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Revista Brasileira de Terapias Cognitivas

versão impressa ISSN 1808-5687versão On-line ISSN 1982-3746

Rev. bras.ter. cogn. vol.18 no.1 Rio de Janeiro jan./jun. 2022

https://doi.org/10.5935/1808-5687.20220009 

10.5935/1808-5687.20220009 REVISÃO TEÓRICA

 

Terapia cognitivo-comportamental e regulação emocional para tratamento da dor crônica em ensaios clínicos randomizados: revisão de escopo

 

Cognitive-behavioral therapy and emotional regulation to chronic pain management in randomized clinical trials: a scoping review

 

 

Lucas Geremia La PortaI; Prisla Ücker CalvettiII

IUniversidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre/UFCSPA, Departamento de Psicologia - Porto Alegre - RS - Brasil
IIUniversidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre/UFCSPA, Programa de Pós- graduação em Ciências da Saúde - Porto Alegre - RS - Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO

A dor crônica afeta 20% das pessoas mundialmente e acarreta impacto biopsicossocial e econômico. As terapias cognitivas comportamentais têm apresentado evidências para tratamento da dor crônica.
OBJETIVO: investigar produção científica de ensaios clínicos randomizados sobre intervenções cognitivo-comportamentais baseadas na internet e presencial e processo da regulação emocional no tratamento de pacientes com dor crônica.
MÉTODO: revisão de escopo realizada nas bases de dados PubMed, Scopus, Web of Science, PsycInfo e Cochrane Central, seguindo diretrizes PRISMA.
RESULTADOS: 24 registros encontrados, sendo 6 incluídos nesta revisão. Os desfechos mais frequentes foram catastrofização, controle da dor, sintomas depressivos, afeto e coping. A maioria das intervenções cognitivo-comportamentais combinaram abordagens integrativas, especialmente mindfulness na modalidade baseada na internet e presencial, incluindo follow-up. Foram verificadas melhorias nos desfechos relacionados à dor e no componente afetivo-emocional.
CONCLUSÃO: As terapias cognitivo-comportamentais baseadas na internet, bem como as tradicionais presenciais evidenciaram resultados clinicamente significativos no componente afetivo-emocional do tratamento da dor crônica.

Palavras-chave: Terapia Cognitivo-Comportamental. Regulação Emocional. Dor Crônica. Ensaio Clínico.


ABSTRACT

Chronic pain affects 20% of the world population, causing significant economic and biopsychosocial impact. Cognitive behavioral therapies have presented evidence for treating chronic pain.
OBJECTIVE: to investigate the scientific production of randomized clinical trials involving cognitive-behavioral intervention and emotional regulation in the treatment of patients with chronic pain in digital and face-to-face mode.
METHOD: scoping review of the PubMed, Scopus, Web of Science, PsycInfo, and Cochrane Central databases, conducted between May 2019 and February 2020, following PRISMA guidelines.
RESULTS: 24 studies were found, 6 of which are included in this review. The most frequent outcomes were catastrophizing, pain management, depressive symptoms, affection, and coping. Most cognitive-behavioral interventions combined integrative approaches, especially mindfulness, in internet-based and face-to-face modes and included follow-up. The outcomes related to pain and affective- emotional aspects showed improvement.
CONCLUSION: Internet-based and face-to-face Cognitive and behavior therapies showed evidence of clinically significant contributions to affective and emotional aspects of the treatment of chronic pain.

Keywords: cognitive behavioral therapy. emotional regulation. chronic pain. randomized controlled trial.


 

 

INTRODUÇÃO

A dor crônica é definida como dor que dura ou se repete por mais de três meses e afeta 20% das pessoas em todo o mundo, tornando-se uma relevante fonte de sofrimento e carga econômica. Geralmente, é acompanhada por desmoralização, angústia e comprometimento funcional. A classificação da dor crônica elaborada pela Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) é fundamentada em evidências científicas atuais e no modelo biopsicossocial (Barke, 2019).

Conforme a duração, a dor é classificada em três categorias: aguda, recorrente e crônica. A dor aguda é identificada como uma queimadura, fratura ou fadiga muscular. De maneira alternada com períodos de ausência da dor, ocorre a dor recorrente, como a enxaqueca. Em intensidade, a dor pode ser contínua ou intermitente, moderada ou grave (Calvetti & Segabinazzi, 2019).

Considerada multissistêmica, a dor pode ser experimentada na totalidade de quase todos tecidos do corpo. É descrita pela Agência Americana de Pesquisa e Qualidade em Saúde Pública e pela Sociedade Americana de Dor como o quinto sinal vital tão relevante quanto temperatura, pulso, pressão arterial e respiração (Souza, 2002). É caracterizada como uma experiência subjetiva passível de estar ligada a dano real ou potencial nos tecidos.

A dor diminui a qualidade de vida, aumenta a vulnerabilidade da pessoa a outras doenças, particularmente, no domínio da saúde mental, provoca dificuldades funcionais assim como ansiedade, depressão e prejuízos de trabalho (afastamento, absenteísmo e aposentadoria) ou na vida escolar. Mesmo que a dor demonstre uma função adaptativa para o organismo, ela é conceituada crônica quando sua duração excede três meses, modificando a fisiologia, a cognição, a emoção e o comportamento (Calvetti & Segabinazzi, 2019).

O componente afetivo-emocional da dor refere-se à relação entre dor e humor, entre as reações emocionais e comportamentais provocadas pelo processo doloroso (Alves Neto et al., 2009). O psicólogo pesquisador Ronald Melzack propôs a Teoria Neuromatrix da Dor, uma perspectiva de modelo biopsicossocial, a qual ressalta que a experiência de dor é definida por estímulos neurais, oriunda de influências genéticas e sensoriais, bem como por processos cognitivos, estresse físico e psicológico, afetando a musculatura, o que, consequentemente, desencadeia a dor aguda e crônica, havendo uma complexa relação entre estresse psicológico e sintomas de dor crônica (Santos et al., 2018).

As categorias de dor são definidas de maneira variável, baseadas na localização percebida, etiologia ou no principal sistema anatômico afetado. A nova categoria do International Classification of Diseases - CID-11 (WHO, 2022) para "dor crônica" contempla os distúrbios clinicamente relevantes mais usuais, sendo divididos em sete grupos: (a) dor primária crônica; (b) dor crônica do câncer; (c) dor crônica pós-traumática e pós-cirúrgica; (d) dor neuropática crônica; (e) dor de cabeça e orofacial crônica; (f) dor visceral crônica; (g) dor musculoesquelética crônica (Treede et al., 2015).

O tratamento da dor crônica abrange intervenções prescritas em longo prazo, necessitando estas evidenciarem boa relação custo-benefício, serem objetivas e de efetivação acessível para que o paciente seja capaz de aderir ao tratamento. A avaliação da dor deve ser sistemática e abordar os aspectos sensoriais e emocionais que a transpassam. Assim, o paciente deve ser continuadamente reavaliado, uma vez que os reajustes das doses, as modificações no tratamento e a decorrente atenuação e interrupção da analgesia dependerá do seu resultado (Thorn, 2017).

A terapia cognitivo comportamental (TCC) revelou-se como o tratamento psicossocial de escolha para dor crônica entre os programas interdisciplinares de manejo desta dor. Identificar e substituir cognições, emoções e comportamentos mal adaptativos por outros mais adaptativos estão entre seus objetivos principais (Gatchel, McGeary, McGeary & Lippe, 2014). A TCC não apresenta os riscos relacionados a medicamentos para dor crônica, cirurgias e procedimentos intervencionistas, ainda que as dimensões médias de efeito sejam pequenas a moderadas nos desfechos da dor. A incorporação da TCC em ambientes médicos, especialmente nos cuidados primários, apresenta muitas perspectivas de evolução dos resultados (Ehde, Dillworth & Turner, 2014).

Em distintas áreas aplicadas da Psicologia, a regulação emocional tem sido um conceito que ganhou relevância, sobretudo por perspectivas terapêuticas, principalmente no campo das Terapias Cognitivas e Comportamentais (Gutiérrez & Munoz-Martínez, 2013). Portanto, como um termostato homeostático, a regulação emocional é capaz de regular as emoções e mantê-las em um "nível administrável" para que possam ser tratadas (Leahy, 2013).

Todas as emoções dispõem de determinado papel regulador a executar e são conjuntos complexos de reações químicas e neurais, constituindo um padrão. A maneira como as emoções são reguladas é um processo que requer variadas estratégias para viabilizar a manutenção da homeostase do organismo. Destaca-se que as emoções são reguladas por meio da interação com outros indivíduos (Crispim, 2015).

Este estudo mostra a relevância de realizar uma revisão de escopo no campo da prática baseada em evidências das intervenções cognitivo-comportamentais (Dobson & Dobson, 2018) em ensaios clínicos randomizados e em especial em TCC baseada na internet (Anderson, 2020) e presencial antes do período da pandemia. Para tanto, o presente estudo tem por objetivo analisar a produção científica sobre contribuições da terapia cognitivo-comportamental e da regulação emocional via internet e presencial no tratamento da dor crônica em ensaios clínicos randomizados.

 

MÉTODO

Trata-se de estudo de revisão de escopo. Foi realizada busca de maio de 2019 a fevereiro de 2020 nas seguintes bases de dados: PubMed, PsycInfo, Web of Science, Scopus e Cochrane Central, no mês de setembro de 2019, com os seguintes descritores: "cognitive behavioral therapy" AND ("emotional regulation" OR "emotional self regulation") AND ("clinical trial" OR randomized) AND "chronic pain", conforme a tabela1. Foram utilizadas para realização deste estudo as diretrizes do PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses), conforme relatório dos itens preferidos para revisões sistemáticas e protocolos de metanálise (PRISMA-P) da declaração de 2015 (Moher et al., 2015).

Para a definição dos itens de análise, determinaram-se os seguintes critérios de inclusão: (a) estudos publicados de maio de 2019 até o mês de fevereiro de 2020; (b) estudos publicados nas línguas inglesa, espanhola ou portuguesa; (c) estudos publicados com resultados finais. Os critérios de exclusão foram os seguintes: (a) publicações duplicadas; (b) estudos publicados em outros idiomas que não português, inglês ou espanhol; (c) artigos teóricos, monografias, dissertações, teses, livros, capítulos de livros e anais de congressos; (d) estudos com análise dos resultados em andamento; (e) estudos que não abrangem os descritores definidos.

A análise dos estudos recuperados foi realizada por dois juízes independentes, isto é, os autores deste trabalho, um deles graduando em Psicologia, outro, psicólogo e docente pesquisador. Inicialmente, a análise foi executada por meio da leitura do título, resumo e das palavras-chave de todos os artigos encontrados, objetivando examinar o enquadre em consonância com os critérios de inclusão referidos anteriormente.

Os juízes deste estudo examinaram a qualidade e fidedignidade das evidências dos artigos incluídos nesta revisão sistemática por meio do método Grades of Recommendation, Assesstment, Development and Evaluation (GRADE) (Ministério da Saúde, 2014). Tal método objetiva estabelecer a qualidade das evidências através da análise de cinco fatores: (a) limitações na metodologia; (b) consistência dos resultados; (c) subjetividade; (d) precisão; (e) viés de publicação. Conforme a adequação dentre estes fatores, o artigo é passível de ser configurado em um dos quatro níveis de qualidade de evidências, isto é, alta, moderada, baixa e muito baixa. A qualidade desses artigos pode ser atenuada diante da insatisfação dos fatores mencionados anteriormente (Ministério da Saúde, 2014). A seguir, consta o fluxograma da amostra (figura 1) localizada nesta revisão sistemática.

 

RESULTADOS

A seguir, a Tabela 2 apresenta os artigos encontrados sobre intervenções da perspectiva cognitivo comportamental a respeito da regulação emocional no tratamento da dor crônica em ensaios clínicos randomizados (n=6). Acerca dos registros adicionais identificados por outras fontes, um artigo foi recuperado na plataforma OVID, utilizando os descritores mencionados anteriormente.

Foram analisados os conteúdos dos artigos a respeito dos objetivos, amostra, medidas, instrumentos, intervenções e principais resultados com base no critério de frequência e relevância relacionada aos objetivos desta revisão.

 

DISCUSSÃO

Dentre os artigos incluídos, Shpaner et al. (2014) visaram obter uma melhor compreensão da neuroplasticidade funcional relacionada ao tratamento da dor crônica e definir biomarcadores de recuperação, através de onze sessões da terapia cognitivo- comportamental em grupo em 38 pacientes com dor musculoesquelética crônica. Brown e Jones (2013) investigaram os efeitos da intervenção baseada em mindfulness através de programa de gerenciamento da dor em desfechos clínicos e atividade neutral correspondente ao controle cognitivo e regulação emocional em 28 indivíduos com dor musculoesquelética crônica.

Zautra, Davis e Reich (2008) examinaram a eficácia de uma abordagem baseada em métodos cognitivo-comportamentais, focada no manejo da dor e outra com base na meditação mindfulness e engajamento social positivo para promover a regulação emocional no tratamento de 144 pacientes com artrite reumatoide. Foram coletados em 30 diários dados sobre afeto positivo, afeto negativo e sintomas depressivos.

Quanto à amostra dos estudos incluídos nesta revisão, os tipos de dor crônica mais frequentes foram a musculoesquelética crônica (Shpaner et al., 2014; Brown & Jones, 2013; Boersma et al., 2019) e dor crônica em artrite reumatoide (Zautra, Davis & Reich, 2008; Davis et al., 2015). Foi localizada também a dor crônica inespecífica (Dowd et al., 2015).

Quanto à modalidade das intervenções, duas delas foram individuais (Brown & Jones, 2013; Dowd et al., 2015), enquanto as demais foram grupais. Duas intervenções foram dispostas de forma computadorizada (Boersma et al., 2019; Dowd et al., 2015). Foram verificadas duas intervenções focadas diretamente em regulação emocional, mindfulness meditation and emotion regulation therapy (M) (Zautra, Davis & Reich, 2008) e The Mia Intervention (Dowd et al., 2015).

A intervenção M (Mindful Awareness and Acceptance Treatment) visou investigar a regulação e desadaptação das emoções na dor crônica (Zautra, Davis & Reich, 2008). Esta mesma intervenção, utilizada em Davis et al. (2015), teve foco no desenvolvimento de dois conjuntos de habilidades, um para atenuar o efeito negativo dos episódios de dor e estresse no humor, sintomas e funcionamento, outro para aperfeiçoar o envolvimento afetivo positivo. Em Dowd et al. (2015), a intervenção The Mia Intervention é formada por um programa de regulação emocional e pela meditação de mindfulness (MBSR), pautada em aspectos de diminuição do estresse incorporada com a terapia cognitiva.

O tratamento híbrido focado na emoção fundamenta-se em princípios de exposição para a dor e comportamentos de prevenção relacionados à emoção, incorporando a metodologia da Terapia Comportamental Dialética para tratar de dificuldades de regulação emocional e déficits de habilidade (Boersma et al., 2019). A Mindfulness-Based Pain Management Program (MBPM) instrui sobre praticar o mindfulness para reduzir o ciclo reativo que conduz ao estresse físico e emocional. O programa MBPM orienta sobre a não realização de algo sob a sensação desagradável subjacente de dor, e sim a pratica do mindfulness para reduzir o ciclo reativo que conduz ao estresse físico e emocional (Brown & Jones, 2013).

O tratamento TCC para dor centralizou-se especificamente em elevar as habilidades de gerenciamento da dor, visando aperfeiçoar o enfrentamento cognitivo e a saúde funcional e restringir os sintomas de fadiga resultantes da dor (Davis et al., 2015). Esse mesmo tratamento, em Zautra, Davis e Reich (2008), incorpora o acréscimo de habilidades de gerenciamento da dor.

A TCC utilizada em Shpaner et al. (2014) objetivou principalmente alterar as cognições, reduzir o enfrentamento desadaptativo e melhorar a capacidade de utilizar estratégias de desvio de atenção. A TCC fornecida pela internet contém módulos com alguns temas, sendo: lidar com a dor mediante exercícios graduados, informações sobre mindfulness, estresse, dor, sono, contratempos e planejamento de manutenção (Boersma et al., 2019).

Outra pesquisa utilizou uma intervenção de psicoeducação (Psychoeducation Programme) (Dowd et al., 2015) com base em elementos presentes nos programas de controle da dor e no modelo biopsicossocial. A intervenção possui informações sobre ativação do ritmo, estimulo a ser ativo, habilidades cognitivo comportamentais para a resolução de problemas e o papel de pensamentos inúteis.

Um dos estudos utilizou abordagem educacional sobre fisiologia da dor, ciclo vicioso da dor crônica, relevância de gerenciar o estresse e a depressão, atividade física, higiene do sono e alimentação adequada. Contudo, nesta abordagem, não foram incluídos aspectos cognitivos e comportamentais sobre estratégias de enfrentamento (Shpaner et al., 2014).

No protocolo do grupo educacional em Zautra, Davis e Reich (2008), não constaram informações sobre estratégias de enfrentamento e foram apresentadas informações gerais associadas à saúde e à medicina. Em Davis et al. (2005), o grupo controle educacional forneceu informações sobre o gerenciamento da dor e do estresse, sem exercitar habilidades para lidar com a dor ou dificuldades emocionais.

O desfecho dor foi encontrado em todos os estudos, sendo a catastrofização e o controle da dor os mais frequentes, seguidos dos sintomas depressivos, afeto e coping. Neste sentido, a análise dos resultados, assim como a discussão, será desenvolvida com foco nos desfechos mais frequentes da amostra desta revisão.

Em relação às melhorias em relação à dor, em um dos estudos, houve diminuição nas classificações efetivas de dor clínica como consequência do tratamento do treinamento da atenção plena (Brown & Jones, 2013). A intensidade média da dor foi diminuída da linha de base para o pós-tratamento para ambos os grupos (The Mia Intervention e Psicoeducação para controle de dor), porém tal redução não foi preservada em acompanhamento. A interferência na dor total, bem como a aceitação e catastrofização da dor melhoraram para ambos os grupos no pré e pós-tratamento, além de que tais melhorias foram preservadas no acompanhamento e variaram de moderada a alta (Dowd et al., 2015).

Na pesquisa de Boersma et al. (2019), a interferência da dor melhorou no decorrer do tempo, e o tamanho da alteração foi similar entre os grupos (tratamento híbrido focado na emoção e TCC fornecida pela internet). Comparando os escores pré-tratamento na variável "desfecho", foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre as intervenções no pós-tratamento. Isto é, na intensidade da dor e na catastrofização, o tratamento híbrido foi favorecido em relação à TCC fornecida pela internet. A diferença média padronizada dos tamanhos de efeito estava na faixa pequena a moderada.

Em relação às avaliações de catastrofização da dor, estas reduziram no decorrer do tempo, e o tamanho desse efeito foi similar entre os grupos. As análises post hoc mostraram que a catastrofização reduziu de T1 (antes da intervenção) para T2 (depois da intervenção) e manteve-se estável de T2 para T3 (6 meses após a intervenção). Os níveis de catastrofização em T3 foram expressivamente inferiores do que os de T1 (Dowd et al., 2015).

Comparando a linha de base da intervenção MIA (The Mia Intervention) e do PE (Psychoeducation Programme), os participantes destes grupos não alcançaram diferenças na "duração da dor", "última experiência de dor", "frequência de dor", "local da dor" e "causa principal de dor". Sobre as classificações da intensidade média da dor, não houve mudanças expressivas, bem como não ocorreu diferença entre os grupos na falta de alterações no decorrer do tempo (Dowd et al., 2015).

O grupo MBPM (Programa de controle da dor baseado no mindfulness') apresentou elevação menos acentuada do pré ao pós-tratamento na catastrofização relacionada a um episódio diário de dor (Tempo x A Dor t = -2,91, p <0,004). Nas relações pré e pós-tratamento, a força da associação entre dor diária e catastrofização se enfraqueceu no decorrer do tempo (Brown & Jones, 2013).

Sobre os níveis gerais de catastrofização, o grupo MBPM apresentou melhora no pré e pós (Tempo t = -2,54, p <0,02) (Brown & Jones, 2013). O grupo TCC para dor apresentou melhorias nos níveis gerais de catastrofização (Tempo t = -3,85, p <0,0003). O grupo E (tratamento usual) apresentou piora dos níveis gerais de catastrofização (Tempo t = 2,49, p <0,02) (Davis et al., 2015).

Conforme as análises de regressão, a melhora na saúde mental não foi associada com as alterações na classificação da dor clínica sensorial ou afetiva. Não houve efeito do tratamento (intervenção MBPM) nas avaliações de dor experimental aguda em relação ao grupo controle (tratamento usual). Não foram encontradas evidências de melhora na saúde física. Embora tenham ocorrido melhoras no controle da dor; contudo, não foram estatisticamente expressivas na interação com o grupo de intervenção (Brown & Jones, 2013).

Entretanto, houve melhorias nos resultados psicológicos como o controle percebido da dor associadas ao maior processamento antecipatório no córtex pré-frontal dorsolateral (DLPFC) e no córtex somatossensorial. Ainda, alterações na atividade neural foram encontradas, tendo o treinamento de mindfulness diminuído a ativação aumentada das regiões centrais do cérebro (especialmente o DLPFC bilateral) durante a antecipação da dor aguda sem afetar as regiões que comumente são correlacionadas com a intensidade da dor (cingulado e córtices da ínsula posterior) (Brown & Jones, 2013).

Em relação ao controle da dor, o grupo M (Mindful Awareness and Acceptance Treatment) apresentou níveis gerais mais elevados de controle da dor do que o grupo TCC para dor (t (97) = 3,01, p <0,01) e o grupo E t (89) = 2,40, p <0,02). O grupo TCC para dor apresentou reduções menos acentuadas no controle da dor percebida nos dias de dor elevada (Tempo x A Dor t = 2,89, p <0,004). O grupo TCC para dor apresentou melhorias nos níveis gerais de controle da dor (Tempo t = 3,35, p <0,002). O grupo controle educacional em artrite demonstrou melhora nos níveis gerais de controle da dor percebida (Tempo t = 2,47, p <0,02) (Davis et al., 2015).

No mesmo estudo de Davis et al. (2015) o grupo M manifestou melhora nas relações pré e pós-tratamento entre episódios de estresse e mudanças no afeto sereno (Tempo x A Estresse t = 2,18, p <0,03) e afeto ansioso (Tempo x A Estresse t = -2,17, p <0,03). Sobre os níveis gerais de afeto sereno, o grupo M apresentou melhora no pré e pós (Tempo t = 5,48, p <0,0001).

A intervenção baseada em mindfulness apresenta-se como uma sólida estratégia sobre as emoções para os indivíduos com sinais e sintomas de depressão recorrente evidenciada no aumento do afeto positivo e na diminuição do afeto negativo quando comparados com TCC para dor e controle educacional. A estratégia baseada em mindfulness promove melhora na regulação emocional (Zautra, Davis & Reich, 2008). O grupo de mindfulness em Davis et al. (2015) apresentou melhora nas relações pré e pós- tratamento entre episódios de estresse e mudanças no afeto sereno e afeto ansioso.

A intervenção MIA (Mindfulness in Action) apresentou mudança da linha de base para o pós-tratamento em relação a capacidade de gerenciar as emoções, lidar com o estresse e usufruir de eventos agradáveis. Efeito que foi conservado no acompanhamento de um semestre sobre as percepções de gerenciamento das emoções e do estresse. A avaliação da Patient Impression of Change (PGIC) para a capacidade de gerenciar as emoções foram mais elevadas no grupo MIA do que no grupo PE em T2 (depois da intervenção) e essa diferença permaneceu em T3 (6 meses após a intervenção) (Dowd et al., 2015).

Em comparação ao grupo educacional (tratamento usual) os participantes da TCC demonstraram conectividade mais fraca entre a DMN (rede de modo padrão anterior) e amígdala, substância cinzenta periaquedutal (PAG) e a lateral esquerda do córtex occipital. Foi verificada conectividade mais forte entre o gânglio basal e o direito S2 (córtex somatossensorial secundário direito) do pré ao pós. Essa conectividade aumentada no período pré e pós-tratamento foi correlacionada com uma redução no pré e pós- tratamento dos sintomas de dor, na diminuição no coping passivo, um aumento na autoeficácia para o tratamento da dor e para lidar com os sintomas (Shpaner et al., 2014).

A amplitude fracionária de flutuações de baixa frequência (FALFF) nas regiões do cerebelo aumentou depois do grupo TCC e reduziu após o grupo EDU. As mudanças na região do cerebelo foram correlacionadas com alterações pré e pós na experiência total de dor, autoeficácia para o tratamento da dor, deficiência familiar percebida e sintomas totais de dor. As mudanças da FALFF no córtex cingulado posterior (PCC) correlacionaram-se com alterações nos sintomas totais de dor e na autoeficácia para o tratamento da dor (Shpaner et al., 2014).

Classificações de controle da dor são fortemente infundidas com a linguagem cognitiva, apoiando tipos de intervenções disponibilizadas pela TCC para dor e programas de educação educativos sobre dor. Nesse sentido, a intervenção TCC para dor proporcionou melhor controle cognitivo. Por outro lado, os métodos de meditação da atenção plena não estimulam o controle, mas a consciência (Zautra, Davis & Reich, 2008). No estudo de Davis et al. (2015), o grupo de TCC apresentou melhorias no controle e na catastorização da dor e, em Zautra, Davis e Reich (2008), também houve o controle da dor.

No ensaio clínico randomizado de Ganji, Pakniat, Armat, Tabatabaeichehr & Mortazavi (2018), foi concluído que a intervenção (Self-Management Group Education) realizada em seis sessões educacionais diminuiu a dor de idosos com osteoartrite. Sendo assim, utilizar a educação de autogerenciamento pode promover mudanças comportamentais no controle da dor.

Sobre os grupos controle educacionais presentes nesta revisão, um destes presenciais apresentou piora nos níveis gerais de catastrofização; contudo, melhora nos níveis gerais de incapacidade (Davis et al., 2015). Outros dois apesentaram resultados inferiores comparados aos seus respectivos grupos de intervenção (Zautra, Davis e Reich, 2008; Shpaner et al., 2014). A psicoeducação computadorizada não indicou diferenças significativas em diversas medidas de dor em relação ao grupo de intervenção (Dowd et al., 2015). A implicação clínica central do estudo de Dowd et al. (2015) é que foi sustentada a viabilidade de utilizar intervenções informatizadas como uma opção adicional para o controle da dor crônica.

No estudo de Vowles, Fink e Cohen (2014), foi utilizado intervenção de programa interdisciplinar de reabilitação com base na Terapia de Aceitação e Compromisso e se avaliou, entre outros desfechos clínicos, o nível de incapacidade. Dos pacientes que relataram redução do esforço pelo controle da dor e elevação do engajamento em atividades que consideram pessoalmente valorizadas no decorrer de uma intervenção de quatro semanas, 80% revelaram uma diminuição confiável da incapacidade no follow-up de três meses.

Já no estudo de Davis et al. (2015), os dados obtidos sugerem que o tratamento M (Mindful Awareness and Acceptance Treatment), voltado à regulação emocional, produz benefícios no manejo da dor e do estresse diário mais amplos que aqueles apresentados pelo grupo de TCC para dor ou pelo grupo educacional sobre artrite. Ainda, o tratamento M apresentou níveis gerais mais elevados de controle da dor em relação ao grupo de TCC para dor.

Quanto à redução dos níveis da dor, no estudo de Brown e Jones (2013), ocorreu diminuição nas pontuações da Escala de Catastrofização da Dor (PCS) desde a linha de base até o final do tratamento. Tais melhorias se mantiveram ou foram otimizadas no acompanhamento em cinco dos seis participantes ao passo que um participante demonstrou declínio no acompanhamento.

Foi avaliado, no estudo de Linton e Fruzzetti (2014), efeitos de um tratamento híbrido que combina um tratamento baseado em Terapia Comportamental Dialética (DBT) focada nas emoções comparado a um controle com base na exposição. Obteve-se a redução de afeto negativo que foi avaliado pela preocupação catastrófica. As descobertas deste estudo sustentam a concepção de que as emoções negativas desempenham um papel relevante na dor crônica e no tratamento numa circunstância de busca de metas relacionadas ao alívio da dor.

Conforme resultados obtidos, a intensidade da dor diminuiu em média 51% a partir do tempo de seguimento (Linton & Fruzzetti, 2014). Em direção oposta, não houve alterações expressivas nas classificações da intensidade média da dor no estudo de Dowd et al. (2015). Em Brown e Jones (2013), as classificações de dor experimental aguda não foram atenuadas no tratamento MBPM (mindfulness-basedpain managementprograms); porém, ocorrendo somente uma pequena redução nas classificações efetivas de dor clínica como consequência do tratamento.

No estudo de Osborne, Jimenez-Torres, Landa, Mahoney e Madan (2017), o grupo de psicoterapia para dor integrou aspectos da terapia de aceitação e compromisso, terapia cognitivo-comportamental e redução do estresse com base na atenção plena. Houve redução da depressão, ansiedade e sintomas somáticos no decorrer do curso do tratamento. Em média, os participantes foram internados com escores altos na escala grave da sintomatologia depressiva; entretanto, tiveram alta com escores mais baixos. Diferentemente, no estudo de Dowd et al. (2015), o sofrimento psicológico não demonstrou alteração com o passar do tempo, assim como a magnitude da mudança não variou por grupo (MIA e psicoeducação computadorizada).

No estudo experimental controlado de Zeinali e Pourhosein (2016), foi avaliada a eficácia de um tratamento com base em regulação emocional em pacientes com dor crônica e foi concluído que estratégias de tratamento que incluam a regulação emocional como um dos principais componentes podem diminuir o nível de ansiedade e estresse e ser eficazes no controle da dor. Em outra pesquisa, Osborne et al., 2017, os resultados demonstraram melhorias na regulação emocional e redução da dor por meio da psicoterapia em grupo. Além disso, melhorou a capacidade de envolver-se em comportamentos voltados a metas, bem como no manejo das respostas impulsivas, ainda que experimentassem emoções negativas. A intervenção de mindfulness promoveu regulação emocional e redução da depressão recorrente (Zautra, Davis & Reich, 2008).

No estudo randomizado de Hearn e Finlay (2018) sobre mindfulness na modalidade computadorizada para pacientes com lesão medular, houve redução da depressão e dor crônica. O treinamento online de atenção plena, quando comparado à psicoeducação, possibilitou melhorias mais significativas quanto aos sintomas de depressão e ansiedade, pensamento catastrófico e em elementos específicos (descrever, agir com consciência, não reatividade à experiência interna e pontuação total) de atenção plena ao final da intervenção. No follow-up, o efeito de maior tamanho foi apresentado para melhorias nos sintomas de depressão, indicando uma relação expressiva entre atenção plena e melhoria deste desfecho.

No estudo de Seminowicz et al. (2013), foram investigadas associações na massa cinzenta do cérebro após sessões de terapia cognitivo-comportamental em pacientes com dor crônica. Onze sessões resultaram no aumento do volume na massa cinzenta nas regiões cerebrais pré-frontal e somatossensorial, assim como no aumento do volume préfrontal dorsolateral relacionado à diminuição da catastrofização da dor. Os resultados sugerem que a matéria cinzenta altera após onze semanas de TCC em paralelo com melhorias clínicas na saúde mental em geral e no enfrentamento da dor.

Nesse sentido, o estudo de Shpaner et al. (2014), demonstrou que a TCC, em comparação ao controle educacional ativo, é associada a alterações relevantes na conectividade funcional em estado de repouso em pacientes com dor crônica. Ainda, foi constatado que, em uma intervenção de TCC, a aprendizagem de novas estratégias de controle da dor produz modificações medíveis na conectividade funcional intrínseca (IFC) dentro e entre redes envolvidas previamente na dor crônica.

Alterações associadas à TCC foram percebidas na conectividade funcional dos gânglios basais (BG) assim como na amplitude de flutuações intrínsecas no cerebelo. Os achados deste estudo sugerem que o tratamento em TCC é capaz de modificar a conectividade corticolímbica por meio de melhorias cognitivas e comportamentais. A intervenção de TCC produziu melhorias clínicas em ansiedade, depressão e dor crônica (Shpaner et al., 2014).

As descobertas alcançadas no estudo de Zautra, Davis e Reich (2008) sugerem que os médicos devem considerar a inclusão do histórico de depressão como um fator nas avaliações e planejamento de tratamento e ressaltam que, nas terapias de regulação emocional, pode ser mais desenvolvido o potencial para aumentar a experiência afetiva positiva concomitante à redução da resposta negativa, especialmente para os indivíduos com histórico de depressão.

 

CONCLUSÃO

Frente ao exposto neste estudo, os tipos de dores crônicas mais prevalentes foram à musculoesquelética e à decorrente da artrite reumatóide. A dor crônica inespecífica, também encontrada na amostra desta revisão, passou a ser denominada dor crônica musculoesquelética descrita na categoria de dor crônica primária, segundo o CID-11.

As intervenções cognitivo comportamentais analisadas nos estudos recuperados nesta revisão apresentaram melhorias em desfechos variados de dor crônica, sobretudo, na catastrofização e controle da dor, assim como na aceitação, manejo e coping para dor. Tais efeitos foram relacionados com melhorias em desfechos de saúde mental.

Foram encontrados efeitos da TCC e mindfulness em estruturas neurológicas associadas a variáveis clínicas de saúde mental, correlacionadas à dor e à regulação emocional, sendo a última através do controle da atenção. Foi observado que a história clínica de depressão recorrente possui influência relevante nos efeitos benéficos (maior diminuição da dor) por meio principalmente da atenção plena. Ainda, metade dos estudos avaliaram estratégias de coping para dor.

Todos os estudos incluíram grupo controle e um período de follow-up, variando entre um a nove meses. Estudos utilizaram modalidades educacionais como condição de controle, outro utilizou tratamento clínico usual e outro a TCC pela internet como um controle ativo. Foram encontrados poucos instrumentos que avaliem especificamente a regulação emocional, e esta foi verificada por elementos relacionados ao componente afetivo-emocional da dor como o afeto negativo e o afeto positivo. Nesse sentido, foram observadas poucas intervenções próprias da regulação emocional, sendo observadas intervenções que utilizam a regulação emocional como estratégias nas abordagens cognitivas e comportamentais tais como Terapia Cognitiva tradicional, baseadas em mindfulness, Terapia Comportamental Dialética e Terapia de Aceitação, configurando modelo integrativo "híbrido", com foco no componente afetivo-emocional da dor.

Em relação às limitações dos estudos, requisita-se precaução não só na interpretação, mas na aplicação dos seus achados, visto que fatores de confusão podem estar presentes, como, por exemplo, uso de medicação pelos pacientes ou mulheres no período menstrual, sendo tais fatores passíveis de interferir nos resultados. Autores das pesquisas sugerem mais replicações dos estudos para aumentar a confiabilidade dos dados. Ainda, outros apontam limitações frente à falta de clareza ou compreensão de determinados mecanismos que possam explicar efeitos das intervenções analisadas.

Sugere-se, para estudos futuros, a utilização de períodos de follow-up para compreender os efeitos potenciais a longo prazo do treinamento da atenção plena online e presencial relacionadas ao controle cognitivo e regulação emocional. Em estudos de intervenção, cabe examinar a relação entre alterações na atenção plena, aceitação e catastrofismo da dor. Por fim, faz-se necessário identificar os principais componentes efetivos da TCC à distância versus presencial, no intuito de preservar o engajamento dos pacientes em programas de tratamento.

 

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Correspondência:
Prisla Ücker Calvetti
E-mail: prisla.calvetti@gmail.com

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBTC em 19 de Agosto de 2021. cod. 243
Artigo aceito em 10 de Janeiro de 2022

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