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Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro)

 ISSN 1413-6295

Cad. psicanal. vol.42 no.42 Rio de Jeneiro jan./jun. 2020

 

ARTIGOS

 

O rival semelhante - uma resenha crítica sobre O duplo de Otto Rank

 

The similar rival - a critical review of The double, by Otto Rank

 

 

André De Martini*

Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro - CPRJ - Brasil
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Neste trabalho, procuro realizar uma leitura próxima e crítica do livro O duplo, de Otto Rank. Destaco aqui os principais eixos da discussão realizada por Rank - a divisão do Eu, a relação entre narcisismo e morte, e os impasses fálicos e a rivalidade presentes nos motivos literários do duplo, dos espelhos e das sombras. Proponho também a retomada da discussão no contexto da cena edípica, apenas mencionada por Rank. Uma aproximação com o texto Batem numa criança (FREUD, 1920/2010) evidenciará elementos centrais a ambos. Por fim, procuro responder uma pergunta do editor do livro, Harry Tucker Jr., sobre o duplo feminino.

Palavras-chave: Rank, Otto, Psicanálise, O duplo.


ABSTRACT

In this paper, I try to make a critical and close reading of "The double", by Otto Rank. His main discussion axes are listed as follows: Ego splitting, the relation between narcissism and death, and the phallocentric impasses and rivalry present in the literary motif of the double, the mirrors and the shadows. Besides, I propose revisiting the double in terms of the oedipal scene, which was only loosely mentioned by Rank. An approximation with "A child is being beaten" (FREUD 1920/2010) will provide important elements to both discussions. Finally, I try to answer a question proposed by Harry Tucker Jr., editor of the book, about the feminine double.

Keywords: Rank, Otto, Psychoanalysis, The double.


 

 

Introdução

Os estudos de Otto Rank sobre o duplo tornaram-se referência obrigatória no tema, e constituem uma das influências originárias para o texto de Freud sobre o estranho (1919/2010). Assim como este, encontrou uma disseminação maior fora da psicanálise do que dentro dela, notadamente no campo das discussões literárias e cinematográficas. E, embora Rank centre suas reflexões na questão do narcisismo, procurarei também demonstrar uma possível leitura edípica sobre o duplo.

A publicação que utilizo é uma tradução para o inglês do livro de 1925, resultado de uma revisão e ampliação de seu primeiro artigo, publicado em 1914, na revista Imago. Antes do livro, esse mesmo artigo foi incluído em uma coletânea do autor sobre mitos, em 1919. Uma tradução do livro para o francês, publicada em 1932, ganhou o título de Don Juan. Une étude sur le double. Também foi adaptado como um capítulo, The double as immortal self, na publicação póstuma Beyond psychology, de 1941. Os títulos podem causar a impressão de distintos materiais, quando na verdade trata-se do mesmo trabalho, com diferenças de edição, adaptação, revisão e ampliação1.

Rank escreve seu primeiro artigo de 1914 inspirado em uma produção cinematográfica do ano anterior, O estudante de Praga, de Paul Wegener e Stellan Rye, com roteiro adaptado de Hanns Heinz Ewers, baseado em seu livro. O filme parece ter causado forte impressão em Rank, que chegou a descrever Ewers como um novo E.T.A. Hoffman (RANK, 1925/1971, p. 8). É a história de Balduin, um estudante pobre da Universidade de Praga, que se apaixona pela condessa Margit Schwarzenberg, após salvá-la de um afogamento. Desolado por não ter condições de cortejar a moça, é visitado por um enigmático senhor, Scapinelli, que lhe oferece cem mil peças de ouro. Em troca, ele poderia levar qualquer item do quarto de Balduin. Para a surpresa e horror do estudante - que aceita a proposta - Scapinelli toma seu reflexo do espelho, e o leva embora consigo.

Há uma referência clara a Fausto, de Goethe, em sua primeira parte; Fausto (Balduin), apaixonado por Margarida (Margit), aceita um acordo e tem a ajuda do demônio Mefistófeles (Scapinelli) para conquistá-la, com resultado trágico. Mas aqui a história se desenrola com um motivo próprio: após alcançar a ascensão sonhada, através do dinheiro, Balduin passa a ser assombrado e perseguido pela imagem removida do espelho, seu duplo. Aos poucos, vai enlouquecendo conforme tem seu lugar e o amor de Margit roubados pela figura sinistra. Quando perde tudo, resta-lhe apenas o desejo assassino de se livrar do rival. A morte desejada, já antevemos, acaba por se revelar como sua própria também.

Uma possível e mais clássica interpretação do duplo observada por Rank é a de que não se pode fugir do próprio passado. A cisão do Eu em uma parte boa e outra má é uma interpretação já conhecida da literatura, principalmente pelo viés moral. Em um primeiro momento, ele conseguiu para si tudo o que era bom (ouro, reconhecimento, ascensão social, o amor de Margit), deixando para Scapinelli sua antiga imagem com tudo o que era ruim (a pobreza, as frustrações e o isolamento). No decorrer da história, contudo, as posições se invertem, e Balduin passa a ser despojado das coisas boas, ficando ele próprio com tudo o que é ruim. A perseguição do duplo representaria a vida anterior que Balduin quis deixar para trás, mas da qual não se escapa.

Muito frequentemente na literatura sobre o duplo o protagonista enlouquece. Há um caráter persecutório, de usurpação, tendo no horizonte a inevitável morte de um ou outro da dupla. Um interesse amoroso aparece frequentemente como eixo da disputa, como solução, perda ou conquista final. O Eu não tolera a divisão, compartilhamento, roubo etc. que a existência do duplo engendra, e é nesse sentido, do abalo narcísico, que Rank procura se ocupar para compreender o motivo literário do duplo. Ele está interessado nos elementos psicológicos que se revelam a partir da literatura, mas que têm alcance para além dela, como guias para a compreensão do psiquismo: "[...] o duplo aponta '... para o eterno conflito do homem consigo próprio e com os outros, para a luta entre sua necessidade de semelhança e seu desejo por diferença'" (RANK, 1925/1971, p. 7)2.

A disposição narcísica do duplo é bastante evidente, seja na perspectiva psicanalítica, seja na tradição literária (com o mito do Narciso, que lhe dá o nome). Rank traz um apanhado de mitos, lendas e tabus em que a preocupação com a própria imagem é o fator fundamental - como na fotografia, no espelho, na sombra, no sonho3 ou no reflexo na água parada. Assim como no mito de Narciso, a relação com a morte também aparece no duplo. Ele aponta a intrigante conexão entre os elementos narcísicos e a morte, que não deveria ser compreendida apenas pela repetição do motivo mitológico do Narciso. Há uma motivação mais fundamental, que Rank observa a partir de Freud: o amor próprio deve ser entendido como uma compensação e modificação do elemento originário mortífero (RANK, 1925/1971, p. 69).

 

1 - Narcisismo e morte

Em formas tardias e isoladas das histórias sobre o espelho, a morte e a desventura são substituídas pela visão do futuro amor e bonança. São versões em que o caráter defensivo e compensatório assumiu o controle sobre a história. Essa é uma das razões pelas quais as fábulas não são estranhas, como apontara Freud (1919/2010, p. 273): via de regra são atenuações de versões mais sombrias e aterrorizantes que foram se modificando ao longo do tempo.

Rank enfatiza a relação entre o narcisismo e a morte no exemplar Retrato de Dorian Gray, de Wilde:

A percepção de sua própria beleza veio a ele como uma 'revelação' no primeiro vislumbre de seu retrato, quando ele 'permaneceu encarando a sombra de seu próprio encanto'. Naquele momento, é tomado pelo medo de que ficasse velho e diferente - um medo intimamente associado com a ideia de morte: 'Quando eu descobrir que estou envelhecendo, irei me matar' (RANK 1925/1971, p. 70).

A incapacidade para o amor também assombra o personagem: "'Eu queria poder amar', exclamou Dorian Gray, com uma profunda nota de sofrimento em sua voz. Mas parece que eu perdi a paixão, e esqueci o desejo. Eu estou muito concentrado em mim mesmo " (RANK, 1925/1971, p. 72, grifo do autor). Assim, além da morte, o amor pelo objeto (ou a incapacidade para ele) também parece ter uma ligação intrínseca com o tema do duplo. Mais adiante explorarei esse aspecto por outro viés, além do narcísico.

Rank destaca o medo neurótico da morte ("thanatofobia ") (RANK, 1925/1971, p. 76) como parte essencial das questões narcísicas que configuram o duplo, sendo a origem de todas as outras formas de medo: da perda da própria sombra, da própria imagem, de um perseguidor, do envelhecimento e da expectativa da morte. A morte, acima de tudo, é a morte do Eu. Mais do que qualquer instinto biológico de autopreservação, é a perda da própria identidade que é temida e equacionada com a morte. Este é o narcisismo do duplo, o amor último por si próprio, de modo que até o suicídio e a perda da vida podem ser preferíveis ao tormento da perda da imagem de si. Ao tentar eliminar o duplo, o protagonista quer livrar-se da culpa, dos desejos incestuosos, dos impulsos repreensíveis, dos aspectos maus de si que projetou nesse outro Eu. Se num primeiro momento o duplo é uma solução, um depósito de todas as fraquezas, no momento seguinte ele ameaça com o maior dos roubos, o da própria identidade, e por isso deve ser destruído.

Essa concepção do duplo, como uma espécie de prenúncio terrível da morte do Eu, encontra também em Freud uma corroboração nos termos da segunda tópica:

Assim, a conhecida afirmação que propaga que todo medo nada mais é que o medo perante a morte não faz sentido e tampouco se justifica. Parece-me bem mais acertado diferenciar o medo perante a morte, do medo (real) sentido frente ao objeto e ambos do medo neurótico frente à libido. Entretanto, essa é uma difícil tarefa do ponto de vista psicanalítico, pois a morte é um conceito abstrato, seu conteúdo é negativo e não é possível encontrar nenhum elemento correspondente no inconsciente. A única possibilidade que vejo é imaginarmos que o mecanismo de sentir medo da morte entre em ação quando o Eu dispensa amplas parcelas do investimento libidinal nele acumulado, isto é, quando ele se abandona a si próprio, tal como o faz nos episódios de medo frente a certos objetos (quando ele abandona o objeto desencadeador de medo) (FREUD, 1923/2007, p. 64).

Assim, andam lado a lado o amor e encantamento pela imagem que o Eu tem de si e o terror e ameaça de destruição que isso pode trazer.

 

2. O retorno do passado e a divisão do Eu

Esse tipo de consideração psicanalítica sobre o narcisismo permite a Rank, então, retomar os entendimentos literários do retorno do passado e da divisão moral do Eu, agora sob uma nova luz. A explicação alegórica do duplo como o retorno inexorável do passado pode ser reinterpretada a partir da ideia da fixação narcísica. O Eu possui uma história, versões de si abandonadas e reconstruções que podem, momentaneamente, "voltar à tona" causando espanto, horror ou admiração: "[O poeta romântico] Jean Paul conta, como uma de suas lembranças mais notáveis da infância, que o insight 'eu sou um eu' veio a ele quando garoto como um relâmpago; e desde então, permaneceu como uma imagem brilhante à sua frente..." (RANK, 1925/1971, p. 36).

O fascínio com a percepção da distinção e surgimento do Eu, experimentado por Jean Paul, deve certamente seu brilho ao registro, ainda presente, de um estado anterior do qual se destacava, e que podia ser rememorado. Este é um excelente exemplo da existência prévia do sentimento de si, em relação ao Eu, e que se mantém como um fio condutor na passagem de um estado anterior para aquele de delimitação e descoberta de um novo sentimento de si e uma nova forma de enunciação - "eu sou um eu".

Encontramos no texto de Freud uma descrição desse estado anterior do Eu, também dentro da temática do duplo: "É fácil apreciar, seguindo o modelo do tema do duplo, os outros distúrbios do Eu explorados por Hoffmann. São um recuo a determinadas fases da evolução do sentimento do Eu, uma regressão a um tempo em que o Eu ainda não se delimitava nitidamente em relação ao mundo externo e aos outros" (FREUD, 1919/2010, p. 264).

De modo similar, o tema da divisão do Eu pode ser ampliado para além das questões morais do bem e do mal, acrescentando-lhes nuances que só seriam possíveis a partir da investigação psicológica. Podemos, por exemplo, retomar a divisão do Eu em termos econômicos, ou seja, das estruturações psíquicas que ocorrem em função das experiências de prazer-desprazer: "O mundo exterior se divide para ele [Eu-de-prazer] em uma parte prazerosa, que incorporou em si, e um resto que lhe é estranho [fremde ]" (FREUD, 1915/2010, p. 75).

Nessa perspectiva, a conotação moral encontra raízes em disposições psíquicas e no desenvolvimento, como também apontara Freud: "[...] o Eu-prazer presente no início do desenvolvimento quer introjetar tudo que é bom e expelir de si tudo que é mau. Inicialmente, para o Eu-prazer não há diferença entre o mal, o que é estranho ao Eu e tudo aquilo que se situa fora do Eu. As três categorias são idênticas" (FREUD, 1925/2007, p. 148). No evento do duplo, o sentimento de si é experimentado alternadamente em ambas as dimensões do Eu, uma que se mantém familiar e outra que se torna estranha.

 

3. A psicologia dos escritores

Depois de discutir em profundidade sobre os elementos narcísicos inerentes à temática do duplo, Rank passa a uma recapitulação biográfica da psicologia de vários dos escritores que se detiveram sobre o tema. É uma tentativa de aproximar cientificamente as produções literárias e a realidade psíquica que elas descrevem, em que a psicologia dos autores serviria como uma espécie de corroboração ou prova daquilo que produziram. Embora seja uma perspectiva fora de uso e atualmente considerada um psicologismo equivocado, ela fez bastante sucesso na segunda parte do século XIX e início do século XX. Hoje sabemos que a linguagem e a produção literária devem ser consideradas em seu mérito próprio no que têm a dizer sobre a psicologia do duplo, e sua validade tampouco depende da psicologia dos escritores.

Contudo, apresentarei algumas das observações de Rank a esse respeito, que não deixam de ter interesse se considerarmos que os escritores são tomados como duplos de seus personagens (o inverso do que sugere o autor). Depois de analisar vários exemplos literários, ele conclui que a recorrência dos temas revela a intuição e sensibilidade dos vários escritores para a psicologia própria do duplo (RANK, 1925/1971, p. 33). O autor então avisa que não fará um estudo propriamente patográfico desses escritores, mas apenas um recorte, no que têm em comum com certos aspectos psicológicos do duplo:

O principal traço compartilhado por aqueles escritores que nos interessam é bastante evidente: [...] eles foram decididamente personalidades patológicas que, em mais de uma frente, foram além até mesmo daqueles limites da conduta neurótica que, em outras situações, seriam aceitáveis para o artista. Eles sofreram - de maneira óbvia - de distúrbios psíquicos ou neurológicos e doenças mentais, e durante suas vidas demonstraram uma excentricidade marcante em seus comportamentos, seja pelo uso do álcool, de narcóticos, ou em relações sexuais - com particular ênfase no anormal, para o último caso (RANK, 1925/1971, p. 35).

Rank, em seus recortes patográficos de Hoffmann, Jean Paul, Poe, Maupassant, Chamisso, Lenau, Heine, Musset, Ferdinand Raimund e Dostoievsky destaca o "egocentrismo" e as perturbações narcísicas, que não raro levaram os autores ao adoecimento e morte precoce. Assim, as personagens seriam como duplos dos escritores, através das quais estes se livrariam dos próprios caracteres indesejados.

Parece-nos que Rank acaba por definir o duplo como uma espécie de adoecimento psíquico; ainda que tenha observado a importância da temática do Eu, faltava-lhe (assim como para Freud, em seu texto sobre o estranho) uma compreensão estrutural ou tópica do Eu. Descreve o interesse narcísico exacerbado desses escritores, constituindo uma espécie de "complexo egoico", que corresponderia a "um forte e anormal interesse na própria pessoa, seus estados psíquicos, e seus destinos" (RANK, 1925/1971, p. 48). A perspectiva patologizante (ainda que eventualmente esteja correta sobre a psicologia de um determinado escritor) faz perder de vista o mais importante, o fenômeno psicológico fundamental ao duplo, a questão da estruturação psíquica do Eu. Ou seja, ao enfatizar a psicopatologia, Rank desvia o foco da dimensão mais fundamental do psiquismo em geral.

Mas é preciso fazer justiça a Rank - por fim, ele próprio aponta as limitações do recorte patográfico, e anuncia ao leitor a necessidade de se observar o tema do duplo para além das psicologias individuais dos escritores, sendo necessário adentrar a etnografia, o folclore, as tradições mitológicas e realizar uma "etnopsicologia". A ressonância dos aspectos individuais dos escritores seria apenas um indicador de uma verdade mais ampla do ser humano.

 

4. Um possível recorte edípico: o rival semelhante

Retomarei agora um ponto específico da cena do duplo: o impedimento amoroso. Como já mencionado, o encontro do amor geralmente é um dos pontos centrais em torno do qual a história se desvela. Além da perda da própria vida, faz parte da tragédia do duplo a disputa, conquista e perda da figura amada. Na história do estudante de Praga, "Balduin é impedido de amar uma mulher por seu próprio self personificado [...]" (RANK, 1925/1971, p. 7). Noutro exemplo, Rank descreve o tormento de Golyadkin, personagem do romance O duplo, de Dostoievski: "Ele menciona, incidentalmente, que eles não hesitariam em usar veneno, mas que o objetivo primário deles era a sua morte moral, sendo que, a esse respeito, sua maior preocupação é sua relação com uma mulher, misteriosamente insinuada" (RANK, 1925/1971, p. 27).

Ao mesmo tempo, a figura amada simboliza a solução para a armadilha narcísica do duplo. Em um conto de Maupassant, He, citado por Rank, o personagem sente que é assombrado pelo duplo por viver sozinho: "Ele me persegue incessantemente". A solução, portanto, seria a de que ele se casasse, para não ficar mais sozinho em casa (RANK, 1925/1971, p. 22).

Para Rank, do ponto de vista psicanalítico, o narcisismo seria a motivação final para a recorrência do impedimento amoroso - os investimentos afetivos voltam-se regressivamente para o Eu, e o objeto é abandonado, por assim dizer. Ainda que seu foco estivesse na investigação da dimensão narcísica do duplo, chama a atenção Rank não ter enfatizado a presença relativamente óbvia da temática edípica nas histórias, assim como sua relevância central no enredo. Há variações da triangulação na disputa amorosa, às vezes presentes na mesma história: o protagonista/o duplo/a figura amada; o protagonista/um pai bondoso/a figura amada; o protagonista/o diabo/a figura amada etc.

Algumas características do conflito edípico são tocadas, contudo: ele reconhece a ligação entre o duplo e a figura do pai, ao pensar no "complexo de perseguição" presente na paranoia: "Nós sabemos que a pessoa do perseguidor frequentemente representa o pai ou seu substituto (irmão, professor, etc.), e também encontramos em nosso material que o duplo é frequentemente identificado com o irmão" (RANK, 1925/1971, p. 75). Vários dos escritores que se detiveram sobre o duplo também trabalharam o tema da rivalidade entre irmãos, como é o caso em Os gêmeos (Jean Paul), Peter e John (Maupassant) e Os irmãos Karamasov (Dostoievsky), entre outros. Assim, a rivalidade assassina entre o protótipo e seu duplo pode ser remetida, igualmente, à rivalidade entre os irmãos na disputa pelo amor materno: "De fato, e considerado externamente, o duplo é o rival de seu protótipo em tudo, em cada coisa, mas primariamente no amor por uma mulher - um traço que ele pode parcialmente atribuir à identificação com o irmão" (RANK, 1925/1971, p. 75).

De forma mais específica, a projeção determinante é a dos desejos e impulsos na figura do diabo, que tem domínio sobre eles, e com quem o protagonista irá negociar. Outra figura relevante é a de um conselheiro protetor, que carrega consigo a advertência da lei, da parcimônia, e que será por fim fonte da culpa do protagonista por ter cedido ao demônio. Rank observa que essa figura está no lugar do Eu ideal, com a qual o Eu se compara e se atormenta por não se equiparar a ela. A culpa que advém daí será fundamental na estruturação do duplo, resultando em punição, autoflagelamento e mesmo no suicídio.

A origem do paradoxo em relação aos ideais (você deve ou deseja alcançá-los; mas se o fizer ficará desconfiado de seu valor) está no imperativo pelo qual passa a resolução do complexo de Édipo: você deve ser como o pai (o Eu se identifica como pai quando o perde como objeto libidinal); você não pode ser como o pai (tem coisas que só ele pode ter/fazer) (FREUD, 1923/2007, p. 44). Assim, o Eu ideal (um combinado, de fato, das identificações paterna e materna) impede e repele o movimento do Eu em sua direção.

Considerando-se o impedimento amoroso para além do narcisismo exacerbado, o duplo parece ser uma modalidade do estranho cuja característica é a encenação do conflito edípico, com ênfase nos elementos narcísicos. Assim, é possível tomar o duplo como um rival semelhante - uma descrição que remete a ambas as determinações, narcísica e edípica. Não à toa, Rank procura formular a concomitância dos processos de recalque e cisão, na tentativa de esclarecer os limites do recalque no duplo.

Por exemplo, para explicar a função persecutória da imagem do Eu, ao mesmo tempo em que é alvo da repressão, Rank cogita uma espécie de condensação entre reprimido e repressão: "Assim, a aparente contradição - a perda da imagem-sombra ou da imagem-espelho representada como perseguição - é compreendida enquanto uma representação do oposto, a recorrência daquilo que é reprimido naquilo que reprime [...]" (RANK, 1925/1971, p. 73). Nesse caso, o sentimento do Eu coincide com um sentimento sobre o Eu (crítico ou persecutório). De modo similar, Freud também se preocupou com a abrangência excessiva do conceito do recalque, para os novos casos que surgiam. Em seu texto O Eu e o Id, ele oscila entre cisão e recalque para os problemas colocados pela temática narcísica: "Tendo em vista a nossa nova compreensão das relações estruturais que compõem a esfera psíquica, faz-se necessário agora substituir a oposição anterior [consciente x inconsciente] por um conflito entre um Eu coeso e um recalcado que dele se cindiu" (FREUD, 1923/2007, p. 31).

De qualquer maneira, se há recalque na cena do duplo, ele incide primordialmente no desejo pelo amor objetal incestuoso, que passa a ser obstruído pela ação persecutória do rival semelhante. Esta é a formulação edípica que entendo ter sido pouco explorada por Rank. O duplo, nesse sentido, encarna o próprio agente repressor - o pai e a lei da interdição -, em uma versão idealizada, com a qual o protagonista se identifica4 transformando-o numa versão de si próprio, só que bem-sucedida em todos os anseios e desejos, notadamente no interesse amoroso. O duplo encena, ao mesmo tempo, a rivalidade entre o pai e o filho, ou entre a mãe e a filha, nos termos de um superego primitivo do conflito edípico: há uma cisão do Eu em uma versão que conquista tudo e outra que tudo perde.

 

5. As operações fálicas

A maldição e vingança do duplo é deixar o Eu sem nada. Há uma interessante história sobre o poeta Chamisso, a esse respeito, resgatada por Rank. Além de nomear um de seus personagens com seu próprio apelido, diversos registros revelam que Chamisso era tímido e considerado uma espécie de azarado - schlemiel (em hebraico), por seus amigos. "O schlemiel, cujo nome se tornou proverbial, é uma pessoa sobre quem o Talmude descreve a seguinte estória: um sujeito tem um caso com a mulher do rabino, é pego no ato, e então é morto. Esta é uma boa ilustração do apuro do schlemiel, que tem de pagar tão caro por aquilo que todo mundo consegue sem maiores consequências" (RANK, 1925/1971, p. 41). Esse caso é particularmente interessante, pois o schlemiel nos remete também ao personagem que perde tudo o que tem para seu duplo. Tanto aquele que sofre com o duplo quanto o schlemiel parecem ocupar um lugar muito específico no conflito edípico: correspondem àquele que está fadado ao fracasso, sendo incapaz de amar e assombrado por uma figura rival que o supera em tudo e o persegue, tornando sua vida miserável.

Em termos da organização libidinal, trata-se do registro fálico, em que a potência é vivida de forma idealizada, uma superpotência que tudo pode (o pai tirânico), alternando-se com uma impotência aniquiladora de quem nada pode (a criança despojada). No entanto, é notável a supressão da figura do pai, no triângulo formado pelo personagem, pelo rival e pelo interesse amoroso5. O pai tirânico foi substituído por uma versão do Eu que se identificou com ele, criando a figura do rival semelhante.

Assim, ainda que o protagonista acabe por perder tudo, sendo eventualmente destruído, há também um triunfo oculto no apagamento da identidade do verdadeiro detentor da onipotência fálica - o pai tirânico -, sendo substituída pelo Eu, ou pelo menos por uma versão sua. O duplo seria esse novo corpo, ou novo Eu, para quem o protagonista secretamente transfere sua identidade, escapando assim da castração e da ruína (tal como na história do homem que engana o diabo, passando sua alma prometida para um novo e insuspeito corpo).

Em termos psíquicos, na fantasia, o duplo encontra-se no impasse da disputa fálica, do tudo ou nada, tendo como horizonte a inalcançável resolução genital de conquistas e perdas parciais. Enquanto não é possível a resolução, as formas narcísica e objetal do amor parecem irredutíveis em sua conquista de tudo ou nada, sendo o assassinato um destino inescapável: "O impulso para se livrar de forma violenta do estranho oponente faz parte, entendemos, das características essenciais do motivo [literário do duplo...]" (RANK, 1925/1971, p. 16).

Ainda na chave da organização fálica, vejamos a questão da sombra, que é também uma imagem do Eu e, de certa forma, um antecessor da forma mais acabada do duplo. Em diversas histórias retomadas por Rank, o tema principal é a sombra como duplo. A sombra é também objeto de crenças, ritos e tabus em diversas culturas antigas, e é digna de nota a expressão "ter medo da própria sombra", retomada frequentemente na literatura.

É fácil imaginar que antes da popularização e acesso ao espelho, a sombra carregava maior importância em sua ligação com o Eu. O autor cita o historiador alemão E. L. Rochholz (RANK, 1925/1971, p. 49), para quem o tema da sombra é origem do duplo, dos espíritos guardiões e de diversas outras crenças. Mais especificamente, nesse sentido: "[…] o conceito primordial de alma, como descreve [o historiador] Negelein, era um 'monismo primitivo' em que a alma era compreendida como um analogon da forma do corpo. Assim, a sombra, inseparável da pessoa, torna-se uma das primeiras 'materializações' da alma humana, 'muito antes de o primeiro homem ter visto seu reflexo em um espelho' (Negelein)" (RANK, 1925/1971, p. 59).

Os temas edípico e fálico também aparecem nas crendices acerca da sombra - há uma série de tabus e ligações mágicas entre a sombra e a gravidez:

Assim, por exemplo, entre os nativos do sul da Austrália há motivo para divórcio quando a sombra do marido acidentalmente recai sobre sua sogra. Na Índia central há um medo popular de ser engravidada por uma sombra, e mulheres grávidas evitam o contato com a sombra de um homem, uma vez que poderia afetar a criança, deixando-a parecida com ele. [...] Quando nós comparamos essas características com aquelas das sombras que crescem e diminuem, e com a correspondente virilidade variável [...], a representação simbólica da sombra como potência masculina fica evidente (RANK, 1925/1971, p. 54).

Outro exemplo da rivalidade fálica, mais próximo de nossa cultura: "Em outra ocasião, como contou um amigo, o poeta [Chamisso, o schlemiel ] e Fouqué saíram para um passeio ao sol em um momento do dia em que a sombra do pequeno Fouqué parecia quase tão grande quanto a do alto Chamisso. Dizem que este último então ameaçou, em tom de brincadeira, enrolar a sombra do companheiro" (RANK, 1925/1971, p. 41).

A sombra pode sugerir um casal ilícito, pode engravidar inadvertidamente, pode tirar ou aumentar a força, pode se tornar a marca de uma maldição de morte, deve ser especialmente observada nas relações entre sogra e genro, e assim por diante. Assim como a forma mais desenvolvida do duplo, a sombra também retoma elementos do conflito edípico, mas com ênfase fálica evidente. Como o falo, a sombra é uma parte do indivíduo que possui certa autonomia - é também um duplo, um amigo, um companheiro. É parte e, ao mesmo tempo, um símbolo do Eu, conforme apontou Ferenczi (1926/1993) a respeito do falo, em seu trabalho sobre Gulliver. Mesmo hoje, ainda que em um registro mais cômico que ritualístico, não raro homens e mulheres possuem apelidos para seus genitais, como se fosse uma pessoa própria.

As questões fálicas mais concretas, presentes no tema da sombra - crescimento, diminuição, força, fraqueza - comparecem no duplo de modo mais discreto, geralmente como sentimento de desamparo. No duplo, há uma oscilação entre a questão fálica e genital, e a ênfase passa a ser o impedimento da relação amorosa - ou seja, a problemática genital é dominante. O mesmo acontece com o tema correlato da maldição do envelhecimento e das tentativas de manter a juventude. O falo, a juventude, a saúde, a potência etc. equivalem a diferentes modalidades de investimento narcísico, sendo a identificação com o rival semelhante o ápice em termos da cena edípica.

 

6. O rival na figura de "uma criança que odeio"

 

Tendo em mente o tema da rivalidade fraterna, vejamos algumas conexões entre o duplo e o texto de Freud de 1920, Batem numa criança. Freud notou a recorrência de uma fantasia ou devaneio nos relatos de alguns pacientes, em que observam uma cena na qual uma criança é espancada. Em seu texto, a discussão dessa fantasia o levou a um último desenvolvimento do que ficou conhecido como sua primeira teoria do masoquismo (em que este é entendido como secundário, uma transformação do sadismo). À insistente questão feita por Freud a alguns de seus pacientes, "Quem era a criança que apanhava?", a resposta era sempre de um sujeito indeterminado: batem em uma criança.

Como resultado dessas análises, Freud pôde resumir a fantasia em três cenas que se sucedem: 1) "Meu pai bate na criança que odeio"; o sadismo se apresenta em sua forma primeira, anterior à repressão. 2) "Sou castigada por meu pai"; nessa cena, inconsciente, a repressão atua causando a reversão do sadismo em masoquismo. 3) "Crianças apanham de adultos"; na cena mais acabada, o sadismo é recuperado, através de uma formação de compromisso. A figura paterna e a relação masoquista permanecem reprimidos. São transformações operadas pela reversibilidade da pulsão, pela culpa e pela triangulação edípica" (FREUD, 1920/2010, p. 226).

A origem dessa fantasia é relevante para a discussão do duplo, pois remete ao rival semelhante, na figura da "criança que odeio". Os ciúmes de um irmão (real ou imaginário) pelo amor dos pais talvez seja o primeiro duplo da vida, depois de o rival original do amor edípico, o pai, ter sido deslocado para a figura do irmão, um semelhante. Assim, o desconhecimento sobre quem é que apanha, e quem é que bate, na terceira fase da fantasia, não é apenas sinal da repressão (que oculta o Eu da fantasia masoquista), mas também uma genuína confusão resultante da identificação com essa figura que é, a um só tempo, semelhante e rival.

Contudo, o sadismo contra o rival semelhante, uma vingança por ele roubar o amor parental, passa a ser também fonte de culpa. Quando esta se torna intolerável (pelo excesso de sadismo, ou pela ameaça da destrutividade voltar contra si), através de uma operação ambivalente o sadismo abandona o objeto e se volta narcisicamente ao Eu, ao mesmo tempo em que se identifica com o rival e estabelece uma relação - agora masoquista -, com o pai. Surge a segunda cena da fantasia:

Ser golpeado é agora uma convergência de consciência de culpa e erotismo; é não só o castigo pela relação genital proibida, mas também o substituto regressivo para ela, e desta última fonte retira a excitação libidinal que a partir de então estará unida a ele e que achará desafogo em atos masturbatórios. Essa é, enfim, a essência do masoquismo. (FREUD, 1920/2010, p. 231).

A manutenção do prazer na passagem do sadismo para o masoquismo, assim como a substituição do rival semelhante pelo próprio Eu, revelam também que a criança passa a desejar apanhar. O espancamento é redescoberto como fonte de prazer, que agora quer para si, excluindo a criança odiada da cena. O espancamento passa a ser sinal ambivalente de ódio e amor, de rejeição e interesse dos pais. Se antes a cena comprovava a exclusividade do amor paterno porque ele bate em outra criança, agora o amor é simultaneamente confirmado e desconfirmado porque ele bate nela própria.

Por fim, o desejo de apanhar do pai e o prazer masoquista com ele revelam uma relação incestuosa sobre a qual o recalque incidirá com especial força (lembremos que esta segunda cena é inconsciente, e só pôde ser conhecida após o trabalho analítico). Disso resulta a terceira cena: o pai é substituído por um adulto indeterminado, há o recalque da relação masoquista de prazer com ele, e o Eu é substituído novamente pelo rival semelhante, a criança odiada, com a concomitante retomada do sadismo, como uma solução de compromisso.

A fantasia de uma criança sendo espancada e as histórias de duplo compartilham vários elementos e traços comuns: a supressão da figura paterna, ou seu deslocamento para uma personagem secundária e, finalmente, sua substituição pelo rival semelhante. Tanto a fantasia do duplo quanto a do espancamento de uma criança encontram suas origens nos conteúdos infantis: a figura do irmão imaginário, a fantasia de produzir bebês junto à mãe, o medo do pai tirânico e o prazer masoquista pelo pai do incesto, operados pela dimensão ambivalente das pulsões.

 

7. O duplo feminino

Por fim, voltemos ao livro de Rank para responder a uma questão colocada pelo editor e tradutor Harry Tucker Jr., em sua introdução: "Talvez estes colegas [antropólogos, psicólogos e estudiosos de literatura comparada] possam prover uma explicação para a interessante característica, já observada por Otto Weininger, de que o duplo não aparece na forma feminina, mas somente na masculina […]" (RANK, 1925/1971, p. 21).

Como uma primeira aproximação a essa questão, diríamos que ela parte de uma generalização incorreta. Pode ter sido uma conclusão enviesada pela literatura disponível naquele momento, por uma preferência da temática masculina. Contudo, hoje não seria mais possível fazer tal afirmação. Em um trabalho anterior, eu já havia apresentado o duplo da figura feminina major Kusanagi, na produção japonesa Ghost in the Shell (1995). Além dela, outras obras especialmente exemplares são o Cisne negro (2010), de Darren Aronofsky, A dupla vida de Véronique (1991), de Kieslowski ou ainda Meu outro eu (2013), de Isabel Coixet. Isto para citar apenas algumas que me vêm imediatamente à lembrança.

Mesmo à época, a situação não era absoluta; havia, por exemplo, The poor Clare, de Elizabeth Gaskell (1856/2017), publicada em três partes na popular revista de Dickens, Household Words. Escapou também a Tucker que dentre os exemplos de Rank, está lá para a figura feminina o importante tema do espelho, da sombra, do interesse pela imagem de si e do envelhecimento, elementos que compõem o duplo: "A perda da própria sombra, novamente, é mais claramente enfatizada no poema 'Anna', de Lenau, cuja fonte é a lenda sueca sobre uma bela moça que temia perder a beleza se tivesse filhos" (RANK, 1925/1971, p. 11).

Ainda que não apresente o duplo em sua forma mais acabada, o conflito em A Branca de Neve possui todos os elementos do estranho na configuração edípica feminina: o espelho, o interesse pela imagem de si, a inveja e disputa pela imagem rival, a morte e a solução através do interesse amoroso.

Assim, a questão de por que o duplo há de ser sempre masculino deve ser transposta para o porquê da preferência pelo protagonismo masculino naquela época, e não como algo inerente ao duplo (além do mais, não é tão óbvio que o duplo devesse ter sempre o mesmo sexo do personagem protagonista. Mas deixemos essa questão de fora, por ora).

Devemos responder a Tucker, portando, em termos da maior resistência, à época, em admitir os elementos de rivalidade, perseguição, inveja e disputa como uma realidade do protagonismo feminino, em sua própria cena edípica. Restava-lhe apenas o lugar de coadjuvante na cena masculina.

 

Conclusão

Vimos como o tema do duplo abrange diversas modalidades do sentimento de si, que pode habitar as sombras, as imagens refletidas, outros corpos, os sonhos etc., em uma cena dramática de disputa, perseguição, busca pelo amor e morte. Ao longo das décadas seguintes à publicação original do texto, a psicanálise voltaria sua atenção cada vez mais para a linguagem, para as relações de objeto e para aquilo que também se chamou de problemática da intersubjetividade. O desenvolvimento das temáticas da cisão, das introjeções, das identificações, incorporações, da tópica e da estrutura do Eu complementam os aspectos econômicos e dinâmicos com que os temas do duplo e do estranho foram formulados, originalmente.

A estranha figura do duplo nos lembra que a realidade do psiquismo é a de distintos espaços, da diferenciação do Eu consigo próprio e do atravessamento pelo outro, tudo sob a marca das pressões da sexualidade, dos impulsos internos e externos. Trata-se de um tema especialmente favorável para as investigações acerca do narcisismo, como o demonstrou Rank em seu importante estudo. Por fim, procurei destacar a importância de se tomar esses elementos no contexto da cena edípica, principalmente nos impasses e fracasso da passagem do registro fálico para o genital.

 

 

Referências

CISNE Negro (Black Swan). Direção: Darren Aronofsky. Produção: Mike Medavoy, Arnold W. Messer, Brian Oliver e Scott Franklin. Roteiro: adaptado de Andrés Heinz. EUA: Fox Searchlight Pictures, 2010.         [ Links ]

A DUPLA vida de Véronique (La double vie de Véronique). Direção: Krzysztof Kieslowski. Produção: Leonardo De La Fuente. França, Polônia e Noruega: Sidéral Productions, 1991.         [ Links ]

O ESTUDANTE de Praga (Der student von Prag). Direção: Paul Wegener e Stellan Rye. Produção: Paul Wegener. Roteiro: adaptado de Hanns Heinz Ewers. Império germânico: 1913.         [ Links ]

FERENCZI, S. (1926). Fantasias Gulliverianas. São Paulo: Martins Fontes, 1993. (Obras completas Sándor Ferenczi, 4).         [ Links ]

FREUD, S. (1925). A negativa. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2007. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 3).         [ Links ]

FREUD, S. (1923). O Eu e o Id. Rio de Janeiro: Imago, 2007. (ESB, 3).         [ Links ]

FREUD, S. (1920). Batem numa criança - Contribuição ao conhecimento da gênese das perversões sexuais. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. (Obras completas, 14).         [ Links ]

FREUD, S. (1919). O inquietante. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. (Obras completas, 14).         [ Links ]

FREUD, S. (1915). Os instintos e seus destinos. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. (Obras completas, 12).         [ Links ]

GASKELL, E. (1856). The poor Clare. California: CreateSpace, 2017.         [ Links ]

GHOST in the shell (Kôkakukidôtai). Direção: Mamoru Oshii. Produção: Mitsuhisa Ishikawa, Ken Iyadomi, Kodansha e Yoshimasa Mizuo. Japão: Manga Entertainment, 1995.         [ Links ]

MEU outro eu (Another me). Direção: Isabel Coixet. Produção: Mariela Besuievsky, Nicole Carmen-Davis e Rebekah Gilbertson. Baseado no livro de Catherine MacPhail. Reino Unido, Espanha: Rainy day films, 2013.         [ Links ]

RANK, O. (1925). The double. A psychoanalytic study. North Carolina: The University of Carolina Press, 1971.         [ Links ]

 

Artigo recebido em: 21/02/2019
Aprovado para publicação em: 07/10/2019

Endereço para correspondência
André De Martini
E-mail: martini.de@gmail.com

 

 

*Psicanalista. Membro Associado do Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro (CPRJ). Pós-doc vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Doutorado e mestrado pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). Graduado em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP). Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
1Para mais detalhes sobre as publicações originais, remeto o leitor ao prefácio de Harry Tucker Jr. (Cf. RANK, 1925/1971).
2Tradução minha, assim como para as demais citações do original em inglês.
3Rank aponta a interessante ideia de Wundt, para quem a origem da noção de alma estaria no sonhar, e não na observação das sombras (RANK, 1925/1971, p. 82).
4A identificação deve ser entendida, aqui, no sentido ferencziano de projeção - o objeto é engolfado por uma ampliação dos limites do Eu.
5Uma supressão semelhante ocorre na fantasia em que "uma criança é espancada", como veremos adiante.

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