8 3A educação como dispositivo de proteção às crianças e adolescentes segundo práticas do UNICEF: problematizações foucaultianas 
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Estudos e Pesquisas em Psicologia

 ISSN 1808-4281

Estud. pesqui. psicol. v.8 n.3 Rio de Janeiro dez. 2008

 

EDITORIAL

 

Estamos concluindo o número 3 do VIII volume da revista “Estudos e Pesquisas em Psicologia” e, com ele, mais um ano de realizações quanto ao que nos propomos com essa publicação. Muito ainda queremos alcançar, é claro, mas não deixamos de saborear os ganhos, já que bem o sabemos, o caminho a percorrer é árduo.

Nesse número, pudemos identificar a preocupação com a criança contemporânea através de alguns artigos que se debruçam sobre o tema. O artigo “A educação como dispositivo de proteção às crianças e adolescentes segundo práticas da UNICEF: problematizações foucaultianas“, de Flávia Cristina Silveira Lemos, trata das políticas brasileiras dirigidas às crianças e adolescentes, durante a redemocratização e sua relação com a UNICEF. Seguindo o método genealógico foucaultiano, explicitado no próprio título, problematiza o caráter normalizador dessa relação e a necessidade da contextualização às condições sociopolíticas locais. No artigo “A espinha partida: considerações acerca da violência no filme Tsotsi & Infância Roubada”, as autoras Junia de Vilhena e Maria Inês G. de Freitas Bittencourt, tomando como base de reflexão o filme sul-africano “Tsotsi”, dirigido por Gavin Hood (2005) e exibido no Brasil sob o título “Infância roubada”, abordam as implicações decorrentes do abandono, na vida de uma criança e na estruturação de sua subjetividade, favorecendo, inclusive, a agressividade como uma reação de sobrevivência. Dando continuidade às discussões sobre as condições da criança contemporânea, tem-se o artigo apresentado por Luciana Vieira Caliman, “ Os valores da atenção e a atenção como valor”. Numa retrospectiva histórica de como a atenção sempre foi abordada na sociedade ocidental, em sua perspectiva moral, existencial, médica e científica, analisa a constituição da atenção como valor e de que valores a constituem, ressaltando a permanência, até os dias de hoje, do julgamento da atenção como um valor social.

Em seguimento, alguns artigos debruçam-se sobre o período da adolescência. No texto “ Juventude e família: expectativas, ideais e suas repercussões sociais”, Hebe Signorini Gonçalves e Luciana Gageiro Coutinho tratam da idéia que jovens da Baixada Fluminense, periferia do Rio de Janeiro, têm sobre família e os sentidos atribuídos a essa instituição, seja à família de convivência ou à idealizada, apontando para a necessidade de um trabalho de atualização dessa idealização, diante da interferência que a mesma traz para esses sistemas familiares. O artigo “Padrões de interação em famílias de adolescentes com anorexia nervosa restritiva e bulímica: semelhanças e diferenças”, de Letícia Langlois Oliveira e Cláudio Simon Hutz, trata de um tema bastante atual, a anorexia nervosa, no caso, a restritiva e a bulímica. A partir do estudo das famílias de adolescentes, onde esse tipo de disfunção aparece, descreve as características de funcionamento dessas famílias, identificando as peculiaridades e diferenças de seus padrões de interação.

Em seguida, encontramos alguns trabalhos que valorizam a prevenção, como o de Camila Miranda de Amorim sobre a A domesticação das singularidades. Reflexões sobre o paradigma da prevenção & o caso da epidemia de HIV/AIDS”, que discute, em seu trabalho, a crescente medicalização da vida cotidiana e a impregnação da noção de risco na formação da subjetividade contemporânea, através da padronização de estilos de vida saudáveis. Ressalta a limitação de uma prevenção alicerçada nesse modelo, no caso específico deste trabalho, na transmissão do HIV, se não se atentar para a dimensão desejante do sujeito. Ainda tratando do aspecto preventivo, temos no artigo “Habilidades de vida: uma estratégia preventiva ao consumo de substâncias psicoativas no contexto educativo”, de Fernando Santana de Paiva e Marisa Cosenza Rodrigues, uma abordagem de prevenção no uso de substâncias psicoativas através do desenvolvimento de competências psicossociais. Para tal fim, é sugerido o modelo apontado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) de “habilidades de vida”, um processo de desenvolvimento de competências psicossociais consideradas essenciais ao desenvolvimento humano. Como a escola é considerada um palco privilegiado para esse tipo de intervenção, o artigo aponta modelos que podem contribuir para sua implementação. Reforçando a preocupação com a prevenção de comportamentos de risco, o artigo ”Crenças e comportamentos sobre práticas de prevenção ao uso de álcool entre pacientes da Atenção Primária à Saúde”, de Tatiana de Castro Amato, Pollyanna Santos da Silveira, Jussara Siqueira de Oliveira e Telmo Mota Ronzani, estuda as crenças de pacientes e médicos da Atenção Primária à Saúde (APS) de Juiz de Fora, cidade de Minas Gerais, sobre a prevenção do uso de álcool. Argumentam que as atitudes que a população ou profissionais apresentam sobre determinada situação de saúde serão fundamentais para a qualidade do atendimento, adesão ao tratamento e atividades de prevenção e apontam questões importantes para serem observadas na elaboração de políticas públicas preventivas desse tipo de dependência.

As autoras Fabiana Neme Nogueira Ramos e Carmen Maria Bueno Neme, no artigo intitulado Burnout em profissionais de bibliotecas”, investigam a síndrome de burnout em profissionais que trabalham em bibliotecas, estudando 24 profissionais de três bibliotecas diferentes, a fim de identificar os fatores determinantes da exaustão e desinteresse pelo trabalho, sintomas predominantes dessa síndrome, e quais as possibilidades de prevenção.

Com a preocupação da melhoria da assistência médica, o artigo “Depressão pós-parto: considerações teóricas, de Maria da Penha de Lima Coutinho e Evelyn Rúbia de Albuquerque Saraiva, aponta a importância de se valorizar as repercussões do sofrimento psíquico de mulheres em fase reprodutiva, especialmente na depressão puerperal, e as implicações desse transtorno no ambiente familiar, ressaltando a relevância de um conhecimento integrado de todos os seus sintomas por parte dos profissionais de saúde.

O artigo intitulado O acompanhamento terapêutico no cuidado em saúde mental”,de Thaís Azevedo e Magda Dimenstein, versa sobre as demandas de portadores de transtornos mentais no processo de reabilitação psicossocial, no que se refere aos cuidados cotidianos, à relação com a comunidade, à ida ao ambulatório e circulação na cidade, discutindo os benefícios do acompanhamento terapêutico, para o atendimento das demandas dos portadores de transtornos mentais, já que esse tipo de intervenção visa facilitar e/ou agilizar o processo de autonomia dos usuários na utilização dos espaços públicos.

A preocupação com a prevenção, a atenção e a problematização da saúde trazem em seu bojo, muitas vezes, a preocupação com o que se convenciona chamar, em nossos dias, de qualidade de vida, tema abordado no artigo de Teresa Rezende e Rosana Marques da Silva “A qualidade de vida no trabalho dos profissionais da área de enfermagem: um estudo a partir do modelo teórico de Hackman & Oldham”, que, a partir do modelo teórico de Hackman e Oldham, como explicita o título, estuda a qualidade de vida de profissionais de enfermagem de uma instituição hospitalar do Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Analisa a percepção desses funcionários quanto à função que exercem e sua importância no sistema no qual estão inseridos.

No artigo “Corpo e velhice na contemporaneidade”, de Gabriela Felten da Maia, pode-se contemplar a contextualização do corpo do “velho” na sociedade contemporânea e suas formas de subjetivação que expressam, em alguns momentos, a tentativa de negação de um ethos próprio a uma determinada faixa etária do desenvolvimento humano. A problematização do tema nos parece importante, já que, normatizar uma forma de envelhecer “saudável”, utilizando um modelo de corpo perfeito, pode se constituir num processo tão aprisionador quanto a valorização do estereótipo da juventude.

Em continuidade, o artigo Memória pictórica e inteligência: duas evidências de validade“, de Fabián Javier Marín Rueda, Dario Cecilio-Fernandes e Fermino Fernandes Sisto, busca evidências de validade concorrente e por grupos extremos para o Teste Pictórico de Memória.

O texto “Por um estudo do ausente: a ausência como objetivação da alteridade em mapas mentais do Brasil”, texto de Ana Carolina Dias Cruz e Angela Arruda, apresenta o resultado de uma pesquisa realizada com 140 universitários de instituições de ensino do Rio de Janeiro, delineando qual a representação social do brasileiro para estes jovens e sua face alteritária, o não-brasileiro, apresentando-nos um elemento peculiar na valorização do ausente como delineador de identidade.

Na seção comunicação de pesquisas, Ariane Patricia Ewald; Michele Thieme de Carvalho Moura e Samira Meletti da Silva Goulart apresentam, sob o título “Psicoterapia e subjetividade: interfaces entre os modos contemporâneos de subjetivação e as demandas de um serviço de Psicologia”, um trabalho que deriva do projeto de pesquisa “Fazer uma psicoterapia: por quê? Para quê? Sentido e representações da demanda endereçada aos profissionais psi”, coordenado pela professora Ariane Ewald, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, UERJ. Esse trabalho é resultado de uma investigação realizada no Serviço de Psicologia Aplicada (SPA) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que teve como objetivo compreender como a conjuntura contemporânea vem contribuindo para os tipos de queixa e demanda das pessoas que procuram por esse serviço.

Fechando a edição da revista, apresentamos a resenha do livro “ A corporeidade do cego: novos olhares” de Eline Porto, publicado em parceria pela editora Memnom e pela UNIMEP, em 2005. A resenha, apresentada por Leonídia Borges, Marcia Moraes, Maria Rita Campello Rodrigues, Marlíria Cunha e Regina Maria Fernandes Chimenti, descreve a abordagem da autora ao valorizar o conhecimento advindo não só através do intelecto, mas também dos sentidos. Destacam como, para Eline Porto, pensar a percepção apenas em seus aspectos biologizantes se configura como uma perspectiva reducionista do entendimento desse fenômeno, já que o corpo é o centro do campo perceptivo que o circunda e, tanto para o vidente como para o cego, viver no mundo implica a “possibilidade de percebê-lo além do ver com os olhos e sentir com os sentidos” (p.36).

Esperamos poder, com esses trabalhos, contribuir um pouco mais para a ampliação dos fazeres e dizeres “psi”.

Desejamos a todos um ano de 2009 promissor...

Comissão Editorial
Adriana Benevides Soares
Ana Maria Feijoo
Anna Paula Uziel
Ariane Patrícia Ewald
Deise Mancebo
Eleonôra Torres Prestrelo

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