SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.2 número1Universidade: espaço institucional para o desenvolvimento político índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. vol.2 no.1 Ribeirão Preto abr. 1994

 

A participação política do adolescente: indicação de uma abordagem psico-social a partir da noção de identidade

 

 

Leoncio Camino1; Joseli Bastos da Costa2

Universidade Federal da Paraíba

 

 

O bom funcionamento da democracia pressupõe uma participação política responsável dos cidadãos. Este pressuposto constitui-se na razão principal para iniciar, no Mestrado em Psicologia da UFPb, uma linha de pesquisa intitulada Análise Psicossocial do Comportamento Político. Iniciamos nosso projeto em 1981 com o estudo das ações coletivas e movimentos sociais. A partir de 1985, dedicamos também nossa atenção ao comportamento eleitoral, o que nos permitiu analisar o comportamento político como um todo em seus dois aspectos: institucional e nãoinstitucional. Finalmente, em decorrência do fato de que boa parte de nossos trabalhos se realizam com jovens, temos acrescentado, a partir de 1992, um terceiro subprojeto, centrado nos problemas da socialização política. Pretendemos descrever neste trabalho como os resultados obtidos em nossas pesquisas sobre o comportamento político dos jovens foram guiando nossa reflexão sobre o processo de socialização política.

Nossas pesquisas, de fato, mostraram baixos índices de participação política, particularmente entre os jovens. Assim, constatamos que a grande maioria dos universitários pesquisados não participa das campanhas eleitorais, não possui conhecimentos satisfatórios sobre as diversas candidaturas e, portanto, experimenta dificuldade em realizar a escolha eleitoral (Camino e Burity)(3); Torres, Bussoletti, Burity, Da Costa e Camino(4). Alguns resultados de nossas primeiras pesquisas, apresentados a seguir, podem exemplificar a situação.

Assim, mais de 80% dos alunos de nossa amostra de 1988 (Tabela 1) não se engajam em nenhum tipo de atividade simples, própria de uma campanha eleitoral, como pedir votos, participar de carreatas e comícios, contribuir financeiramente com seu partido ou candidato etc. Os dados referentes ao conhecimento das candidaturas (nomes de candidatos e siglas partidárias) mostram que 50% dos alunos entrevistados conhecem menos da metade dos candidatos. Só um pouco menos de 8% conhecem os nomes dos candidatos e as siglas partidárias. Trata-se de um quadro bastante desolador considerando-se que a pesquisa foi realizada três dias antes das eleições. Com índices tão baixos de participação eleitoral não é de estranhar que só 38% dos alunos da amostra tivessem já escolhido um candidato.

 

 

Recebemos uma segunda surpresa na constatação empírica de que a Universidade, nos seus aspectos curriculares e acadêmicos, praticamente não possui nenhuma influência no desenvolvimento dos índices de participação política dos estudantes (Camino, Burity, Da Costa e Torres).(5)

Partíamos do pressuposto de que quanto mais tempo útil o aluno passa na Universidade (o tempo útil seria medido pelo número de créditos integralizados) mais o aluno seria influenciado pela Universidade. Mas os resultados (Tabela 2) de nossas pesquisas mostram que a grande maioria dos índices de participação política não aumentam conforme o aluno avança no seu curso. A única exeção a esta regra é constituída pelo conhecimento das candidaturas. De fato, os alunos com maior número de créditos integralizados mostram igualmente um melhor conhecimento das alternativas políticas existentes antes das eleições.

 

 

Em oposição a esta quase ineficiência da Universidade como instituição acadêmica, podemos observar o papel importante que desempenha a participação em atividades extra-curriculares no desenvolvimento do comportamento político dos estudantes.

Por atividades extra-curriculares incluímos três formas de atividade, frequentemente realizadas no âmbito das universidades federais: atividades de extensão, onde se avalia o grau de participação do aluno em atividades comunitárias, fórum de debates etc; atividades de co-gestão, onde se mede o grau de participação nos órgãos colegiados da universidade, nas eleições universitárias etc..., e, finalmente, atividades gremiais, onde se registra o nível de participação nas diversas atividades do movimento estudantil.

A análise dos diversos índices de participação político-eleitoral, em função dos diversos níveis de participação no conjunto das atividades extracurriculares, mostra a decisiva influência que essas atividades possuem no desenvolvimento do comportamento político dos alunos. Como se pode observar na Tabela 3, todos os índices de participação na campanha de 1989 mostram um claro crescimento em função no nível de participação no conjunto de atividades extracurriculares de UFPb.

 

 

Acrescentando um outro aspecto, apesar da baixa participação política tanto dos estudantes como dos eleitores comuns podemos constatar que existe uma certa afinidade política entre a escolha de um partido de simpatia e a visão da estrutura social. Perguntando aos alunos de nossa amostra de 1990 pelos setores sociais representados tanto pelo seu partido de simpatia como pelos partidos opostos à sua visão política, constatamos diferenças na percepção da estrutura sócio-política em função da posição ideológica de seu partido.

Assim, 83% dos que simpatizam com partidos considerados de esquerda (Tabela 4), atribuem simultaneamente a representação da classe baixa ao seu partido de simpatia e a representação da classe alta aos partidos opostos. Torres (1992) denominou este tipo de percepção social de "visão classista", considerando-a própria dos simpatizantes de partidos de ideologias socializantes.

 

 

Já aqueles que simpatizam com partidos de centro não manifestam padrões definidos de atribuição. Finalmente, 75% dos que simpatizam com partidos situados à direita do espectro político atribuem ao seu partido a representação de todas as classes enquanto que atribuem aos partidos opostos a representação de setores corporativos, visão social que, segundo a mesma autora, carateriza ideologia liberal.

Uma análise do conjunto de resultados de nossas pesquisas sobre o comportamento eleitoral dos estudantes da UFPb durante as eleições de 1988, 1989 e 1990 (Torres, 1992; Torres et alli, 1990), mostra que as visões da estrutura sócio-política, desenvolvidas pelos estudantes da UFPb, implícitas nas atribuições de representação política dos partidos, relacionam-se com a posição ideológica do partido de simpatia. Os dados obtidos, embora revelem estudantes pouco inseridos nas campanhas eleitorais e pouco informados sobre as diversas candidaturas, mostram também cidadãos cujas preferências partidárias (ou ausência delas) adequam-se a formas específicas de visão da estrutura social.

Como se adquirem estas visões diferenciadas sobre a estrutura social, que se manifestam posteriormente tão importantes na determinação do comportamento político? Para responder a esta pergunta Torres (1992) escolheu uma das visões de estrutura social mais frequentes entre os alunos de nossa amostra de 1990, a "Visão Classista", e analisou, através da Regressão Múltipla, efetuada pelo Método Gradual (Jennrich, 1977) quais das diversas variáveis estudadas eram as que melhor prediziam a formação da "Visão Classista".

Observa-se (Tabela 5) que o sub-conjunto de índices que melhor prediz a construção de uma visão classita pelos estudantes da UFPb é constituído pela participação no movimento estudantil, pela idade e pelo número de créditos integralizados pelo estudante. São os mais jovens (a correlação parcial é negativa), com o maior número de disciplinas cursadas e com a maior participação no movimento estudantil, que mais desenvolvem uma visão classista da sociedade.

 

 

Em outras palavras, é entre aqueles que ingressaram jovens na UFPb, já são antigos nela pois cursaram muitas disciplinas e se destacam pelo bom entrosamento com o movimento estudantil, que se encontra a maior porcentagem de alunos com visão classista. Estes resultados mostram claramente a importância da participação social no desenvolvimento político. Os dados parecem indicar que o início do desenvolvimento político do indivíduo está ligado ao seu desenvolvimento social e institucional.

Pode-se pensar, então, nesta perspectiva, que a apatia política está ligada a uma certa marginalização institucional. Não se trata da apatia política produzida pela marginalização sócio-econômica constatada em nossas pesquisas na Paraíba (Oliveira, Lima, Arruda e Camino, 1993(6) e em outros estados (Lamounier, 1978). Trata-se, sim, de uma marginalização subjetiva frente aos processos sociais, em geral, e frente ao processo político-eleitoral em particular.

A partir destas constatações começamos a analisar os fatores que levam o jovem adolescente a se dispor a participar de instituições da Sociedade Civil, como sindicatos. Estudamos uma amostra constituída por 164 jovens que ainda não tinham ingressado formalmente no mercado de trabalho e que estavam realizando cursos profissionalizantes na escola do SENAI (Serviço Nacional da Indústria), localizada no Distrito Industrial de João Pessoa, Paraíba (Silva, Aquino, Torres e Camino, 1993) .(7) Os jovens de nossa amostra, de ambos os sexos, provinham de famílias de baixo nível sócio-econômico e tinham entre 14 e 18 anos.

Além de avaliar a disposição desses jovens de se filiar a um sindicato ao começar a trabalhar, estudávamos seus contatos com sindicalistas, suas participação nas diversas organizações de jovens, a influência de seus pais e alguns elementos de sua visão da estrutura social, como a representação das formas de relação inter-classes e as crenças nas formas de ascenção social.

As formas de relação inter-classes podem variar do conflito ou antagonismo à cooperação entre as classes. As classes podem também ser percebidas como independentes entre si. No que se refere às formas de ascenção social, dependendo da percepção que se tenha da permeabilidade do sistema podem-se tomar crenças em diversas formas de ascenção (Tajfel, 1981). A percepção de que a barreira entre diversas classes é intransponível leva à crença na mudança social ou ascenção realizada num grupo. Já a crença na mobilidade social ou ascenção individual decone da percepção da permeabilidade do sistema (Ellemers e Van Knippenberg, 1990).

Como nos estudos anteriores, nos perguntamos quais das variáveis estudadas podem ser consideradas para predizer a disposição dos adolescentes em filiar-se ou não a um sindicato. A fim de responder a esta pergunta utilizamos um modelo de Regressão Múltipla que procura, passo a passo, as variáveis que em conjunto dão a melhor predição. As variáveis são analisadas por níveis, numa ordem determidada a priori por um modelo teórico.

A análise mostra (Tabela 6) a importância, no desenvolvimento da disposição a filiar-se, tanto dos agentes clássicos de socialização, os pais, como da participação do jovem nas organizações da Sociedade Civil. Neste grupo de jovens trabalhadores parece existir uma certa complementariedade entre a influência da família e as experiências sociais fora do âmbito familiar. No caso dos estudantes de UFPb, jovens de classe média em geral, as influências familiares parecem se contrapor à influência exercida pelos pares (Camino, Burity, Torres e Da Costa, 1991).

 

 

Mas antes de entrar no debate destas influências, que podem ser complementares ou contraditórias, devemos analisar um outro fator que também desempenha um papel importante no processo de socialização política: o desenvolvimento de uma visão da estrutura social. Já foi constatado o papel mediatizador que estas visões desempenham na participação política dos jovens estudantes universitários (Camino et al., 1991; Torres, 1992). Coloca-se, aqui, o problema de saber como evolui com a idade este conjunto de conhecimentos e crenças sociais, e qual a natureza do desenvolvimento destes conhecimentos e opiniões.

Pode-se constatar que alguns elementos cognitivos da visão da estrutura social (Tabela 7) evoluem com a idade: o conhecimento de nomes, a crença na mudança social e as diversas formas de percepção das relações inter-classes. Outros elementos não mostram essa evolução: os conhecimentos gerais e a crença na mobilidade social. Podemos pensar que alguns elementos, como as opiniões gerais sobre sindicatos ou a crença no esforço pessoal (mobilidade social), por serem muito difundidos na sociedade, são aprendidos muito cedo. Outros elementos mais concretos, como os nomes de sindicatos, exigiram situações de aprendizagem mais específicas. Mas pode-se supor que elementos de conhecimento como a noção de conflito, por exemplo, exigem habilidades cognitivas mais evoluídas para serem comprendidas (Adelson e O'Neil, 1966; Leahy, 1981; 1983).

 

 

Podemos aqui nos perguntar se o desenvolvimento político é um processo que acompanha o desenvolvimento cognitivo ou é o produto de um acúmulo contínuo de aprendizagens sociais. Os cognitivistas consideram que o desenvolvimento cognitivo, base dos outros desenvolvimentos, procede através de estágios hierarquizados que representam organizações ou maneiras particulares de se representar o mundo. O motor deste desenvolvimento encontra-se na necessidade do indivíduo de conservar o equilíbrio frente aos desafios que vão aparecendo (Kohlberg, 1969). As pesquisas que estamos atualmente realizando sobre o desenvolvimento do conceito de classe social em crianças de 7 a 17 anos, embora mostrem padrões fixos de desenvolvimento cognitivo, manifestam igualmente diferenças em função do meio em que vivem. Mas este meio só é influente na medida em que o jovem se identifique com as categorias sociais (classe social, religião etc.) próprias deste meio. A identidade se dá, em geral, através da participação em organizações sociais próprias destas categorias sociais.

Este conjunto de observações se ajustava mal aos modelos clássicos de socialização com que até então tínhamos trabalhado. Embora psicólogos sociais por formação, nos descobrimos pesquisando um campo típico da psicologia do desenvolvimento: a Socialização Política. L% para nossa surpresa, ao procurar referências recentes, constatamos que o antigo interesse por este tema (o Journal of Social Issues chegou a dedicar-lhe dois números completos na década de 70) tem praticamente desaparecido nestes dias (Merelman, 1986). Para alguns autores, a falta de interesse estaria ligada à apatia política do jovem contemporâneo, situação que contrasta com o forte movimento estudantil dos anos 60 e 70, o que torna menos chama ti vo o estudo da socialização política (Torney-Purta, 1990).

Já para outros autores (Merelman, 1986), a causa se encontraria na falta de uma perspectiva teórica no estudo da socialização que possa dar conta da especificidade do campo político. A constatação de que muitos resultados sobre a ligação dos jovens com o sistema polític o não vão além de reproduzir situações conjunturais datadas e específicas de uma sociedade, tem levado de fato a um certo esgotamento nos trabalhos empíricos da área (Kinder e Sears, 1985).

Estas explicações do desinteresse pelo tema nos parecem não só adequadas mas também complementares. Assim, por um lado, consideramos que, da perspectiva do bom funcionamento das instituições democráticas, é tão relevante compreender as causas do conjunto dos movimentos de protesto dos jovens como a sua atual apatia política. A sociedade deve dar resposta adequada a ambos os fenômenos se quer se desenvolver democrática e harmoniosamente; a necessidade de pesquisar cada um deles em seus aspectos sociológicos e psicológicos continua sendo essencial. E hoje, a urgência talvez seja maior pelo fato da apatia ser mais corrosiva dos fundamentos de uma sociedade democrática que a rebeldia.

Como nos propomos a demonstrar neste trabalho, vários dos avanços teóricos na área da Psicologia Social podem ajudar a encontrar uma melhor articulação entre os processos gerais de socialização e o domínio específico da política. Entre estes avanços, consideramos que as reflexões atuais sobre influência social e inovação, introduzidas por Moscovici e colaboradores (Moscovici, 1985; Moscovici e Faucheux, 1972; Doms e Moscovici, 1984), colocam numa nova perspectiva o paradigma clássico da socialização, que se apoia no conceito de conformidade e adaptação.

Mais especificamente, a importância atribuída hoje, na Psicologia Social, às relações intergrupais, tanto nos seus aspectos cognitivos e portanto individuais (Stephan, 1985), como nas suas consequências para a construção da identidade social dos indivíduos (Tajfel, 1981), permite compreender melhor, como veremos adiante, alguns aspectos importantes não só do desenvolvimento político dos jovens, mas também do processo geral de socialização. Finalmente, uma articulação melhor dos diversos níveis de explicação psicológica (intra-individual, inter-individual e inter-grupal) com o nível de explicação sociológica, permitirá colocar em perspectiva os resultados empíricos, diferenciando-se melhor as explicações conjunturais das processuais (Doise, 1976; 1982).

Antes de abordar as explicações psicológicas do processo de socialização política, precisamos definir melhor o que se entende por sistema político e qual o papel que a socialização desempenha nesse sistema. O conceito de política referese fundamentalmente à uma forma de atividade ou praxis humana estreitamente ligada ao poder (Bobbio, 1986; Heller, 1991). Evidentemente, não se trata de qualquer poder, mas do poder ''político". Isto nos remete à origem etimológica do termo, que coloca como campo de ação do poder em estudo a Polis (cidade), que hoje denominamos de Estado. Trata-se, pois, do estudo das relações de poder no interior de uma Sociedade.

As relações de poder na sociedade podem ser sistematizados a partir de duas perspectivas teóricas opostas (Bottomore, 1979). A primeira, que denominaremos de Sistêmica (Easton, 1969,1975), origina-se da Teoria Funcionalista, que concebe a sociedade como um sistema integrado cuja existência é mantida por relações complementares entre seus vários elementos ou subsistemas, e sustentada, em última análise, sobre um conjunto de objetivos e metas comuns (Merton, 1957).

Na perspectiva da Teoria Sistêmica, a socialização política é concebida como um processo que procura proporcionar apoio generalizado ao sistema social como um todo, e não aos elementos particulares ou subsistemas deste. Do ponto de vista psicológico, o processo de socialização política procura criar atitudes positivas em relação às instituições políticas gerais, bem como crenças na eficácia da atividade política do sujeito. Reforça igualmente sentimentos de respeito e confiança na autoridade. O processo de socialização política procura a manutenção do que se denomina de Democracias Estáveis. Interesses setoriais devem ser regulados pelos interesses gerais. Preservar as instituições democráticas é a palavra de ordem.

Uma variante da Concepção Sistêmica é a visão Pluralista, cuja origem deve ser procurada na invenção moderna da democracia representativa (Mill, 1991). Esta doutrina política propõe criar mecanismos que absorvam os conflitos de poder, institucionalizando procedimentos capazes de dar voz às insatisfações e ao mesmo tempo, neutralizar os componentes degradadores presentes na atividade da oposição, tornando-a alternativa de poder (Balbachevsky, 1989). A instituição mais importante é constituída pelo sistema partidário, embora a adesão aos partidos deva ser balanceada pela crença consensual na tolerância política. O domínio da maioria é regulado pelos direitos da minoria.

Como decorrência destes presupostos, a socialização política teria como objetivo formar cidadãos capazes de utilizar um partido político para representar, negociar e, se possível, realizar seus interesses. Ao nível psicológico, a socialização política na visão pluralista procura construir fortes atitudes positivas em relação aos partidos políticos, inculcar marcos ideológicos que orientem as diversas opiniões dos jovens e fortalecer disposições à participação política.

O modelo alternativo à teoria funcionalista toma como ponto de partida a existência de pressões, contradições e conflitos em todos os sistemas sociais e considera a manutenção da ordem e da estabilidade apenas como uma resolução parcial e temporária (não necessariamente breve) dos vários antagonismos. A existência destes antagonismos é conseqüência da formação de grupos dominantes e subordinados no processo economico. Esta sistematização das relações elações de poder apoia-se, do ponto de vista da sociologia, tanto na teoria marxista (Marx e Engels, 1986) como em alguns aspectos da obra de Weber (1991).

Dentro deste quadro conceituai, a socialização política teria como função introduzir a homogeniedade e coesão nos diversos grupos ou setores sociais. Ao nível psicológico, a socialização política destina-se a formar jovens fortemente identificados com seu própio sociais e totalmente imbuídos de concepções de justiça e de regras de distribuição que favoreçam seu grupo frente a outros grupos antagônicos.

Neste contexto, a socialização política do adolescente só se dará na medida em que ele reconheça seus interesses e se insira ativamente nos diversos grupos da Sociedade. Este processo de socialização se apoia em processos de constituição da identidade social e não na adaptação às normas vigentes. Aliás, nossos resultados mostram que o paradigma clássico da socialização política que contrapõe o jovem à Sociedade não reconhece o fato de que os grupos constroem suas identidades nas relações inter-grupais e que os sujeitos se "socializam" neste processo.

Aliás, esta concepção de socialização se ajusta à nossa percepção da articulação entre o psicológicos e o sociológico. Para nós, tanto a identidade social dos indivíduos, construída pelo sentimento de pertença a grupos sociais, como as alternativas políticas, formadas pelos interesses dos diversos grupos sociais, sãof consequências das relações inter-grupais no interior de uma Sociedade. Desse modo, postulamos que a identidade social dos indivíduos e a representação sócio-política dos partidos, como percebida pelos indivíduos, estão intimamente relacionadas e que esta relação é função da participação do sujeito nas organizações da sociedade civil.

Nossos dados sugerem um modelo de socialização que além de apontar a im portância do desenvolvimento de certas estruturas cognitivas como condições prévias de aprendizagem, bem como a existência de mecanismos clássicos de aprendizagem, mostra a necessidade de se estudar a participação dos jovens nas diversas organizações da Sociedade. E através desta participação ativa que um grupo constrói, conjuntamente com os sujeitos que a ele pertencem, os valores e normas que formam a identidade social desses sujeitos.

Concluímos afirmando que os jovens não só se adaptam a grupos já existentes mas participam de grupos onde ativamente constroem suas normas e suas identidades sociais. Pensamos que na dinâmica social, não são os indivíduos que se socializam individualmente mas os grupos nas relações que mantêm com os outros grupos. E, deste modo, só se poderá falar em sociologia política dos indivíduos na medida em que cada um destes seja visto como participante (ativa ou passivamente), n socializam na medida em que participam desses grupos.

 

Referências Bibliográficas

Adelson, J. e O'Neil, R. (1966) The growth of political ideas in adolescence: the sense of community. Journal of Personality and Social Psychology, 4, 295-306.         [ Links ]

Balbachevsky, E. (1989) Stuart Mill: liberdade e representação. Em, F. C. Weffort (Org.), Os Clássicos da Política. São Paulo: Editora Attica.         [ Links ]

Bobbio, N. (1986) Política. Em, N. Bobbio; N. Matteurci e C Pasquino (Orgs.), Dicionário de Política. Brasília: Editora da Universidade de Brasília.         [ Links ]

Bottomore, T. (1979) Political Sociology. London: Hutchinson & Co .         [ Links ]

Doise, W. (1982) L'Explication en Psychologic Sociale. Paris: P.U.F.         [ Links ]

Dooms, M. e Moscovici, S. (1984) Innovation et influence des minorités. In, S. Moscovici (Ed.), Psychologie Sociale. Paris: Presses Universitarios de France.         [ Links ]

Easton, D. (1975) A reassessment of the concept of political support. British Journal of Political Science, 5, 435-457.         [ Links ]

Ellemers, N . ; van Knippenberg, A- e Wilke, H. (1990) The influence of permeability of group boundaries and stability of group status on strategies of individual mobility and social change. British journal of Social Psychology. 29, 233-246.         [ Links ]

Heller, A. (1991) The concept of the political revisited. Em, D, Held (Org.), Political Theory Today. California: Stanford University Press.         [ Links ]

Jennrich, R. I. (1977) Stepwise regression. In, K. Enslein; A. Ralston e H. S. Wilf (Eds.) Statistical Methods fir Digitai Computers. New York: Wiley (Cap. 4).         [ Links ]

Kinder, D.R. e Sears, D . O . (1985) Public opinion and political action. Em, G. Lindzey e E. Aronson (Orgs.), The Handbook of Social Psychology, Reading, Massachusetts: Addison-Wesley.         [ Links ]

Kohlberg, L. (1969) Stage and sequences: the cognitive-developmental approach to socialization. Em, D. Goslin (ed.) Handbook of Socialization Theory and Research Chicago: Rand McNally.         [ Links ]

Lamounier, B. (1878) Presidente Prudente: o crescimento da oposição em um reduto oposicionista. Em, F. Wander ley Reis (Ed.), Os Partidos e o Regime: a higica do Processo Eleitoral. São Paulo: Ed .Símbolo.         [ Links ]

Leahy, R.L. (1981) The development of the conception of economic inequality I. Descriptions and comparisons of rich and poor people. Child Development, 52, 523-532.         [ Links ]

Leahy, R.L. (1983) The development of the conception of economic inequality II. Explanations, justifications and conceptions of social mobility and social change. Developmental Psychology, 19, 111-125.         [ Links ]

Marx, K. e Engels, F. (1986) A Ideologia Alemã. São Paulo: HUCITEC (Edição original de 184r.         [ Links ]).

Merelman, R.M. (1986) Revitalizing political socialization. Em, M C I . Hermann (Org.), Political Psychology: Contemporary Probtems and Issues, California: Jossey-Bass.         [ Links ]

Merton, R.K. (1957), Social Theory and Social Structure. Glencoe, 111: The Free Press.         [ Links ]

Middleton, R. e Putney, S. (1963) Political expression of adolescent rebellion. American journal of Sociology, 68, 527-535.         [ Links ]

Mill, J. S. (1991) Considerações sobre o Governo Representativo. Brasília: Editora da UnB (Edição original de 1861).         [ Links ]

Moscovici, S. (1985) Social influence and conformity. Em G. Lindesey e E. Aronson (Orgs.), The Handbook of Scial Psychology. Reading, Mass.: Add i son-Wesley.         [ Links ]

Moscovici, S. e Faucheux, C, (1972) Social influence, conformity bias and the study of active minorities. Em, L. Berkowitz (Ed.) Advances in Experimental Social Psychology. New York: Academic Press.         [ Links ]

Stephan, W . C (1985) Intergroup relations. Em, C. Lindzey e E. Aronson (Orgs.) The Handbook of Social Psychology, Reading, Mass.: Addison-Wesley.         [ Links ]

Tajfel, H. (1981) Human Croups and Social Categories. Cambridge: Cambridge University Press.         [ Links ]

Torney-Purta, J. (1990) Youth in relation to social institutions. Em, S. Feldman e G. Elliot (Orgs.) At lhe Threshold: the Developing Adolescent. Cambridge: Harvard University Press.         [ Links ]

Torres, A.R. (1992) Uma análise psicossocial da identificação partidária: o caso dos estudantes da UFPb nas eleições de 1988, 1989 e 1990. Dissertação de mestrado. Curso de Mestrado em Psicologia da UFPb.         [ Links ]

Weber, M. (1991| Enmomm e Sociedade: Fundamentai da Sumiria Compreensiva. Brasília: Editora da UnB (Edição original de 1919).         [ Links ]

 

 

(1) Curso de Mestrado em Psicologia Social.
(2) Departamento de Psicologia
(3) Camino, L. e Burity, M.H. (1989) Mediadores psicosociales de la conducta electoral: el caso de las elecciones de 1988. Trabalho apresentado durante o XXII Congresso Interamericano de Psicologia. Buenos Aires: 25 a 30 de julho.
(4) Torres, A.R.; Bussoletti, D.; Burity, M.H.; Da Costa, J. e Camino, L (1990) Vota-se politicamente? O comportamento eleitoral dos estudantes da UFPb nas eleições de 1988. Trabalho apresentado no I Encontro Nacional sobre Comportamento Político. Florianópolis: 12 a 14 de março.
(5) Camino, L.; Burity, M.H.; Da Costa, J. e Torres, A.R. (1991) El papel de la Universidad sobre la conducta electoral de sus alunos. Un análisis psicosocial de los estudiantes de la UFPb durante las elecciones de 1989. Trabalho apresentado durante o XXIII Congresso Interamericano de Psicologia. São José (Costa Rica), julho.
(6) Oliveira, G.A.; Lima, M.E.; Arruda, A.S. e Camino, L. (1993) Análise psico-sociológica do comportamento eleitoral: Influencia dos fatores socio-demograficos nas eleições municipais de 1992 em João Pessoa. Trabalho apresentado durante a 45a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Recife.
(7) Silva, J.P.; Aquino, T.A.; Torres, A.R. e Camino, L. (1993) Disposição para participar de sindicatos: uma análise psicosocial à luz da teoria da Identidade Social. Trabalho apresentado durante a 45a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Recife.