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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

 ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.7 no.1 São Paulo jun. 2005

 

ARTIGOS

 

Um panorama analítico-comportamental sobre os transtornos de ansiedade1

 

An analytical-behavioral panorama on the anxiety disorders

 

 

Denis Roberto ZamignaniI, II, III 2, 3 ; Roberto Alves BanacoIII, IV, 4

I Universidade de São Paulo
II Universidade São Judas Tadeu
III Paradigma Núcleo de Análise do Comportamento
IV Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

 

 


RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo apresentar uma análise das variáveis envolvidas nos quadros psiquiátricos denominados como transtornos de ansiedade a partir dos pressupostos teóricos do behaviorismo radical de Skinner. Em primeiro lugar, apresenta-se uma definição da ansiedade enquanto fenômeno clínico e enquanto construto. A ênfase dada pela literatura comportamental nas respostas de evitação e eliminação de estímulos ansiogênicos, e as escolhas por procedimentos terapêuticos padronizados resultantes dessa ênfase são então discutidos tendo em vista a inobservância de outras variáveis ambientais relevantes. Propõe-se que outras relações funcionais podem ser detectadas, além daquelas de esquiva que tradicionalmente são foco da intervenção. Relações respondentes e operantes que compõem o repertório comportamental do cliente que é diagnosticado como portador de transtornos de ansiedade são analisadas, incluindo a interação entre contingências operantes e respondentes, relações de controle aversivo, controle de estímulos, classes de resposta de ordem superior e operações estabelecedoras tais como privação e estimulação aversiva. Por último, um modelo de análise é apresentado de modo a integrar as relações passíveis de observação nos quadros clínicos em questão e possíveis estratégias terapêuticas dele decorrentes são elencadas.

Palavras-chave: Transtornos de ansiedade, Análise do comportamento, Terapia analítico-comportamental.


ABSTRACT

This work aims to present an analysis from the standpoints of Skinner's radical behaviorism about the variables involved in the psychiatric problems denominated as anxiety disorder. At first, anxiety is defined as a clinical phenomenon and as a theoretical construct. The behavioral literature emphasizes avoidance and elimination responses, and the selection of standardized therapeutic procedures due to that emphasis. They are then discussed considering the current non-observance of other environmental relevant variables. The article suggests that other functional relationships than avoidance can be detected, as focus of the intervention. Respondent and operant relationships that compose the client's behavior repertoire that is diagnosed as anxiety disorder are analyzed, including the interaction among operant and respondent contingencies, aversive control, stimuli control, superior order response classes and establishing operations such as privation and aversive stimulation. At last, a model that integrates the relationships involved in the clinical patterns in focus is presented and possible therapeutic strategies are suggested.

Keywords: Anxiety disorders, Behavior analysis, Behavior analytic therapy.


 

 

Em nosso dia-a-dia enquanto terapeutas, um grande número de eventos é descrito pelos nossos clientes como envolvendo algum tipo de ansiedade. O termo ansiedade, todavia, pode se referir a eventos bastante diversos, tanto no que diz respeito a estados internos do falante, quanto a processos comportamentais que produzem esses estados internos. Muitos eventos descritos como agradáveis podem implicar em um sentimento de ansiedade, principalmente quando envolvem espera. Entretanto, é principalmente quando a ansiedade se refere à relação do indivíduo com eventos aversivos em suas múltiplas possibilidades de interação, que ela adquire o status de queixa clínica. E é essa a natureza do objeto de discussão deste capítulo: a ansiedade enquanto queixa clínica, mais especificamente, a ansiedade presente nos chamados Transtornos de Ansiedade.

Antes de mais nada, é necessário definir aqui a natureza dos eventos que serão discutidos sob o rótulo de “ansiedade”. A ansiedade tem sido definida como um estado emocional desagradável acompanhado de desconforto somático, que guarda relação com outra emoção - o medo. Esse estado emocional é geralmente relacionado a um evento futuro e, às vezes, considerado desproporcional a uma ameaça real, (Gentil, 1997). O desconforto presente na ansiedade costuma ser descrito pelo senso comum por meio de sensações físicas tais como “frio na barriga”, “coração apertado”, “nó na garganta”, “mãos suadas” e é, além disso, sentido como “paralisante”.

O fenômeno ansiedade tem sido considerado mais um conceito do que propriamente um fenômeno empírico (Friman, Hayes & Wilson, 1998). De acordo com Kanfer e Phillips (1970), por exemplo, a ansiedade é um construto freqüentemente definido a partir de três diferentes perspectivas de observação: (1) com base na descrição verbal do estado interno de uma pessoa; (2) pela avaliação de padrões fisiológicos e comportamentais; (3) por meio de operações experimentais. Obviamente, cada uma dessas perspectivas produzirá conhecimentos e técnicas bastante distintas entre si (Banaco, 2001), conforme veremos adiante.

Elementos comuns nas definições do conceito “ansiedade” apontam para um estado que envolve excitação biológica ou manifestações autonômicas e musculares (taquicardia, respostas galvânicas da pele, hiperventilação, sensações de afogamento ou sufocamento, sudorese, dores e tremores), redução na eficiência comportamental (decréscimo em habilidades sociais, dificuldade de concentração), respostas de esquiva e/ou fuga (o que sugere expectativa ou um controle por eventos futuros) e relatos verbais de estados internos desagradáveis (angústia, apreensão, medo, insegurança, mal-estar indefinido, etc.) (Gentil, 1998; Kanfer e Phillips,1970).

O construto “ansiedade”, de acordo com essas perspectivas, necessariamente envolve o anúncio de que algum evento aversivo vai ocorrer. Em outras palavras, sua definição implica um futuro carregado de aversividade. No entanto, para uma análise científica, a explicação do comportamento por eventos futuros é bastante imprecisa (Skinner, 1953). Voltaremos a este tema mais à frente.

A ansiedade define-se enquanto fenômeno clínico (1) quando implica em um comprometimento ocupacional do indivíduo, impedindo o andamento de suas atividades profissionais, sociais e acadêmicas, (2) quando envolve um grau de sofrimento considerado pelo indivíduo como significativo e (3) quando as respostas de evitação e eliminação ocuparem um tempo considerável do dia. Esses casos são tratados pela literatura médica e psicológica como Transtornos de Ansiedade.

 

Transtornos de Ansiedade: Enfoque nas respostas de evitação/eliminação e Estratégias Terapêuticas Decorrentes

O padrão comportamental característico dos transtornos de ansiedade, de acordo com grande parte da literatura, é a esquiva fóbica: na presença de um evento ameaçador ou incômodo, o indivíduo emite uma resposta que elimina, ameniza ou adia esse evento. O que diferencia cada um destes transtornos é o tipo de evento experimentado como ameaçador ou incômodo e/ou o tipo de resposta na qual o sujeito se engaja de forma a produzir uma diminuição do contato com o estímulo aversivo (processos de fuga/esquiva). As respostas envolvidas nesse processo podem ser classificadas topograficamente como respostas de evitação5 e/ou eliminação do estímulo temido, assim como respostas de verificação ou outras respostas repetitivas que pospõem ou eliminam temporariamente a ameaça da apresentação desse estímulo. A Tabela 1 a seguir apresenta uma comparação entre os diferentes transtornos de ansiedade no que se refere a estes aspectos:

 

 

Como parte de uma contingência de fuga/esquiva, a resposta classificada como ansiosa seria mantida pela retirada ou adiamento da apresentação do evento aversivo (estímulo público ou privado). Desse ponto de vista, as respostas ansiosas que compõem esses diferentes transtornos de ansiedade seriam funcionalmente semelhantes, o que permitiria análises e propostas de intervenção comuns.

As intervenções propostas atualmente para o tratamento psicológico desses problemas adotam o procedimento de exposição com prevenção de respostas como a principal estratégia (Salkovskis e Kirk, 1997). Esta técnica consiste em expor o cliente repetidas vezes e por um tempo prolongado (45 min a 2 h) às situações que provocam desconforto ou ansiedade, geralmente maximizando a estimulação aversiva, enquanto se pede que ele se abstenha de realizar qualquer ritualização. As exposições geralmente são realizadas de forma gradual, partindo dos estímulos que produzem menor sofrimento ou sofrimento moderado, em direção àqueles mais perturbadores. As sessões de exposição aos estímulos ansiogênicos podem ser realizadas de forma imaginária ou in vivo (exposição real). Além disso, os pacientes são instruídos a engajar-se em exercícios adicionais de exposição entre as sessões terapêuticas (Riggs e Foa, 1999).

Embora essa técnica terapêutica seja eficaz em boa parte dos casos, sua adoção generalizada tendo como critério apenas o diagnóstico psiquiátrico tem sido questionada por alguns analistas do comportamento (Banaco, 2001; Vermes e Zamignani, 2002; Zamignani, 2000; Zamignani e Vermes, 2003). Esses autores afirmam que a atenção privilegiada que este tipo de estratégia dispensa às variáveis de natureza encoberta (ansiedade, obsessões) pode ocultar o papel de outras variáveis ambientais relevantes. Além disso, partem de concepções a respeito dos fenômenos ansiosos que são mais coerentes com vertentes respondentes e/ou cognitivas da terapia comportamental (Banaco, 2001). A aplicação desse procedimento, portanto, se isolada de uma análise mais ampla sobre outras relações funcionais envolvidas no problema, pode ser pouco eficaz (Zamignani, 2000). Valeria a pena, portanto, examinar em detalhe que variáveis seriam essas e como essa proposta de intervenção poderia ser ampliada.

 

Ansiedade enquanto Fenômeno Comportamental

Emoções: estímulos ou respostas?

Uma das preocupações básicas do behaviorismo radical é a de não negar a existência de eventos que ocorram sob a pele dos organismos (Skinner, 1974). De fato, os behavioristas radicais preocupam-se também com esses eventos e com o seu papel no entendimento (leia-se controle e previsão) dos comportamentos a serem explicados (Skinner, 1953). Opta-se, nesta abordagem, por um esforço de explicação externalista, ou seja, o “recorte” epistemológico, a unidade de análise só está completa quando o pesquisador de qualquer fenômeno tiver, pelo menos um organismo em interação com o ambiente (Abreu-Rodrigues & Sanábio, 2001; Micheletto 1997; Tourinho, 1997; Tourinho, Cavalcante, Brandão & Maciel, 2001). Deste ponto de vista, a tríplice contingência (os estímulos que controlam a emissão de uma resposta do organismo, a resposta em si e as alterações que ela provoca no ambiente) tem sido apontada como a unidade básica do estudo dos comportamentos (Skinner, 1953; 1969; 1974).

Algumas relações comportamentais supostamente prescindiriam do terceiro elo (como ocorreria, em tese, nas relações reflexas, nas quais apenas um estímulo ambiental elicia uma resposta do organismo). No entanto, em muitos casos, como se verá adiante, ainda que a relação respondente seja observada em sua primeira instância de ocorrência, a possível alteração que a própria resposta provoca no ambiente poderia entrar em relação de contingência, selecionando a resposta e, portanto, acrescentando uma relação operante à relação respondente original.

Vamos observar, como um exemplo hipotético, uma seqüência temporal que envolva uma relação entre uma criança e seus pais em um ambiente inanimado tal como:

(i) distanciamento entre os pais e a criança + um ruído intenso g (ii) respostas encobertas e abertas (de medo) na criança : (iii) aproximação dos pais.

Embora neste exemplo, o ruído intenso em si seja o suficiente para produzir respostas autonômicas de medo em crianças (por relações reflexas), os componentes públicos e privados dessas respostas (choro, contrações, etc.) podem ser seguidos pela aproximação dos pais. Se isso aconteceu, esta primeira experiência pode estabelecer uma relação operante das respostas com os outros componentes da situação (a anterior ausência dos pais e a posterior aproximação dos pais quando, especial-mente, as respostas públicas de medo foram eliciadas). Nesse exemplo, respostas de medo - que inicialmente eram reflexas - poderiam ser reforçadas pela aproximação dos pais - produzindo uma relação operante. Não deve ser deixada de fora da análise, no entanto, a possibilidade de que embora os pais tenham tido acesso apenas às respostas públicas de medo emitidas pela criança, suas respostas encobertas também venham a sofrer o efeito do reforço.

Se levarmos uma história de vida como essa em frente, suponha-se agora, muito tempo depois e depois de muitas outras relações complexas que, quando sozinho, o indivíduo, por qualquer alteração ambiental, “sinta” as respostas de medo. Imagine-se ainda que, no passado, essas respostas (encobertas) juntamente com as respostas abertas de medo tenham sido suficientes para que ele tivesse dispensa de seu trabalho. As respostas encobertas podem adquirir a função de estímulo sinalizador para que o indivíduo emita respostas de desculpar-se por não ir trabalhar. Desse ponto de vista, a formulação seria a seguinte:

Situação I

(i) Respostas (abertas e encobertas) de medo do indivíduo em seu ambiente de trabalho g (ii) Dispensa do trabalho.

Situação II

(i´) respostas de medo antes de ir para o trabalho g (ii´) respostas verbais explicativas do porquê não ir ao trabalho g (iii) dispensa de ir ao trabalho.

Portanto, em uma análise do comportamento, respostas poderiam também entrar em relação funcional com outras respostas por sua história de proximidade temporal com outros estímulos, sendo, nesse caso, consideradas como estímulos sinalizadores para as respostas subseqüentes. Alguns autores (Malerbi, 1997; Matos, 1997; Micheletto, 1997a; Skinner, 1945; Tourinho, 1997, por exemplo) têm considerado esses episódios como cadeias comportamentais em que respostas poderiam ser estímulos sinalizadores para outras respostas.

 

O papel das emoções na explicação do comportamento

Este talvez seja um aspecto que deva ser discutido... Se for possível que respostas emocionais sejam estimuladoras para outras respostas, isto implica que elas sejam “responsáveis” pelo que o indivíduo faz? Essa questão já foi amplamente discutida por Skinner (1974; 1989).

O aspecto a ser abordado aqui diz respeito ao modelo explicativo. Quando se utiliza um modelo causa-efeito para a explicação de eventos que ocorrem em sucessão, é bem possível utilizar a emoção como originadora de comportamento especialmente se formuladas pelo esquema apresentado acima. No entanto, em uma proposta skinneriana, mais preocupada com a funcionalidade das relações entre organismo e ambiente, é apenas porque uma resposta (eliciada ou emitida) modificou o ambiente e esta modificação altera a probabilidade de nova ocorrência de respostas da mesma classe funcional (ou seja, daquelas respostas que poderiam provocar as mesmas alterações no ambiente) que ela se torna importante no estudo do comportamento como um todo.

Deste ponto de vista, além de tudo, um pressuposto selecionista, no sentido mais darwi-iano da palavra é invocado para a explicação do comportamento. Classes de respostas serão mantidas ou extintas pelas modificações ambientais que produzem... Não caberia mais, neste modelo explicativo, a noção de causa e efeito, mas sim, de interação. (Micheletto, 1997).

As respostas emocionais se tornam importantes enquanto elementos para a análise se, e apenas se, suas manifestações entrarem em contato com (modificarem) o ambiente no qual o sujeito que se “emociona” estiver inserido, e mais ainda, se esse contato (a modificação) voltar a atingir o organismo de maneira a modificá-lo.

 

O que é, então, ansiedade?

O papel da aversividade na determinação da ansiedade

Segundo Estes e Skinner (1941), a ansiedade teria “at least two defining characteristics: (1) it is an emotional state, somewhat resembling fear, and (2) the disturbing stimulus which is principally responsible does not precede or accompany the state, but is 'anticipated' in the future” (p.390).

Esses autores apontam que alguns termos nessa definição merecem uma maior clarificação. O primeiro deles diz respeito a “estado emocional”. Muitas vezes, estados emocionais têm sido descritos como reações fisiológicas (variáveis do organismo) resultantes de operações de estímulos (variáveis do ambiente). Assim, um componente respondente estaria envolvido em situações de ansiedade.

Ao apontarem uma similaridade de estados de ansiedade a estados de medo, poderíamos apelar para explicações respondentes de medo para darmos início às explicações da ansiedade. Alguns autores têm oferecido descrições de operações de punição, ou de liberação de estímulos incondicionados aversivos como eliciadoras de respostas de medo (apontada por esses autores como uma das três emoções básicas, juntamente com alegria e raiva) (e. g. Millenson, 1967). Assim, a apresentação de estímulos naturalmente aversivos seria seguida por respostas de medo.

Como o componente “antecipação” do estímulo aversivo é necessário para a definição de ansiedade, os autores têm apelado para o conceito de estímulo aversivo condicionado. Dessa forma, estímulos habitualmente neutros para a resposta de medo, se forem seguidos consistentemente por (ou seja, se forem condicionados a) estímulos aversivos incondicionados, passarão a adquirir, eles próprios, propriedades aversivas e poderão eliciar respostas “semelhantes ao medo”: a ansiedade... Esta então, seria uma resposta que se “anteciparia” ao estímulo aversivo incondicionado, embora não estivesse sob controle do futuro, e sim de um estímulo aversivo condicionado presente (chamado por alguns autores como “pré-aversivo”).

A resposta de ansiedade então seria seme-lhante (mas não igual) à de medo, já que é eliciada por um estímulo condicionado e não por um estímulo incondicionado. E anteciparse-ia ao estímulo aversivo incondicionado, mas seria resultante da apresentação do estímulo aversivo condicionado. Dessa maneira, Estes e Skinner abarcam o segundo aspecto que necessitaria de maior clarificação na definição de ansiedade: como poderia uma resposta “antecipar” um estímulo.

Considerando então as respostas de ansiedade como respondentes, mas que podem ser eliciadas por estímulos aversivos condicionados, vamos elencar algumas das respostas que seriam consideradas representativas de uma condição de ansiedade. Utilizando as descrições apresentadas pelo DSM IV (APA, 1995) temos, entre outras: elevação da freqüência de batimentos cardíacos, com alterações na respiração e na pressão sanguínea, sudorese, tremores, sensações de falta de ar ou asfixia, dor ou desconforto torácico, náusea, desconforto abdominal, vertigem, desmaio sensações de formigamento.

Embora estas respostas sejam apresentadas como representativas de quadros de ansiedade, outras situações emocionais poderiam causar também reações reflexas semelhantes; por exemplo, situações de “craving”, a busca por reforçadores primários (alimento, sexo, etc.), esportes radicais (Friman, et al, 1998). A questão seguinte seria: o que diferencia situações de ansiedade dessas outras situações?

 

Fuga e Esquiva como componentes abertos da resposta ansiosa e suas interações com outras respostas operantes

Como pode ser notado, algumas situações que eliciam respostas reflexas de taquicardia, sudorese, elevação da pressão sanguínea, etc. são buscadas pelos indivíduos (por exemplo, na prática de esportes radicais, em parques de diversão, etc.). Já em situações de ansiedade, o indivíduo tende a eliminar, diminuir a intensidade, postergar ou evitar a produção de estímulos (Sidman, 1989). Assim, para depurar a definição de ansiedade, devemos acrescentar que ela também é composta por respostas que modificam o ambiente, ou seja, são operantes. Além de ser uma resposta reflexa perante um estímulo aversivo condi-cionado, a ansiedade seria também composta de respostas operantes de fuga e esquiva de estímulos aversivos incondicionados e condicionados. Mais especificamente, quando um organismo elimina ou diminui a intensidade de um estímulo incondicionado aversivo, falamos que a resposta que produziu esse efeito é uma resposta de fuga. Quando o organismo posterga ou elimina um estímulo aversivo condicionado, chamamos a resposta de esquiva (Skinner, 1953).

Mais do que isso, se pode observar também uma interação dessas manifestações sobre o comportamento operante que estiver em curso quando da apresentação do estímulo aversivo incondicionado. Por exemplo, se houver a possibilidade de emissão das respostas de fuga do estimulo condicionado e/ou de fuga do incondicionado, essas respostas tornam-se mais prováveis de serem emitidas do que as que levariam à produção de estímulos reforçadores positivos. Caso não haja a possibilidade de respostas de fuga e esquiva, o efeito reflexo da estimulação condicionada paralisa a emissão de respostas operantes que produzem o estímulo reforçador positivo. A esta descrição da ansiedade deu-se o nome de “supressão condicionada” (Estes e Skinner, 1941).

Embora o paradigma de supressão condicionada venha sendo a forma mais bem aceita na Análise do Comportamento para a descrição de fenômenos de ansiedade por apresentar um efeito marcado, bem descrito e que produziu grande quantidade de estudos experimentais, observam-se algumas críticas ainda a esse modelo. Especialmente quando transposto diretamente do laboratório animal para a prática clínica, a supressão condicionada parece ainda não abarcar todos os fenômenos que têm sido descritos como transtornos de ansiedade.

De qualquer forma, até este ponto de nossa explanação, pode-se notar que em uma proposta behaviorista radical o fenômeno ansiedade, se for analisado em sua completude, deveria levar em consideração seus aspectos reflexos incondicionados, condicionados, operantes e de interação entre cada um deles (Banaco, 2001). Ainda assim, a análise pode não estar completa.

 

Explicações adicionais ao paradigma de supressão condicionada

A importância de outras conseqüências que se seguem à resposta.

Considerando que a emissão de respostas de ansiedade é seguida, não apenas pela eliminação do aversivo, mas por qualquer outro evento presente na situação, podemos considerar que a resposta estará submetida, simultaneamente, a diferentes possibilidades de reforçamento. Pode ocorrer reforçamento positivo se, por exemplo, a resposta de esquiva for seguida por um reforçador social. Pode ocorrer também reforçamento negativo pela eliminação de outros estímulos (que não a eliminação do estímulo aversivo ou préaversivo considerados na análise presente), caso a resposta produza, por exemplo, a retirada ou adiamento de uma tarefa indesejada. Todas essas conseqüências, portanto, seriam adicionais à conseqüência de eliminação do aversivo ou pré-aversivo.

Considerando essa possibilidade, continua válida a observação de Kanfer & Phillips (1970) a respeito da possível extinção do pareamento entre o pré-aversivo e o aversivo que ocorreria na esquiva. Se de tempos em tempos não ocorrerem pareamentos do préaversivo e do aversivo, poder-se-ia enfraquecer a conexão entre o aversivo e o préaversivo, e em decorrência, enfraquecer a relação operante entre a resposta de esquiva e a sua conseqüência reforçadora negativa. Entretanto, pode ser que a resposta continue a ocorrer sob controle dessas outras conseqüências adicionais.

Zamignani (2000) sugere ainda a possibilidade de que a resposta ansiosa pública venha a ocorrer, como resultado dessas operações de reforçamento, independentemente da ocorrência de respostas privadas de medo e ansiedade. A relação operante que controlaria a emissão destas respostas poderia, nesse caso, envolver apenas os estímulos ambientais antecedentes e as conseqüências reforçadoras que se seguem à resposta pública, sem passar necessariamente pelas respostas privadas de medo, ansiedade ou obsessões.

 

Controle de estímulos

Como ocorre em qualquer contingência operante, as respostas envolvidas nos quadros ansiosos são emitidas na presença de um conjunto de estímulos que podem, juntamente com o estímulo eliciador, tornarse estímulos relevantes para a emissão futura da resposta ansiosa. Isso ajuda a compreender alguns aspectos da contingência de ansiedade.

Um desses aspectos é descrito por Ayres (1998) e Tierney & Bracken (1998). Esses autores apontam para o fato de que fobias podem surgir sem que nenhum pareamento tenha ocorrido entre o estímulo fóbico e um outro estímulo aversivo incondicionado. Nesses casos, o modelo do pareamento que sustentaria o paradigma da supressão condicionada não poderia ser invocado.

Como resposta a esta constatação, alguns autores recorrem a explicações que levam em consideração os estímulos contextuais que seriam envolvidos em muitos fenômenos de condicionamento (e.g. Bouton & Nelson, 1998), e outros ainda apontam os resultados de estudos sobre equivalência de estímulos para aumentar o conhecimento sobre os transtornos de ansiedade (Friman, Hayes e Wilson, 1998; Tierney e Bracken, 1998).

Podemos aqui imaginar uma situação na qual pela primeira vez ocorreu um ataque de pânico. A primeira resposta ansiosa ocorreu como um reflexo incondicionado eliciado pela ativação biológica do organismo, configurando um ataque de pânico. Essa resposta, entretanto, ocorreu em um contexto no qual estavam presentes muitos outros estímulos; além disso, outras respostas (públicas e privadas) do indivíduo poderiam estar sendo emitidas no momento do ataque. Os estímulos que estavam presentes na ocasião do ataque de pânico, bem como as respostas que o indivíduo emitia no momento podem, por associação com o estímulo aversivo incondicionado, adquirir a função de estímulo aversivo condicionado e estímulo discriminativo para a emissão de respostas de esquiva. As funções eliciadora e discriminativa desses estímulos condicionados, por sua vez, podem ser transferidas para outros estímulos por meio de novos pareamentos, pelo processo de generalização de estímulos, ou ainda por meio da formação de classes equivalentes de estímulos. Vale lembrar que inclusive as respostas que o indivíduo emitia podem ser sujeitas aos mesmos processos, adquirindo a função de estímulos eliciadores e discriminativos condicionados.

As contribuições dos estudos sobre controle de estímulos ampliam significativamente a análise dos transtornos de ansiedade. Fica revelado, por meio dessa análise o enorme conjunto de estímulos e respostas que podem ter relações com as respostas ansiosas. Essa é mais uma razão pela qual não se justifica a adoção de uma única técnica para o manejo de repertórios ansiosos; os fenômenos ansiosos exigiriam uma análise caso a caso de que contingências estão envolvidas em seus controles (Banaco, 1999).

 

Classes de resposta de ordem superior

O tópico anterior ajuda a compreender um outro conceito da análise do comportamento: o conceito de classes de resposta de ordem superior. Algumas respostas podem permanecer inalteradas, mesmo quando alteramos algumas conseqüências imedia-tas. Catania (1998), alerta para o fato de que essas respostas podem participar de classes de respostas mais amplas, cujas conseqüências que as controlam precisam ser identificadas e manipuladas para que se possa produzir a alteração desejada.

Resgatando aqui o exemplo apresentado anteriormente sobre o ataque de pânico, podemos ima-ginar que esse ataque de pânico ocorreu em uma sala de aula e, em função disso, o cliente passou a evitar entrar em salas de aula, esquivando de sofrer um novo ataque. Consideremos também que ime-diatamente após esse primeiro ataque, o indivíduo obteve grande atenção e cuidado dos colegas e da professora, o que selecionou a resposta por meio de reforçamento positivo. A partir dessa história de reforçamento, novas contingências foram ocor-rendo, e os ataques de pânico passaram a fazer parte de uma classe mais ampla, controlada pelas conseqüências de atenção e cuidado. Nesse caso, se o delineamento do tratamento levar em conside-ração apenas a contingência de fuga-esquiva, poderíamos planejar um procedimento de exposição gradual a salas de aula. Entretanto, esse procedimento não contempla a conseqüência de reforçamento social que mantém a classe mais ampla, e o procedimento pode não resultar em sucesso.

Um tipo específico de classe de resposta de ordem superior foi denominado por Hayes et al. (1996) de evitação experiencial. Esses autores resgataram a noção de evitação cognitiva ou evitação emocional tradicionalmente adotada por outras abordagens de psicologia para explicar alguns fenômenos presentes nos transtornos psiquiátricos. Segundo esses autores, muitas formas de psicopatologia podem ser vistas como métodos não-saudáveis de evitação da experiência. Evitação experiencial seria “um fenômeno que ocorre quando uma pessoa está relutante em permanecer em contato com experiências privadas par-ticulares” (Hayes et al., 1996, p. 1154). Estas experiências podem envolver pensamentos, memórias, emoções, estimulação autonômica e outras sensações privadas. Se considerarmos que respostas podem adquirir a função de estímulo eliciador ou discriminativo, quando associadas a contingências aversivas, po-demos compreender a evitação experiencial como uma classe ampla de esquiva. Nesse tipo de classe de resposta de esquiva, não apenas os eventos aversivos presentes na situação de estimulação aversiva e as respostas emitidas na ocasião adquiriram propriedades aversivas, mas toda a classe de estímulos privados adquiriu essa propriedade por meio de generalização ou formação de classes equivalentes.

Hayes et al. (1996) sugerem que inclusive respostas verbais podem adquirir propriedades aversivas, fazendo parte de classes equivalentes de estímulos. Essa análise permite compreender o porque, com freqüência nos transtornos de ansie-dade, as respostas de ansiedade podem ser elicia-das/evocadas por pensamentos e sentimentos os mais diversos. A possibilidade de que, a partir de contingências aversivas, respostas e estímulos privados podem adquirir propriedades aversivas é defendida também por Sidman (1989) e Skinner (1953), o que corrobora a noção de evitação expe-riencial.

Entre as síndromes que envolvem evitação experiencial, Hayes et al. (1996) citam o TOC e a Transtorno do Pânico. Na primeira, o cliente busca, sem sucesso, escapar de várias experiências privadas por meio da emissão de rituais, enquanto no Transtorno do Pânico, diversas respostas de fuga e esquiva são utilizadas na tentativa de evitar o contato com a estimulação autonômica e outras sensações privadas (por exemplo, abuso de álcool e outras substâncias ansiolíticas). Análise semelhante pode ser aplicada aos outros transtornos de ansiedade. Eventos privados tais como sentimentos, pensamentos e emoções são alvo de respostas de fuga/esquiva no PTSD, TAG, stress agudo, alguns tipos de fobia específica e na fobia social.

 

Operações estabelecedoras

Consideradas as relações respondentes e operantes e as variáveis antecedente, conseqüente e contextual presentes na contingência, é necessário ainda considerar as chamadas operações de motivação, que explicam as diferenças entre situações e algumas vezes entre indivíduos no responder perante determinados estímulos. Essas variáveis têm sido denominadas “operações estabelecedoras”. Estas são operações que estabelecem e/ou alteram os valores reforçadores de determinados estímulos. Duas operações estabelecedoras serão destacadas neste trabalho, por terem efeito direto sobre manifestações de ansiedade: a privação e a estimulação aversiva

(a) Privação: Muitos fatores ambientais podem aumentar o poder de controle operante das conseqüências sobre o responder. Grande parte dos clientes que apresentam padrões de comportamentos do tipo ansioso possui um repertório bastante limitado, tanto no que se refere a habilidades sociais, quanto a habilidades diversas necessárias para a resolução e enfrentamento de problemas. Por conta desse repertório limitado, sua ação no ambiente pode produzir poucas conseqüências reforçadoras. Tanto com repertórios limitados quanto com um ambiente pobre de reforçado-res, existe pouca probabilidade de que respostas alternativas à resposta-problema (no caso a ansiosa) sejam estabelecidas e mantidas.

Sabemos que a privação aumenta a probabilidade de emissão de qualquer resposta que produza o estímulo reforçador do qual o organismo está privado (mesmo que esta resposta envolva estimulação aversiva). Se os poucos reforçadores ambientais disponíveis se originam das conseqüências às respostas ansiosas (cuidado, atenção especial, isenção de responsabilidades, proximidade dos familiares), este padrão tenderá a se manter.

Um relato de caso apresentado por Banaco (1997), descreve o atendimento de um cliente que apresentava pensamentos obsessivos sobre autolesão durante todo o dia. Ao final do dia, sentia alívio por ter conseguido evitar a autolesão de fato:

“Continuando com a minha hipótese, eu supus que este rapaz acreditasse que evitava aversivos com seus pensamentos sobre autolesão - e sentiase aliviado quando os evitava. Desde que se encontrava inserido num contexto pobre de reforçadores, esse alívio era exatamente reforçador para ele”.(Banaco, 1997, p. 84-85).

Segundo analisado por esse autor, a simples sensação de alívio decorrente do processo de reforçamento negativo ocorrido com a realização do ritual seria a única fonte de reforçamento à qual o cliente estava exposto, o que revelaria um grau de privação intenso. Poderíamos acrescentar à análise desenvolvida pelo autor outras prováveis conseqüências agindo sobre a resposta, além daquela decorrente da não concretização da autolesão, tais como reforçadores sociais - a atenção da mãe quando de seu relato sobre as obsessões, a manifestação de preocupação de toda a família sobre a possibilidade de ocorrência da autolesão, as conseqüências fornecidas pelo próprio terapeuta ao relato. Essas conseqüências provavelmente não seriam suficientes para manter a ocorrência do comportamento obsessivo-compulsivo, se o cliente tivesse, em seu repertório, alternativas de resposta para a obtenção desses reforçadores. Sidman (1989) afirma que privação intensa é também uma condição de estimulação aversiva, que produz respostas de esquiva e fuga. Afirma ainda esse autor que a condição de privação intensa reduz a variabilidade, produzindo estereotipia da resposta, assim como o fazem as contingências de punição.

(b) Estimulação aversiva: Em uma condição de estimulação aversiva, além dos respondentes incondicionados e condicionados eliciados, são evocadas respostas operantes que tenham como conseqüência a eliminação ou adiamento dessa estimulação aversiva.

Para a compreensão dessa relação, vamos resgatar o paradigma de supressão condicionada descrito anteriormente. Nesse paradigma, um estímulo discriminativo (pré-aversivo) sinaliza que, após a passagem um deter-minado tempo, será apresentado um estímulo aversivo. O próprio estímulo pré-aversivo torna-se aversivo devido ao pareamento com o estímulo aversivo. A presença do pré-aversivo é estímulo discriminativo que controla a emissão de respostas - paralisa o comportamento operante que estava em andamento - e, se for possível a eliminação do estímulo discriminativo através de resposta operante, estas aparecem, mesmo que o aversivo não seja suspenso ao final do tempo programado. Nessa condição, todos os respondentes da ansiedade são eliciados. (Sidman, 1989).

Caso o indivíduo esteja exposto a um ambiente rico em estimulação aversiva, teremos uma condição crônica de interações que produzem respostas de ansiedade e esquiva, além de baixa probabilidade de ocorrência de respostas que produzam reforçamento positivo, reduzindo a variabilidade e produzindo, também, estereotipia da resposta. Se essa condição ambiental não for considerada no processo terapêutico, e este não levar ao desenvolvimento de um repertório que produza interações menos aversivas, a fonte de ansiedade continuará presente e, por conseguinte, todo o quadro retratado. Não seria útil, portanto, agir unicamente sobre a resposta de esquiva se não for desenvolvido um repertório eficaz que permita ao indivíduo eliminar ou esquivar-se com sucesso da(s) fonte(s) de ansiedade, pois o comportamentoproblema, neste caso, tenderá a ocorrer novamente, talvez com uma outra topografia.

 

Uma Proposta de Análise

Consideradas todas as possíveis interações entre variáveis nos transtornos de ansiedade, o quadro a seguir (Figura 1) apresenta uma proposta de análise das contingências envolvidas.

No quadro, as operações estabelecedoras (condições de privação ou estimulação aver-siva) comporiam, juntamente com os estímulos discriminativos/ eliciadores públicos e privados e com as respostas encobertas, o contexto antecedente para a emissão da resposta. O esquema ainda apresenta outras possíveis conseqüências que poderiam se seguir à resposta, além da eliminação ou adiamento da estimulação aversiva proveniente da exposição ao estímulo ansiogênico. Possíveis consequências reforçadoras negativas produziriam a posposição ou o cancelamento das operações estabelecedoras constituídas por estimulação aversiva, enquanto os reforçadores positivos agiriam sobre operações estabelecedoras envolvendo estados de privação. Essas conseqüências poderiam controlar a ocorrência de toda a cadeia de eventos comportamentais, mantendo um padrão de responder repetitivo e com a variabilidade da resposta restrita. Como resultado, teríamos um repertório empobrecido e estereotipado, característico dos transtornos de ansiedade. Além disso, os estímulos (e respostas) presentes em qualquer ponto da cadeia de eventos poderiam se estabelecer como parte de classes de estímulos equivalentes, por meio de relações de equivalência e de generalização de estímulos, eliciando ou evocando respostas de ansiedade. Como resultado de tal processo, a seta tracejada representa uma possível ocorrência da resposta aberta sem a participação dos elos privados.

 

 

Algumas implicações da análise apresentada no delineamento do tratamento

Alguns autores, levando em consideração parte dos pressupostos apresentados anteriormente, propuseram estratégias de manejo dos transtornos de ansiedade alternativas ou complementares ao procedimento de exposição com prevenção de respostas.

A constatação de que contingências aversivas são operações estabelecedoras que podem evocar respostas de esquiva implica no cuidado ao se usar a técnica de exposição com prevenção de respostas (EPR). Como essa é uma técnica que exige o contato com os estímulos aversivos para que ocorra a habituação, há o risco de que a própria situação de terapia adquira propriedades de estímulo aversivo condicionado, levando a respostas de esquiva e inviabilizando a aderência ao tratamento. Uma relação terapêutica baseada em audiência não punitiva, conforme já proposto por Skinner (1953), pode produzir maior adesão (Banaco, 1997; Vermes e Zamignani, 2002; Zamignani, 2000; Zamignani e Vermes, 2003).

Mesmo quando a estratégia terapêutica utilizada é a EPR, é importante que haja uma relação reforçadora estabelecida antes do início de sua aplicação. Além disso, a exposição clara de todas as etapas da técnica e o cuidado para que nenhuma etapa da técnica seja aplicada sem a informação prévia ao cliente são imprescindíveis (Cottraux, 1994; Vermes e Zamignani, 2002; Zamignani e Vermes, 2003).

A técnica de exposição com prevenção de respostas pode ser ainda melhor implemen-tada se levarmos em consideração a impor-tância dos reforçadores positivos na manuten-ção de respostas alternativas às respostas ansiosas. A aplicação da técnica, nesse sen-tido, pode ser mais efetiva em situações nas quais o cliente possa ter acesso a reforçadores naturais produzidos pela resposta de enfrentamento. Essa proposta, segundo os au-tores, exigiria uma análise ampla dos refor-çadores potenciais e de habilidades a serem desenvolvidas pelo cliente para a escolha da aplicação mais adequada. (Vermes e Zamignani, 2002; Zamignani e Vermes, 2003).

A técnica de exposição com prevenção de respostas pode ser ainda melhor implementada se levarmos em consideração a importância dos reforçadores positivos na manutenção de respostas alternativas às respostas ansiosas. A aplicação da técnica, nesse sentido, pode ser mais efetiva em situações nas quais o cliente possa ter acesso a reforçadores naturais produzidos pela resposta de enfrentamento. Essa proposta, segundo os autores, exigiria uma análise ampla dos reforçadores potenciais e de habilidades a serem desenvolvidas pelo cliente para a escolha da aplicação mais adequada. (Vermes e Zamignani, 2002; Zamignani e Vermes, 2003).

A ampliação do contato do cliente com eventos reforçadores é também um objetivo importante para que respostas alternativas às respostas ansiosas sejam instaladas. Para isso, é necessário um levantamento cuidadoso das habilidades e déficits pré-existentes em habilidades sociais ou no repertório do cliente no manejo e enfrentamento de problemas. (Banaco, 1997; Zamignani, 2000; Vermes e Zamignani, 2002; Zamignani e Vermes, 2003).

O levantamento dessas variáveis pode implicar na análise e intervenção sobre as relações familiares, já que essas podem ter um papel importante na instalação e manutenção de problemas dessa natureza. Guedes (1997) pesquisou o envolvimento da família nos casos do transtorno obsessivo-compulsivo, constatando que a família age de maneira inconsistente com o paciente portador de TOC, ora participando do ritual juntamente com o paciente, ora antecipando o ritual, e em outros momentos ignorando ou mesmo punindo a emissão do ritual. Este padrão da família geraria um padrão intermitente que tenderia a manter o quadro obsessivo-compulsivo.

Vermes e Zamignani (2002) sugerem que os seguintes aspectos poderiam ser alvo de intervenção sobre a família de forma a aumentar a efetividade das estratégias terapêuticas: (1) a orientação familiar; (2) a atribuição aos familiares da tarefa de coletar dados e colaborar no tratamento; (3) a intervenção sobre a família em busca de se estabelecer condições ambientais que previnam as respostas ansiosas e promovam respostas alternativas; (4) Alteração do padrão de relacionamento familiar, de forma a:

“(a) diminuir a ambigüidade nas interações; (b) desenvolver uma melhor qualidade de comunicação; (c) identificar e alterar padrões de interação que possam ser prejudiciais; (d) proporcionar condições para que os membros da família possam identificar, prever e controlar condições responsáveis pela manutenção do [problema]; (e) desenvolver um repertório de resolução de problemas; (f) construir relações mais reforçadoras.” (pp. 144-145).

Algumas pesquisas realizadas dão sustentação às propostas aqui apresentadas. Vermes (2003) realizou uma pesquisa na qual os rituais de limpeza de três crianças que apresentavam o diagnóstico de Transtorno Obsessivo-Compulsivo foram estudados empiricamente por meio de análise funcional (Iwata, 1994). Os dados obtidos sugerem que a apresentação de tarefas indesejadas favorece a ocorrência de respostas obsessivo-compulsivas, indicando uma possível função de esquiva de demanda para essas respostas.

Queiroz, Motta, Madi, Sossai e Boren (1981) propuseram uma forma de tratamento do comportamento obsessivo-compulsivo com base na análise funcional do comportamento, cuja ênfase é dada às conseqüências que se seguem à resposta. Esses autores apresentam dados de três casos clínicos nos quais foram utilizados procedimentos que proporcionaram o desenvolvimento de relações sociais mais reforçadoras, produzindo a melhora do funcionamento geral do cliente e a redução das relações aversivas. Os autores utilizaramse de procedimentos tais como a extinção para as respostas mantidas por conseqüências reforçadoras (por exemplo, atenção), modelação de respostas alternativas à resposta obsessivo-compulsiva, orientação familiar para a manutenção destes procedimentos utilizados permitiram reduzir de forma indireta a freqüência dos comportamentos obsessivo-compulsivos.

Em estudos de caso publicados por Banaco (1997), Graña y Bayón (2000) e Zamignani e Vermes (2003), são relatados sucessos em procedimentos baseados na avaliação funcional e em estratégias terapêuticas tais como o uso da técnica de EPR de forma não sistemática e inserida no contexto cotidiano do cliente, reforçamento diferencial de comportamentos alternativos à resposta ansiosa, modelagem e fortalecimento de repertório social, desenvolvimento de repertório de enfrentamento e intervenção sobre os familiares.

A título de conclusão, vale ressaltar que não é objetivo desse capítulo condenar o uso de estratégias padronizadas. Conforme afirmaram Zamignani e Vermes, “a condenação pura e simples deste tipo de proposta parece tão simplista quanto o é a sua adoção ingênua” (p. 134). Entretanto, o que se pretende questionar é o uso indiscriminado de determinados procedimentos padronizados sem a devida avaliação das variáveis relevantes.

A questão apontada por Eifert (1996) a respeito do debate sobre a adoção de tratamentos padronizados versus individualizados merece destaque. Esse autor defende que essas propostas têm sido apresentadas de forma desnecessariamente excludente, quando de fato, seriam comple-mentares.

A existência de pacotes de tratamento padronizados, de fato, é um avanço para o treinamento e aplicação de estratégias de tratamento, e seu uso pode produzir bons resultados em muitos casos. Em outros casos, todavia, a melhor escolha pode ser a adoção de alguns dos elementos presentes nos pacotes de tratamento ou mesmo o uso de estratégias completamente individualizadas. O que irá definir qual o melhor delineamento do tratamento será a avaliação funcional. A avaliação funcional do caso individual, portanto, é a melhor forma de se desenvolver uma boa análise da queixa apresentada e o delineamento adequado das estratégias de tratamento.

 

 

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Recebido em: 06/03/2005
Primeira decisão editorial em: 07/05/2005
Versão final em: 26/05/2005
Aceito em: 30/05/2005

 

 

1 Versão traduzida e revisada de artigo já publicado, com autorização da editora. Publicação original: Banaco, R. A. e Zamignani, D. R. (2004). An analytical-behavioral panorama on the anxiety disorders. Em: T. C. C. Grassi (org) Contemporary challenges in the behavioral approach: a Brazilian overview. Santo André: ESETec.
2 Doutorando em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo. Professor da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade São Judas Tadeu. Coordenador do Paradigma Núcleo de Análise do Comportamento. E-mail: dzamig@terra.com.br
3 A ordem dos autores é meramente alfabética.
4 Professor Titular do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Psicologia e do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento, ambos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Coordenador do Paradigma® Núcleo de Análise do Comportamento. E-mail: rbanaco@terra.com.br
5 Vale observar que o termo evitação será utilizado neste texto, não como um sinônimo de esquiva, mas como um tipo de resposta de esquiva, no qual o indivíduo simplesmente “evita se expor“ ao evento aversivo, diferentemente, por exemplo, de uma resposta repetitiva que produz o adiamento do estímulo.