ARTIGOS

 

Avaliação do nível de stress em profissionais de saúde¹

 

Evaluation of the stress level in professional health

 

 

Liliane de Carvalho ^{I, *}; Lucia Emmanoel Novaes Malagris ^{II, **}

^I Mestranda em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
^II Professora de Graduação e Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Endereço para correspondência

 

 

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RESUMO

A qualidade do atendimento em saúde depende, além de outros fatores, do estado físico e mental do profissional assistencial. Pesquisas voltadas à avaliação da saúde desses profissionais são fundamentais para manutenção da qualidade dos serviços. Objetivou-se neste estudo detectar presença de stress entre profissionais de saúde, fase do stress na qual se encontravam, predominância de sintomas, físicos e/ou psicológicos, e comparar o nível de stress entre as categorias. Participaram 31 profissionais de nível superior que atuavam em um Posto de Assistência Médica (PAM) da Zona Norte do Rio de Janeiro. Foram submetidos ao ISSL e a um Questionário Informativo. Dos profissionais avaliados, 58% encontravam-se estressados, dentre os quais, 94% na fase de resistência. Em 56% dos estressados houve predominância de sintomas físicos. Serviço social, enfermagem e medicina apresentaram maior incidência de stress. Sugere-se trabalhos de controle do stress para garantir bom nível de atendimento aos pacientes e boa qualidade de vida aos profissionais.

Palavras-chave: Stress, Sistema único de saúde, Profissionais de saúde.

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ABSTRACT

The quality of healthy attendance depends, among others factors, of the physical and mental state of the assistance professional. Researches directed to the health’s evaluation of these professionals are extremely important to guarantee the quality of the service. The purpose of this study was to evaluate the presence of stress among healthy professionals, the phase of stress in which they found themselves, the predominance of symptoms, physic and/or psychological, and to compare the level of stress between the professional categories. Thirty-one graduated professionals, who worked in a center of medical assistance (PAM), in a Rio de Janeiro’s quarter, participated in the research. They answered to ISSL and an Informative Questionnaire. Fifty-eight per cent of the participants were found stressed, and 94% of them had symptoms pertaining to the second phase of the stress process, the Resistance. In relation to the symptoms' prevalence, it was found that in 56% of the stressed professionals, there was predominance of physic symptoms. The categories of professionals with greatest prevalence of stress were from the social service, nursing and medicine areas. stress management procedures are suggested to guarantee a good level of services to the patients and a good quality of life to the professionals.

Keywords: Stress, Unified health system in Brazil, Professional health

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O tema stress ocupacional vem a cada dia ganhando mais espaço entre os estudiosos. Lipp e Malagris (1995) enfatizam a gravidade do problema e sua importância na saúde do trabalhador, cujo resultado pode ser o absenteísmo e até mesmo o abandono do emprego.

A literatura (ABREU; STOLL; RAMOS; BAUMGARDT; KRISTENSEN, 2002; COVOLAN, 1996; HERNÁNDEZ, 2003; MALAGRIS, 2004; VOLPATO et al., 2003) tem revelado que o stress ocupacional crônico pode evoluir para a chamada síndrome do burnout, termos, portanto, empregados de maneira diversa. Lipp (2004), em pesquisas realizadas no Laboratório de Estudos Psicofisiológicos do stress da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, aponta para a degradação da saúde física e mental e da qualidade de vida da pessoa submetida a um estado de stress crônico. Segundo a autora, o indivíduo estressado apresenta irritação, agressividade, impaciência, que acabam por dificultar seu relacionamento com outras pessoas, levando-o a uma dificuldade de pensar em outros assuntos, que não sejam os relacionados a seu estressor. Em fases avançadas do stress, a pessoa já apresenta prejuízo na sua linha de pensamento e sua meta principal é apenas sobreviver e se livrar de tudo aquilo que cause sofrimento. Diante desse quadro de stress e se as fontes de stress da pessoa forem relacionadas ao ambiente ocupacional, pode-se cogitar o desenvolvimento da síndrome do burnout, na medida em que a sintomatologia característica deste quadro começa a aparecer em decorrência do desgaste causado pelo stress crônico. Assim, o profissional estressado encontra-se debilitado, devido a investimentos de energia contra estressores, o que pode levá-lo a apresentar déficits em seu trabalho e, principalmente, em sua relação com o outro, sendo este último fator essencial para o diagnóstico de burnout.

A síndrome do burnout acomete principalmente profissionais assistenciais, notadamente profissionais de saúde, professores e policiais militares (MALAGRIS, 2004). Segundo Benevides-Pereira (2002), a diferença fundamental entre o stress ocupacional e o burnout é que neste é dada mais importância à relação interpessoal entre o profissional e o usuário do serviço, levando a um total prejuízo de seu trabalho. Dessa forma, profissionais de quaisquer atividades laborais podem sofrer de stress ocupacional, ao passo que somente os profissionais voltados primariamente ao cuidado do outro estão propensos ao desenvolvimento do burnout. Fatores como desatenção, negligência, cinismo, falta de empatia e hostilidade são característicos deste quadro, evidenciando a dificuldade do trabalhador em desempenhar de forma satisfatória suas responsabilidades. Como citam Borges, Argolo, Pereira, Machado e Silva, 2002 (página?):

ajudar outras pessoas sempre foi reconhecido como objetivo nobre, mas apenas recentemente tem sido dada atenção para os custos emocionais da realização do objetivo. O exercício destas profissões implica uma relação com o cliente permeada de ambigüidades, como conviver com a tênue distinção entre envolver-se profissional e não pessoalmente na ajuda ao outro.

Mas o que é de fato o burnout? Essa tarefa de demarcação conceitual, tal como ocorre com o termo stress, é muito difícil de ser empreendida, pelo fato de existirem inúmeras definições a respeito. Contudo, a concepção sócio-psicológica proposta por Maslach e Jackson (apud BENEVIDES-PEREIRA, 2002) é a mais utilizada no meio científico para definir o termo, devido à profundidade dos estudos das autoras. Estas concebem burnout como um conjunto de sinais e sintomas composto de aspectos multidimensionais em resposta ao stress laboral crônico, envolvendo três fatores principais, a saber, exaustão emocional, despersonalização e redução da realização pessoal. O primeiro deles, exaustão emocional, refere-se à falta de energia e recursos - emocionais e físicos - para lidar com as diferentes situações de trabalho; no segundo fator, chamado despersonalização, ocorre uma verdadeira transformação negativa da relação do profissional com o usuário de seu serviço (paciente, cliente, aluno etc). Sentimentos como indiferença, ironia e cinismo são desenvolvidos pelo trabalhador em relação ao outro, culminando em um endurecimento afetivo; o terceiro e último fator - redução da realização pessoal e profissional - diz respeito a uma insatisfação por parte do profissional, concernente ao desempenho de suas atividades, este não mais acreditando em sua capacidade de trabalho, levando-o a sentimentos de baixa auto-estima, desmotivação e inadequação, dentre outros (BENEVIDES-PEREIRA, 2002; FERREIRA, 2003). Importante salientar que o desenvolvimento desses três aspectos da síndrome do burnout é, segundo Malagris (2004), progressivo e dinâmico, não ocorrendo do mesmo modo e com a mesma intensidade em todas as pessoas. Além disso, se observa uma evolução gradativa, referente à deterioração da relação do trabalhador com suas atividades.

Maslach e Jackson, juntamente com o psicólogo Michael Leiter, a partir da revisão do instrumento MBI – Maslach Burnout Inventory - para avaliação do burnout, concluíram que a síndrome acometeria não só profissionais “cuidadores”, mas também outros profissionais. Entretanto, existe resistência a essa nova perspectiva, devido ao fato de as pesquisas mostrarem que os níveis de exaustão emocional e despersonalização são mais acentuados em atividades que exigem o contato direto com o outro (BENEVIDES PEREIRA, 2002). Confirmando esse dado, Cadiz, Juan, Rivero, Herce e Achucarro (apud BORGES et al., 2002), a partir de uma análise de estudos epidemiológicos desenvolvidos com as diversas profissões, relatam o aparecimento da dimensão esgotamento emocional de uma forma generalizada entre as atividades estudadas, não ocorrendo o mesmo com as outras duas dimensões, que compõem a síndrome, as quais aparecem especialmente em atividades envolvendo cuidados humanitários.

Estudos atuais demonstram que o nível de stress profissional tem sofrido um aumento vertiginoso nos últimos anos, principalmente em virtude dos avanços tecnológicos, das inovações na metodologia de trabalho, da competição entre trabalhadores, da sobrecarga de tarefas, da pressão relativa ao tempo de execução das mesmas etc, além de os profissionais terem de se defrontar com problemas específicos de suas áreas de atuação (PARKES apud MALAGRIS, 2004; MARTINS, 2003). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), os locais de trabalho com um número considerável de estressores apresentam proporcionalmente um grande número de trabalhadores estressados, sendo 5% a 10% com problemas graves (MENDES, 1995).

O profissional de saúde pública é um exemplo de categoria que parece estar submetida à influência de estressores, pois, além de conviver com inúmeros problemas estruturais, tais como falta de infra-estrutura e material básico para o trabalho, forte demanda imposta pelos órgãos competentes etc, precisam constantemente estar atentos a seus papéis e ao papel da instituição pública frente ao usuário, na tentativa de atender aos desafios decorrentes da implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), como: universalização, regionalização, hierarquização dos serviços, dentre outros (BORGES et al., 2002).

O estabelecimento do SUS trouxe para a prática do profissional uma série de mudanças referentes à gestão em saúde, tais como atendimentos nas residências, vinculados à Estratégia de Saúde da Família, ênfase na promoção da saúde e prevenção de doenças e até mesmo redefinição de conceitos básicos como saúde, doença e cuidado. Estas e outras mudanças forçaram o profissional, na ponta desse sistema, a se adequar, se recolocar e repensar sua postura frente ao novo paradigma. Em conseqüência disso, maior investimento se direciona à adaptação a demandas, fato que muitas vezes leva ao adoecimento físico e mental. Avaliar e acompanhar a saúde desses profissionais torna-se de extrema relevância, assim como a necessidade de encontros entre a equipe com objetivos de trocas de experiências, resoluções de conflitos e solução de problemas advindos da prática.

Em meio a tantos fatores estressantes, faz-se necessário cuidar da saúde física e mental dos profissionais em geral, a fim de evitar o absenteísmo e a baixa produtividade, associados, muitas vezes, a doenças crônicas. Todavia, atentar principalmente para o profissional “cuidador”, que além de exposto ao stress também está na mira do burnout, cuja conseqüência pode ser bem desastrosa para sua qualidade de vida e a qualidade de vida do outro.

Considerando a assertiva acima exposta, este estudo justifica-se a partir da literatura científica, que tem se mostrado preocupada com a saúde física e mental dos profissionais de saúde. Além disso, o fato da efetividade de seu trabalho depender de seu bem-estar leva a se pensar que a saúde do profissional da referida área é fundamental para a qualidade de vida da população por ele atendida.

Pretendeu-se, com esta investigação, colaborar com o conhecimento a respeito do stress nessa classe de trabalhadores, para que, a partir daí, possa se pensar em formas práticas de se lidar com a questão.

 

Método

 

Participantes

Participaram voluntariamente do presente estudo 31 profissionais de nível superior, que atuavam assistencialmente e/ou em cargos de chefia em um Posto de Assistência Médica (PAM), localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro. A seleção se deu de forma aleatória, buscando contemplar a proposta inicial de trabalho com as seguintes categorias profissionais: médicos, enfermeiros, psicólogos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, nutricionistas e cirurgiões-dentistas.

Dos 31 profissionais entrevistados, sete eram médicos, dentre os quais dois, além das funções relativas à medicina, acumulavam funções de chefia, quatro enfermeiros, dois psicólogos, dois fonoaudiólogos, um fisioterapeuta que, tal como os dois médicos supracitados, atuava em cargo de chefia, três nutricionistas e três cirurgiões-dentistas.

 

Material

Utilizou-se na pesquisa o Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp (ISSL) (LIPP, 2000), que tem como objetivo detectar a presença de stress, identificar a fase do stress na qual a pessoa se encontra e a predominância de sintomas físicos e/ou psicológicos em cada fase. O ISSL é constituído de três quadros: o primeiro diz respeito aos sintomas apresentados nas últimas 24 horas – fase de alerta; o segundo é relativo aos sintomas experimentados na última semana – fases de resistência e quase-exaustão; e o terceiro se refere aos sintomas apresentados no último mês – fase de exaustão.

Além disso, utilizou-se também Questionário Informativo (QI), visando conhecer dados pessoais e profissionais dos participantes. O QI visou o levantamento dos seguintes dados: sexo, faixa etária, estado civil, número de filhos, profissão, tempo de serviço, tempo de serviço no PAM e local de trabalho.

 

Procedimento

Para que a pesquisa pudesse ser realizada, foi necessária primeiramente a autorização do diretor do PAM e, posteriormente, a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética da Secretaria Municipal de Saúde. Foi também obtido consentimento dos profissionais participantes, cada um deles recebendo um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, contendo informações sobre as implicações do estudo para que assinassem, caso concordassem em participar. Após, foi aplicado o Inventário de Sintomas de stress para Adultos de Lipp – ISSL e o Questionário Informativo (QI). A aplicação dos instrumentos ocorreu em diferentes ambientes do PAM – salas de atendimento, copa (local de descanso dos profissionais), dentre outros, conforme disponibilidade local.

 

Resultados

Dos 31 profissionais entrevistados, 13 deles (42%) não apresentaram stress, ao passo que 18 (58%), mostraram-se estressados. Neste último grupo, 17 (94%) estavam na fase 2 do stress - resistência – e 1 se encontrava na fase 3, de quase-exaustão. Considerando a grande proporção de profissionais estressados na fase de resistência, mostrou-se interessante analisar, a freqüência com que cada sintoma típico desta fase do stress esteve presente nas respostas dos profissionais, conforme demonstrado na tabela 1.

 

 

Observa-se na tabela acima que os sintomas mais assinalados foram sensação de desgaste físico constante (16%) e cansaço constante (13,6%). Por outro lado, aparecimento de problemas dermatológicos (1,6%) e aparecimento de úlcera (0,8%) foram os sintomas menos apontados pelos profissionais.

No que diz respeito à prevalência de sintomas, constatou-se que em 10 (56%) profissionais estressados, houve predominância de sintomas físicos e em 8 (44%) os sintomas psicológicos foram os prevalentes.

Analisar-se-á na tabela abaixo (tabela 2), a porcentagem de profissionais estressados, considerando a amostra total e o total de profissionais em cada categoria:

 

 

De acordo com o exposto na tabela, observa-se que o número de estressados foi total (100%) dentre os assistentes sociais, fonoaudiólogos e médicos que atuavam concomitantemente em cargos de chefia. Em contrapartida, os profissionais que atuavam somente em funções de chefia, bem como o fisioterapeuta, cujas atividades se desdobravam em ambulatoriais e de gestão, não encontravam-se estressados. As outras categorias profissionais apresentaram as seguintes porcentagens no que se refere ao stress, a saber, 2 (67%) cirurgiões-dentistas, 3 (75%) enfermeiros, 1 fisioterapeuta, dentre os dois existentes na amostra, 3 (60%) médicos e 2 (67%) nutricionistas.

Examinando a tabela 3, que inclui somente os profissionais estressados (18), observou-se que 3 (16,7%) pertenciam a categoria de assistência social, com igual número e porcentagem para a enfermagem e medicina. Nos cirurgiões-dentistas, fonoaudiólogos, nutricionistas e médicos que acumulavam funções de chefia, foi encontrada a mesma quantidade de estressados, 2 (11,1%). Apenas 1 profissional de fisioterapia, dentre os 2 da amostra, estava estressado.

 

 

Discussão

No que diz respeito à incidência de stress, constatou-se que 18 (58%) dos profissionais participantes encontravam-se estressados e 13 (42%) não estressados. O fato de mais da metade dos profissionais de saúde da instituição se encontrar estressada gera preocupação quanto à qualidade dos atendimentos prestados e quanto à sua própria qualidade de vida. Grande parte dos profissionais estressados achava-se na fase 2 do stress – resistência – 17 (94%), cujos sintomas podem interferir sobremaneira nas diferentes esferas de suas vidas pessoal e profissional, uma vez que a característica principal desta fase é o grande requerimento de energia adaptativa do organismo em prol do restabelecimento da homeostase interna perdida na fase anterior (alerta). Os principais sintomas apresentados pelos profissionais estressados na fase de resistência, desgaste físico constante (16%) e cansaço constante (13,6%) demonstram bem a utilização dessa energia e o esgotamento do corpo frente a esse emprego. Além disso, sugere que a qualidade do trabalhos desses profissionais pode estar prejudicada, pois o cansaço e o desgaste físico podem estar interferindo no desempenho profissional.

Embora a porcentagem entre predomínio de sintomas físicos e psicológicos não tenha se diferenciado de forma importante, físicos 10 (56%) e psicológicos 8 (44%), os primeiros revelaram-se predominantes. Refletindo sobre esses resultados, pode-se supor que tais profissionais não se utilizam de estratégias que envolvam a amenização dos efeitos do stress físico em seu cotidiano, como exercícios físicos, por exemplo. É possível também que o fato de lidarem no seu dia-a-dia com queixas somáticas por parte dos pacientes, os torne mais treinados na percepção desse tipo de sintomatologia mesmo em si próprios.

Foram bastante diversificadas as categorias profissionais abrangidas pelo estudo, entretanto, o número de profissionais entrevistados em cada uma foi reduzido, devido à dificuldade de encontrá-los em horário livre para responderem aos instrumentos. Tal fato, de alguma forma, pode revelar a intensa rotina de trabalho dos mesmos, favorecendo o desenvolvimento do stress.

No que se refere à relação entre stress e profissão, foram observados dados bastante interessantes, na medida em que se encontrou um maior número de profissionais estressados dentre os que desenvolviam atividades assistenciais, em detrimento daqueles que, no momento do estudo, estavam lotados em cargos de chefia unicamente. O grupo de profissionais que somavam o trabalho ambulatorial ao trabalho de chefe também apresentou alta incidência de stress. Supõe-se, com tais resultados, que a prática da assistência, que leva o profissional ao contato direto com o sofrimento, o torna mais vulnerável ao stress. Esses dados condizem com a literatura (ABREU et al., 2002; HERNÁNDEZ, 2003; MALAGRIS, 2004), que chama a atenção para o desenvolvimento da síndrome de burnout em profissionais que prestam assistência.

Analisando mais pormenorizadamente as categorias profissionais, notou-se que as que apresentaram maior índice de estressados são as de serviço social, enfermagem e medicina. É possível supor a razão desse fato, ao levar-se em conta a prática de cada profissão, ou seja, as atividades características de cada uma. Os assistentes sociais lidam diretamente com as políticas públicas e as dificuldades encontradas pelos indivíduos em nelas se inserirem, desempenhando o papel de “ponte” entre o usuário e o Estado. A carga de responsabilidade depositada neste profissional é por vezes demasiada, pois dele depende, em muitos casos, a continuação do tratamento pelo paciente. Já o profissional de enfermagem é aquele cujo trabalho volta-se inteiramente ao cuidado do cliente. É ele quem atende às necessidades mais básicas daquele que sofre, encontrando-se mais próximo de sua dor, fato que pode causar grande desgaste físico e emocional. O mesmo ocorre com os médicos que, embora não estejam tão próximos aos pacientes como os enfermeiros, também lidam com a doença e com as dificuldades por ela trazidas. Além disso, cabe enfatizar que, embora o paciente seja tratado por uma equipe de profissionais, ainda hoje a sociedade atribui ao médico a maior responsabilidade pela cura do paciente. Tal fato pode contribuir para o stress do profissional médico. Interessante salientar o fato dos psicólogos não estarem estressados. Isto pode se relacionar à utilização de estratégias psicológicas, por parte destes profissionais, para controle do stress em seu cotidiano.

Embora este estudo tenha sido preliminar e o desenvolvimento de outros seja necessário para explorar a questão do stress entre profissionais de saúde, o número de trabalhadores estressados encontrados nesta pesquisa é bastante preocupante, principalmente em se tratando de profissionais desta área de atuação. O stress nesses profissionais pode acarretar prejuízos no desempenho profissional, afetando sobremaneira o ambiente institucional, interpessoal e pessoal, trazendo comprometimento para a sociedade de um modo geral.

 

Considerações Finais

A sociedade atual é marcada pela constante rotatividade de informações, o que demanda freqüente atualização. A todo momento, nos deparamos com mudanças que exigem adaptação, muitas vezes conseguida com grande desgaste. Além disso, a cobrança por perfeição acaba por se somar à desenfreada busca por informações, o que, juntamente com outros fatores, pode propiciar o desequilíbrio da homeostase interna e o aparecimento do stress.

Levando em conta os danos causados pelo stress excessivo, no que concerne à saúde física e mental, tornou-se fundamental para pesquisadores e estudiosos o entendimento do conceito, visando diminuir seus efeitos negativos sobre a população, bem como garantir melhorias na qualidade de vida. Muitas pesquisas sobre o tema vêm sendo feitas e a cada dia surgem novidades com relação ao stress, suas implicações e formas de intervenção.

Os profissionais de saúde, devido à peculiaridade de suas atividades, necessitam estar atentos à sua saúde física e mental, pois disso depende a qualidade de seus atendimentos. Estressores como falta de estrutura física para o desempenho de atividades, alta demanda de atendimentos, dentre outros, aliados aos estressores da sociedade contemporânea, podem levar a uma deterioração da qualidade de vida desses profissionais, interferindo diretamente em seus trabalhos. Pesquisas para avaliação da saúde física e mental do profissional de saúde são fundamentais para contribuir na manutenção da qualidade dos serviços.

Vale lembrar que o stress é um processo dinâmico e, por isso, tanto pode ser agravado quanto revertido, dependendo da forma de enfrentamento utilizada pela pessoa. Para que a reversão do quadro de stress aconteça, faz-se necessário o emprego de intervenções que envolvam técnicas específicas para seu controle, a fim de ajudar o indivíduo a manejá-lo de modo mais eficiente. Caso isto não ocorra, é provável que haja aumento na gravidade do quadro, deixando o organismo debilitado e propenso a doenças. Levando-se em consideração essa problemática, torna-se de extrema importância o desenvolvimento de outros estudos, a fim de melhor investigar a questão stress x profissionais de saúde e buscar, não só avaliar o nível de stress desses profissionais, como também suas fontes causadoras. Interessante também seria a elaboração de pesquisas, cujo foco fosse o desenvolvimento de protocolos voltados para esse público em particular, considerando, obviamente, seus contextos.

Em 58% dos profissionais de saúde submetidos ao Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp foi encontrado stress, dentre os quais, 94% achavam-se na Resistência, fase associada a prejuízos importantes na qualidade de vida, o que pode interferir diretamente na prática destes profissionais. Os dados relativos à profissão aqui relatados também merecem reflexão, na medida em que apontam para uma grande incidência de stress entre os profissionais assistenciais. Merece ser melhor investigado o motivo pelo qual a assistência sobrecarrega o profissional.

Embora preliminar, este estudo contribuiu para o levantamento de questões importantes a respeito da relação do stress entre profissionais de saúde, além de disponibilizar alguns dados para outras pesquisas sobre o tema.

 

Limitações do Estudo

Como qualquer estudo científico, este possui também suas limitações. Um dos fatores que restringe os resultados se refere ao número de participantes, pequeno, em vista da quantidade de profissionais atuantes no PAM estudado. Isso se deu devido à dificuldade de encontrar os profissionais fora de seus consultórios no ambulatório do PAM, refletindo a rotina estressante vivida pelos mesmos. Logo, não se pode generalizar os resultados aqui encontrados.

Embora com seus limites, espera-se que este estudo possa contribuir para um entendimento da questão do stress em profissionais de saúde e sirva de base para outras formulações a respeito do tema e para estudos mais abrangentes posteriormente.

 

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Endereço para correspondência
Liliane de Carvalho
E-mail: carvalho.liliane@gmail.com

Recebido em: 12/03/2007
Aceito para publicação em: 05/06/2007

 

 

Notas

^* Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.
^** Doutora em Fisiopatologia Clínica e Experimental pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ.
¹ Artigo baseado na monografia de final de curso da primeira autora. Agradecimentos à Professora Lucia Novaes por sua orientação e à Psicóloga Cecília Fiorotti pelo apoio.