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Pesquisas e Práticas Psicossociais

 ISSN 1809-8908

Pesqui. prát. psicossociais vol.14 no.1 São João del-Rei jan./mar. 2019

 

Iniciação musical no ensino fundamental: afetividade e aprendizagem

 

Musical initiation in elementary school: affection and learning

 

Iniciación musical en la enseñanza fundamental: afetividad y aprendizaje

 

 

Girlane Moura HickmannI; Adolfo Antonio HickmannII

IDoutoranda pela Universidade Federal do Paraná (UFPR)
IIDoutorando pela Universidade Federal do Paraná (UFPR)

 

 


RESUMO

Buscando tornar acessível o ensino gratuito de música para a população de baixa renda, foi criado o Projeto Música para Todos, sediado em Teresina, Piauí. A primeira autora deste trabalho participou do referido projeto realizando curso de iniciação à formação de professores de flauta doce soprano e contralto, que era desenvolvido pela Yamaha Musical do Brasil, no programa Sopro Novo. Na mesma época, a referida autora cursava Letras (Inglês) e passou a ministrar aulas de música em uma escola pública da cidade de Teresina, combinando dois conhecimentos (aulas de flauta e inglês), envolvendo afetivamente os alunos no processo, que influenciou no desempenho deles nas demais aulas.

Palavras-chave: Projeto Social. Música. Língua Inglesa. Afetividade.


ABSTRACT

Música para Todos Project, based in Teresina City, Piauí State, was created with the purpose of making available free music education for low-income population. The first author of this work participated in this project, doing introductory course in teacher training for soprano and alto flute in Sopro Novo program, developed by Yamaha Musical do Brazil. At the same time, the author was studying English Literature and began teaching music classes in a public school in Teresina City. Two types of knowledge (flute and English classes) were combined, affectively involving students in a process which influenced the students' performance in other classes.

Keywords: Social Project. Music. English Language. Affection.


RESUMEN

En busca de acceder a la enseñanza gratuita de música para la población de bajos ingresos, fue creado, el Proyecto Música para Todos, con sede en Teresina, Piauí. La primera autora del presente trabajo participó en dicho proyecto, realizando curso de iniciación a la formación de profesores de flauta dulce soprano y contralto que era desarrollado por Yamaha Musical de Brasil, en el programa Sopro Novo. En la misma época la autora cursaba Letras Inglés, y pasó a impartir clases de música en una escuela pública de la ciudad de Teresina, Piauí, combinando dos conocimientos (clases de flauta e inglés), involucrando afectivamente a los alumnos en el proceso que influenció en el desempeño de los resultados estudiantes en las demás clases.

Palabras clave: Proyecto Social. Música. Idioma en Inglés. Afectividad.


 

 

Introdução

A música e a Língua Inglesa são manifestações culturais universais que permitem que povos de diferentes nacionalidades, etnias, classes econômicas, gêneros e escolaridades comuniquem-se, compartilhando conhecimentos, sonhos, sentimentos e experiências. As diferenças de interesse entre crianças, jovens, adolescentes ou idosos desaparecem ao toque de um instrumento. Acredita-se que, no contexto do ensino da Língua Inglesa, o aprendizado de um instrumento pode viabilizar muitos sonhos, pois concorre, como ferramenta de ensino, para o melhor aprendizado da língua.

Músicas cantadas em inglês fazem parte do dia a dia de diferentes gerações: crianças, jovens e adultos. No Brasil, muitas canções estrangeiras são tocadas em inúmeros meios de comunicação. Além disso, o idioma aumenta as chances de acesso ao conhecimento musical que não está disponível em português.

A globalização fortaleceu a demanda pelo domínio do idioma inglês para a vida pessoal e profissional de todos. No que concerne à Língua Inglesa, como língua de comunicação, atende a diferentes demandas educacionais e do mundo do trabalho, por transitar entre as diversas áreas do conhecimento. A música, por sua vez, desenvolve habilidades essenciais para a vida, como sensibilidade, rotina e dedicação. Essa influência no desenvolvimento do indivíduo começa bem cedo e pode ser percebida ainda no útero, onde o bebê reage aos estímulos musicais (Martins, 2017). Bréscia (2003, p. 81) afirma ainda que o aprendizado musical "[...] melhora o desempenho escolar dos alunos e contribui para integrar socialmente o indivíduo".

Na adolescência, em função de aspectos maturacionais envolvendo o desenvolvimento neurológico e psicológico, é comum os jovens perderem o interesse por atividades que antes os encantavam. Nesse sentido, o aprendizado formal é um dos âmbitos em que o adolescente tende a diminuir o investimento de tempo (Salvo, 2010). Se nesse momento, para ensinar ao jovem, o educador fizer uso de estratégias diferenciadas, como a música, a motivação dele pode novamente aflorar. Conforme Kishimoto (1999), os professores precisam encarar modificações necessárias no seu papel de ensinar, bem como conceber que o aluno é o centro na produção do conhecimento.

Famílias com bom poder aquisitivo podem contratar professores tanto de línguas quanto de música para seus filhos. Nas famílias com limitações econômicas, tal contratação é inviável. Trabalhos pedagógicos como o realizado pelo Projeto Música Para Todos (PMPT), que foi elaborado com o objetivo de proporcionar, gratuitamente, música de qualidade a todos, é uma iniciativa que merece destaque, visto que possibilita o acesso ao aprendizado musical por meio do ensino de instrumentos ministrado em escolas públicas municipais. Tal projeto foi aprovado pelo Ministério da Cultura e publicado no Diário Oficial da União e, desde sua fundação, depende dos recursos provenientes de incentivos fiscais, como os garantidos pela Lei nº 8.313/91 (Lei de Incentivo à Cultura), popularmente chamada de Lei Rouanet.

Professores que participaram do PMPT, depois de desenvolverem domínio do instrumento, optaram por agirem como multiplicadores. A oferta de música, antes restrita à Escola de Música, na qual o projeto foi concebido, foi estendida a escolas de ensino regular e à população em geral que se interessa em aprender um instrumento musical. O efeito multiplicador do projeto permitiu que o número de beneficiados fosse ampliado, já que os professores formados no projeto, sem vínculo com as escolas, puderam se tornar ministrantes de aulas em escolas públicas nas comunidades carentes.

A primeira autora deste artigo passou por tal experiência, primeiramente estudando flauta doce e contralto no Projeto Sopro Novo,1 parceiro do PMPT, e depois compartilhando tal conhecimento ao tornar-se professora de flauta, sem vínculo empregatício, em uma escola pública, de Ensino Fundamental e Médio na cidade de Teresina. Por estar na época cursando Letras (Inglês) na Universidade Federal do Piauí, surgiu a possibilidade de usar as canções em inglês na disciplina de Música. O ensino de flauta foi ministrado para uma população de baixa renda, na qual havia adolescentes que frequentemente abandonavam a escola para trabalhar e contribuir na renda familiar ou desistiam dos estudos por falta de interesse. Segundo alguns professores das matérias regulares, como o de Matemática, havia o desinteresse dos alunos quanto aos estudos e o rendimento da maioria deles estava abaixo do esperado.

A receptividade dos alunos, das diversas matérias curriculares, após a participação das aulas que utilizaram o idioma nas aulas de música, foi muito boa. O acesso aos instrumentos musicais para as aulas de flauta foi facilitado pelo projeto implementado na escola, que repassava aos alunos o valor de custo dos instrumentos. As práticas em sala de aula contribuíram para o desenvolvimento da percepção sonora, numérica, concentração e motivação dos alunos. Supõe-se que esses resultados tenham sido alcançados porque a música age como facilitadora da aprendizagem, pois mantém os neurônios cerebrais em atividade e "[...] ajuda a desenvolver a capacidade de concentração imediata, de persistência e de dar resposta à constante variedade de estímulos". (Scherer & Domingues, 2012, p. 7).

As aulas de flauta eram ministradas de forma lúdica e havia mais participação dos alunos envolvidos no projeto. Os ganhos para a formação integral dos educandos, identificados nas aulas, correspondem a dados da literatura, conforme afirma Ilari (2003, p. 9)

Os jogos musicais quando utilizados de forma lúdica, participativa e não competitiva, podem constituir uma fonte rica de aprendizado, motivação e neurodesenvolvimento. Em geral, os jogos acontecem em aulas coletivas, o que obviamente visa à estimulação dos sistemas de orientação espacial e do pensamento social. Jogos de memória de timbres, notas e instrumentos, dominós de células rítmicas e brincadeiras de solfejo podem ativar os sistemas de controle de atenção, da memória, da linguagem, de ordenação sequencial e do pensamento superior. Já os jogos que utilizam o corpo, tais como mímica de sons imaginários, brincadeira de cadeira, cantigas de roda, encenações musicais e pequenas danças podem incentivar o sistema da memória, de orientação espacial, motor e do pensamento social, entre outras. Além de prazerosos, os jogos musicais de participação ativa podem constituir exemplos típicos do aprendizado divertido.

A relação afetiva professor-aluno nas aulas de iniciação musical, por meio da flauta doce, teve seus impactos no desenvolvimento das atividades propostas. Rossini (2001) propõe que o desenvolvimento cognitivo se dá com o relacionamento afetivo entre mestre e aprendiz. Piaget (1962) defende não haver dúvidas de que o afeto2 desempenha papel essencial para o funcionamento da inteligência. Para o autor, não haveria inteligência, motivação, necessidade ou interesse se não houvesse afeto, porque "[...] a afetividade é uma condição necessária na constituição da inteligência [...]" (1962, p. 1, tradução nossa). Considera-se, portanto, que a relação entre professor e aluno deva ser marcada pela presença de afeto, na medida em que a afetividade influencia na qualidade e direção das atividades acadêmicas.

Cabe, então, ampliar as pesquisas sobre o comportamento de aprendiz sob a influência de uma educação com afeto. Segundo Freire (1987, p. 81),

Ao fundar-se no amor, na humildade, na fé, nos homens, o diálogo se faz numa relação horizontal, em que a confiança de um pelo no outro é consequência óbvia. Seria uma contradição se, amoroso, humilde e cheio de fé, o diálogo não provocasse este clima de confiança entre seus sujeitos.

Os professores demonstram interesse pelo aluno quando lhes dão a oportunidade de compartilhar seu conhecimento prévio de mundo, dando-lhe espaço para expressar suas realidades e sonhos. Os aprendizes podem discutir os mais variados assuntos por meio da música, com o uso de canções em inglês. Com afetividade e trocas de experiências, o professor poderá encorajar os alunos a usarem a criatividade e superar, dessa forma, suas dificuldades no aprendizado de qualquer matéria. É importante ressaltar que o ensino exige diálogo e afeto, e com a música não é diferente. Educar envolve estar disponível e atento ao outro (o educando). Faz-se necessário, portanto, considerar os gostos musicais do aprendiz, aproveitando sua própria musicalidade para ensiná-lo de forma a proporcionar a ele um aprendizado prazeroso. A respeito disso, Snyders (1999, p. 170) afirma que

A música é feita para ser bela e o belo existe para proporcionar alegria, a alegria estética. O ensino da música tem por objetivo levar os alunos a um contato feliz com as obras musicais, fazê-los viver uma experiência de alegria a partir delas. As diferentes músicas podem contribuir para isto: é necessário levar a sério o rock e os outros gêneros apreciados pelos jovens, assim como é preciso incitá-los a exprimir e viver seus gostos sem culpas nem provocações. O ensino da música é o mais desesperado, porque conta muito pouco para o futuro profissional e escolar dos alunos em seu conjunto. E é o mais carregado de esperança: o professor não tem de passar aos alunos o amor pela música, pois, sem dúvida, nenhuma geração de jovens viveu tão musicalmente como a de agora, cabe a ele "simplesmente" estabelecer a comunicação entre a música "deles" e as outras.

 

Processo de construção do projeto

Os professores de flautas que atuavam nas escolas de ensino regular não tinham nenhum vínculo empregatício com a escola. Entretanto, os progressos dos alunos eram compartilhados com a diretoria, que disponibilizava uma sala para planejamento das aulas e momentos de diálogos com os professores que trabalhavam na escola. Os professores de música aproveitavam todas as oportunidades oferecidas pelo Programa Sopro Novo e o empenho da escola em facilitar o ensino do instrumento musical nas dependências da escola.

Nesse contexto, foi dada liberdade para unir o conhecimento musical ao do idioma inglês, duas manifestações culturais universais, em prol de um melhor aproveitamento das aulas. Por ter graduação em língua estrangeira, a primeira autora, entre uma aula e outra de flauta, nas aulas do 6° ao 9° ano do Ensino Fundamental, cantava e tocava músicas em inglês para os alunos e dava alguns exemplos, para facilitar a compreensão, por parte dele, sobre intensidade, altura e timbre. Conforme cita Chagas (1997, p. 24), o aprendizado musical ajuda a unir pensamento, ação e emoção e facilita "o contato direto com as sensações físicas, com os sentimentos e com a mais profunda sensação de ser o que se é". Além disso, outras experiências têm mostrado a eficácia do uso da música como ferramenta de apoio cognitivo e afetivo, influenciando o desenvolvimento social dos sujeitos aprendentes (Fernandes et al., 2017).

Villa-Lobos (1972) enfatizou a importância da educação musical, principalmente com gerações de crianças, com idade entre 5 e 14 anos. Essa fase do desenvolvimento coincide com a saída do aluno do primeiro para o segundo ciclo do Ensino Fundamental. Ainda de acordo com Villa-Lobos (1972, p. 85), o principal objetivo do ensino "não é o de criar artistas nem teóricos de música, senão cultivar o gosto pela música e ensinar a ouvir". Nossos alunos são capazes de aprender sobre sons, pois os utiliza para falar e cantar. O professor de Língua Inglesa, por exemplo, pode se utilizar de ferramentas e métodos para tornar o aprendizado mais prazeroso e efetivo.

Com o progresso das aulas, os alunos começaram a demonstrar encantamento. Isso aumentou o grau de atenção deles nas aulas de inglês. Poder participar de aulas regulares de música contribui para o desenvolvimento integral do educando, uma vez que facilita a aquisição de inúmeras habilidades importantes para o aprendizado sistemático e para a vida.

Um exemplo dessas novas habilidades foi o conhecimento matemático. A relação entre música e Matemática faz-se clara quando pensada em termos de frações. É possível encantar os alunos com o aprendizado da Matemática devido a alguns conceitos frequentemente utilizados no ensino da música. Para preencher um compasso 4 x 4, o aluno deve somar 4 semínimas (), que equivalem, cada uma, a ¼ do tempo.

Segundo Oliveira e Sabba (2013, p. 6631), os alunos podem ser capazes de "apreciar o belo, não apenas das melodias e das sensações, mas também das relações matemáticas como proporções, frações e divisões". A esse respeito, Campos (2009, p. 121) estudou a relação entre Matemática e música e concluiu que

O pensamento lógico-matemático auxiliava o entendimento de conceitos comumente relacionados ao cenário musical, tais como notas, intervalos e escalas musicais, ciclo das quintas, dissonância, ressonância e freqüência. A competência musical trazia benefícios para que os alunos entendessem e dessem novos significados a proporções, razões e progressões geométricas.

A nota nas aulas de música, a princípio, não era um pré-requisito, porém o comportamento participativo e assiduidade eram. Tal exigência potencialmente influenciou no engajamento das crianças no aprendizado de flauta doce. A música aproxima os alunos uns dos outros, instigando o desenvolvimento da socialização eles e contribui para a formação integral. A educação musical tem o seu valor, outras coisas, porque ela potencializa o senso crítico do aprendiz, possibilitando uma maior sintetização de formas e conteúdos e "[...] as vivências que enriquecem a imaginação e a formação global da personalidade". (Martins, p. 8).

Além do conteúdo formal das aulas de inglês, a inserção da música propiciou a oportunidade de olhar o aluno de maneira mais integral. Isso facilitava a aproximação de estudantes mais resistentes, ou que apresentavam padrão de comportamento disfuncional para o contexto escolar. Aos poucos, houve mais engajamento dos alunos em comportamentos socialmente aceitos, diminuindo a frequência de comportamentos agressivos ou de baixo envolvimento com a educação.

Cardoso (2013) comprovou haver um desempenho superior dos alunos participantes de aulas de música articuladas com matérias regulares, em todas as matérias, com exceção da Educação Física, quando comparados àqueles que participaram apenas das matérias regulares. As diferenças entre grupos participantes foi superior e estatisticamente significativa. Os impactos positivos, influenciados pela participação dos alunos nas aulas articuladas, refletiram na assiduidade dos estudantes e no aproveitamento escolar.

Percebeu-se então que as contribuições do ensino de música, inseridas no contexto do ensino da Língua Inglesa, iam muito além de somente aprender notas musicais e aliá-las ao ensino do idioma. A proposta dessas atividades revelou possibilidades interdisciplinares, pela sensibilidade que se foi ganhando, ao perceber que os seres humanos integram o ritmo a outros conhecimentos.

A natureza interdisciplinar do conhecimento não se situa no campo pragmático que opera no nível das "atividades" nem no extremo teórico que ignora a sala de aula: a interdisciplinaridade se situa na vida. Igualmente, a música se oferece à abordagem interdisciplinar pelo simples fato de ser intrínseca à vida e à cultura. Existem afinidades, interfaces e convergências inquestionáveis entre música e diversas áreas do conhecimento humano. Por exemplo: matemática e música se encontram nas regularidades, na métrica e nos padrões; espacialidade e música se encontram nas proporções, no equilíbrio, na perspectiva e na forma; linguística e música, no som e no ritmo das palavras e na semântica; corporalidade e música, na plasticidade do movimento, nas habilidades físicas e de coordenação, e assim por diante. (França, 2016, p. 87)

A sensibilidade para o outro e a contribuição para a formação integral dos educandos despertadas pela música trouxeram questionamentos sobre o papel da afetividade no aprendizado dos alunos. Atitudes que aumentem a autoconfiança e a motivação, e diminuam os níveis de ansiedade, podem também influenciar na persistência dos alunos em se engajar nas aulas de música, nas quais canções em inglês se faziam sempre presente. Hickmann (2015, p. 111) reforça a importância de se cultivar relações afetivas e de se apresentar um espaço acolhedor para o aprendizado. Segundo a autora, é preciso também

Incentivar a colaboração, cujos objetivos principais sejam, entre outros: aumentar autoestima e motivação do aluno, diminuir a ansiedade debilitante e, portanto despertar o conhecimento e por consequente, desenvolver no aluno as diversas inteligências, poderá surtir mais efeitos positivos nos alunos do que comportamentos de avaliação de quanto esperto o aluno é (metas de aprendizagem orientadas pelo meio e desempenho pessoal), condutas de rotulação e classificação, críticas e uso de controle aversivo.

Para que o aprendizado tenha significado para o aluno e se torne uma marca em sua formação integral, o professor precisa envolver-se no processo, dando o melhor de si. A relação pessoa/ambiente, conforme Skinner (1957), é uma relação dialética, na qual o professor influencia na formação do educando, mas também é influenciado pela relação que estabelece com ele. Assim, professor e aluno saem enriquecidos. O docente tem a facilidade de trabalhar os ambientes para intensificar a interação entre manifestações culturais como a Música e a Língua Inglesa. Pois "[...] para tornar o ambiente social tão livre quanto possível do controle aversivo, não precisamos destruir o ambiente ou fugir dele; precisamos remodelá-lo" (Skinner, 1971, p. 36).

Para Skinner (1957), o controle aversivo existe no ambiente e acarreta ações para fugir de algo que é ruim ou para não se ter consequências ruins, como punições ou ameaças. Para o autor, remodelar o ambiente é ter responsabilidade em fazer a diferença. Ao se dar conta do nível de controle existente, pode-se construir um ambiente mais produtivo para o aprendizado.

Ademais, ao fazer parte do dia a dia, assim como a cultura letrada, a música amplia a produção espontânea e criativa da comunicação (Oliveira & Vanzela, 2017). O projeto Sopro Novo desenvolveu-se justamente nessa direção. Por meio de interações, mediadas pela música, facilitou o ensino do idioma estrangeiro, transformando um ambiente escolar com muitos estímulos aversivos em algo agradável, ao qual os alunos gostavam de ir.

Além do ensino do inglês, os recursos musicais serviram para desenvolver habilidades em adolescentes que contribuíram para a cidadania, ao propiciar competências importantes na sociedade contemporânea, mas de custo elevado, para uma população carente. A eficácia do uso da música no ensino da Língua Inglesa é reforçada por pesquisas como a de Bonato (2014). A autora destacou a melhora do interesse dos estudantes no aprendizado do idioma, causando a aproximação do contato com a língua estrangeira nos contextos em que esse contato normalmente é distante da realidade dos alunos.

Essas experiências também demonstram a necessidade de uma formação de professores de modo integral e que considere o sentir, aliado ao pensar. Nesse sentido, é preciso considerar as possibilidades de integração de atividades criativo-artísticas como ferramentas para a melhoria do aprendizado (Stoltz & Weger, 2015). Esses autores consideraram a interação do belo, do bem e da verdade como elementos da liberdade para a aprendizagem, levando em conta o desenvolvimento de seres humanos em sua integralidade. Ao olhar essas considerações, percebe-se o quanto essas experiências criativas contribuíram significativamente para a vida dos estudantes e dos próprios professores.

 

Resultados

O professor ministrante das aulas de inglês pôde perceber que a música enriqueceu bastante sua percepção em relação ao outro, além de melhorar a interação e o desempenho dos estudantes, de modo geral. Isso revelou o quanto a música pode ajudar a quebrar barreiras e obstáculos que muitas vezes dificultam o aprendizado e a socialização dos participantes.

Os estudantes aprenderam, de forma lúdica e com grande envolvimento, os princípios musicais, ao mesmo tempo em que passaram a conviver, de maneira mais dinâmica, com elementos da Língua Inglesa. Eles também desenvolveram outras habilidades como persistência, atenção e concentração, que favoreceram a sua autoestima.

A carência financeira que poderia inviabilizar a aquisição dos instrumentos musicais foi compensada pela disponibilização destes pela escola, com flautas adquiridas para uso compartilhado entre todos os estudantes que não puderam comprar uma. Essa é mais uma demonstração de como a escola pode ir além com pouco investimento, mas com ganhos significativos, não somente para o desempenho pedagógico como também para a melhora do clima escolar.

A música fortaleceu o engajamento dos alunos nas tarefas educacionais, elevando seu desempenho no aprendizado de algumas habilidades como a Matemática e conhecimento de elementos do idioma inglês, que pôde ser vivenciado por meio do cantar. Trazer para o ambiente escolar essa ferramenta de interação tornou as lições mais prazerosas e atrativas para os alunos. Ao engajarem-se nesse processo, os educandos desenvolveram também atenção e concentração, aprenderam a compartilhar, a respeitar as normas e os colegas, bem como a trabalhar em equipe.

O professor de inglês, por sua vez, ao acompanhar tal processo, aprendeu a olhar cada aluno como único, em um contexto de diversidades, e a ficar mais atento e ouvir as necessidades de cada aluno. Isso pôde apoiá-los nas suas tentativas de realização das tarefas e de compreensão do significado, não somente da matéria, mas também da vida, na cultura em que estão inseridos. O professor, pelo papel formativo que exerce, pode influenciar os alunos de maneira lúdica a perceber novas possibilidades para a solução de problemas, fazendo o uso da criatividade.

 

Referências

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Recebido em: 13/2/2018
Aceito em: 28/11/2018

 

 

1 O programa Sopro Novo é uma iniciativa da Yamaha, companhia fabricante de instrumentos musicais, para busca proporcionar educação musical para a formação de professores musicais e professores leigos para atuarem nas escolas de ensino regular. O Cursos oferecidos têm carga horária que varia de 78 a 86 horas.
2 "Sentimento que nos liga a algo ou alguém". (Dicionário Escolar da Língua Portuguesa, ABL, p. 108, 2008).

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