3. Poste riormente todos os participantes foram submetidos a um procedimento de escolha entre diferentes tarefas de resolução de problemas matemáticos com atraso do reforço. Abaixo serão apresentados os dados referentes à proporção de escolha por A (esc.A/(esc.A+esc.B)), razão de escolha por A (esc.A/esc.B), latência ((lat.A/ esc.A)/(lat.A/esc.A)+(lat.B/esc.B)) e porcentagem de acertos para os dados de todos os participantes e para os dados de grupo (acert.Ax100/esc.A), separadamente para os participantes com e sem TDAH.

 

 

 

A Figura 1 apresenta dados dos seis participantes do grupo sem TDAH referente à proporção de escolha por A, por condição. Dois participantes (S2 e S5) obtiveram proporção de escolha por A maior que 0.5 em todas as condições.

 

 

 

O participante S6 apresenta pequenas quedas na proporção de escolha por A da condição 60/1 para a 1/60. Já o participante S1 mostrou queda na proporção de esolhas em A na condição 30/30 em relação às demais condições e proporções mais altas para as condições 15/45 e 1/60 em comparação às condições 60/1 e 45/15, enquanto o participante S3 obteve aumento na proporção de respostas. A média do grupo mostra que apesar de algumas diferenças entre os participantes, a proporção de escolha por A variou em torno de 50% para todas as condições.

 

A Figura 2 apresenta a proporção de escolha por A dos oito participantes do grupo com TDAH. A proporção em A ficou acima de 0,6 para dois participantes (S12, S14) e abaixo de 0,5 para outros quatro participantes (S4, S8, S9 e S11) independentes dos atrasos de reforços programados. O participante S10 apresentou resultados que ora se elevavam acima de 0,5, como nas condições 30/30 e 60/1, ora ficavam abaixo deste valor, contudo, sem relação com a diminuição do atraso relativo em A. Os dados de grupo variaram assistematicamente em torno de 0,5.

 

 

Ao se comparar os grupos sem TDAH e com TDAH, observa-se que a alternativa A foi preferida à alternativa B. Contudo, houve variações em ambos os grupos na preferência pela alternativa A. Esta variação foi maior para o grupo com TDAH. Além disso, essas variações foram assistemáticas em relação à manipulação do atraso para a maioria dos participantes. A Figura 3 apresenta dados de latência de resposta de escolha por A relativamente à latência na escolha por B dos seis participantes sem TDAH. A latência relativa em A para cinco participantes (S1, S3, S5, S6 e S7) em todas as condições ficou acima de 0,5. Deste conjunto de dados excetua-se o dado do participante S3 na condição 30/30. O participante S2 apresentou latência relativa abaixo de 0,4. Estes dados indicam que a latência de escolha por A foi maior que a latência de escolha por B na maioria das condições, como observado para os dados de grupo. Além disso, esta medida não variou sistematicamente com a manipulação dos atrasos.

Os gráficos apresentados na Figura 4 apresentam a latência relativa em A para os participantes do grupo com TDAH. Dois participantes (S12 e S14) obtiveram latência relativa inferior a 0,5 e cinco participantes (S4, S8, S9, S11, S13) obtiveram latência relativa em A superior a 0,5 em todas as condições. O participante S10 apresentou resultados que variaram entre 0,1 e 0,6. Destes dados, para três participantes (S8, S12 e S14) observou-se uma tendência decrescente na latência relativa com a diminuição do atraso relativo em A.

 

 

Analisando em conjunto os dados dos dois grupos verifica-se que a latência em A foi mais alta que a latência na escolha por B para a maioria dos participantes e na maior parte das condições. A variabilidade dos dados dos participantes do grupo com TDAH foi maior que entre o grupo sem TDAH.

A Figura 5 apresenta os resultados obtidos dos seis participantes do grupo sem TDAH, referentes à percentagem de acertos em A. Os seis participantes obtiveram porcentagem de acerto superior a 50% em todas as condições, excetuando os dados dos participantes S3 e S7 na condição 30/30. Observa-se que cinco participantes, S1, S2, S3, S6 e S7 obtiveram menor porcentagem de acertos nesta condição em relação às demais. A média do grupo ilustra a tendência dos participantes de alta porcentagem de acertos em quatro condições, com uma diminuição na condição 30/30 em relação à porcentagem de acerto nas demais condições.

 

 

A Figura 6 apresenta os dados sobre a percentagem de acertos em A para os participantes do grupo com TDAH. Dos oito participantes, dois (S9 e S10) obtiveram porcentagem acima de 50% e três (S4, S11 e S12) obtiveram porcentagem acima de 20% em todas as condições. Padrões variáveis de acertos foram encontrados para um mesmo participante em diferentes condições e entre diferentes participantes. Os participantes S8, S13 e S14 apresentaram porcentagem zero em pelo menos uma condição, sendo que o S13 e S14 apresentaram porcentagem zero na condição 30/30. Ao compararmos o grupo com TDAH e sem TDAH é possível observar que existe maior variação na percentagem de acertos em A, ou seja, na situação em que na tela os números se movimentavam.

 

 

Há diferença entre os dois grupos com relação à porcentagem de acertos em A, com os participantes do grupo sem TDAH apresentando maiores porcentagens de acertos que os participantes do grupo com TDAH. A mesma tendência pode ser observada analisando-se a porcentagem de acertos em B.

 

DISCUSSÃO

O trabalho em questão objetivou investigar a influência da tarefa na resolução de problemas matemáticos e verificar as conseqüências do atraso na escolha de diferentes tarefas e para tanto, houve a manipulação de valores dos atrasos dos reforços nas duas situações utilizadas (A e B).

O estudo realizado teve como participantes crianças de duas escolas particulares de Goiânia, que ao serem selecionadas foram submetidas ao Teste de Matrizes Progressivas de Raven (Angelini & cols, 1999) e preencheram um protocolo com operações matemáticas de adição e subtração com números de 0 a 9. Como o teste apenas traçava o diagnóstico diferencial, eliminando a possibilidade de o participante possuir algum transtorno que pudesse ser confundido com TDAH e o protocolo certificava o reconhecimento de números e o conhecimento de operações matemáticas simples, foi solicitado que os professores preenchessem a Escala de TDAH (Benczik, 2000) e uma entrevista posterior foi realizada com os pais.

O procedimento adotado foi importante para distinguir o grupo sem TDAH do grupo com TDAH e assim avaliar de forma adequada os resultados obtidos na pesquisa, ressaltando que os critérios para diagnóstico de TDAH levados em consideração basearam-se no DSM IV (APA, 2003), por padronizar os sintomas característicos do transtorno. Observou-se que esses critérios diagnósticos precisam ser reavaliados, em concordância com autores como Hayes e Follete (1992), que sugerem que novos manuais, com classificações funcionais, sejam utilizados, o que favoreceria avaliar as relações que exercem controle sobre o comportamento de cada indivíduo.

Após a organização dos participantes em um dos dois grupos, grupo com TDAH e grupo sem TDAH, as sessões foram organizadas, totalizando cinco com duração média de 30 min e atraso médio de 30 s. O conteúdo das sessões, operações matemáticas, foi escolhido na intenção de compreender que situação propicia a aprendizagem, a considerada divertida ou a considerada formal. Dentre as pesquisas relacionadas a aprendizagem poucos trabalhos envolviam matemática, inclusive Carmo e Prado (2004) levando em consideração a grade escolar investigaram quais as disciplinas levam a reprovação dos alunos, e a matemática apareceu como a matéria considerada mais difícil pelos estudantes e com maior índice de reprovação. A par dessa informação buscou-se então estudar que situação pode influenciar a aprendizagem do conteúdo matemático.

No caso de pessoas com TDAH, observa-se ainda, que a dificuldade não se restringe a conteúdos da disciplina matemática, mas se estende às demais matérias escolares, pois estas têm apresentado, independente da faixa etária, baixo rendimento escolar (Andrade, 2003; Mattos, 2005), possibilitando concluir que o Déficit de atenção e hiperatividade pode gerar dificuldades na aprendizagem de várias matérias, inclusive matemática.

Os resultados obtidos demonstraram variabilidade tanto entre grupos quanto intra grupos, ou seja, os participantes foram influenciados por diferenças individuais, porém com tendência de escolha por situações que envolviam mais cor e movimento.

Outros estudos que avaliaram pessoas com TDAH observaram também que a escolha é influenciada diferencialmente por um ou mais reforço ou dimensões de respostas e relativas a dimensões variadas de um indivíduo para o outro (Neef & Lutz, 2001).

A análise de igualação foi impedida, pois não foi possível visualizar aumento de escolha pela opção A, nem mesmo quando o atraso estipulado era considerado baixo, o que pode ser justificado por alguns fatores como: tempo de duração das sessões, quantidade de variáveis independentes utilizadas, critério mais rígido para mudança de condição. Apesar dos possíveis fatores que interferiram em uma avaliação mais precisa, o presente trabalho abriu possibilidade para ampliar o número de VIs e suas conseqüências diante da variabilidade de cada indivíduo. O estudo, no entanto, despertou o interesse das crianças diante da tarefa proposta, o que resultou na freqüência nas sessões e ausência de desistência. Durante todas as sessões as crianças estavam animadas e buscavam se esforçar cada vez mais para poder conquistar mais pontos e conseqüentemente mais reforçadores.

 

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Received January 26, 2010
accepted June 29, 2010

 

 

1) Professora do. Renata Limongi França Coelho Silva. Endereço para correspondência com o conselho editorial: RUA 1128,Nº610,AP. 202, SETOR MARISTA, ED. ÔNIX, GOIÂNIA, GOIÁS, CEP.: 74175-460; (62) 81050550; (62) 36226897. rlimongi@hotmail.com; renatalimongi@yahoo.com.brrenatalimongi@yahoo.com.br
2) Professor do. Doutor em Psicologia. cristicoelho@gmail.com
3) Professor da. Doutor em Ciências do Comportamento. profandrevs@hotmail.com

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