Pesquisas e Práticas Psicossociais
ISSN 1809-8908
Pesqui. prát. psicossociais vol.16 no.3 São João del-Rei jul./set. 2021
Editorial 16(3)
Alessandra PimentelI; Daiana Paula BaroniII; Gleidson Jordam dos SantosIII; José Rodrigues de Alvarenga FilhoIV; Maria de Fatima Aranha de Queiroz e MeloV; Victor Freitas HenriquesVI
Ialessandrapimentel@ufsj.edu.br
IIdaianapaulam@yahoo.com.br
IIIgleidson-js@hotmail.com
IVjoserodrigues@ufsj.edu.br
Vfatimaqueiroz.ufsj@gmail.com
VIvf_henriques@hotmail.com
Com olhos cansados, desejamos crer que vemos luz ao final desse túnel em que fomos colocados. Apesar de todos os pesares, das quase 600 mil mortes, da economia caótica e da pobreza que assola o país, a imunização está acontecendo e temos, sim, a esperança de sermos sobreviventes deste holocausto tupiniquim. Aos poucos e à revelia dos nossos desgovernantes, algumas coisas voltam aos seus lugares e outras, provavelmente, já não podem ser as mesmas e encontram lugares alternativos antes não cogitados. As universidades seguem com seus orçamentos minguados, a educação titubeia com jovens desmotivados pelo tempo de isolamento, professores se mantêm firmes na sua luta por uma educação pública e de qualidade e as revistas tentam marcar sua posição de resistência nesse cenário. Assim, seguimos.
Neste ano de 2021, o terceiro número da Revista Pesquisas e Práticas Psicossociais se apresenta num modelo híbrido: parte dele é composto por artigos de temáticas variadas e outra parte nos traz um dossiê composto por artigos remanescentes do número PesquisarCOM: Feminino e Feminismos na ciência. No bloco multitemático, os assuntos abordam as interfaces do trabalho da psicologia com áreas da saúde, assistência social e direitos humanos, discutindo temas como adoção, violência conjugal, vida comunitária, envelhecimento, saúde mental, educação e relações de gênero. Além desses, dois artigos nos oferecem ensaios oriundos de campos teóricos diferentes, trazendo a ousadia das misturas, dos questionamentos e das reflexões. A seguir são apresentados.
No primeiro artigo, buscando conhecer o trabalho de equipes técnicas das Varas de Infância e Juventude que realizam o processo de habilitação de candidatos à adoção no estado do Espírito Santo, as autoras Rebeca Valadão Bussinger, Danielly Bart do Nascimento e Edinete Maria Rosa, da Universidade Federal do Espírito Santo produziram o artigo "O trabalho de assistentes sociais e psicólogos nos processos de adoção". Os dados foram obtidos por meio da aplicação de questionário semiestruturado, utilizando a análise de conteúdo. As perguntas envolveram a formação profissional dos respondentes, os obstáculos e êxitos nos processos de adoção e algumas questões levantadas previamente pelos pesquisadores.
Sob o título "Violência conjugal: diferentes olhares epistemológicos e práticas psicoterapêuticas", o artigo das autorasAna Paula Sesti Becker, Ana Paula Laura Tridapalli e Simone Azeredo Bolze, da Universidade Federal de Santa Catarina, discute a violência conjugal sob diferentes epistemologias, incluindo a teoria do apego, a psicanálise e a abordagem sistêmica. O objetivo foi a reflexão sobre a formação do vínculo conjugal e as relações abusivas, problematizando conceitos relacionados a violência conjugal e apontando estratégias de intervenção terapêutica com casais que possam contribuir com os programas de prevenção a esse tipo de violência.
A partir da inspiração do Institucionalismo, em sua vertente esquizoanalítica, Geiscislaine Laís Martins, Bruna Chaves Leal, Jeane Oliveira Santos, Guilherme Dias Santos, Tereza Cristina Peixoto, do Centro Universitário UNA e Roberta Carvalho Romagnoli, da PUC-Minas, desenvolvem no artigo "Produção de Saúde: potencializar a invenção de novos modos de vida comunitária" uma problematizacão sobre processos de singularizacão relacionados a um grupo de jovens em uma cidade de Minas Gerais. O trabalho, construído enquanto pesquisa-intervenção, cartografou modos de vida, movimentos, relações de poder, em suma, diferentes linhas que atravessam e constituem o território da pesquisa, com o foco nos movimentos que afirmam potência de vida.
Visando contribuir com a realização de intervenções que desvinculem a hanseníase e o envelhecimento de antigos e problemáticos paradigmas, Ádilo Passos, da Universidade Federal do Ceará, Ludgleydson de Araújo, da Universidade Federal do Delta do Parnaíba e Raquel Belo, da Universidade Federal do Piauí, trazem em "Hanseníase e Envelhecimento: Representações Sociais dos moradores de um Hospital Colônia", uma importante contribuição sobre as representações sociais de fenômenos como a hanseníase e o envelhecimento a partir de um questionário sociodemográfico e Teste de Associação Livre de Palavras realizados com dezesseis moradores de um Hospital Colônia da região nordeste do Brasil.
Adriana Leão e Bruna Lidia Taño, da Universidade Federal do Espírito Santo, Douglas Gonçalves Jacob, do Instituto Capixaba de Ensino Pesquisa e Inovação em Saúde/Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo, e a terapeuta ocupacional Karine Pimentel assinam o artigo "Obstáculos à produção do cuidado em álcool e outras drogas na perspectiva dos trabalhadores de saúde mental: prelúdios do cenário atual?", objetivando compreender os principais obstáculos para o cuidado em Rede de Atenção Psicossocial (Raps) no âmbito do Sistema Único de Saúde, pela perspectiva dos trabalhadores da saúde mental. Pelo estudo, os autores indicam um retrocesso e possível desmonte das Raps.
"Existencialismo e o campo político carioca (1945-1955): um olhar fenomenológico-ator-rede", do autor Rodolfo Rodrigues de Souza, professor do Centro Universitário Celso Lisboa, apresenta a chegada do existencialismo de Jean-Paul Sartre ao Rio de Janeiro entre os anos de 1945 e 1955 . O autor apresenta histórias que conjugam o existencialismo e o campo político através de diferentes narrativas encontradas nos jornais cariocas "A Manhã" e "Última Hora", emergindo daí uma compreensão da apropriação do pensamento de Sartre no país, permitindo entrever características locais imiscuídas nos textos jornalísticos.
A autora Daiana Paula Milani Baroni, da Universidade Federal de São João del Rei, no artigo "Reflexões acerca da relação entre ensaio, verdade e produção de subjetividade a partir de uma perspectiva foucaultiana", apresenta algumas reflexões em torno do tema ensaio a partir de uma perspectiva foucaultiana, dialogando com autores como Larrosa, Barthes e Morin, de modo a problematizar a relação entre "sujeito e verdade" no contexto de produção científica e a programação metodológica no campo da Psicologia. O método ensaio é então discutido em um enfoque de estetização, tendo em vista os efeitos de subjetividade e o caráter de produção de verdades em uma escrita ensaística.
No artigo "Extensão universitária e atividade grupal: potencial transformador das práticas do agente comunitário", os autores Carlos Roberto Castro e Silva e Pamela Talamoni Chiaperini, da Universidade Federal de São Paulo, discutem as contribuições da estratégia grupal como ferramenta para a qualificação profissional de agentes comunitários de saúde atuantes na Estratégia de Saúde da Família (ESF) de uma região de alta vulnerabilidade, tomando como referência a Teoria Fundamentada nos Dados para sistematização e análise de resultados provenientes de diários de campo, complementados pelo grupo focal. (ainda não sabemos se estará nesta edição pois os autores não respondem)
A partir de entrevistas com profissionais de uma equipe de Atenção Básica Prisional de uma penitênciaria feminina, Paola Fagundes Pase, Alexandre Rodrigues Lucas e Angelo Brandelli Costa, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; Águida Luana Veriato Schultz e Gabriel Savaris Ignácio, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Gabriel Ibarra Zanella da Universidade de Utrecht; Bárbara Sordi Stock da Universidad de Sevilla e Renata Maria Dotta da Fundação Escola Superior do Ministério Público do RS, discutem em "Relações de gênero no trabalho em saúde em um estabelecimento prisional feminino" o papel da educação permanente para a redução do preconceito e qualificação no atendimento de usuários do SUS.
Dossiê PesquisarCOM: Feminino e Feminismos na ciência
Nesse número estão também publicados mais alguns trabalhos que foram enviados para a chamada temática "PesquisarCOM: Feminino e Feminismos na ciência", que lançamos em 2020 (volume 15.4), dando seguimento à chamada anterior, que fizemos em 2016 (volume 11.1). O fato de termos recebido, em 2020, mais textos do que imaginávamos, nos leva a afirmar que o pesquisarCOM, como direção de método na Psicologia Social, alcança diferentes pesquisas e campos problemáticos. Trata-se de afirmar que a pesquisa em psicologia se faz com os outros, numa relação de parceria e não sobre os outros, nos moldes das pesquisas de cunho extrativistas. Assim, no presente número, os leitores encontrarão mais seis artigos da referida chamada: "O homem feminino na atualidade pensado à luz da psicanálise"; "Crítica à categoria universal de "mulher": por uma articulação entre feminismo e psicanálise"; "Da Psicologia como profissão feminina à Psicologia feminista: criando novos modos e novas epistemologias a partir do feminismo negro"; "Feminismos ciborgues numa cama de gato, ciência e saberes coletivos universitários de mulheres"; "Marcas na/da pele "entre mulheres": a experiência de um processo arteterapêutico no diálogo com Feminismos e Psicologias"; "Entre apagamentos e afirmações: reposicionamentos do trabalho e da deficiência". O que reúne estes trabalhos é a afirmação feminista de que a pesquisa é uma prática situada e localizada que se tece com aqueles e aquelas com quem pesquisamos.
Como nas movimentações da vida, neste ano, além das partidas, a revista também registra chegadas. É com alegria que damos as boas vindas à professora Alessandra Pimentel e ao doutorando Gleidson Jordan dos Santos, que se juntam a nós neste trabalho de resistência que é manter o periódico vivo. Agradecemos a todos os nossos colaboradores a finalização de mais um número na esperança de tê-los conosco para continuar enfrentando o desafio de divulgar trabalhos inéditos no campo das pesquisas e práticas psicossociais.