7 2Estudo de caso: a reutilização de células de ninho abandonado de Polistes (Aphanilopterus) simillimus Zikán, 1951 (Hymenoptera: Vespidae, Polistinae) por Tetrapedia (Tetrapedia) diversipes Klug, 1810 (Hymenoptera: Apidae, Apinae)Aprendizagem e eficiência da predação: uma abordagem didática 
Home Page  


Revista de Etologia

 ISSN 1517-2805 ISSN 2175-3636

Rev. etol. v.7 n.2 São Paulo dez. 2005

 

ARTIGOS

 

Padrão de atividade de onças pintadas (Panthera onca Linnaeus, 1758) mantidas em cativeiro - manejo e comportamento

 

Activity pattern of jaguars (Panthera onca Linnaeus, 1758) in captytity - handle and behavior

 

 

Bianca Campos1; Vinícios de Seixas Queiroz3; Ronaldo Gonçalvez Morato2,3,4; Gelson Genaro1,5

1 Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto
2 Associação para a Conservação dos Carnívoros Neotropicais - Pró-Carnivoros, São Paulo
3 Centro Nacional de Pesquisas para Conservação dos Predadores Naturais-IBAMA
4 Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Bandeirante, São Paulo
5 Universidade Estadual Paulista - São Vicente

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O estudo do comportamento e do bem estar de onças pintadas (Panthera onca) mantidas em cativeiro é vital para o seu manejo e reprodução. Avaliamos as condições dos recintos e o manejo de 9 animais em 5 zoológicos (SP), correlacionando-os com as observações obtidas pelo etograma que foi estabelecido visando avaliar a duração dos comportamentos destes animais. Os resultados corroboram a visão de que os tratadores dos zoológicos apresentaram uma percepção consonante com nossos achados. No entanto, as diferenças comportamentais observadas entre zoológicos, com distintos regimes de manejo, indicam que estudos futuros serão necessários. Este estudo propõe-se a contribuir para o desenvolvimento de um modelo para aplicação das técnicas de quantificação comportamental na avaliação dos diferentes efeito das condições de manutenção sobre o padrão de atividade das espécies de felídeos mantidas em cativeiro.

Descritores: Animal em cativeiro, Manejo, Onça pintada, Panthera onça.


ABSTRACT

The study of behavior and welfare of jaguars (Panthera onca) in captivity is vital for their maintenance and reproduction. We evaluated the enclosure conditions and the handling of 9 animals in 5 zoos (SP). Correlating them to the observations obtained by the ethogram which was established aiming at the duration of the behaviours. The results confirm the view of the zoo animal keepers present a consonant perception with our findings. However, the differences notice between zoos with different strategies point the necessity more studies. This work can contribute to development of a new model to quantified behaviors under different conditions to different species of felids in captivity.

Index terms: Animal captivity. Handling. Jaguar. Panthera onca.


 

 

O cativeiro impõe aos animais selvagens condições muito diferentes daquelas encontradas em seus ambientes naturais. Sabe-se que comportamentos incomuns a espécie, tais como agressividade excessiva, estereotipias ou inatividade, são considerados resultados do cativeiro inadequado (Carlstead, 1996; Morato et al., 2001). Por essa razão, é importante que os recintos tenham ambientes enriquecidos e a equipe de tratadores conheça o comportamento dos animais, para que as espécies mantidas nestas condições apresentem um bom desenvolvimento físico e psicológico.

O presente estudo objetivou realizar observações etológicas, através de registros diretos dos animais, e também discutir a percepção de tratadores através de um questionário comportamental (Wielebnowski, Fletchall, Carlstead, Busso, & Brown, 2002), na avaliação do padrão de atividade de onças pintadas (Panthera onca Linnaeus, 1758) mantidas em cativeiro.

 

Método

Foram observados 9 animais, em 5 diferentes zoológicos, onde foram mantidos em casais - Ribeirão Preto, Americana e Sorocaba - ou isolados - Paulínia (1 macho e 1 fêmea) e São Paulo (1 fêmea). Investigou-se a presença de parâmetros como:

Área relativa do recinto - área definida em metros quadrados por animal;

Número de itens de ambientação - foram considerados como tais: piso de terra, vegetação, troncos, tanque com água, barreiras dentro do recinto (pontos de fuga, onde um animal poderia refugiar-se da visão de outra onça ou de visitantes) e opção entre luz solar e sombra.

Número de itens de enriquecimento alimentar - presença de tanques com animais, como peixes e tigres d'água, oferecimento de carnes não picadas, esconder a alimentação e presença de presas vivas na dieta (Law, Graham, & Macgowan, 2001).

Estilo de manejo ou atenção do tratador - O estilo de manejo foi analisado relacionado suas interações com o animal.

Tempo de habituação dos animais ao manejo - Período de tempo decorrido desde a chegada do animal à instituição até o momento em que o estudo foi realizado.

Procurou-se identificar os comportamentos cujas durações poderiam ser quantificadas, chegando-se às seguintes categorias comportamentais: locomoção, repouso, movimentos estereotipados, auto-limpeza e esconder-se (Weller & Bennett, 2001; Wielebnowski & Brown, 1998).

As observações de cada animal ocorreram durante 5 dias consecutivos, entre aqueles com visitação e sem visitação, no período compreendido entre os meses de julho e setembro. Os dados foram coletados através de observações de animal focal, escolhidos ao acaso, em intervalos de 15 minutos para cada animal (Altmann, 1974). Os períodos de observação foram realizados durante a manhã e a tarde, com duração de duas e meia hora, cada período. Registrava-se o comportamento quando o mesmo tinha duração igual ou superior a 10s; eventos com menos de 10s eram considerados como continuação do comportamento anterior.

No presente estudo também foi aplicado aos tratadores um questionário para a colheita de informações sobre o temperamento de cada animal avaliado Este questionário foi baseado em um modelo utilizado para o estudo de pantera nebulosa (Neofelis nebulosa) por Wielebnowiski et al. (2002).

 

Resultados e Discussão

Os tratadores apresentaram dificuldade para responder às perguntas sobre atividade, repouso e agressividade. Estes profissionais sempre respondiam a questão sobre a atividade dos animais dividindo-a em manhã e tarde. Foi observado que não houve variação entre as respostas dos tratadores em relação à atividade no período da tarde, pois segundo eles todos os animais repousaram durante este período. Dessa forma, apenas a resposta sobre atividade pela manhã permitiu comparar a impressão dos tratadores sobre o padrão de atividade dos animais. De fato, foi observada uma correlação negativa entre atividade pela manhã e o tempo que os animais permaneciam escondidos, o que implica que os animais que se escondiam por menos tempo eram vistos pelos tratadores como mais ativos pela manhã. Essa observação permite sugerir que estudos comportamentais de longa duração, que envolvam amostragens por intervalos mais reduzidos, dêem preferência pela realização das observações no período da manhã. Observações comportamentais de onças-pintadas em vida livre corroboram este achado, tendo sido constatado que esta espécie é mais ativa nos períodos menos quentes do dia, sendo o período da tarde notadamente mais quente que o período da manhã (Genaro, Adania, & Silva, 2001; Oliveira, 1994).

A pergunta sobre movimento estereotipado gerou resultados diretamente relacionados às observações comportamentais, indicando que a impressão dos tratadores sobre esse aspecto do temperamento dos animais está de acordo com o padrão comportamental observado. Portanto, a percepção dos tratadores dos zoológicos pode ser diretamente correlacionada à quantidade de movimento estereotipado efetivamente realizado pelas onças pintadas, sendo este item fundamental no desenvolvimento de questionários comportamentais. A importância da observação de movimento estereotípico pode ser ressaltada pelo fato de que estudos têm utilizado essa manifestação do comportamento como um indicativo de estresse (Carlstead, 1996; Wielebnowiski, 2002).

A correlação negativa entre respostas sobre agressividade e tempo de repouso fornece indícios de que essas respostas refletiram o padrão de atividade dos animais, sugerindo que, na opinião dos tratadores, os animais menos ativos eram os menos agressivos e vice versa.

As variações entre os zoológicos, podem estar associadas diretamente a características individuais de adaptação às condições do cativeiro (Carlstead, 1996). No entanto, tais diferenças comportamentais observadas entre zoológicos com distintos regimes de manejo indicam que estudos futuros deverão dar ênfase para ensaios experimentais (Moreira et al., 2002) que investiguem a influência de outros aspectos ambientais específicos, além da área do recinto, sobre o padrão de atividade e de estereotipias apresentadas por esses animais. Este estudo poderá ainda representar um modelo para aplicação das técnicas de quantificação comportamental na avaliação do efeito das condições de cativeiro sobre o padrão de atividade das demais espécies de felídeos neotropicais mantidas em cativeiro.

 

Referências

Altmann, J. (1974). Observational study of behavior: Sampling methods. Behaviour, 49, 227-265.        [ Links ]

Carlstead, K. (1996). Effects of captivity on the behavior of wild mammals. In D. G. Kleiman, M. E. Allen, K. V. Thompson & S. Lumpkin (Ed.), Wild mammals in captivity (pp. 317-333). Chicago: University of Chicago.        [ Links ]

Genaro, G., Adania, C. H., & Silva, M. G. (2001). Pequenos felinos brasileiros: desconhecidos e ameaçados. Ciência Hoje, 29, 34-39.        [ Links ]

Law, G., Graham, D., & Mcgowan, P. (2001). Environmental enrichment for zoo and domestic cats. Animal Technology<, 52, 155-163.

Morato R. G., Conforti V. A., Azevedo F. C., Jacomo A. T. A., Silveira L., Sana D., Nunes A. L. V., Guimarães M. A. B. V., & Barnabe R. C. (2001). Comparative analyses of semen and endocrine characteristics of free-living versus captive jaguars (Panthera onca). Reproduction, 122, 745-751.        [ Links ]

Moreira, N., Brown, J. L., Moraes, W., Bellem, A., Swanson, W. F., & Monteriro-Filho, E. L. A. (2002). Effects of the captivity conditions on reproductive cyclicity, adrenocortical activity and behavior in female tigrina (Leopardus tigrinus) and margay (Leopardus wiedii). In Proceedings of International Symposium on Assisted Reproductive Technology for the Conservation and Genetic Management of Wild Life (pp. 85-86), Omaha, NE.         [ Links ]

Oliveira, T. G. (1994). Neotropical cats ecology and conservaton. São Luís, MA: Edusmo.        [ Links ]

Weller, S. H., & Bennett, C. L. (2001). Twenty-four hour activity budgets and patterns of behavior in captive ocelots (Leopardus pardalis). Applied Animal Behaviour Science, 71, 67-79.        [ Links ]

Wielebnowiski, N., & Brown, J. L. (1998). Behavioral correlates of physiological estrus in cheetahs. Zoo Biology, 17, 193-209.        [ Links ]

Wielebnowiski, N. C., Fletchall, N., Carlstead K., Busso, J. M., & Brown, J. L. (2002). Noninvasive assessment of adrenal activity associated with husbandry and behavioral factors in the North American clouded leopard population. Zoo Biology, 21, 77-98.        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Prof. Dr. Gelson Genaro
Caixa Postal 390, 14001-970, Ribeirão Preto, SP, Brasil
E-mail: ggenaro@ffclrp.usp.br

Recebido em 6 de abril de 2005
Revisão recebida em 11 de novembro de 2005
Aceito em 13 de outubro de 2005

 

 

Trabalho apresentado na forma de painel no XXII Encontro Anual de Etologia, Campo Grande, MS. Agradecemos à Associação Pró-Carnívoros pelo apoio técnico e logístico e a Instituição Sierra Endagered Cat Haven, na figura de Dale Anderson, por acreditar e viabilizar este estudo com a concessão do financiamento.

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License