34 35ANÁLISE SOBRE A NEUROCIÊNCIA APLICADA NA ESCOLA, ESPAÇO DE CONHECIMENTO, DE PESQUISA E DE APRENDIZAGEM. DESAFIOS E PERSPECTIVAS EM TEMPOS ESCOLARES. ALGUMAS POSSIBILIDADES.INDISCIPLINA, VIOLÊNCIA E BULLYING: UM DESAFIO PARA OS GESTORES ESCOLARES 
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Construção psicopedagógica

 ISSN 1415-6954 ISSN 2175-3474

Constr. psicopedag. vol.34 no.35 São Paulo  2024   24--2024

https://doi.org/10.37388/cp2024/v34n35a08 

MONOGRAFIA

FOME DE APRENDER: CONTRIBUIÇÕES DO LETRAMENTO RACIAL PARA A PSICOPEDAGOGIA

HUNGER TO LEARN: CONTRIBUTIONS OF RACIAL LITERACY TO PSYCHOPEDAGOGY

Paulo Sérgio de Oliveira Júnior1 

1Especialista em Psicopedagogia pelo Instituto Sedes Sapientiae, licenciado em Letras (USP) e Pedagogia (Uninove) e bacharel em Psicologia (UMC). É Professor de Língua Portuguesa, Psicólogo (CRP 06/161.507) e Psicopedagogo, além de revisor de textos. É membro do Departamento de Psicopedagogia do Instituto Sedes Sapientiae e monitor nas disciplinas de Monografia e Metodologia da Pesquisa Científica, do curso de pós-graduação. É conselheiro do Tear Junguiano - Núcleo de Psicologia Analítica de Mogi das Cruzes e Alto Tietê, exercendo, atualmente, a função de Coordenador Geral. E-mail: paulosgoliveira3882@gmail.com.


RESUMO

O presente artigo, fruto da experiência clínica obtida durante a especialização, avalia as ideias de Letramento Racial Crítico como possível contribuição para a Psicopedagogia. Para tanto, é feita uma revisão bibliográfica, destacando os conceitos da Psicopedagogia acerca da dificuldade de aprendizagem, déficit de aprendizagem e fracasso escolar, principalmente, a partir do trabalho de Fernandez (2001). Também são retomados os conceitos de Letramento e Alfabetização para que possa ser introduzido o termo Letramento Racial Crítico, como propôs Ferreira (2015). Por fim, é apresentado um estudo de caso de uma paciente negra com dificuldades de expressão escrita, apresentando os recursos utilizados para a intervenção, por meio de objetos culturais de origem afro-descendente (filmes e textos de temática negra). O relato apresentado demonstra que os objetos culturais apresentados pelo profissional, atrelado ao vínculo estabelecido entre terapeuta e paciente, possibilitaram a instauração de uma espaço criativo, no qual a atendida pôde ressignificar sua visão frente à expressão escrita.

Palavras-Chave: Aprendizagem; Letramento; Racismo; Objetos Culturais

ABSTRACT

This article, the result of the clinical experience obtained during the lato sensu postgraduate course - specialization, evaluates the ideas of Critical Racial Literacy as a possible contribution to Psychopedagogy. To this end, a bibliographical review is carried out, highlighting the concepts of Psychopedagogical Science regarding learning difficulties, learning deficits and school failure, mainly based on the work of Fernandez (2001). The concept of Literacy is also revisited so that the term Critical Racial Literacy can be introduced, as proposed by Ferreira (2015). Finally, a case study of a black patient with written expression difficulties is presented, presenting the resources used for the intervention, through cultural objects of Afro-descendant origin (films and texts with black themes). The report demonstrates that the cultural objects presented by the professional, linked to the bond established between therapist and patient, enabled the establishment of a creative space, in which the client was able to give new meaning to their vision in relation to written expression.

Key words: Learning; Literacy; Racism; Cultural Objects

Sabedoria é comida que nos alimenta.

(Rodrigo Andrade)

Introdução

Este artigo apresenta um trabalho de pesquisa, desenvolvido durante a formação em Psicopedagogia: Atendimento Clínico e Institucional, curso de especialização oferecido pelo Instituto Sedes Sapientiae. A pesquisa culminou na produção da monografia Refeição à brasileira: Psicopedagogia e Letramento Racial (2022), a qual aguarda sua catalogação pela biblioteca desse instituto.

O objetivo do texto é avaliar as ideias de Letramento Racial Crítico como possível contribuição para os estudos de Psicopedagogia. Considerando que nosso ensino público é marcado por uma heterogeneidade de alunos em diversos aspectos - classe social, níveis de ensino e aprendizagem, etnias, configuração familiar, orientação sexual etc. -, programas de ações afirmativas têm sido implantadas como forma de acolher a todas as pessoas presentes no contexto educacional, partindo da legislação que foi se atualizando nos últimos anos. Como exemplo, temos as Leis nº. 10.639, de 09/01/2003 e nº. 11.645, de 10/03/2008, as quais alteraram a Lei nº. 9.394, de 20/12/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), acrescentando a obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.

Do mesmo modo, essa diversidade também alcança a clínica psicopedagógica, na medida em que pessoas afrodescendentes buscam tal modalidade de atendimento clínico e se dão conta de que experiências relacionadas ao racismo estrutural, as quais sofreram, também são marcas pessoais que estão ligadas à constituição de si mesmas como sujeitos aprendentes e ensinantes.

A metodologia de pesquisa é a qualitativa, pois é o resultado do contato direto do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo investigada, tendo mais relevância a perspectiva dos participantes acerca do tema, o que requer uma especial atenção à maneira como são coletadas impressões e percepções desses participantes. Sendo assim, além de ter um caráter descritivo, a pesquisa qualitativa valoriza o processo e o sentido dado pelos participantes a ele. Caracteriza-se, também, esta pesquisa como etnográfica, pois ela parte da descrição de um sistema de significados culturais de um determinado grupo. Como técnica de pesquisa, além da pesquisa bibliográfica, foi adotado o estudo de caso, a fim de que fosse feita uma análise particular de um percurso de aprendizado (LÜDKE & ANDRÉ, 2013).

Durante este artigo, são retomados os conceitos de Psicopedagogia e Letramento Racial Crítico, conforme a seleção de autores que versam sobre o assunto: Fernandez (2001), Bossa (1994) e Rubinstein (1999; 2008), para a Psicopedagogia e Ferreira (2015), para o Letramento Racial. Em seguida, um episódio clínico é apresentado como ilustração para se compreender a intervenção psicopedagógica adotada, tendo em vista a escolha de objetos culturais, pensados para a participante atendida. Por fim, o artigo se encerra com a discussão dos resultados, fazendo as considerações finais.

Aprendizagem e Psicopedagogia

A Aprendizagem é um processo inerente ao ser humano, o qual ocorre em diversos contextos. Além disso, faz parte de uma visão sistêmica, em que família e meio social também participam de seu processo. Nas palavras de Bossa (1994, p. 28): “Mediante a aprendizagem, o indivíduo se incorpora ao mundo cultural, com uma participação ativa, ao se apropriar de conhecimentos e técnicas, construindo, em sua interioridade, um evento de representações simbólicas”.

A Psicopedagogia, no início de sua formação, encontrou-se, muitas vezes, em um processo de formulação de seu objeto de estudo e construto teórico. Afastando-se da visão de Psicopedagogia como reeducação, esse campo do conhecimento desenvolveu o olhar para identificar o potencial de aprendizagem que o ser humano tem. Em autoras como Rubinstein (1999), é notável a importância de incentivar o anseio de saber, entendendo como o sujeito da aprendizagem apreende as informações e as transforma em conhecimento, modificando-as e sendo modificado por elas.

A elaboração desse objeto de estudo está diretamente atrelada à construção da identidade do profissional de Psicopedagogia. Há outros campos de atuação para o psicopedagogo que não só a clínica e a escola. Para Rubinstein (2008), a perspectiva psicopedagógica evoluiu, partindo de um ponto de vista pluridisciplinar, passando-se para o interdisciplinar e atingindo o enfoque transdisciplinar. Isso significa que a Psicopedagogia tem uma fonte plural de conhecimento, tendo como foco o sujeito da aprendizagem, o qual é ensinante e aprendente ao mesmo tempo.

Durante o trabalho psicopedagógico, o atendente e o atendido são levados a refletir sobre seus processos de aprendizagem, ou seja, sobre como o cliente se desenvolve e como o atendente conduz o seu trabalho. Trata-se de um processo de autoconhecimento, com atenção especial à forma como um sujeito aprende/ensina. É papel desse profissional, além de refletir sobre a aprendizagem, identificar e elucidar as crenças implícitas, realizando um trabalho com base no arcabouço teórico da Psicopedagogia. Por essa razão, é muito importante para a formação do profissional reconhecer seu processo de aprendizagem para compreender a aprendizagem do outro, atendido por ele, desenvolvendo, assim, uma postura de empatia. A relação, num atendimento psicopedagógico, é necessária e contribui para uma mediação sólida e coerente com o propósito do profissional.

Em se tratando de aprendizagem, a Psicopedagogia não está à parte do fenômeno escolar e do processo de escolarização. Fernandez (2001) contribui para o entendimento acerca do objeto de estudo da Psicopedagogia, apresentando como se entende o sujeito, ao mesmo tempo, ensinante-aprendente-autor, atuante e atuando em todos os vínculos. Quando se denomina os termos ensinante e aprendente, o sujeito é visto de forma singular diante do conhecer e do aprender. Além disso, paralelo ao trabalho com a criança e o adolescente, há aquele feito com o grupo familiar, pois também são seres ensinantes-aprendentes. O contexto familiar, segundo a estudiosa Argentina, conta para a formação de nossas crenças sobre a aprendizagem.

Compreendendo a singularidade do sujeito diante do conhecer, temos a preponderância do sujeito autor: aquele que, diante do conhecimento, produz a transformação para si e para os outros a sua volta (FERNANDEZ, 2001). Uma formação em Psicopedagogia necessita do compromisso de desenvolver também a autoria do profissional, por meio da construção da sua identidade, em parceria com o autoconhecimento, sem, no entanto, afastar-se da autocrítica, necessária para se atualizar e se adequar a cada nova situação apresentada em um atendimento psicopedagógico. Assim, conforme aponta Delors (1999), pratica-se o aprender a ser, mediante a imaginação e a criatividade para o desenvolvimento da autonomia e da responsabilidade social.

Este artigo destaca o trabalho de Alícia Fernandez e sua obra, Os idiomas do aprendente (2001), colocando-o em diálogo com o tema proposto, qual seja, as contribuições do Letramento Racial Crítico para a Psicopedagogia. Para a autora, os profissionais de educação confundem dois fenômenos relacionados ao aprender: problemas de aprendizagem e fracasso escolar. Para refletir sobre o tema, ela propõe uma associação com o processo de alimentação: há pessoas desnutridas e pessoas com transtornos alimentares. Entenda-se como alimento o conhecimento.

A pensadora argentina critica o fato de o fracasso escolar ser considerado, por especialistas de educação, como resultado de um problema de aprendizagem, tal qual alguma patologia no aparelho digestório. Segundo a autora, o fracasso escolar é um estado de desnutrição decorrente do contexto que privou a pessoa de se alimentar adequadamente. No entanto, o ser desnutrido nem sempre manifesta sua fome como reação à falta de alimento do ambiente.

Para Fernández, o sistema ensinante precisa ter espaço para a “autoria do pensamento” (FERNÁNDEZ, 2001, p. 26), sem o qual o aprendente sofre, em sua totalidade, com o fracasso escolar. Sabendo que, durante o período escolar, há uma grande força de construção do desenvolvimento e da identidade do indivíduo, percebe-se um grande reflexo na maneira como o aprendente se vê diante da aprendizagem e na relação com os outros. É no ambiente escolar que há o reconhecimento (ou não) de suas habilidades e competências.

Cabe ao psicopedagogo possibilitar espaços de autoria do pensamento, por meio da recuperação do desejo de conhecer e de saber que é imanente a todo indivíduo. Nas palavras da autora:

A liberação da inteligência aprisionada só poderá dar-se através do encontro com o prazer de aprender que foi perdido. Por tal razão, acreditamos que nossa principal tarefa na relação com os pacientes (aos quais denomino “aprendensinantes”) é “ajudá-los a recuperar o prazer de aprender” e, de igual modo, pretendemos, para nós mesmos, recuperar o prazer de trabalhar aprendendo e de aprender trabalhando. (FERNÁNDEZ, 2001, p. 27).

A estudiosa argentina alerta para a formação de professores que não alia conhecimento à história individual. Nesse tipo de formação, valoriza-se somente o acúmulo do conhecimento, sem espaço para a vivência individual dentro da aprendizagem e para o desenvolvimento do sujeito autor do pensamento.

Além da vivência em aprender e na autoria do pensamento, ainda sobre o ambiente escolar, é necessário desenvolver, entre os docentes, a diferença entre fracasso escolar, que nada mais é do que a “desnutrição do conhecimento” e o problema de aprendizagem, patologia orgânica como uma “anorexia do conhecimento” (FERNÁNDEZ, 2001). Para tanto, faz-se uma análise da modalidade de aprendizagem do aprendente em sua relação com a modalidade ensinante da escola. Nesse processo de análise, deve haver espaço para a dinâmica familiar e social, o que implica em uma escuta atenta e para além do fenômeno observado. Com a palavra, a autora:

Tanto no fracasso escolar quanto no problema de aprendizagem, o aluno mostra que não aprende, mas, no primeiro caso, a patologia está instalada nas modalidades de ensino da escola, e esse é o lugar sobre o qual se deve, prioritariamente, intervir. (FERNÁNDEZ, 2001, p. 33).

O Letramento Racial Crítico

Antes de introduzir o termo, cunhado por Ferreira (2015), é necessário tecer algumas palavras sobre o próprio letramento, tema essencial em todos os cursos de Educação e de Psicopedagogia.

O termo letramento foi introduzido, pela primeira vez, por Kato (1986), em seu trabalho No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística. A autora, preocupada em construir uma teoria da aprendizagem da linguagem escrita, reflete sobre a função da escola que é a de formar cidadãos letrados, capazes de usar a linguagem escrita para as demandas sociais desse tipo de linguagem.

Magda Soares (SOARES, 2004) afirma que é muito comum confundir letramento com alfabetização, pelo fato de o primeiro termo ter sido introduzido recentemente no léxico de ciências como a Pedagogia. Por estarmos no campo da Psicopedagogia, é essencial que tenhamos clareza quanto ao sentido de cada um desses conceitos.

Para a autora, “alfabetização é o processo pelo qual se adquire o domínio de um código e das habilidades de utilizá-lo para ler e escrever, ou seja: o domínio da tecnologia - do conjunto de técnicas - para exercer a arte e ciência da escrita” (SOARES, 2004, p. 91). Sendo um processo, é necessário que certas competências sejam apreendidas para se efetivar a alfabetização, como a codificação de fonemas em grafemas, decodificação de grafemas em fonemas, habilidades motoras de manipulação de instrumentos e equipamentos de codificação e decodificação, dos suportes em que se escreve e lê, postura correta e organização espacial da escrita na página.

A autora ainda enfatiza que a definição de alfabetização tem sentido próprio, contrapondo-o ao sentido ampliado que vem sendo difundido, acompanhado de adjetivos que caracterizam a qual tecnologia se refere a aquisição, como alfabetização numérica, alfabetização musical etc. Enquanto a alfabetização diz respeito às habilidades que levam à codificação e decodificação da escrita, o letramento diz respeito ao uso dessas habilidades com uma determinada finalidade: adquirir conhecimento, informar-se, interagir com os outros, pelo próprio prazer estético, entre outros (SOARES, 2004).

Para Magda Soares, atualmente, com a evolução dos conceitos, alfabetização e letramento são tratados de forma distinta, por terem naturezas diferentes. No entanto, esses processos são interdependentes e indissociáveis. Nas palavras da autora:

A alfabetização - a aquisição da tecnologia escrita - não precede nem é pré-requisito para o letramento, isto é, para a participação em práticas sociais de escrita, tanto assim que analfabetos podem ter um certo nível de letramento: não tendo adquirido a tecnologia da escrita, utilizam-se de quem a tem para fazer uso da leitura e da escrita; (...) a tecnologia da escrita é aprendida (...) através de atividades de letramento, isto é, de leitura e produção de textos reais, de práticas sociais de leitura e de escrita. (SOARES, 2004, p. 92)

Britto (2004) afirma que o termo letramento é uma versão em português do termo inglês literacy, comumente traduzido por alfabetização, num momento em que se compreendia esse processo como também a inserção do indivíduo no mundo da escrita, consequentemente, na perspectiva de formação do cidadão leitor e escritor. A nova tradução dada ao termo em inglês deve-se ao fato de que, com os avanços na pesquisa em alfabetização, surgiram novos sentidos para o ser alfabetizado na sociedade contemporânea, levando-se em conta a interação, a participação social e a construção do conhecimento.

Ao tratar de alfabetização e de letramento, não podemos deixar de lado o termo escolarização, muito caro para nossos estudos em Psicopedagogia. Segundo Soares (2004), podemos entendê-lo do ponto de vista das relações entre níveis de aprendizado escolar e níveis de letramento, e também do ponto de vista das práticas sociais e práticas escolares de leitura e de escrita.

Comumente, associamos de forma natural alfabetização e escolarização, embora seja possível aprender a ler e a escrever em instâncias não escolares, como no seio familiar, na comunidade, na instituição religiosa, entre outros. No caso do letramento, seu vínculo com a escolarização não é tão óbvio, visto que, segundo Soares (2004), há muitas e diversas práticas de uso da leitura e da escrita, sejam sociais, sejam escolares. Para a autora:

(...) letramento é um contínuo não linear, multidimensional, ilimitado, englobando múltiplas práticas com múltiplas situações e múltiplos contextos, em que, consequentemente, são múltiplas e muito variadas as habilidades, conhecimentos, atitudes de leitura e de escrita demandadas, não havendo gradação nem progressão que permita fixar um critério objetivo para que se determine que ponto, no contínuo, separa letrados de iletrados. (SOARES, 2004, p. 95)

Dessa forma, ao tratar de letramento, não há um ponto de chegada para o letramento, em que o indivíduo “letrou-se” por inteiro. Dada a multiplicidade do fenômeno, estamos sempre em processo de letramento, à medida que participamos de eventos sociais com conteúdos de escrita.

Com as Tecnologias da Informação e da Comunicação em constante evolução, o conceito de letramento ampliou-se. Rojo (2012) nos apresenta o termo multiletramentos para abarcar a diversidade cultural. Diferente de letramentos múltiplos, os multiletramentos referem-se não só à multiplicidade cultural populacional, mas também à multiplicidade semiótica de constituição textual. A perspectiva idealizada pela autora brasileira, a partir de um grupo estadunidense que se debruçou sobre qual educação era apropriada para grupos minoritários que se interagiam com grupos hegemônicos, num mesmo espaço e de forma global. Isso implica em uma variedade de gêneros textuais híbridos, em uma multimodalidade (múltiplas linguagens), requerendo, dessa forma, práticas de compreensão e de produção próprias.

O termo letramento racial crítico é uma expressão que se encaixa na classificação de Soares (2004) de sentido ampliado por meio de uma adjetivo caracterizador, para se referir a uma prática social específica de escrita. Criado por Aparecida de Jesus Ferreira, professora do curso de Letras da Universidade Estadual de Ponta Grossa (PR), Doutora e Pós-doutora pela University Of London, trata-se do uso da escrita para se pensar raça, racismo e a identidade negra. A autora compreende que a área da linguagem deve ser uma espaço para a formação de indivíduos críticos e reflexivos, o que inclui a temática do racismo que, para a pesquisadora, precisa mobilizar todas as identidades (branca, negra etc.), a fim de que tenhamos uma sociedade mais igualitária e justa (FERREIRA, 2015).

Para a formação dessa perspectiva no campo da linguagem, Ferreira partiu de estudos acerca da Teoria Racial Crítica, originada nos Estados Unidos, por Derrick Bell e Alan Freeman, com o objetivo de fazer uma análise das experiências de estudantes afro-americanos e latinos, em relação à classe, gênero e sexualidade. Entende-se, para os autores e seus seguidores, que a teoria questiona a neutralidade que impede de ver situações sociais de privilégio de grupos dominantes e busca diminuir ou mesmo eliminar situações de racismo, sexismo e pobreza.

Um ponto essencial da Teoria Racial Crítica, e que foi adotada por Ferreira (2015), é a valorização do conhecimento empírico da população preta, fonte de compreensão de como se dá a relação social por meio da etnia. Dessa forma, há espaço para a análise, a escuta das experiências vividas por pessoas negras, seja em rodas de conversa, seja na elaboração de textos autorais sobre a experiência de racismo, por exemplo.

O destaque dado pela autora às narrativas autobiográficas advém do fato de que esse gênero textual permite espaço para que surjam questões de raça e de racismo vivenciadas pelos(as) autores(as) de seus textos. Segundo Ferreira (2015), a troca de histórias pessoais oferece a possibilidade de construir a realidade social, por meio de uma organização da experiência, inicialmente, no próprio autor do texto.

É o que Gomes (2005) afirma sobre a construção da identidade negra: para essa autora, a identidade é construída no cotidiano, mas se inicia no ambiente familiar para, em seguida, atingir outros grupos sociais. Por essa razão, há uma grande importância o ambiente escolar ter espaço para a educação antirracial. Nesse ponto, o trabalho de Ferreira (2015) contribui com essa capacitação docente, visto que seus cursos têm os docentes como público-alvo. São eles, inicialmente, a produzirem textos autobiográficos, partindo de uma questão central: “como você se deu conta de que o racismo existe?”

As autobiografias escritas por um grupo de professores tornaram-se objeto de estudo para analisar as relações raciais, seguidas de uma reflexão sobre o texto, bem como de sugestões de outros materiais, como vídeos (documentários, entrevistas, palestras), artigos científicos, no sentido de estabelecer um diálogo entre eles, enriquecendo a discussão sobre o tema. Dessa forma, parte-se da formação docente para que se reflita na interação professor-aluno e aluno-aluno, no ambiente escolar.

Os estudos de Letramento Racial Crítico são fundamentais para a Psicopedagogia, na medida em que auxiliam a situar demandas específicas de nossos atendidos, no que diz respeito à negritude e ao racismo. Embora o trabalho de Ferreira concentre-se na formação docente, o Letramento Racial Crítico pode-se adequar às pessoas que buscam atendimento psicopedagógico, criando-se um setting apto para acolher essa demanda, dando voz ao texto (oral ou escrito) que não é hegemônico, qual seja, a da pessoa pertencente a um grupo que é discriminado e tem feridas em decorrência dessa condição social. As questões sociais podem e são trabalhadas no contexto de sala de aula, porém, também podem ser tema de atendimentos psicopedagógicos clínicos e institucionais.

Dandara e a Psicopedagogia

Para compreender o papel que o Letramento Racial tem no espaço psicopedagógico de atuação, um estudo de caso será apresentado, com especial destaque a episódios relacionados ao tema da Aprendizagem.

Dandara1 (nome fictício), jovem mulher preta que, com mais de vinte e cinco anos, decidiu realizar o sonho de cursar o Ensino Superior, a graduação em Serviço Social, procurou por atendimento psicopedagógico para trabalhar as dificuldades relacionadas à escrita.

Cursar a graduação em um ambiente majoritariamente dominado por pessoas brancas e de alto poder aquisitivo a fez paralisar também, pois a jovem não se identificava como parte do grupo de colegas da universidade, mas sim, como pertencente ao grupo de funcionários, em sua maioria, formado por pessoas pretas. Além disso, as dificuldades com a linguagem escrita, principalmente, quanto à produção textual, ela as trazia dos anos de Educação Básica.

O contato inicial feito pelo WhatsApp trouxe à tona, para Dandara, o perfil e dados do psicopedagogo, o que a fez que aceitasse o atendimento psicopedagógico e seu início o quanto antes. O atendimento foi todo ele na modalidade remota. Superando a distância e obstáculos pela carência de recursos tecnológicos, foi-se construindo, entre ela e seu terapeuta, um espaço potencial de espontaneidade, a ponto de a jovem fazer-lhe um depoimento.

Logo nas primeiras sessões, Dandara olhou-o por alguns segundos e declarou, emocionada, que estava contente em ser atendida por ele, pois o via como seu par, em termos de negritude. Sem saber o que lhe responder, o terapeuta disse-lhe, sorrindo, que estava contente em atendê-la, complementando com a frase de que era muito bom tê-la ali, naquele momento. A jovem continuou a conversa, dizendo “é muito difícil pra gente conquistar as coisas, né? A gente sofre muito pra estar nos lugares”. O terapeuta lhe respondeu que sim, sem se aprofundar no assunto.

O episódio gerou comoção. Sabemos que há pacientes que escolhem terapeutas de acordo com seus perfis: se homem ou mulher, pertencente ou não a algum grupo minoritário etc.

Para Santos e Ricci (2020), a procura por um profissional negro, feita por um pessoa negra, deve-se ao fato de esta entender que, dessa maneira, haverá um espaço terapêutico para o reconhecimento e a legitimidade de um discurso, muitas vezes, marcado por episódios de injúria racial e de racismo, o que pode acarretar em intervenções com vistas à resistência e ao fortalecimento da própria identidade. Salviano (2017) complementa a visão das autoras citadas, afirmando que:

Quando um indivíduo negro procura um psicólogo também negro, o faz por identificação. Ou seja, esse indivíduo julga que um psicólogo, negro como ele próprio, saberá ouvir e acolher melhor a sua queixa, do que um psicólogo não negro. (SALVIANO, 2017)

Segundo o autor citado, terapeutas não negros, por não terem contato com conteúdos e vivências em torno do racismo, podem inconscientemente descaracterizar o discurso de exclusão, aumentando ainda mais o sofrimento psíquico de seus pacientes/clientes. Além disso, a escolha por profissionais negros é uma maneira de visibilidade da questão social que é uma marca de nosso país.

No período de anamnese, Dandara citou dificuldades em se concentrar para ler por inteiro os livros paradidáticos cobrados pela escola em que estudava. Um episódio que relatou no atendimento foi a dificuldade em ler O Pequeno Príncipe, romance escrito por Antoine de Saint-Exupéry, de 1943, que conta o encontro entre o narrador, um aviador que é obrigado a pousar no deserto do Saara, por causa de uma pane no avião, e um menino de cabelos louros e cachecol amarelo, morador do asteroide B-612. Este pede para que o homem lhe desenhe um carneiro. Assim, o animal poderia comer as ervas daninhas que cresciam em sua localidade (SAINT-EXUPÉRY, 2008).

Obra mundialmente conhecida e traduzida em diversas línguas, O Pequeno Príncipe serviu de inspiração para filmes e desenhos infantis, graças, também, à quantidade de ilustrações, feitas em aquarela, pelo autor do romance. Não podemos deixar de notar como o encontro entre o homem e a criança é uma forma de resgate do olhar infantil que o aviador havia perdido, em função do episódio narrado no começo do livro, quando o aviador, ainda criança, desenha uma cobra que engolira um elefante, porém, os adultos enxergam, nessa imagem desenhada, somente um chapéu. O desestímulo dado por eles à personagem, o que o fez desistir da carreira de artista, é transformado graças ao contato com a criança que, não só lhe pede para fazer-lhe um desenho, como também reconhece o que o aviador havia desenhado na infância.

O incômodo de Dandara em ler o clássico de Exupéry ampliava-se mais ainda com a presença da mãe, a qual, constantemente, obrigava a filha, ainda menina, a ler a obra. Dentre tantos episódios de frustração com a aprendizagem em ambiente escolar, como falas de professoras de que Dandara era “esforçada”, esse fato relatado tornou-se o ponto de partida para o trabalho psicopedagógico.

Ao relatar os primeiros contatos com Dandara, na Supervisão Clínica, houve a sugestão de conhecer e ler a obra de Rodrigo França, O Pequeno Príncipe Preto (FRANÇA, 2020).

Rodrigo França é um artista preto carioca que aborda, em suas obras, a representatividade da população preta. O livro foi ilustrado por Juliana Barbosa Pereira, animadora e designer preta. O romance é uma adaptação da peça teatral de mesmo nome. Hoje, também conta com uma versão para crianças (FRANÇA, 2021).

Voltado ao público infantil, infanto-juvenil e adulto, a obra traz uma visão afrodescendente do livro de Antoine de Saint-Exupéry, O Pequeno Príncipe. A impressão inicial (e marcante) dessa obra são as imagens de tom marrom-terra, o que nos remete à paisagem típica africana.

No caso do livro do artista brasileiro, a personagem é uma criança negra de pele retinta que mora em seu pequeno planeta, tendo de dividi-lo com uma grande Baobá, a princesa de imenso porte. Aqui está o grande diferencial entre a obra original e a releitura de França: no livro de Saint-Exupéry, o Pequeno Príncipe arranca as mudas de baobás que crescem em seu planeta, pois ameaçam ocupar toda a morada do garoto. Na versão brasileira, a baobá não só permanece no planeta do Pequeno Príncipe Preto, como é respeitada e cultuada, sendo símbolo de resistência ancestral! Ao ler a versão de França e reler a obra do escritor francês, fica nítida a diferença de pontos de vista de ambos os livros!

De volta ao livro de Rodrigo França: o Príncipe Preto, em busca de aventuras e regido por uma grande curiosidade, resolve visitar outros planetas, conhecer lugares novos e espalhar a Ubuntu. Essa palavra traduz uma filosofia africana antiga de que o indivíduo e o coletivo andam juntos, tamanha a importância que o ambiente e o grupo têm para a formação da personalidade do caráter de uma pessoa. Nas palavras de Vasconcelos (2017):

Traduzir Ubuntu para a linguagem ocidental, certamente, não é coisa fácil. Este conceito diz respeito à essência do ser humano. Quando desejamos ofertar nosso mais alto apreço a alguém, dizemos: “Yu, u nobuntu” (“Ei, ele ou ela tem Ubuntu”). Isto significa que a pessoa é generosa, hospitaleira, amigável, atenciosa e compassiva. Ela compartilhou o que possuía. Significa também que minha humanidade foi alcançada, está inextricavelmente ligada à da outra pessoa. Nós pertencemos a uma mesma força vital. A pessoa é humana porque pertence, participa, compartilha. Alguém com Ubuntu é aberta e acessível aos outros. (VASCONCELOS, 2017, p. 3)

Kashindi (2015) considera que o Ubuntu surge das vivências comunitárias, ou seja, na prática da alteridade, em que a existência da outra pessoa é condição para o desenvolvimento da própria humanidade. Vemos, aqui, como essa filosofia africana se aproxima das ideias de Vygotsky, para quem a interação social é o bem mais precioso para a formação do ser humano. Parafraseando o pensador russo, Oliveira declara que “é através da relação interpessoal concreta com outros homens que o indivíduo vai chegar a interiorizar as formas culturalmente estabelecidas de funcionamento psicológico” (OLIVEIRA, 1997, p. 38).

O Pequeno Príncipe Preto nos apresenta a Baobá, sua floração, o traço de que os galhos parecem raízes, reiterado pela lenda de que essa árvore encontra-se de cabeça para baixo, pois havia reclamado de sua aparência para o Criador e este resolveu calá-la, plantando-a dessa forma.

A ancestralidade é uma marca viva do povo africano. França traz, na voz do nosso Príncipe, o papel dos ancestrais em nossa vida. Numa relação sanguínea, o autor apresenta o ser humano como alguém interdependente, uma vez que não basta atuar no mundo: é preciso compreender-se como parte de uma cadeia de ancestrais que construíram o caminho para que ele pudesse traçar.

O didatismo de França revela-se no discurso da identidade preta afirmativa, não só a partir da ascendência, mas também dos traços fenotípicos. O tratamento dado a eles desenvolve a autoestima, desconstruindo expressões preconceituosas, como “cabelo ruim”.

Afora a presença de personagens conhecidas do universo de Saint-Exupéry, como o Rei do planeta habitado unicamente por ele, ou a Raposa que precisa ser cativada, o Pequeno Príncipe Preto, às voltas com o Planeta Terra, estranha a falta de empatia das pessoas apressadas e pouco acolhedoras. As diferenças culturais entre essas pessoas e nosso herói são marcadas por uma discriminação diante daquilo que é novo e incomum. O garoto preto entra em contato com seres competitivos e não colaborativos, indo na contramão do que propõe a filosofia africana do Ubuntu. A estranheza da nossa criança preta o fez desejar retornar para seu planeta e sua baobá.

O trabalho de Rodrigo França é fundamental para trabalhar a negritude, que é parte da identidade brasileira, além de ser um alerta para o trabalho com a coletividade, característica essencial de povos como indígenas e africanos, mas desvalorizada nesta sociedade de consumo de base eurocêntrica.

A obra de França foi apresentada para Dandara, algumas sessões depois do início dos atendimentos, a partir da reflexão sobre o episódio de contato de leitura que foi proposto pela mãe de nossa jovem. O psicopedagogo disse à jovem que entrara em contato com a obra de um escritor brasileiro negro que escrevera sua versão do clássico de Saint-Exupéry e lhe passou as imagens da obra. Dandara demonstrou interesse em saber mais. O terapeuta, então, contou-lhe sobre o papel que o artista buscava ao criar sua versão afrodescendente, voltada para o público brasileiro. Dandara, por alguns segundos, viu as imagens do livro.

O profissional, então, propôs fazer uma leitura em conjunto, ou seja, em que alternassem os trechos de leitura da obra. Dandara deu-lhe nova proposta: ler a obra toda sozinha! A jovem dizia que contava as páginas de um livro para ter ideia de quantas ainda faltavam para terminar a leitura.

Neste momento, Dandara se apresentou ao terapeuta, pela primeira vez, como leitora. Sua leitura não fluía como leitora experiente: por vezes, parecia ainda decodificar o que acentos e pontuações serviam para a palavra e para a frase. Ela, diante de trechos incompreensíveis, parava e retomava algumas frases anteriores, obstinada em cumprir sua aventura. O psicopedagogo, então, colocou-se como testemunha desse seu processo de reconhecer-se como leitora autônoma.

Ao final da leitura, Dandara respirou fundo e lhe disse “consegui”. O terapeuta lhe perguntou o que sentiu ao ler o livro sozinha, ao que lhe respondeu “aliviada”. O evento com o qual se comprometera não era só um fato corriqueiro: Dandara, inconscientemente, revisitou o momento em que sofria ao ler em voz alta, por obrigação da mãe. Agora, num ambiente de maior confiança, sem a conduta repressiva materna, a jovem encontrou espaço próprio para si, lidando com as pedras no caminho que a conduziam ao prazer de ler. A jovem também fez um julgamento da obra, elogiando as imagens. Comentou que conhecia o termo Ubuntu e ampliou esse saber, com a intervenção do profissional que a situou quanto à origem do termo e sua grande divulgação graças à figura do Arcebispo sul-africano Desmond Tutu.

Desse primeiro contato com a obra, foi possível ver com clareza em que momento se encontra a jovem, quanto à prática de leitura e compreensão textual. Dandara ainda precisava de mais exercícios de leitura e de escrita, para que desenvolvesse melhor essas habilidades, aproximando-se do que é esperado para uma jovem adulta, um domínio maior de leitura e produção de textos com maior complexidade.

Nos atendimentos seguintes, Dandara passou a ler todo e qualquer texto que escrevia, independente das propostas vindas de atendimentos psicopedagógicos. A jovem passou a escrever, como forma de organização interior, tudo o que sentia, e partilhava com o psicopedagogo, lendo em voz alta os seus escritos. O trabalho psicopedagógico iniciou-se no trabalho com as lacunas de aprendizagem, as quais eram reconhecidas, identificadas e retomadas.

Portanto, para chegar ao nível de maturidade da aprendizagem, para tornar-se fluente nas leituras previstas no Ensino Superior, Dandara precisou retomar práticas de leitura dos anos de Educação Básica.

A negritude está presente em toda atividade que Dandara realiza, visto que seu senso de identidade é muito forte. Em uma das sessões, a jovem questionou a idade do terapeuta, ao que lhe disse de imediato. Ela acreditava que ele fosse, pelo menos, dez anos mais jovem. A conversa surgiu no momento em que contou parte da trajetória profissional. Dandara, então, comentou: “mas a nossa pele ajuda a esconder a idade, né?”. Disse essa frase com um sorriso no rosto e o psicopedagogo, mais à vontade com o assunto, concordou com ela.

Diante desse traço que Dandara trazia para os atendimentos, foram selecionadas cenas e filmes que tratassem de representatividade negra. Foi escolhido o gênero curta-metragem, em função do tempo da obra ser menor, consequentemente, apresentando um enredo mais condensado, com possibilidade, após sua exibição, de discutir o tema abordado.

O primeiro curta apresentado à Dandara foi “Parece comigo” (2016)2, documentário produzido por Kelly Cristina Spinelli. O filme se inicia com o trabalho da bonequeira Ana Fulô que, para criar bonecas negras, precisa fazer adaptações a partir de bonecas brancas. Há, nesse curta, relatos de pessoas que só tiveram bonecas negras quando adultas, testes realizados com crianças que qualificam bonecas negras como “bonecas más”, ou seja, avaliadas de forma negativa, fruto do contexto social e histórico em que pessoas negras reproduzem o racismo sem o perceber. Vendo o filme, descobrimos a origem das bonecas abayomi, feitas sem cola e sem costura, a atuação de artistas pretas do rap, bem como projetos sociais criados com a finalidade de conscientização da negritude do povo brasileiro.

Depois de assistirem ao filme, Dandara fez rememorações de sua vida. Assim como mostrou o curta, também não teve bonecas negras na infância, mas sim brancas de marcas conhecidas. A jovem lembrou-se da abayomi que havia feito quando participava de um grupo psicopedagógico. Dandara ampliou sua fala, dizendo gostar muito de roupas coloridas, bem como de cabelos tingidos. Trouxe lembranças de falas racistas ouvidas em casa, dos próprios parentes, o que corrobora com o que o curta-metragem declara. Nessas falas, Dandara ouvia conselhos de como deveria cuidar dos cabelos crespos, a ponto de receber até a recomendação de alisá-los.

O diálogo em torno da identidade racial ampliou-se com o reconhecimento da imagem típica da pessoa preta, principalmente, nos cabelos e cor da pele. A vestimenta também é marca identitária, porém, nem todo afrodescendente adota o estilo africano de se vestir, marcado com o uso de estampas coloridas, turbantes e colares que, não necessariamente, relacionam-se à devoção a alguma religião de matriz africana. Desse encontro, surgiu a escolha por “Hair Love” (2019), desenho dirigido por Matthew A. Cherry.

O curta conta a história de Zuri, uma menina negra que, para fazer uma visita à mãe que está internada em um hospital, precisa fazer o próprio penteado. A mãe de Zuri é dona de um canal do YouTube que aborda penteados afro. Não conseguindo cuidar dos próprios cabelos, a menina pede ajuda ao pai. O que seria um ato corriqueiro torna-se um grande desafio que envolve aceitação do cabelo crespo como ele é e, principalmente, reconciliação, tendo por mote a frase que mãe dizia em seu canal: “um pouco de trabalho, com um grande toque de amor”.

Dandara ficou feliz em ter assistido ao vídeo e por ter-se lembrado de como era, quando criança, para pentear os cabelos. Lembrou-se de quando precisava da ajuda da mãe e como dava trabalho fazer penteados. A mãe, muitas vezes, demonstrava impaciência para com a filha, pelo fato de esta pedir determinados penteados que não eram corriqueiros. A jovem, novamente, relembrou a questão do cabelo em sua família, e do que escutava, em casa, para cuidar dos cabelos, de penteá-los com mais frequência, alisá-los etc.

A atividade proposta pôde fazer nossa jovem rememorar eventos passados de sua vida, mais alegres e otimistas. Dandara gostou de ter visto, no curta, a quantidade de cremes que a mãe de Zuri tinha e ficou com vontade de, não só ter mais cremes para o cabelo, como também de dar atenção à sua vaidade e a gostos pessoais. Sem dúvida, a vivência psicopedagógica possibilitou um trabalho de reconstrução emocional da autoestima, abrindo novas perspectivas.

Você tem fome de quê, Dandara?

Dandara procurou atendimento psicopedagógico para concluir seu curso de graduação, auxiliando-a na produção de textos acadêmicos. Olhar para a superfície não foi o suficiente: para “destravar a escrita” (expressão usada pela jovem), foi preciso encarar suas questões de aprendizagem.

Partindo do mote apresentado por Alicia Fernández (2001), Dandara sentia fome! Sua fome de aprender não era qualquer fome. Nossa jovem necessitava de uma dieta especial, feita para ela, pensando nela e, principalmente, com a sua participação! Dandara, acostumada a ouvir, em ambientes escolares, que era alguém esforçada, criou para si a imagem de que era incapaz de aprender. Somada a traumas familiares, essa incapacidade cresceu, atingindo o campo da linguagem escrita e criando lacunas em seu processo de letramento. O ambiente pelo qual passou, e que era fonte da aprendizagem, a adoeceu. Esse adoecimento está diretamente relacionado a eventos emocionais, com feridas que não foram olhadas e cuidadas. Dandara pedia um cuidado especial, pedia um alimento que fosse feito para si!

A fome de Dandara é uma fome de se sentir representada. Em contextos escolares, em que alunos são tratados de forma sui generis, não há espaço para a construção do singular. Essa singularidade é formada por ingredientes comuns a todo sujeito aprendente-ensinante, mas também conta com temperos especiais, pois o organismo de Dandara não é o mesmo que o de outras pessoas: nem sempre a jovem consegue absorver determinados alimentos, o que é natural quando estudamos que há povos que rejeitam alimentos, como é o caso de pessoas amarelas que têm dificuldade em ingerir leite e seus derivados.

A negritude de Dandara é o tempero que faltava à sua jornada de aprendizagem. Não só à formação da própria identidade, mas também o reconhecimento de espaços em que há a representatividade preta era o que nossa jovem, inconscientemente, solicitava. Sentir-se entre os pares, com a livre circulação de assuntos ligados a eles, era um pedido silencioso dela.

Mas pode vir o questionamento: Dandara não convivia com pessoas pretas? Não conhecia materiais voltados à população preta? Por um lado, sim, mas em locais específicos e com finalidades específicas. Dandara não tinha vivência de lugares positivos que pudessem falar de negritude, com conscientização, mas também com comemoração.

Assim como faltaram bonecas negras para muitas pessoas negras, na infância e adolescência, também faltaram, na vivência escolar de Dandara, espaços para trazer a negritude e, dessa forma, sentir-se pertencente. Pelas instituições de ensino que passou, não houve atenção devida à equação “modalidade de aprendizagem do aprendente” e “modalidade ensinante da escola”. O que houve foi uma incongruência entre essas modalidades e aquelas necessárias para que Dandara traçasse uma aprendizagem que lhe fizesse sentido.

As Leis nº. 10.639, de 09/01/2003 e nº. 11.645, de 10/03/2008, alteraram a Lei nº. 9.394, de 20/12/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). Nos dois parágrafos da Lei nº. 11.645/08, encontramos o seguinte texto acerca da história e cultura afro-brasileira e indígena:

§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras. (BRASIL, 2008)

A inclusão desses aspectos, em nível de escolarização oficial, aponta para a representatividade da população preta e dos povos originários, fazendo com que o ensino também tenha cara, cor e traços da população brasileira. Fagali (2007), citando Edgar Morin, aponta para a inclusão da diversidade no contexto escolar, como forma de tornar significativa a aprendizagem, com a presença da afetividade. Nas palavras da autora:

São condições de aprendizagem que geram descobertas em direção a uma nova ordem regida por uma nova forma de pensar e de sentir gerando integrações do homem e da cultura e o respeito às diferenças. Nessas situações que envolvem este diálogo, a afetividade se constitui como uma disposição emocional que possibilita o movimento complementar e contínuo entre o aproximar-se e o distanciar-se dos diferentes ângulos do eu, do outro, do sociocultural e do objeto de conhecimento. A manifestação afetiva nesse sentido requer movimento de cooperação sem excluir a competição e a busca da identidade apesar das diferenças e discordâncias. (FAGALI, 2007, p. 57)

Do mesmo modo, trabalhos voltados para relações étnico-raciais, como os de Ferreira (2015), podem servir de inspiração para desenvolver temas, como o racismo, tornando-se espaço de expressão emocional que tais temas produzem. Com a diversidade da sociedade levada para a escola, o aprendizado só tem a ganhar com um cardápio rico, balanceado e para todos os gostos. Dandara, não recebendo essa dieta durante a Educação Básica, pôde ter contato com “alimentos” que lhe fizeram sentido, no percurso psicopedagógico.

Espaços Criativos e Objetos Culturais

A Psicopedagogia torna-se um espaço para a criatividade, porém, para se chegar a ela, é preciso que esse espaço sustente a dor e o sofrimento que levam o indivíduo (e o grupo) para os atendimentos psicopedagógicos. Trata-se das lacunas de aprendizagem, intrincadas em questões emocionais e afetivas, que interferem no seu processo de amadurecimento.

Com Dandara, o estabelecimento de um vínculo, entre o terapeuta e ela, possibilitou que a jovem expusesse toda dor advinda da ausência de habilidades de escrita esperadas e cobradas pela sociedade. Essa carência veio acompanhada de uma ferida pessoal étnica, relacionada a questões de raça e de racismo, as quais não poderiam ser ignoradas.

A apresentação de obras relacionadas à negritude - objetos culturais pensados e selecionados para a jovem - fez com que Dandara se sentisse acolhida, à vontade em compartilhar suas experiências pessoais, possibilitando ressignificar sua relação com a escrita. O fortalecimento da escrita autoral, pessoal, é o resultado dessa confiança, graças a um espaço potencial que servisse de laboratório de experimentação para que retornasse à jornada de aprendizado, antes engessado.

Nessa jornada psicopedagógica, a identidade é um elemento essencial e que precisa ser desenvolvida, caso a pessoa atendida não a tenha. O espaço criativo psicopedagógico deve possibilitar esse mergulho em si mesmo, a fim que o sujeito aprendente entenda de onde sai, isto é, seu contexto familiar, seus ancestrais, conforme vimos nas narrativas selecionadas sobre negritude, para, então, traçar prospectivamente, caminhos novos. Dessa forma, a jornada de aprendizagem torna-se significativa, pois o ponto de partida é compreensível e o ponto de chegada (ou os pontos de chegada) é melhor visualizado.

Sobre o papel do espaço criativo em Psicopedagogia, Perrotta (2017) afirma:

É função do meio suprir necessidades da criança e apresentar a ela materialidades ofertadas pela cultura: pessoas, experiências, ideias, palavras, situações pelas quais pode jogar, brincar, se apropriar e vir a ser. Dançar, desenhar, escrever têm, portanto, potencialidade transformadora - o adulto também se responsabiliza por ofertar esse repertório de jogo, disponibilizando não só tempo e espaço, mas também novas ideias e meios expressivos para que cada uma possa encontrar possibilidades de estar com o outro e com ele se comunicar. (PERROTTA, 2017, p. 131)

É o meio responsável pela constituição desse sujeito, o qual está em “trânsito”, necessitando do cuidado oferecido pelo ambiente, do acolhimento de frustrações, da instauração de limites, mas também da apresentação de objetos, conforme sua singularidade (PERROTTA, 2017).

Considerações Finais

A Psicopedagogia, na sua empreitada pelo estudo da Aprendizagem, torna-se mais rica com a contribuição da visão proposta pelas relações étnico-raciais, vindas do ambiente escolar, para o contexto psicopedagógico clínico e institucional. Podemos encontrar o recorte dessas relações na teoria do Letramento Racial Crítico que, para o estudo de caso apresentado, ampliou-se para que temas pessoais voltados ao racismo institucional fossem tratados em um ambiente seguro, como deve ser o setting terapêutico psicopedagógico.

Para tanto, foi necessário que o vínculo entre terapeuta e paciente existisse, o que ocorreu graças à negritude comum a ambos, fazendo com que a jovem, relatada neste estudo, sentisse estar diante de um parceiro. Guardadas as proporções, a Psicopedagogia tem essa função: trazer o ensinante para perto do aprendente, bem como levar o aprendente para perto do ensinante. Os resultados foram positivos, na medida em que Dandara termina sua jornada psicopedagógica sentindo-se mais segura de si para produzir textos, compreendendo que, ainda que tenha dificuldades com a produção acadêmica, é capaz de escrever com subjetividade, tendo facilidade para gêneros textuais em que essa é a principal característica, como é o caso do diário pessoal.

O Letramento Racial Crítico e os objetos culturais selecionados para os atendimentos com Dandara (O Pequeno Príncipe Preto, Parece Comigo, Hair Love) tornaram-se importantes elementos para que Dandara, olhando para si, pudesse ressignificar seu lugar de aprendente. Nas palavras da jovem: “Hoje não me considero mais esforçada, mas sim lúdica.” Quando a escrita deixa de ser uma experiência traumática e se torna uma brincadeira, a Psicopedagogia, então, alcançou o seu propósito.

Referências

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1 Para esse estudo de caso, houve o consentimento da jovem e sua identidade está preservada.

2 Sou grato à professora Dra. Cláudia Mazzini Perrotta, docente do curso de especialização em Psicopedagogia, pelas sugestões de filmes, trazidas durante a orientação para a elaboração da monografia.

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