A Educação, na sociedade contemporânea, assumiu um papel privilegiado de distribuição das oportunidades sociais e se tornou uma das principais vias para a mobilidade e ascensão social. Contudo, em nosso país, o processo de institucionalização da universidade, no início do século XIX, reafirma, desde o início, um espaço de reprodução da lógica de privilégios dos ricos por meio de seus mecanismos de seletividade e de exclusão das camadas mais pobres. No contexto da lógica escravista, a universidade serve apenas a uma determinada parcela (os brancos), fazendo com que a maioria dos sujeitos seja mantida à margem de qualquer oportunidade educacional (Sena, 2011).
Fernandes (2001) afirma que, apesar dos avanços advindos do processo de industrialização e das transformações socioeconômicas, os efeitos produzidos não foram suficientes para equalizar as desigualdades presentes na sociedade brasileira e contribuíram para perpetuar a estratificação educacional, em que os ganhos simbólicos e materiais do grupo racial dominante, no caso, os brancos. Questionando o mito da democracia racial e os efeitos da falsa abolição, a autora destaca a ideologia presente nesses imaginários como elementos importantes de legitimação para camuflar e absorver as tensões, além de tentar controlar os conflitos sociais. Nesse sentido, ressalta a importância de políticas que promovam a igualdade racial e o acesso a melhores oportunidades no setor.
Na sociedade brasileira, a atuação dos movimentos sociais tem sido fundamental na luta pela consolidação e garantia do acesso à educação. Movimentos heterogêneos, formados por grupos como negros, mulheres, homossexuais, pessoas com deficiência, entre outros, sustentam as políticas de ações afirmativas com o intuito enfrentar as inúmeras desigualdades do nosso país (Salvador et al., 2017). No que se refere à população negra, algumas das vertentes do Movimento Negro iniciaram, na década de 1980, debates intensos para confrontar o mito democracia racial, conforme apontado acima (Pinto & Silva, 2019). As políticas de ações afirmativas são uma de suas conquistas, que de acordo com Gomes (2002) são políticas públicas para o combate à discriminação racial, de gênero e de origem nacional, com vistas a sanar as consequências atuais da discriminação praticada no passado, garantindo o acesso a bens fundamentais como educação e emprego. Dentre as políticas de ações afirmativas, destacamos o Programa Universidade para Todos - ProUni, que busca a democratização do acesso e de ações afirmativas nos estabelecimentos de ensino privados e públicos, como uma resposta aos elevados índices de desigualdades educacionais em nível superior.
O ProUni, foco deste estudo, se sustenta no grande número de estabelecimentos privados no país com vagas ociosas e que, ao aderirem ao programa, recebem a isenção de impostos e incorpora elementos das políticas de ação afirmativa ao reservar bolsas de estudo a pessoas com deficiência e aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas (Lei n. 11.096, 2005). Além dos estudantes da rede pública, o programa também concede bolsas a estudantes de escolas particulares que comprovem a isenção do pagamento da mensalidade e a professores do ensino básico que não possuem o diploma de licenciatura (Ribeiro & Guzzo, 2017).
Ao destacar o que nos diz Almeida (2018) a respeito da importância de se pensar em raça como um marcador determinante das desigualdades socioeconômicas, quaisquer políticas públicas de combate à pobreza e/ou de redistribuição de renda devem levar em conta o fator raça/cor para que se tornem mais efetivas. No caso do ProUni, sua efetividade também se faz ao considerar outras variáveis para além da renda, pois não se pode pensar na estrutura econômica desvinculando-a das questões raciais, que também são produtoras de desigualdades. Nos últimos anos, como mostram os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2018), houve um aumento no número de estudantes negros no ensino superior. Com isso, tem-se impactos econômicos e ideológicos, o que faz com que surjam tensionamentos entre diferentes percepções.
Certamente, a inserção dos bolsistas na universidade não se faz sem tensões. Ribeiro e Guzzo (2017) apontam para a ausência de uma política de assistência e de permanência dos estudantes, além de questões como a necessidade periódica de comprovação de renda, que causa nos estudantes um medo generalizado de perder a bolsa de estudos. Assim, muitos alunos têm de conciliar a rotina de trabalho aos estudos, além dos recursos financeiros que a universidade demanda, entre eles, transporte, alimentação, materiais, o que pode levar à queda no desempenho acadêmico e até mesmo à evasão. Mongim (2016) relata em seus estudos as discriminações evidenciadas pelas atitudes dos colegas economicamente privilegiados diante da chegada dos bolsistas na universidade, fato visto, inúmeras vezes, como uma ameaça à excelência acadêmica da instituição. Outro elemento de tensão refere-se às diferenças simbólicas dos mundos, pois a mudança do estudante para a posição de universitário pressupõe interações com mediadores diferenciados que ultrapassam os limites da rede de relações da família nuclear. A inserção em um novo universo pode trazer dilemas ao sujeito bolsista, com a sensação de que a vida transita entre mundos simbólicos diferentes. Embasados na teoria de Análise Institucional de René Lourau, pretendemos realizar um exame do campo de forças institucionais que fazem parte desse processo de inserção desses alunos negros na universidade, enfatizando o processo de institucionalização dessa política no cotidiano da universidade.
Conhecer e Transformar: Sobre o Processo de Institucionalização e as Apostas Metodológicas
De acordo com Lourau (1993), as instituições não se reduzem ao observável, e sim são detentoras de uma dinâmica contraditória que as fazem deslocar. Para defender o movimento das instituições, René Lourau utiliza o pensamento dialético de Hegel, para sustentar a gênese teórica e a gênese prática do conceito de instituição. Na gênese teórica, Lourau (2004) faz uma discussão filosófica desmembrando o conceito em três momentos que se contradizem e se associam: universalidade, particularidade e singularidade. O autor sustenta assim a processualidade da instituição, gerada pelas contradições entre cada um desses momentos.
No que se refere à gênese prática, o autor estudou os movimentos sociais em articulação com a gênese teórica, e fez a seguinte correlação: ao momento da universalidade corresponde a supremacia do instituído, enquanto forma abstrata instituída e verdadeira, força que visa à conservação do estabelecido; ao momento da particularidade, temos a emergência do instituinte, força que se dirige para a mutação, em que a base social do conceito, configurada em uma forma social concreta, produz condições para aflorar do novo; e, finalmente, ao momento da singularidade corresponde a institucionalização propriamente dita, cujo produto, localizado em um substrato físico, tem uma organização funcional concreta, com a presença da força instituída e da força instituinte em constante luta. Portanto, trata-se de um processo dialético, que comporta a presença de forças antagônicas: o instituinte e o instituído. De acordo com Lourau (2004), as forças instituintes são aquelas que fundam, que visam à produção, à transformação. Já as forças do instituído referem-se àquelas que defendem o que já está estabelecido, que buscam a estabilização na tentativa de continuar se reproduzindo.
Ao propormos uma análise do processo de institucionalização do ProUni, levamos em conta os atravessamentos presentes no fenômeno que estão para além da esfera individual e que estão presentes na estrutura macrossocial, destacando a dinâmica entre as forças do instituído e do instituinte. Nesse sentido, Lourau (2004) destaca que é a tensão entre as forças opostas, presentes no processo de institucionalização, que permite essas mudanças e deslocamentos institucionais. Em sua crítica à naturalização das instituições, Lourau (2004) sinaliza para essas tensões entre o instituído e as forças instituintes, que são evidenciadas pelos analisadores, episódios e práticas que desvelam o conflitivo, trazendo à tona as forças ocultas da dominação do instituído e apontando para as forças instituintes. Essa perspectiva busca desmontar dicotomias e considera a heterogeneidade e a multideterminação de fatores ao enfatizar, por exemplo, os atravessamentos políticos, históricos, sociais e econômicos.
Nesse contexto, abordamos a inserção e permanência de estudantes prounistas negras na universidade a partir da metodologia da pesquisa-intervenção. A pesquisa-intervenção associa teoria-prática, sujeito-objeto, agenciando pesquisador e campo de pesquisa em um estudo no qual o campo de investigação é também o espaço concreto de intervenção. Nesse sentido, corresponde a um processo de produção coletiva amparada na habitação do campo de pesquisa e na implicação do pesquisador. Sustentando as forças presentes no processo de institucionalização do ProUni, perseguimos “... a modificação processual do objeto de pesquisa por meio de intervenções no dia a dia dos estabelecimentos” (Romagnoli, 2014, p. 45). Essa metodologia leva em consideração “... a implicação do pesquisador, a complexidade e a indissociabilidade da produção de conhecimento da atuação/intervenção” (Romagnoli, 2014, p. 46).
Para colocar estas instituições em análise tendo como eixo a instituição educação e seus desdobramentos e imbricações em outras instituições tais como o trabalho, a raça, dentre outras, efetuamos uma análise de implicações, que, de acordo com Nascimento e Coimbra (2008), dedica-se às relações que são estabelecidas com o que nos constitui e atravessa, com as redes de poder nas quais estamos inseridos, processo que visa à desnaturalização permanente das instituições, expondo o seu caráter político. Analisar nossa implicação é também refletir sobre o lugar de fala, expressão trabalhada por Ribeiro (2017), ao fazer a diferenciação entre o conceito de representatividade e o de lugar de fala. Acerca da representatividade, compreendemos com a autora que deve haver uma responsabilização de cada sujeito visto que partimos de diferentes lugares no que diz respeito à fala e à escuta, por exemplo, “Uma travesti negra pode não se sentir representada por um homem branco cis, mas esse homem branco cis pode teorizar sobre a realidade das pessoas trans e travestis a partir do lugar que ele ocupa.” (Ribeiro, 2017, p. 47). Sobre o conceito de lugar de fala, Ribeiro (2017) afirma que todos têm lugar de fala e este está atravessado por hierarquias, dinâmicas de poder, o que exige reflexões e debates já que “o lugar que ocupamos socialmente nos faz ter experiências distintas e outras perspectivas" (p. 40). Dessa forma, buscamos desvelar as relações de poder produzidas a partir de nosso lugar social.
Assim, o marcador social raça aparece não como um recorte, mas como elemento que se apresenta em todas as instituições. Pensar o lugar de fala é fundamental para romper com os discursos e práticas hegemônicas de produção científica, que objetificam sujeitos, desvinculando os atravessamentos macroestruturais presentes nas relações. Cientes da impossibilidade de posicionamentos neutros por parte das pesquisadoras brancas e das sujeitas envolvidas na pesquisa, e dando ênfase às relações raciais como elementos que sempre atravessam o campo, compreendemos que somos falados também pelas instituições que nos atravessam. Assim, a questão racial se articula na relação com o campo e precisa ser problematizada de modo a romper com o pacto de silêncio a respeito do lugar das branquitudes que se capilarizam por todas as estruturas e espaços sociais.
A forma como a produção de conhecimento se institucionaliza não se separa das opressões naturalizadas na esfera social estratificada. Sendo assim, é possível pensar que a ciência moderna ainda se utiliza de instrumentos de imposição e legitimação da norma simbólica de um suposto padrão cultural e estético, e isso se reflete no ambiente acadêmico como indicam Nunes e Costa Júnior (2018). Tal padrão ainda é heteropatriarcal e branco. Conectadas à necessidade de uma prática antirracista também na construção de conhecimento, foi fundamental questionarmos o silenciamento da própria academia acerca das questões raciais em uma manutenção dos instituídos, das dificuldades de sustentar a existência do racismo em nossa sociedade e de se incluir nos debates por não reconhecer a branquitude na qual se assentam seus privilégios.
Nesse contexto, para esta pesquisa, realizamos uma pesquisa de campo com produção de dados por meio de entrevistas em grupo semiestruturadas com roteiro previamente estabelecido, com 4 estudantes prounistas negras em três encontros virtuais. Dadas as limitações e as necessidades de cuidados impostas devido à pandemia da COVID-19, o contato se deu por meio de chamadas de vídeo no aplicativo WhatsApp, com duração média de uma hora cada. A plataforma foi escolhida por ser a de menor oscilação na rede de dados. As datas e os horários foram estabelecidos de acordo com a disponibilidade das participantes, em um movimento de autogestão do próprio grupo. O registro dos encontros foi feito com o programa Audacity, gravador de voz, por meio de um computador.
A chegada às estudantes se deu por meio da técnica Bola de Neve. Esse procedimento utiliza a ligação entre membros de uma mesma população para, por meio de algum(s) desse(s) membro(s), obter uma amostra dela. Por intermédio da indicação por parte de um indivíduo da população de outro(s) que também a constitui, e assim sucessivamente, a amostra é construída em um formato que se assemelha a uma bola de neve que cresce a partir da integração de novos membros (Dewes & Nunes, 2013). Embora tenhamos usado esse procedimento, em nossa pesquisa, mais que amostra, as entrevistadas foram agentes das práticas na problematização aqui apresentada. Nesse sentido, produzem enunciações de quem vive a prática institucional do ProUni, materializada na universidade estudada e nas vidas dessas estudantes bolsistas.
As entrevistas em grupo permitiram uma produção coletiva e elaborações conjuntas na sustentação das tensões presentes na relação entre as estudantes e a universidade. Do trajeto entre o primeiro e o segundo encontro do grupo, com base nas colocações trazidas e na análise das implicações, nos deparamos com tensões internas a respeito do processo investigativo com as alunas prounistas. Essas tensões foram partilhadas através da restituição, procedimento metodológico que possibilita que a população pesquisada expresse suas percepções e que estas sejam usadas como um suporte para reflexões coletivas. A pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética sob número CAAE 33604520.2.0000.5137. A análise dos dados e as reflexões efetuadas nesse estudo são apresentadas a seguir.
Sobre Contradições
Como apontado acima, o processo de pesquisa também teve tensões. Ao dividir com o grupo as contradições e as relações de poder presentes nas trajetórias das universitárias e discutidas abaixo, o conhecimento produzido se deslocou cada vez mais para as questões das relações raciais e da branquitude acrítica, indispensáveis para analisar a dimensão institucional das implicações e do cotidiano das prounistas negras na universidade. Desse modo, buscamos desnaturalizar a inserção das bolsistas negras através dos analisadores que emergiram nesse percurso: a inserção e permanência material e simbólica no ensino, atravessamentos raciais, efeitos da pandemia da COVID-19 e, por fim, as âncoras e caminhos possíveis.
Ao examinar a inserção e permanência material e simbólica no ensino notamos que a entrada na universidade constitui uma sequência na vida estudantil, um marco no ciclo de vida dos estudantes, vivido de forma singular por cada um de nós. Para Zago (2010), o ingresso no ensino superior, considerando que até pouco tempo era alcançado por pessoas dos setores de alto poder aquisitivo, para o aluno prounista, já é uma conquista e manter-se na universidade é mais um desafio. É comum entre esses estudantes que sejam os primeiros a ingressarem em um curso superior em sua família. Ao estudar a inserção das prounistas negras, observamos uma ruptura em suas vidas com a chegada em um novo ambiente, por muitos bastante almejado. Um dos pontos dessa ruptura são as documentações exigidas pelo programa para a obtenção da bolsa como colocado por uma das entrevistadas: “A burocracia parece que é uma burocracia feita pra poder minar o corpo do pobre”. As documentações necessárias podem variar de instituição para instituição e o prazo para obtenção dos documentos é curto, o que se torna um dificultador para muitos estudantes.
A transição do ensino médio para o ensino superior não se dá da mesma maneira para todos os estudantes. Diferentemente da maioria dos alunos da universidade estudada, esses alunos têm que adiar a entrada na universidade tendo em vista a luta pela sobrevivência. Zago (2010, p. 25) conclui, após analisar diversas histórias escolares, que a “escolaridade não obedece ao tempo normal de entrada e permanência até a finalização de um ciclo escolar, mas se define no tempo do possível”.
Observamos algumas tensões que também se relacionam a questões estruturais relativas não só à diferença de classe social, mas também à qualidade da educação brasileira, considerando que as bolsistas, em sua maioria, são ex-alunas de escolas da rede pública de ensino. Uma das entrevistadas afirma que “Foi um choque muito grande porque muita coisa era tratada como um ‘todo mundo já sabe’”. Nesse sentido, podemos pensar que a inserção das bolsistas no espaço acadêmico não é lida pela universidade como um fenômeno heterogêneo, cujas trajetórias desses estudantes distinguem-se, em sua maioria, dos outros pagantes.
No que se refere à permanência no ensino, Zago (2010) afirma que as jornadas duplas (trabalho e estudos) vêm como uma “solução” devido à necessidade de subsistência e muitos se distanciam de atividades complementares para a formação porque há necessidades básicas que precisam ser atendidas. Ao apontarem a diferença de cotidianos como elemento de tensão, observamos que, devido a diferença de classe e a necessidade de trabalhar, os estudantes não conseguem participar de eventos comuns dentro do mundo universitário, o que também gera uma sensação de exclusão dos rituais institucionais. Uma das entrevistadas relata que: “não conseguia compartilhar das vivências das pessoas, primeiro porque eu era pobre (sou, inclusive, né... não aconteceu a mobilidade social por aqui ainda!) e porque eu trabalhava”.
Mongim (2016), em seus estudos, constatou que os prounistas buscam construir estratégias para conciliar trabalho e estudo. Entre os que não têm vínculo empregatício direto, suas buscas consistem em construir estratégias que lhes tragam algum ganho financeiro para arcar com as despesas referentes à graduação tais como, passagens de ônibus, materiais, alimentação, entre outros. Em se tratando de alunos de baixa renda, apenas a bolsa é insuficiente para que o aluno permaneça na graduação, pois ainda há gastos, com moradia, alimentação, gastos pessoais, materiais, livros, taxas institucionais, o que cria mais um entrave para a permanência no ensino (Ariño & Delvan, 2018). Nesse sentido, uma entrevistada assinala:
Porque tipo assim... não é só entrar na faculdade... e aí? ... Eu tenho dinheiro para ir pra faculdade? Eu sei que matéria é essa? Eu me sinto bem nesse lugar, sabe? As pessoas... sabe? Tipo assim... tanta coisa que pode ser pensada.
Entretanto, a inserção por meio do Programa também possibilitou encontros potentes com a universidade. Na mesma esteira, uma das prounistas afirma já ter pensado em desistir de muitas coisas na vida, e: “A única coisa que tenho certeza absoluta é do curso e da profissão. Então... foi um encontro muito feliz que tive com a universidade, com o curso, com a matéria... essa jornada toda aí”. Sua fala evidencia também o comprometimento presente no aluno prounista, como bem pontuam Felicetti (2014), que afirma que o termo se refere à qualidade de esforço e envolvimento nas atividades produtivas de aprendizagem. Assim, “o comprometimento é constituído do que se faz e como se faz” (Felicetti, 2014, p. 2). A universidade também foi considerada um espaço novo, instituinte, uma conquista, como bem aponta Zago (2010), como uma vitória para vidas muitas vezes marcadas pela exclusão social. “Eu nunca me senti mal naquele espaço, porque foi um espaço que eu conquistei, entendeu?” é afirmado pela prounista em um dos encontros.
Também a respeito da oportunidade que o programa proporciona, pode-se pensar que o ProUni, apesar dos inúmeros desafios enfrentados ao longo da trajetória universitária, é visto como uma porta de entrada para o ensino superior privado para aqueles que não teriam outra forma possível de acessá-lo. Assim, em seu processo de institucionalização, o programa também traz situações inéditas e funciona como força instituinte na própria universidade e na vida de cada um dos bolsistas. Nesse sentido, como aponta outra entrevistada:
O ProUni, para mim, é uma experiência de: “a gente vai viver!”; e aí depois: “a gente vai morrer!”; e, depois: “a gente vai viver de novo”. É assim: muda. Porque... quando eu entrei, eu falei: “C******. Não tinha outro jeito pra minha vida”.
Além disso, apesar das dificuldades enfrentadas, a crença nas possibilidades, nas mudanças e na ascensão social por meio da oportunidade proporcionada pela bolsa do ProUni estão presentes, como vemos nessa fala, que aposta que a inserção dos estudantes negros no ensino se trata de um ponto de partida e acredita que “são pequenas mudanças que podem, no futuro, gerar grandes mudanças!”.
No que se refere aos atravessamentos raciais, a reprodução do instituído que tem como foco o privilégio branco e o mito da democracia racial dificultam a sustentação da diferença que advém da entrada desses estudantes negros em um espaço majoritariamente embranquecido historicamente.
A branquitude produz efeitos nas diferentes trajetórias universitárias das estudantes bolsistas, e é entendida como uma posição de poder não nomeada, em que o branco ocupa um lugar estrutural de privilégios. Segundo Carone e Bento (2012, p. 77), “o lugar de raça seria a excessiva visibilidade grupal do outro e a intensa individualização do branco”. Enquanto instituição, ou seja, uma norma, é necessário debater acerca dos “não ditos” a respeito das questões raciais presentes no ambiente universitário majoritariamente embranquecido, como nos afirma uma das entrevistadas:
o quanto que eles padronizaram na cabeça deles lá, né, na “lógica”, digamos assim, faz com que ainda que não tenha uma regra, um escrito, né, uma lei que diz: “Todo mundo que estuda na universidade é branco”, mas é uma lei não oficial! Cê sabe que ela tá correndo por trás das questões mais oficiais.
Contudo, é necessário destacar que há diferentes maneiras de se sustentar esse instituído. Cardoso (2010, p. 612) afirma que “a branquitude são muitas” e diferencia a branquitude crítica da branquitude acrítica. Na primeira, o sujeito se reconhece racializado e desaprova publicamente o racismo, se propondo à tarefa individual e também coletiva de insistir cotidianamente na autocrítica e na crítica em relação aos seus privilégios e os de seu grupo. Já a branquitude acrítica “sustenta que ser branco é uma condição especial, uma hierarquia obviamente superior a todos os não-brancos” (Cardoso, 2010, p. 611), e Carone e Bento (2012) acrescenta que o branco é considerado uma unidade representativa apenas de si mesmo, um “modelo paradigmático de aparência e de condição humana” (p. 77).
Ao descrever a branquitude crítica, Cardoso (2010) assinala a importância da vivência do conflito, por parte do branco, de sua vantagem e privilégio racial, da necessidade de enfrentar o desconforto da luta antirracista sem planos de fuga, sem meios para amenizá-la. E, em se tratando de instituições e sua materialização nos estabelecimentos, detectar os tentáculos do racismo presentes em suas práticas e construir fissuras e brechas na estrutura rígida da branquitude acrítica pode ser um primeiro passo para desmantelar o racismo presente nas identidades raciais brancas e nos espaços sociais majoritariamente embranquecidos.
Como afirmam Nunes e Costa Júnior (2018), o modo de produção científica reflete a estrutura social, ele legitima aqueles que estão no topo das hierarquias e reproduz, a partir desses discursos, a lógica do universal. Esse traço da igualdade que pretende abolir as diferenças e as relações de poder presentes no tecido social, que é também perpetuado pelos silenciamentos das branquitudes, é tão estabelecido em nossa sociedade e tão difundido por meio das instituições que muitas vezes não pode nem ser simbolizado e faz parte do “não dito”, do que está implícito e que acontece cotidianamente nesse espaço (Lourau, 2004).
Esse “não dito” refere-se ao racismo estrutural com raízes cravadas em nossa sociedade e também à lógica de silenciamento das questões raciais imposta pela branquitude acrítica, que também atravessam as trajetórias dessas universitárias. A esse respeito, Almeida (2018) ressalta que o racismo é sempre estrutural e precisa ser visto como uma manifestação normal da sociedade, um elemento que integra a organização econômica e política e que fornece as tecnologias que sustentam as desigualdades e violências da vida social. Esses elementos aparecem na fala de uma das entrevistas que discute o racismo cotidiano presente nas práticas em vários espaços, inclusive dentro da universidade:
em algum momento da nossa vida a gente foi racista, ... foi assim que a sociedade foi fundada. E essa questão da universidade, porque ela foi construída para ser um espaço de elite e a elite é branca. Então, as pequenas práticas do dia a dia deles são racistas!
De acordo com Almeida (2018, p. 49), o racismo “é um processo de constituição de subjetividades, de indivíduos cuja consciência e cujos afetos estão de algum modo conectados com as práticas sociais” e suas particularidades se ligam às diferentes dinâmicas presentes em cada formação social. O autor acrescenta que, por ser sempre estrutural, o racismo captura em sua teia social as instituições, que atuam na formulação de regras e na imposição de padrões sociais que vão atribuir privilégios a grupos raciais específicos, no caso, os brancos. Desse modo, é imprescindível destacar que “as instituições são apenas a materialização de uma estrutura social ou de um modo de socialização que tem o racismo como um de seus componentes orgânicos” (Almeida, 2018, p. 36).
Considerando que o espaço universitário foi o ambiente que maior propagou a ideologia do mito da democracia racial e das políticas de embranquecimento, é importante destacar como aponta Nunes (2020), que a educação institucionalizada está dentro de uma cultura e em seu meio estão presentes as tensões sociais. Além disso, no âmbito das políticas educacionais, o racismo pode ser produzido em engrenagens institucionais e não questioná-lo é impedir deslocamentos, intervenções nessa realidade. Assim, é urgente pensar a universidade como um reflexo da sociedade e que relações esta estabelece com a diferença pois busca tamponar as desigualdades, naturalizando-as. Debater as questões raciais em um campo em que ser branco é a norma apresenta-se como uma via para que assim seja possível desnaturalizar as desigualdades raciais, desvelando seus mecanismos e efeitos.
Nesse sentido, essas diferenças constatadas pelas entrevistadas não se referem apenas à esfera individual, como propagado pela forma dominante de fazer Psicologia, mas se abre para outros vetores que atravessam essas pessoas e também as subjetivam. Articulando as trajetórias dos alunos bolsistas a seus contextos sociais, econômicos, culturais e políticos, podemos ver como a desigualdade se materializa cotidianamente em suas rotinas e escancara a exclusão à qual esses sujeitos são submetidos. Na mesma esteira, ao pontuar sobre os padrões instituídos pela branquitude acrítica presentes também nas práticas pedagógicas da instituição universitária com seus ideais de universalização, a fala seguinte ilustra que:
A gente vive num mundo em que o ser branco é o padrão, e qualquer coisa que foge ao padrão... ops! Qualquer coisa que foge ao “ser branco” já é exótico... E a universidade ela se assenta sobre esse lugar da branquitude, do privilégio branco, e se a gente não conseguir minimamente perceber essa questão do privilégio branco, pra minimamente dizer que ele existe, que ele está lá e que ele tece as nossas relações e que a gente é atravessado por ele o tempo todo, a discussão sobre o racismo é uma discussão... enfraquecida!!!
A ideia de universalidade presente em um primeiro momento nas instituições, já destacada por Lourau (2004), ao usar o raciocínio hegeliano para desenvolver o conceito de instituição, é uma força que se dirige para a estabilização e a manutenção, que visa à supremacia do instituído. Com isso, busca a reprodução enquanto forma abstrata instituída e verdadeira. Enquanto força instituinte, a inserção do prounista negro inicia um segundo momento, a particularidade, em que as forças se direcionam para a mutação e produzem condições para que o instituinte aflore, negando o universal em condições particulares e concretas. Em seu processo de institucionalização, em um terceiro momento, o programa abarca forças instituídas e instituintes em uma dialética constante, que não cessa as tensões.
Sendo assim, é possível estabelecermos uma relação entre as branquitudes (crítica e acrítica) como normas, “não ditos”, que permeiam as práticas acadêmicas. Branquitudes naturalizadas pela dominação do instituído que se fundamenta no esquecimento das origens dos privilégios e da exclusão social. “Este esquecimento, este não dito que fundamenta os discursos sobre o silêncio em lugar de fazê-lo sobre o que os institui, eis o que a análise institucional faz aparecer, interrogando o ato de instituir que definiu a instituição” (Lourau, 2004, pp. 73-74).
A força presente nos “não ditos” que regem as práticas institucionais dos estabelecimentos de ensino se materializa na suposta ideia de universalização dos estudantes que frequentam o ambiente acadêmico e se desconsideram os efeitos silenciosos que o poder normativo da branquitude exerce sobre os corpos das estudantes bolsistas negras. Carone e Bento (2012) consideram, ainda, que as dimensões subjetivas das relações raciais se articulam a outras mais concretas e objetivas e que se reforçam mutuamente, potencializando a reprodução do racismo. Em uma tentativa de estabelecer rupturas com as normas vigentes impostas pelos ideais da branquitude, a fala de uma das prounistas nos mostra que: “se a gente não discutir a branquitude, a gente não consegue discutir como é que isso continua se perpetuando e continua se mantendo e como que o branco tem um papel nisso. E as coisas ficam muito distantes, sabe?!”
Considerando os efeitos da pandemia da COVID-19 e suas implicações na vida universitária, o regime remoto adotado pela Universidade aparece como um outro elemento que evidencia os contrastes sociais e se relaciona à dificuldade da instituição em compreender as singularidades dos estudantes bolsistas negros de baixa renda, principalmente nas diferenças no acesso à plataforma virtual e à rotina. Ao estudar a educação remota e seus efeitos, Guizzo et al. (2020) encontraram uma série de obstáculos nessa modalidade de ensino, pois, dada a grande desigualdade social em nosso país, nem todos os estudantes têm o mesmo acesso aos equipamentos adequados, à internet e a um ambiente reservado para o aprendizado. A esse respeito, uma das entrevistadas afirma que:
Acho que na prática, no dia a dia, o que bate na gente é esse ideal da branquitude, é essa branquitude lá, batendo o tempo todo, sem palavras específicas, sem ninguém chegar com o dedo na sua cara e falou: “Quem estuda na [universidade] tem internet!”. Mas, aí vem o ensino remoto e fala pra gente: "Então... Quem estuda na [universidade] tem internet! Tem um lugar reservado!”.
É importante ressaltar que a conjuntura referente à pandemia de COVID-19 afetou a rotina de todos nós, nos impondo outras maneiras de relacionar, produzir e educar. Maia e Dias (2020) destacam que as pandemias são geradoras de fortes impactos econômicos, sociais e políticos, como estamos vivendo agora. No que se refere à rotina universitária, Maia e Dias (2020, p. 3) afirmam que a alteração rápida à qual foram submetidos esses sujeitos, com a suspensão das aulas e com o decreto do estado de emergência, pode desencadear “dificuldades de adaptação e estados emocionais menos positivos” e chamam a atenção para a necessidade de se investigar a fundo os efeitos à saúde mental dos estudantes para que, assim, seja possível traçar estratégias de prevenção ou de remediação.
Por fim, um outro elemento analisador que destacamos são as âncoras e caminhos possíveis, que também se articulam aos elementos anteriores. Este analisador refere-se à importância do coletivo na invenção das forças de resistência, na sustentação de processos instituintes nas universidades. As bolsistas relatam que, ao se aproximarem de outros estudantes também bolsistas, a formação de redes de apoio amenizou, em certa medida, alguns estressores advindos dos instituídos acadêmicos. Uma das entrevistadas afirma: “O que me salvou em diversos momentos na faculdade foram espaços em que as coisas eram menos desagradáveis, em que eu tava mais cercada de gente igual a mim ou com vivências parecidas”.
A importância da rede de afetos é discutida por Collins (2019) ao dissertar que a identidade seria um ponto de partida no processo de autodefinição em que os sujeitos são moldados pelas múltiplas marcações sociais. Em se tratando de estudantes negras em um espaço embranquecido, nomear as experiências e falar sobre emoções e afetos se faz necessário para que assim construam um “espaço seguro”. Esse território de partilha perpassa as identidades raciais e se expande para a afirmação de uma luta política e coletiva. Assim, Lima (2020), em sua tese, pontua que os grupos, os espaços onde se é seguro dizer das experiências e dos afetos, são vistos como espaços também de sobrevivência, de acolhimento cotidiano e não de oposição a grupos dominantes. Na fala de uma das entrevistadas, ela acrescenta que sua permanência na universidade foi fortalecida com sua participação em um coletivo, o Grupo de Estudos Pretos e relata que: “o grupo me fortaleceu muito em relação a isso, sabe? A perceber que tipo ‘ter uma rede de afetos’ e assim me... me... como que falo? Me prender nisso da universidade, sabe?”.
Sobre o papel exercido pelo grupo de estudos, Jesus et al. (2020, p. 81) afirmam que:
o Grupo de Estudos Pretos percebeu que suas práticas realizavam um importante papel acadêmico, mas iam além dos estudos coletivizados sobre as relações étnico-raciais. Tinham dimensões pedagógicas, terapêuticas e sócio-políticas estando compromissadas com as mudanças e transformações sociais.
Dessa forma, a trajetória das estudantes, apesar das tensões presentes na vida universitária encontra respiros entre os sujeitos com quem sentem que podem compartilhar experiências. Isso também se reverbera na trajetória de outra entrevistada, que relata:
e eu caminhei durante muito tempo até eu encontrar alguém que minimamente compartilhasse esse mesmo tipo de experiência e isso me deu... força pra continuar REAL assim, sabe?! Se tornou menos violenta minha permanência na universidade depois que encontrei pessoas em que eu pude, com quem eu pude dividir as minhas experiências e em que eu podia me apoiar e ser apoio também.
Além disso, a importância de se abrirem caminhos para os outros que também virão é destacada por uma das entrevistadas, ao afirmar que: “vai deixar um espaço aberto para as próximas pessoas e que eu não acredito que... vão ter, que vão ter outras dificuldades, mas que será possível, entendeu?! As possibilidades estão sendo maiores!”.
A construção desses espaços coletivos dentro das universidades pode ser vista como forma de se institucionalizar o tema das questões raciais, como indica Lima (2020) ao introduzir debates urgentes e necessários na academia, convocando-a a repensar a respeito de seus posicionamentos e responsabilidades dentro da temática racial. Aqui apontadas como elementos analisadores, a exemplo da questão da permanência, do racismo estrutural, das desigualdades sociais e da branquitude, esses elementos articulados podem ser compreendidos como um resultado do campo de forças incoerente e contraditório:
porta-vozes dos conflitos em assídua oposição ao harmônico e ao estático acalentados pela instituição. Os analisadores irrompem nas organizações de forma a mostrar que elas não apenas reproduzem o que já estava previsto, mas também produzem o impensado, o conflitivo, revelando a ação do instituinte, possibilitada pelo aflorar do negativo não integrado no equilíbrio institucional (Romagnoli, 2014, p. 47).
Ao discutirmos acerca dos atravessamentos presentes na inserção e na permanência de bolsistas negros por meio do Programa Universidade Para Todos, entendemos a relevância de destacar essa política como importante via de acesso à educação superior e, como tal, torna-se fundamental a realização de estudos que contribuam para seu desenvolvimento e manutenção.
Considerações Finais
A iniciativa de tentar compreender as trajetórias acadêmicas das estudantes prounistas negras levanta inúmeras problematizações que precisam ser refletidas para se repensar as práticas educacionais, a própria política e o papel das instituições de ensino no processo de inserção e de permanência desses estudantes. Para conhecer essas trajetórias, buscamos reconhecer que o embate entre as forças presentes nas experiências desses sujeitos são elementos que desvelam as instituições invisíveis e que precisam emergir para que novos caminhos sejam possíveis.
Vale destacar que todas as entrevistadas eram mulheres autodeclaradas negras, cujos relatos e experiências indicam para interseção de vulnerabilidades - raça, gênero e classe social - associando discriminações com consequências no cotidiano. Sem dúvida, tais vulnerabilidades vão impregnar toda vida social e, em consonância com o pensamento de Collins (2015, p. 18) que propõe a natureza imbricada das opressões, acreditamos que “Raça, classe ou gênero podem estruturar uma situação, mas podem não ser igualmente visíveis e/ou importantes nas auto definições das pessoas”. Assim, as dimensões simbólica e institucional formam um pano de fundo que nos subjetivam e acerca das quais precisamos nos posicionar.
Desse modo, este estudo nos mostrou a necessidade de colocar em análise essa inserção e as instituições que falam através de nós no cotidiano da universidade, sendo que uma das maneiras de se fazer isso é através da análise de implicação, dos gestores, dos professores, dos alunos em suas relações entre eles e consigo mesmo. Isso porque o que a implicação nos mostra é que aquilo pelo qual somos afetados é sempre produção coletiva, de valores, interesses, crenças e hierarquias que estão imbricados nessa relação, e que muitas vezes estão ocultas. E não podemos nos esquecer que a crítica é a primeira condição para a sustentação de forças instituintes. Certamente, o processo de institucionalização do Prouni é sinuoso, com várias bifurcações e tensões, algumas delas expostas nesse texto. A dinâmica entre as forças de reprodução e de invenção não cessam, conjugando conquistas e conservação do que já existe. Diante da urgência de se debater a respeito da branquitude acrítica na qual ainda se assenta a universidade, faz-se necessário enfrentar os desconfortos que tal questão apresenta ao escancarar a reprodução e produção de opressões que se perpetuam pelos diversos espaços sociais e se institucionalizam no ambiente acadêmico. Entendemos que o desvelamento dessas relações de poder é essencial para a construção de uma sociedade mais justa e menos desigual, na qual a educação possa ser uma via potente de ascensão social e de produção de rachaduras e brechas nas estruturas de manutenção do colonialismo, do racismo e da branquitude acrítica.