2 1Bibliometria e análise de redes sociais: possibilidades metodológicas para a psicologia social da ciênciaUm convite à neurociência cognitiva social 
Home Page  

  • (pdf)
  • SciELO Analytics


Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

 ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.2 no.1 Juiz de fora jun. 2009

 

ARTIGOS

 

Coping em situações específicas, bem-estar subjetivo e autoestima em adolescentes

 

Situational coping, subjective well-being, and self-esteem in adolescents

 

 

Adriane S. AntoniazziI,1; Luciana Karine de SouzaII; Claudio S. HutzIII

IAustralian Bureau of Statistics, Perth, Austrália
IIUniversidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil
IIIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil

 

 


RESUMO

Coping tem sido definido como um processo cognitivo através do qual os indivíduos lidam com situações de estresse e problemas no seu cotidiano. Estudos têm enfatizado a importância de fatores situacionais com relação ao uso de estratégias de coping. Este estudo buscou identificar diferenças nas estratégias de coping utilizadas por adolescentes em três áreas específicas familiar, social e escolar, bem como avaliar correlações entre coping, bem-estar subjetivo e autoestima. Participaram deste trabalho 242 estudantes de ambos os sexos, com idades entre 13 e 20 anos, estudantes de escolas públicas e privadas em Porto Alegre. Os resultados apontaram diferenças situacionais significativas no emprego de estratégias de coping entre o domínio social e escolar social (r = 0,24) e escolar (r = 0,22). Entretanto, não foram verificadas correlações significativas. Foram encontradas correlações significativas entre coping e bem-estar subjetivo para os domínios entre coping e autoestima.

Palavras-chave: Coping; Bem-estar subjetivo; Autoestima


ABSTRACT

Coping has been defined as a cognitive process through which people manage problems and stressful situations in daily life. Researchers have emphasized the influence of situational factors on coping strategies. This study investigated differences on coping strategies used by adolescents in three specific areas: family, friends and school, and examined the relationship between coping, subjective well-being, and self-esteem. The participants were 242 male and female students of high schools in Porto Alegre, Brazil, between 13 and 20 years of age. The results pointed to significant differences between coping strategies in two areas, friends and school. Significant correlations were found between coping and subjective well-being in these two areas (r = .24 and r = .22, respectively). No significant correlations were found between coping and self-esteem.

Keywords: Coping; Subjective well-being; Self-esteem


 

 

O conceito de coping tem sido descrito e estudado enquanto um processo cognitivo através do qual os indivíduos lidam com situações de estresse e problemas no seu cotidiano (Folkman & Lazarus, 1980). Apesar de S. Folkman e R. S. Lazarus serem responsáveis pela popularização do termo, o tratamento ao conceito remete ao início do século passado. Da Psicologia do Ego, associando-o aos mecanismos de defesa inconscientes, para a abordagem cognitiva e situacional dos autores anteriormente citados, o conceito vem sendo discutido e investigado mais recentemente juntamente com aspectos da personalidade, como otimismo, rigidez, autoestima e locus de controle (Antoniazzi, Dell' Aglio & Bandeira, 1998).

Mesmo o modelo de Folkman e Lazarus (1980) sendo o mais utilizado, não é unanimidade entre os pesquisadores. Interlocutores no debate sobre o conceito de coping, Rudolph, Denning e Weisz(1995) propuseram que o fenômeno fosse considerado como um episódio constituído por uma resposta, um objetivo intrínseco e um resultado. Outra questão relevante é a distinção entre estilos de coping e estratégias de coping. Enquanto o estilo remete a uma tendência relativamente consistente de resposta a um evento estressante (de natureza, portanto, disposicional), a estratégia diz respeito ao processo para lidar com um estressor, seja na forma de um comportamento ou de um pensamento (de cunho situacional) (Antoniazzi et al., 1998).

Pesquisadores têm enfatizado a importância de fatores situacionais que influenciariam, em parte, as respostas de coping e determinariam mudanças no tipo de estratégia utilizada, segundo as características do evento estressante (Amirkhan, 1990; Hyman, Paliwal & Sinha, 2007; Stone, Greenberg, Kennedy-Moore & Newman, 1991). Segundo Lazarus e Folkman (1984), o contexto desempenha um papel fundamental na escolha das estratégias empreendidas para lidar com eventos estressantes. Nesse sentido, determinadas estratégias, consideradas adequadas para certos contextos e conseqüentemente utilizadas pelos indivíduos em determinadas situações, não serias as mesmas empregadas por eles em situações diversas. Dessa forma, estratégias empregadas para lidar com conflitos no ambiente familiar poderiam diferir, em muito, daquelas efetivamente empreendidas para administrar problemas no ambiente de trabalho ou social, por exemplo.

Um estudo longitudinal recente que exemplifica a corrente situacional para coping foi realizado por Seiffge-Krenke, Aunola e Nurmi (2009) com adolescentes alemães de 12 a 16 anos. Os autores buscaram investigar o papel de fatores situacionais e pessoais no coping e nas mudanças da percepção do estresse. Das conclusões do trabalho, destaca-se que mesmo com a detecção de variações individuais nos níveis de estresse percebido e coping, o impacto situacional foi o grande fator determinante da percepção do estresse e dos três estilos de coping estudados (ativo, internalizado e de evitação).

Para avaliar coping em contextos específicos, estudos têm se utilizado de questionários que solicitam aos sujeitos que descrevem situações de estresse as quais tenham enfrentado recentemente, bem como expliquem de que forma lidaram com o problema em questão (Band & Weisz, 1988). Estes procedimentos, bastante utilizados nas pesquisas de coping com crianças e adolescentes, possibilitam o levantamento das estratégias de coping utilizadas com referência a um evento estressante em particular (Compas, 1987; McKee et al., 2007; Mellins, Gatz & Baker, 1996). As respostas de coping obtidas através dos questionários são posteriormente codificadas, seguindo procedimentos de análise de conteúdo, e agrupadas em categorias que representam grupos de estratégias de coping, segundo critérios teóricos determinados pelos pesquisadores (Band & Weisz, 1988).

Outros instrumentos vêm sendo desenvolvidos na avaliação do coping. No Brasil, Balbinotti, Barbosa e Wiethaeuper (2006) têm trabalhado no Inventário Multifatorial de Coping para Adolescentes (IMCA-43), Noriega, Albuquerque, Alvarez e Pimentel (2003) dedicaram-se à validação da Escala Multidimensional de Estilos de Coping (EMEC), enquanto Seidl, Tróccoli e Zannon (2001) debruçaram-se sobre a Escala Modos de Enfrentamento de Problemas (EMEP). Na América Latina há também como exemplo o trabalho de Londoño et al. (2006) sobre a Escala de Estrategias de Coping Modificada (EEC-M) com amostra colombiana.

Há um considerável conjunto de pesquisas desenvolvidas com crianças sobre o estudo de eventos estressantes distintos, como a separação dos pais, hospitalização, consultas médicas e desempenho escolar. No Brasil, os trabalhos de Dell'Aglio e Hutz (2002a) e de Motta e Enumo (2004) ilustram parcialmente estes esforços em pesquisa. O estudo conduzido por Lisboa et al. (2002) abrangeu crianças vítimas de violência doméstica, comparando-as com não vitimadas, segundo diferentes situações estressantes. Já a investigação de Serafini e Bandeira (2009) abordou jovens (média de idade de 18,7 anos) portadores de HIV/AIDS para avaliar o impacto da rede de relações, do coping e do neuroticismo sobre a satisfação de vida.

Diferenças de gênero associadas ao coping vem também sendo investigadas e discutidas. Sob o efeito da socialização direcionada por papéis de gênero masculino ou feminino, meninos parecem lançar mão de estratégias de coping mais competitivas para responderem à exigência social de independência, ao passo que meninas usam mais estratégias pró-sociais. Num estudo com adolescentes brasileiros, Câmara e Carlotto (2007) observaram que as meninas tendem a buscar resolver o problema que a elas se apresenta, o que aumenta seu bem-estar psicológico. Já os meninos demonstraram que estes preferem buscar amigos próximos, pertença e ajuda profissional para lidar com eventos estressantes, o que contribui para seu bem-estar. Ainda assim, as autoras detectaram que as estratégias que melhor distinguiram os participantes por gênero foram a redução da tensão, mais usada pelas meninas, e a distração física, preferida pelos meninos. Já Eschenbeck, Kohlmann e Lohaus (2007) encontraram, em 1990 crianças e adolescentes alemães, que as meninas buscaram mais apoio social e resolver o problema, ao passo que os meninos se destacaram na estratégia de evitação, diante de situações estressantes sociais (por exemplo, na discussão com um amigo).

Antoniazzi et al. (1998) discutem os dados da literatura empírica que apontam a variação etária dos processos de coping. Além disso, destacam os autores que defendem a proposição de uma teoria específica para coping em crianças, especialmente em virtude da dependência delas a seus cuidadores, da diferença quanto aos estressores com os quais se deparam e dos recursos cognitivos de que dispõem para lidar com situações estressantes (Peterson, 1989; Ryan-Wenger, 1992).

Especificamente com respeito aos dados de pesquisa sobre coping em adolescentes, em sua revisão de estudos na área Antoniazzi et al. (1998) perceberam que adolescentes utilizam mais coping com foco na emoção do que crianças, que preferem focalizar o problema com o qual lidam. Em uma investigação com crianças e adolescentes residentes com os pais ou abrigados em instituição governamental, Dell' Aglio e Hutz (2002b) perceberam que as crianças de sete a 10 anos relataram mais o uso de estratégias de busca de apoio social, ao passo que os participantes de 11 a 15 anos preferiram a ação direta a empreender sobre o problema. Ademais, os autores encontraram que a estratégia de ação agressiva foi a mais utilizada entre os adolescentes e a segunda mais usada pelas crianças da amostra. Esses resultados foram explicados pelos autores como possivelmente relacionados à origem socioeconômica baixa dos participantes.

Dois estudos sobre coping em crianças e adolescentes portugueses são resumidamente descritos a seguir por sua relevância científica. Borges, Manso, Tomé e Matos (2006) investigaram a relação entre depressão e coping em 916 adolescentes portugueses com média de idade de 14,4 anos, na faixa dos 10 aos 22 anos. A amostra foi dividida em três grupos etários: préadolescentes de 10 a 13 anos, adolescentes de 14 a 17 anos, e adolescentes mais velhos de 18 a 22 anos. Dentre os principais resultados, os autores encontraram uma maior quantidade de estratégias de coping utilizadas por ambos os grupos de adolescentes e de adolescentes mais velhos, na comparação com os pré-adolescentes. Raimundo e Pinto (2006) estudaram as estratégias de coping e o estresse no contexto escolar em 443 crianças e adolescentes portugueses com média de idade de 12,8 anos na faixa dos 9 aos 17 anos. A amostra foi organizada em três grupos etários: de 9 a 12 anos, de 13 a 14, e de 15 aos 17 anos. Com os resultados foi possível observar que o grupo mais jovem, na comparação com os demais, utilizou menos frequentemente a estratégia de acting out, considerando-a a menos eficaz. Já o grupo intermediário destacou-se com o uso mais frequente de estratégias de isolamento social.

Embora os esforços para lidar com situações estressantes não se encontrem necessariamente vinculados aos resultados alcançados através dos mesmos (Folkman, 1984), pesquisadores têm buscado relacionar estratégias de coping a resultados mais, ou menos, adaptativos (Zeidner & Saklofske, 1996). Nesse sentido, Holahan, Moos e Schaefer (1996) sugerem que as respostas de coping representam estratégias que objetivam lidar com o estresse a partir de ações cognitivas e/ou comportamentais em dois pólos: aproximação ou evitação. As estratégias de aproximação, que incluiriam subgrupos tais como busca de apoio social e ações diretas, têm sido vistas como mais adaptativas e funcionais do que aquelas denominadas estratégia de evitação, das quais fariam parte os subgrupos negação e distração (Holahan & Moos, 1985).

Esforços mais adaptativos de coping estariam ainda relacionados a variáveis como bem-estar subjetivo e autoestima (McCrae & Costa, 1986). Estudos têm referido que os indivíduos que utilizam estratégias de coping de aproximação apresentam níveis mais elevados de autoestima e bem-estar subjetivo (Grob, Stesenko, Sabatier, Botcheva & Macek, 1999; Guedea et al., 2006; Smith, Wethington & Zhan, 1996).

O presente trabalho buscou investigar quais as estratégias de coping utilizadas por adolescentes em diferentes domínios, bem como suas relações com outras variáveis. Especificamente, os objetivos deste trabalho foram os seguintes: (a) avaliar diferenças situacionais nas estratégias de coping utilizadas por adolescentes no âmbito familiar, social e escolar; (b) investigar as relações entre estratégias de coping e avaliação dos resultados do emprego destas estratégias; (c) verificar a existência de correlações entre coping, bem-estar subjetivo e autoestima; e (d) levantar descrições das estratégias de coping utilizadas pelos participantes.

 

Método

Participantes

Participaram do presente estudo 242 estudantes, 122 do sexo masculino e 120 do sexo feminino, com idades entre 13 e 20 anos (média de 15,4 anos), alunos de escolas da cidade de Porto Alegre (RS), das quais 60% eram públicas e 40% privadas. O critério de seleção das escolas e das turmas de alunos foi o de conveniência.

Instrumentos

Para avaliar coping em situações específicas foi utilizado um questionário especialmente desenvolvido para esta finalidade. Foram utilizados três domínios distintos, entendidos aqui como áreas de convivência social, nas quais os adolescentes poderiam deparar-se com situações de estresse no dia-a-dia. Estes domínios foram denominados familiar, social e escolar. Para cada uma das três situações, os participantes descreveram uma problemática recentemente enfrentada, esclarecendo qual foi a estratégia de coping utilizada para lidar com o evento estressante em questão. Em seguida, através de uma escala de quatro pontos (1 = muito ruim; 4 = muito boa), os participantes avaliaram o quão efetiva consideraram ter sido a estratégia empregada. Finalmente, os participantes forneceram uma estratégia alternativa de coping que julgaram que poderiam ter utilizado na situação referida.

Para avaliar bem-estar subjetivo foi utilizada a adaptação brasileira da Escala de Satisfação de Vida de Diener, Emmons, Larsen e Griffin (1985) produzida pelo Laboratório de Mensuração da UFRGS (Hutz, Bardagi & Stenert, 2009). Para a avaliação da autoestima foi utilizada a adaptação brasileira da Escala de Autoestima de Rosenberg (1965), adaptada para uso no Brasil por Hutz (2004).

Procedimentos

Os participantes foram orientados para a tarefa sendo solicitados a recordar e descrever algum problema que houvessem enfrentado recentemente nas três áreas investigadas, fornecendo respostas sobre como haviam lidado com cada um dos problemas descritos. Foram ainda fornecidas orientações adicionais sobre os procedimentos de resposta aos demais instrumentos que compuseram o material de coleta de dados.

Os estudantes que participaram da pesquisa foram contatados em suas escolas, sendo informados dos objetivos do trabalho e do caráter voluntário de sua participação. Os procedimentos éticos em pesquisa com seres humanos atenderam às normas e legislação vigente quando de sua realização. Os instrumentos de coleta de dados foram administrados de forma coletiva, nas salas de aula, por assistentes previamente treinados, que garantiram aos participantes o sigilo e o anonimato de suas respostas.

 

Resultados

Com base em trabalhos anteriores (Holahan et al., 1996), as respostas fornecidas pelos participantes foram classificadas, de acordo com as estratégias de coping utilizadas para lidar com o problema, em dois grupos definidos a priori, (1) evitação e (2) aproximação. Estes dois grupos incluíram oito diferentes categorias de estratégias, baseadas no trabalho de Ryan-Wenger (1992).

As categorias que representam respostas de coping incluídas no grupo evitação foram: ações agressivas, que inclui estratégias como utilizar-se de violência física ou verbal e procurar impor sua opinião, como formas de lidar com o conflito; negação, que agrupa estratégias como ignorar ou evitar as pessoas envolvidas no conflito ou procurar esquecer o problema; distração, que inclui estratégias tais como buscar fazer atividades que distraiam o indivíduo da situação de estresse em que se encontra e aceitação, que abarca estratégias do tipo acatar ou submeter-se ao problema ou às pessoas envolvidas no mesmo, como forma de lidar com o conflito.

Durante o processo de categorização houve a necessidade de que se adicionasse uma nova categoria ao grupo evitação. Esta categoria agrega respostas do tipo nada poderia ter sido feito ou nada foi feito para lidar com o problema, que aparecem em grande quantidade nos relatos dos participantes. A nova categoria foi denominada inibição da ação e baseia-se nas proposições teóricas de Lazarus e Folkman (1984).

As categorias que representam respostas de coping incluídas no grupo aproximação foram as seguintes: reavaliação positiva, que inclui estratégias como refletir sobre o problema, buscar ver o lado positivo da questão ou tentar aprender com a situação conflitiva; autocontrole, onde encontram-se as estratégias de coping que apontam para a manutenção da calma quando frente a situações de estresse; apoio social, que engloba respostas de coping que incluam buscar auxílio externo para a resolução do conflito apelando para a família, os amigos ou pessoas que possam ajudar ou consolar o indivíduo; e ações diretas, onde encontram-se classificadas as estratégias que representam ações e comportamentos concretos que buscam modificar as circunstâncias do evento estressante.

A categorização das respostas foi realizada por dois juízes e a concordância entre eles foi de 83,7%. Os percentuais das respostas encontradas, separadas segundo os domínios familiar, social e escolar, em cada um dos grupos, bem como os percentuais para cada uma das categorias que eles agrupam, são apresentados na Tabela 1. Note-se que na Tabela 1 estão assinaladas com asteriscos as proporções que apresentaram diferenças significativas no Teste para Diferenças entre Proporções (p < 0,05). As proporções assinaladas com um asterisco diferenciam-se significativamente das marcadas com dois asteriscos.

 

 

Através de uma escala de quatro pontos, os participantes avaliaram a efetividade das estratégias utilizadas com relação ao problema que haviam descrito. Os resultados destas avaliações são apresentados na Tabela 2. Da mesma forma que na Tabela 1, os percentuais com um asterisco diferenciaram-se significativamente dos percentuais com dois asteriscos, conforme o Teste de Diferenças entre Proporções.

 

 

Após avaliarem a efetividade da estratégia utilizada, os participantes indicaram estratégias alternativas de coping para o problema que haviam descrito. As estratégias alternativas de coping citadas foram também classificadas segundo as categorias anteriormente descritas.

Os dados coletados para estratégias alternativas de coping não apresentaram nenhuma diferença significativa entre os domínios avaliados. Entretanto, Testes para Diferenças entre Proporções indicaram diferenças significativas com relação às estratégias alternativas citadas e aquelas efetivamente utilizadas pelos participantes da pesquisa no âmbito escolar, como pode ser visto na Tabela 3. Assim como nas tabelas anteriores, os dados assinalados com um asterisco diferenciaramse de modo significativo daqueles acompanhados de dois asteriscos.

Análises de correlação entre o tipo de estratégia de coping utilizada pelos participantes (evitação ou aproximação) e a avaliação da efetividade destas estratégias mostraram resultados significativos. Estes resultados, bem como as correlações encontradas entre bem-estar subjetivo e coping, são apresentados na Tabela 4 para cada um dos domínios investigados.

 

 

Foi também encontrada uma correlação significativa entre a avaliação da efetividade da estratégia de coping e bem-estar subjetivo apenas no domínio familiar (r = 0,16; p < 0,05). Não foram obtidas correlações significativas entre o tipo de estratégia de coping empregado, a avaliação da efetividade destas estratégias e a autoestima. As escalas de bem-estar subjetivo e autoestima apresentaram correlações significativas (r = 0,57; p < 0,05).

 

Discussão

Os resultados encontrados apontam para diferenças situacionais na utilização de estratégias de coping. As diferenças observadas constituem-se num indicativo de que o uso de determinadas estratégias de coping varia conforme o contexto da situação de estresse na qual o indivíduo encontrase envolvido (Compas, 1987; Seiffge-Krenke et al., 2009). Entretanto, diferenças significativas entre a utilização de estratégias de aproximação e evitação foram encontradas apenas para o domínio social e o escolar. Dado semelhante no contexto escolar foi encontrado no trabalho de Raimundo e Pinto (2006), com crianças e adolescentes portugueses, que no enfrentamento a situações conflitivas com pares preferiram estratégias ativas.

Dentre as categorias que compuseram o grupo de estratégias aproximação, a categoria ações diretas aparece como sendo mais utilizada nos domínios familiar e social pelos adolescentes que participaram desta pesquisa. No domínio escolar, são mais utilizadas estratégias de inibição da ação e aceitação. Estas categorias, que pertencem ao grupo denominado evitação, incluem estratégias como esperar que os conflitos se resolvam com o tempo, não atuando de forma ativa na tentativa de solucioná-los. Segundo Folkman e Lazarus (1980), a utilização de estratégias do tipo ações diretas é mais empregada quando a situação problemática é avaliada como modificável pelos indivíduos. A utilização de estratégias de evitação, por sua vez, tem sido associada a resultados de coping menos adaptativos (Holahan et al., 1996). As diferenças significativas observadas com relação ao âmbito escolar, com uma mais freqüente utilização de estratégias de evitação, fornecem um indicativo de que os problemas nesta área de convivência social têm sido entendidos pelos adolescentes como menos passível de mudanças, podendo ainda apresentar resultados menos adaptativos ou satisfatórios.

Nesse sentido, resultados avaliados como insatisfatórios tem sido referidos e associados ao uso de estratégias de evitação tais como ações agressivas, por exemplo (Folkman, Lazarus, Dunkel-Schetter, DeLongis & Gruen, 1986). As correlações significativas entre coping e avaliação de efetividade encontradas neste estudo apontam nessa direção, uma vez que, quanto mais estratégias de aproximação são utilizadas, mais positiva é a avaliação dos resultados feita pelos adolescentes. Novamente, diferenças puderam ser observadas no domínio escolar, que agrupou um maior número de respostas dos participantes avaliando como muito ruim ou ruim as estratégias que declarou haver utilizado para lidar com os conflitos na escola, se comparadas às avaliações feitas com relação aos demais domínios investigados.

Foram observadas ainda diferenças significativas para o domínio escolar, com relação a estratégia efetivamente utilizada e a estratégia alternativa que os adolescentes supunham, poderiam ter utilizado. Estratégias de aproximação que foram utilizadas por apenas 39,8% dos participantes para lidar com os conflitos relatados no ambiente escolar, foram citadas como alternativa de coping por 64,6% dos adolescentes, nessa mesma área. Estes resultados são similares aos encontrados com os adolescentes portugueses de mais idade na amostra do estudo de Raimundo e Pinto (2006), que observaram que as estratégias de coping ativas foram mais utilizadas e consideradas mais eficazes ("procurar lidar com os problemas ou situação estressante, centrando-se nos seus próprios recursos ou procurando ajuda exterior", p.13), embora no mesmo patamar que as do tipo acting out.

De maneira geral, pode ser observada uma tendência de aumento quanto à utilização de determinadas estratégias de coping quando se comparam a estratégia efetivamente utilizada à alternativa de estratégia de coping que poderia ter sido empregada, no evento citado pelos participantes. Embora as diferenças sejam significativas apenas para o domínio escolar, há uma diminuição na utilização de estratégias de evitação, e um aumento no percentual de respostas com relação a estratégias de aproximação em todas as áreas para a questão sobre a alternativa de coping. Este fato parece indicar um reconhecimento, por parte dos adolescentes, de que estratégias como apoio social e ações diretas poderiam ser mais adequadas ou trazer melhores resultados frente aos problemas enfrentados nos contextos abordados no estudo, especialmente o escolar.

É interessante notar que as estratégias englobadas pelas categorias distração, reavaliação positiva e autocontrole foram pouco citadas pelos participantes desta pesquisa. Estas categorias de estratégias, relevantes em outros estudos (Carver, Scheier & Weintraub, 1989; Folkman et al., 1986; Stone & Neale, 1984), aparentemente não representam significativamente as respostas de coping apresentadas pela população avaliada.

Embora diversos estudos tenham observado correlações entre autoestima e coping (Carver et al., 1989; Smith et al., 1996), não foram encontradas neste trabalho quaisquer correlações significativas entre estes conceitos. Entretanto, coping correlacionou-se significativamente com bem-estar subjetivo nos domínios social e escolar indicando que quanto mais se utilizam de estratégias de coping de aproximação, maiores são os níveis de bem-estar subjetivo relatados pelos adolescentes que compuseram a amostra deste estudo. Este resultado era esperado uma vez que tem sido substancialmente encontrado em diversos trabalhos na área de coping (Grob et al., 1999; Lazarus & Folkman, 1984; McCrae & Costa, 1986).

Os resultados deste estudo, especialmente o fato de que as diferenças situacionais observadas foram relativamente pequenas, reforçam a ideia de que se possa pressupor certa estabilidade do conceito de coping. Tal estabilidade possibilita avaliá-lo através de instrumentos próprios para a investigação de traços latentes. Ademais, torna-o passível à utilização de metodologia de elaboração e análise pertinente de medidas dessa natureza, tais como os procedimentos de análise fatorial. Mais estudos também são necessários para melhor fundamentar tais esforços. A título de exemplo, o investimento científico na avaliação das estratégias de coping diante de situações como bullying no contexto escolar ou mesmo abuso físico por parte de cuidadores (por exemplo, babás) é pertinente e socialmente relevante, com espaço amplo para investigação mediante pesquisa.

 

Referências

Amirkhan, J. H. (1990). A factor analytically derived measure of coping: The coping strategy indicator. Journal of Personality and Social Psychology, 59,1066-1074.         [ Links ]

Antoniazzi, A. S., Dell'Aglio, D. D., & Bandeira, D. R. (1998). O conceito de coping: Uma revisão teórica. Estudos de Psicologia (Natal), 3(2),273-294.         [ Links ]

Balbinotti, M. A. A., Barbosa, M. L. L., & Wiethaeuper, D. (2006). Consistência interna e fatorial do Inventário Multifatorial de Coping para Adolescentes. PsicoUSF, 11(2),175-183.         [ Links ]

Band, E. B., & Weisz, J. R. (1988). How to feel better when it feels bad: Children's perspectives on coping with everyday stress. Developmental Psychology, 24,247-253.         [ Links ]

Borges, A. I., Manso, D. S., Tomé, G., & Matos, M. G. de (2006). Depressão e coping em crianças e adolescentes portugueses. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, 2(2),73-84.         [ Links ]

Câmara, S. G., & Carlotto, M. S. (2007). Coping e gênero em adolescentes. Psicologia em Estudo (Maringá), 12(1),87-93.         [ Links ]

Carver, C. S., Scheier, M. F., & Weintraub, J. K. (1989). Assessing coping strategies: A theoretically based approach. Journal of Personality and Social Psychology, 56,267-283.         [ Links ]

Compas, B. E. (1987). Coping with stress during childhood and adolescence. Psychological Bulletin, 101,393-403.         [ Links ]

Dell'Aglio, D. D., & Hutz, C. S. (2002a). Estratégias de coping e estilo atribucional de crianças em eventos estressantes. Estudos de Psicologia (Natal), 7(1),5-13.         [ Links ]

Dell'Aglio, D. D., & Hutz, C. S. (2002b). Estratégias de coping de crianças e adolescentes em eventos estressantes com pares e com adultos. Psicologia (USP), 13(2),203-225.         [ Links ]

Diener, E., Emmons, R. A., Larsen, R. J., & Griffin, S. (1985). The satisfaction with life scale. Journal of Personality Assessment, 49,71-75.         [ Links ]

Eschenbeck, H., Kohlmann, C. W., & Lohaus, A. (2007). Gender differences in coping strategies in children and adolescents. Journal of Individual Differences, 28(1),18-26.         [ Links ]

Folkman, S. (1984). Personal control and stress and coping processes: A theoretical analysis. Journal of Personality and Social Psychology, 46,839-852.         [ Links ]

Folkman, S., & Lazarus, R. S. (1980). An analysis of coping in a middle-aged community sample. Journal of Health and Social Behavior, 21,219-239.         [ Links ]

Folkman, S., Lazarus, R. L., Dunkel-Schetter, C., DeLongis, A., & Gruen, R. (1986). Dynamics of a stressful encounter: Cognitive appraisal, coping, and encounter outcomes. Journal of Personality and Social Psychology, 50,992-1003.         [ Links ]

Grob, A., Stesenko, A., Sabatier, C., Botcheva, L., & Macek, P. (1999). A Model of Adolescents' Well-Being in Different Social Contexts. In F. D. Alsaker & A. Flammer (Orgs.), The adolescent experience: European and American adolescents in the 1990s (pp. 115-130). New York: Lawrence Erlbaum.         [ Links ]

Guedea, M. T. D., Albuquerque, F. J. B. de, Tróccoli, B. T., Noriega, J. A. V., Seabra, M. A. B., & Guedea, R. L. D. (2006). Relação do bem-estar subjetivo, estratégias de enfrentamento e apoio social em idosos. Psicologia: Reflexão e Crítica, 19(2),301-308.         [ Links ]

Holahan, C. J., & Moos, R. H. (1985). Life stress and health: Personality, coping, and family support in stress resistance. Journal of Personality and Social Psychology, 49,739-747.         [ Links ]

Holahan, C. J., Moos, R. H., & Schaefer, J. A. (1996). Coping, stress, resistance, and growth: Conceptualizing adaptative functioning. In M. Zeidner & N. S. Endler (Orgs.), Handbook of coping: Theory, research, applications (pp. 24-43). New York: Wiley & Sons.         [ Links ]

Hutz, C. S. (2004). Adaptação e normatização da escala de Autoestima de Rosenberg. Manuscrito não publicado. Laboratório de Mensuração, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil.         [ Links ]

Hutz, C. S., Bardagi, M. P., & Stenert, F. (2009). Adaptação brasileira da Escala de Satisfação de Vida. Manuscrito submetido para publicação. Laboratório de Mensuração, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil.         [ Links ]

Hyman, S. M., Paliwal, P., & Sinha, R. (2007). Childhood maltreatment, perceived stress, and stress-related coping in recently abstinent cocaine dependent adults. Psychology of Addictive Behaviors, 21(2),233-238.         [ Links ]

Lazarus, R. S., & Folkman, S. (1984). Stress, appraisal, and coping. New York: Springer.         [ Links ]

Lisboa, C., Koller, S. H., Ribas, F. F., Bitencourt. K., Oliveira, L., Porciuncula, L. P., & Marchi, R. B. (2002). Estratégias de coping de crianças vítimas e não vítimas de violência doméstica. Psicologia: Reflexão e Crítica, 15(2),345-362.         [ Links ]

Londoño, N. H., López, G. C. H., Puerta, I. C., Posada, S., Arango, D., & Aguirre-Acevedo, D. C. (2006). Propiedades psicométricas y validación de la Escala de Estrategias de Coping Modificada (EEC-M) em uma muestra colombiana. Universitas Psychologica (Colombia), 5(2),327-349.         [ Links ]

McCrae, R. R., & Costa Jr., P. T. (1986). Personality, coping, and coping effectiveness in an adult sample. Journal of Personality, 54,385-405.         [ Links ]

McKee, L., Jones, D. J., Roland, E., Coffelt, N., Rakow, A., & Forehand, R. (2007). Maternal HIV/AIDS and depressive symptoms among inner-city African American youth: The role of maternal depressive symptoms, mother-child relationship quality, and child coping. American Journal of Orthopsychiatry, 77(2),259-266.         [ Links ]

Mellins, C. A., Gatz, M., & Baker, L. (1996). Children's methods of coping with stress: A twin study of genetic and environmental influences. Journal of Child Psychology and Psychiatric, 37,721-730.         [ Links ]

Motta, A. D., & Enumo, S. R. F. (2004). Brincar no hospital: Estratégia de enfrentamento da hospitalização infantil. Psicologia em Estudo (Maringá), 9(1),19-28.         [ Links ]

Noriega, J. A. V., Albuquerque, F. J. B. de, Alvarez, J. F. L., & Pimentel, C. E. (2003). Coping em uma população do nordeste brasileiro. Avaliação Psicológica, 1,17-27.         [ Links ]

Peterson, L. (1989). Coping by children undergoing stressful medical procedures: Some conceptual, methodological, and therapeutic issues. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 57,380-387.         [ Links ]

Raimundo, R. C. P., & Pinto, M. A. P. M. (2006). Stress e estratégias de coping em crianças e adolescentes em contexto escolar. Aletheia, 24,9-19.         [ Links ]

Rosenberg, M. (1965). Society and the adolescent self-image. Princeton: University.         [ Links ]

Rudolph, K. D., Denning, M. D., & Weisz, J. R. (1995). Determinants and consequences of children's coping in the medical setting conceptualization, review, and critique. Psychological Bulletin, 118,328-357.         [ Links ]

Ryan-Wenger, N. M. (1992). A taxonomy of children's coping strategies: A step toward theory development. American Journal of Orthopsychiatry, 62,256-263.         [ Links ]

Seidl, E. M. F., Tróccoli, B. T., & Zannon, C. M. L. da C. (2001). Análise fatorial de uma medida de estratégias de enfrentamento. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 17(3),225-234.         [ Links ]

Seiffge-Krenke, I., Anoula, K., & Nurmi, J. E. (2009). Changes in stress perception and coping during adolescence: The role of situational and personal factors. Child Development, 80(1),259-279.         [ Links ]

Serafini, A. J., & Bandeira, D. R. (2009). Jovens vivendo com HIV/AIDS: A influência da rede de relações, do coping e do neuroticismo sobre a satisfação de vida. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 31(1),51-59.         [ Links ]

Smith, M., Wethington, E., & Zhan, G. (1996). Self-concept clarity and preferred coping style. Journal of Personality, 64,407-434.         [ Links ]

Stone, A. A., & Neale, J. M. (1984). New measure of daily coping: Development and preliminary results. Journal of Personality and Social Psychology, 46,892-906.         [ Links ]

Stone, A. A., Greenberg, M. A., Kennedy-Moore, E., & Newman, M.G. (1991). Self-report, situation-specific coping questionnaires: What are they measuring? Journal of Personality and Social Psychology, 61,648-658.         [ Links ]

Zeidner, M., & Saklofske, D. (1996). Adaptative and maladaptative coping. In M. Zeidner & N. S. Endler (Orgs.), Handbook of coping: Theory, research, applications (pp. 505-531). New York: Wiley & Sons.         [ Links ]

 

 

Recebido em: 09/03/09
Aceito em: 24/10/09

 

 

1 Endereço eletrônico para correspondência: adriane.antoniazzi@abs.gov.au

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License