Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia
ISSN 1983-8220
Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.9 no.1 Juiz de fora jun. 2016
ARTIGOS
Acolhimento institucional: realidade, causalidade e singularidade na psicanálise e no direito
Institutional sheltering: reality, causality, singularity in the psychoanalysis and the law
Emilie Fonteles Boesmans1; Karla Patrícia Holanda Martins
Universidade Federal do Ceará
RESUMO
O Estatuto da Criança e do Adolescente trouxe avanços ao tornar o acolhimento institucional uma medida protetiva frente à violação de direitos de crianças e adolescentes. O último relatório sobre a situação do Acolhimento no Brasil denuncia a ocorrência de violações de direito, como a não promoção da convivência familiar e a desconsideração sobre os aspectos afetivos da criança em relação à sua família. A realidade em Fortaleza não é diferente. No presente artigo, sob as perspectivas da Psicanálise e do Direito, os conceitos de realidade, causalidade, universalidade e singularidade foram analisados visando pensar as repercussões de suas compreensões sobre a aplicação da medida protetiva. Encontramos um predomínio da objetividade da pobreza em detrimento das relações entre pais e crianças na aplicação da medida protetiva. Considera-se que a Psicanálise contribui introduzindo novos elementos a serem considerados na aplicação da referida medida, como o lugar assumido pelo sujeito na estrutura familiar.
Palavras-chave: Psicanálise; Direito; Acolhimento institucional; Realidade; Causalidade.
ABSTRACT
The Child and Adolescent Statute generated advances in order to make the institutional sheltering a protective measure against the violation of the children and adolescents' rights. The latest report of the Brazilian situation accounts that violations of the law have been upheld, such as the lack of promotion of family life and the disregard of the emotional aspects of the child in relation to his/her family. The reality in Fortaleza is not different. Under the perspectives of psychoanalysis and law, the concepts of reality, causality, universality and uniqueness were analyzed with the goal of determining the impact of their understanding on the implementation of the protective measures. It was found that poverty was used by law enforcement to justify the detriment of the relationships between parents and their children, during the application of the protective measure. The psychoanalysis may contribute by introducing new elements to be considered when applying the measure, such as the place assumed by the subject within the family's structure.
Keywords: Psychoanalysis; Law; Institutional sheltering; Reality; Causality.
INTRODUÇÃO
Com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990, o acolhimento institucional tornou-se uma medida protetiva contra a violação de direitos de crianças e adolescentes, rompendo com o paradigma da situação irregular e fazendo avançar outras legislações e políticas públicas, a exemplo da Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009, relativa à adoção e parâmetros para o acolhimento, da Resolução nº 71/2011 do Conselho Nacional do Ministério Público e do Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (2006).
Em seu art. 98, o ECA elenca os casos em que as medidas protetivas devem ser aplicadas, a saber: por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; ou em razão de sua conduta. As medidas específicas de proteção devem fortalecer os vínculos familiares e comunitários (art. 100). O ECA cita, no art. 101, oito tipos de medidas, de modo não exaustivo, sendo uma delas a de "abrigo em entidade", havendo ainda uma ressalva no próprio artigo: ela é excepcional e provisória e como forma de transição para colocação em família substituta. Este trabalho tem como foco a análise dessa medida protetiva.
Diz o art. 24 do ECA que a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo per se para suspensão ou perda do poder familiar. Entretanto, os dados divulgados sobre a situação do acolhimento no Brasil denunciam a ocorrência de situações nas quais o motivo principal para o acolhimento decorre da falta de condições materiais. São listadas ainda outras violações de direitos, atestadas em nossa experiência nessas instituições: crianças vivendo na instituição há mais de dois anos, sem o direito à convivência familiar e comunitária preservados, separadas de irmãos, sem guia de acolhimento, sem Plano Individual do Acolhimento.
Diante dessa realidade de violações, perguntamo-nos: quais princípios e argumentos jurídicos sustentam a aplicação da medida de acolhimento e o consequente afastamento da família? Nossa hipótese é de que a pobreza tem sido tomada disfarçadamente como justificativa para a medida de acolhimento, como indicativo da centralidade do fato empírico em detrimento da interpretação do fato. Partindo dessa hipótese, elencamos os conceitos de causalidade, realidade, universalidade e singularidade, para a Psicanálise e para o Direito. Temos como objetivo central deste trabalho compreender a problemática gerada pela hipótese apresentada a partir da interlocução entre esses dois campos, tomando como eixo central a discussão teórica dos conceitos elencados, perfazendo uma revisão bibliográfica. Como consequência dessa discussão conceitual, somamos à discussão sobre a medida de acolhimento o imperativo da consideração da realidade psíquica da criança, aproximando a prevalência de seus direitos a sua singularidade.
Para a problematização da questão, utilizamos dados de relatórios, legislações, bem como estudos da área da Psicologia e da Psicanálise que se debruçam sobre o tema da institucionalização de crianças, tais como os de Sônia Altoé (1990/2008), Maria Eunice Fávero (2008), Luana Cuperman (2011) e Maria Lívia Nascimento (2008). Em relação ao campo do Direito, recorremos aos jurisfilósofos Miguel Realle (2001), Norberto Bobbio (2003) e Hans Kelsen (2003). Para o debate dos conceitos no âmbito da Psicanálise, apoiamo-nos em escritos de Sigmund Freud (1900/1996), Jacques Lacan (1964; 2008) e comentadores como B. Fink (1998).
CONTEXTUALIZAÇÃO DA SITUAÇÃO DO ACOLHIMENTO NO BRASIL
Em 2013, dados relativos ao acolhimento institucional foram divulgados pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Das 2.754 entidades que executam programas de atendimento institucional ou familiar, 2.370 entidades foram inspecionadas pelo Ministério Público brasileiro até março de 2013 (MINISTÉRIO PÚBLICO, 2013). Os dados apontam a existência de grandes violações de direitos das crianças e adolescentes nessas instituições e o descumprimento das diretrizes operacionais previstas para seu funcionamento em termos de estrutura física, composição da equipe técnica e de educadores e cuidadores, material, entre outros.
Entre todas as irregularidades, a que mais nos chama atenção, e que é paradigmática para nosso trabalho, é relativa aos motivos para acolhimento. Esses foram os mais diversos possíveis, sendo a negligência e o uso de substâncias entorpecentes disparadamente maiores em 2013, com 81% cada (vale lembrar que há mais de uma causa relatada, por isso o total ultrapassa 100%), seguida pelo abandono (78%), violência doméstica (57%), abuso sexual praticado por pais ou responsáveis (44%), vivência de rua (35%), carência de recursos materiais da família/responsável (26%) e submetidos a trabalho, tráfico ou mendicância (17%), entre outras. Esse é um retrato que muito preocupa por elencar causas materiais como a justificativa para a aplicação da medida protetiva de acolhimento, o que aponta que a medida não tem sido utilizada de forma excepcional.
Em Fortaleza, no ano de 2012, o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente - Ceará (CEDECA) promoveu o monitoramento que visitou 23 Unidades de Acolhimento, e a realidade encontrada foi exposta no "Relatório de Monitoramento das Unidades de Acolhimento Institucional de Fortaleza", com o Relatório relativo às inspeções realizadas pelo Ministério Público. Os dois relatórios chegaram à mesma conclusão: o descaso em relação à política de acolhimento no Estado, constatando a predominância de instituições de caráter não governamental, com condições estruturais inadequadas e inconsistência dos Planos Individuais de Atendimento (PIA). Além das recomendações do Ministério Público, o CEDECA também fez suas considerações, que destacamos aqui a de escutar a criança para a construção de seu PIA. Essa é a indicação pungente da desconsideração da opinião da criança em relação a sua vida e seu futuro, comprometendo a escuta relativa ao desejo da criança (CEDECA, 2012).
Identificamos, então, que a decisão acerca da aplicação da medida protetiva tem se sustentado em pressupostos que não problematizam a relação entre pobreza e vínculo afetivo. Considera-se que a pobreza e suas consequências podem promover entraves para o desenvolvimento infantil, sendo determinante no modo como as relações entre criança e família se constroem. Porém, do ponto de vista do sujeito, há que se considerar outras variáveis para a construção desse vínculo, como a disponibilidade da família em assumir seus papéis e sua responsabilidade e o lugar assumido pelo sujeito na estrutura familiar: trata-se então de uma realidade psíquica, e não apenas material e objetiva.
Fávero et al. (2008), em seu livro Famílias de crianças e adolescentes abrigados: quem são, como vivem, o que pensam, o que desejam, trazem dados de suas pesquisas com abrigos na cidade de São Paulo que corroboram a hipótese que lançamos, quando apontam o perfil socioeconômico das famílias que têm filhos em abrigos. Em sua grande maioria, como Fávero et al. (2008) apontam, as famílias estão excluídas do mercado formal de trabalho, têm baixa escolaridade, moram em locais que muitas vezes não têm saneamento básico, luz ou acesso ao serviço de correios, moram nas periferias, isso quando têm onde morar.
Suas pesquisas também apontam que essa é uma realidade transgeracional e que aponta para um ciclo que dificilmente é rompido com a institucionalização da criança. Esses dados são importantes, pois, não obstante sabermos da existência de situações de violência, negligência e abandono em todas as classes sociais, são as classes mais pobres o alvo da medida, quando se faz equivaler pobreza e acolhimento, equação que leva no mínimo a um discurso de incapacidade que se desdobra em tutela estatal e controle sobre as famílias pobres (Costa, 1979).
Outro importante dado da pesquisa de Fávero (2008) é apontar que as famílias participantes visitavam seus filhos, buscavam a reintegração familiar, mas não alcançavam as condições para tanto, o que demonstra que, na verdade, a medida protetiva foi aplicada pela carência de recursos materiais dos pais e/ou responsáveis e suas consequências, de modo que o vínculo, o afeto e o desejo dos pais em relação ao cuidado dos filhos não é posto como argumento principal para que a criança volte para casa, e sim, por exemplo, suas condições de trabalho, as condições de habitabilidade da moradia.
Tais condições são certamente importantes para a preservação do desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes. Porém, como já aludido anteriormente, não configuram motivo para o acolhimento, mas sim como indicativo da necessidade de família de um suporte psicossocial, que é dever do Estado ofertar por meio de serviços socioassistencias realizados nos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) ou Centros de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS).
Nossa problematização se apoia na diferente concepção sustentada pela Psicanálise e pelo Direito no que concerne às consequências que geram a pobreza na construção do vínculo entre família e criança. O que identificamos é uma superenfatização da pobreza em detrimento de outros fatores, como a disponibilidade familiar para o cuidado da criança.
Apoiamo-nos também nas contribuições de Altoé (1990/2008), que datam da época em que era vigente o Código de Menores, por serem emblematicamente atuais, já que a contradição permanece: "A Instituição atende esses meninos 'carentes' ou 'abandonados' com o objetivo de minimizar, com a internação, a situação em que se encontravam, mas isso não ocorre. O sentimento de desproteção e abandono os invade de diversas formas [...]" (Altoé, 1990/2008, p. 122). Muito embora sejam outros os problemas que se apresentam nas entidades e de ter havido mudanças significativas na legislação e no ordenamento dos serviços de acolhimento, perguntamos como a medida protetiva pode cumprir seu papel amparando essas crianças se não considerar apropriadamente a história da criança em seu aspecto subjetivo.
Também é preciso apontar, como ressalta Cuperman (2011), a complexidade envolvida na relação da criança com a família da qual é retirada, pois se misturam, nessa vivência familiar, "[...] proteção e desamparo, cuidado e abandono" (p. 89), o que torna necessário uma atenção à história da criança para "tentar compreender e resgatar o valor dessas relações, por mais crítica que possa se mostrar a circunstância do acolhimento" (Cuperman, 2011, p. 89), inclusive para que o acolhimento opere como de fato uma medida de proteção.
Diante do exposto, a discrepância entre a legislação vigente, a realidade com a qual nos deparamos e o questionamento sobre o que há de determinante ou não na pobreza, no que tange às condições de desenvolvimento, inserimos na discussão a dimensão psíquica, apoiados na Psicanálise. Abordamos então a questão por dois vieses: o do Direito e o da Psicanálise e pensamos estabelecer aproximações e distanciamentos entre os dois campos em relação aos elementos envolvidos na medida protetiva de acolhimento.
CAUSALIDADE EM DIREITO: O "DEVER-SER" E O "SER" OU ENTRE O UNIVERSAL E O SINGULAR
No campo do Direito, cada comportamento ou ação humana pressupõe uma relação indireta com a lei, sendo que esta pretende garantir a possibilidade da convivência entre os homens (Realle, 2001). Quando o Direito legisla sobre uma ação humana, esta passa a ser um fenômeno jurídico, sobre os quais os dispositivos jurídicos operam: "O Direito é, sob certo prisma, um manto protetor de organização e de direção dos comportamentos sociais" (Realle, 2001, p. 5) e "Existem tantas espécies de normas e regras jurídicas quantos são os possíveis comportamentos e atitudes humanas" (Realle, 2001, p. 5). Ressaltamos que o campo do Direito opera sobre o comportamento, enquanto ação que une dois cidadãos. Entende-se, então, o fato como ação humana. Por exemplo: uma violência física é um fato jurídico a partir do momento em que há leis que preveem sanções ou consequências para o autor da violência.
No Dicionário jurídico brasileiro, temos uma definição de fato jurídico, ou jurígeno. Citamos Santos (2001, p. 98):
[...] conforme Edmond Picard, "são os acontecimentos através dos quais as relações de direito nascem, se conservam, se transferem, se modificam, ou se extinguem"; segundo Savigny, "é todo acontecimento que determina o nascimento e a extinção dos direitos". Nota: Os fatos jurídicos são as fontes ou fatores das relações de direito.
Por exemplo: a situação de violência faz iniciar um novo tipo de relação jurídica entre vítima e agressor. A violência torna-se um fato jurídico.
Marcamos uma peculiaridade do fato em relação à lei no Direito. Nas Ciências Naturais, a lei se altera em conformidade com os fatos, quando ambos não condizem entre si. Quer dizer, existe, por exemplo, um fato: a maçã, ao soltar-se da árvore, cai. Temos uma lei, a lei da gravidade, que determina obrigatoriamente o movimento de queda dos objetos. Porém, se, por exemplo, a maça não mais cair, a lei da gravidade não seria mais válida, uma vez que outra lei explicaria o movimento dos corpos.
Já no campo do Direito, em caso de discordância entre o fato e a lei, esta permanece inalterada, pois se sobrepõe ao fato que não condiz com ela. Um exemplo: um ato de violência contra uma criança não altera a legislação sobre o assunto. É com essa realidade que o Direito opera: a realidade que existe a partir da regulação do Direito sobre as ações humanas.
Por sua vez, o conceito de causalidade se faz importante neste artigo por questionar o que se considera causa justificativa para a medida protetiva, quais os motivos que a geram. A noção de causalidade no Direito está em vários âmbitos: entre o fato e o fato jurídico, entre a norma e a sanção, por exemplo. A causalidade natural determina uma lei, determina que algo será e tem elos limitados. No Direito, essa causalidade assume o nome de imputabilidade (Kelsen, 1998) e determina que algo "deve ser" e tem elos ilimitados. A noção de imputabilidade, proposta por Kelsen, aproxima-se da noção de causalidade quando analisamos sua função: relacionar dois fatos em uma ordem, quando um depende da existência do outro; ligam-se dois elementos.
Porém, a imputabilidade deve levar em conta duas questões: a não obrigatoriedade entre um fato e outro (uma relação de deverser) e um ato de vontade. Em outras palavras, o autor afirma que há uma relação de "dever ser" entre um pressuposto (hipótese legal) e suas consequências jurídicas, ou seja, entre a lei e a sanção, a partir de um ato de vontade, quer dizer: a vontade do legislador (o que difere da lei natural, em que o ato de vontade não é necessário). A causa é então a hipótese fática e o efeito é a consequência jurídica, ou seja, o efeito se origina ou se produz na causa; a causalidade guarda, nesse caso, a noção de fonte.
A ligação entre o ato ilícito, por exemplo, e sua consequência só pode ser fundada em um dever-ser, nunca no ser, pois é isso que confere a validade da norma, pois "Na proposição jurídica não se diz, como na lei natural, que, quando A é, B é, mas que, quando A é, B deve ser, mesmo quando B, porventura, efetivamente não seja" (Kelsen, 1998, p. 66). Caso contrário, que valor teria a norma nos casos em que B, ou a consequência, não se concretizasse? A lei de nada serviria, uma vez que não normatizaria nada.
Sobre a discussão acerca da causalidade no campo jurídico, repousa exatamente o que define a ciência jurídica em oposição à ciência natural: ao considerar a conduta humana em relação entre si ou com outros fatos, temos de levar em conta um segundo princípio além da causalidade, o que, segundo Kelsen (1998), ainda não foi apropriadamente designado. Disso decorre que é preciso compreender a sociedade "como uma ordem normativa da conduta dos homens entre si" (p. 65) e é por isso que
[...] ela pode ser concebida como um objeto diferente da ordem causal da natureza. [...] Somente na medida em que o Direito for uma ordem normativa da conduta dos homens entre si pode ele, como fenômeno social, ser distinguido da natureza, e pode a ciência jurídica, como ciência social, ser separada da ciência da natureza. (Kelsen, 1998, p. 65)
A noção de imputabilidade ainda remete a outra discussão: a da liberdade. Pensamos, inicialmente, que liberdade se opõe à causalidade, ou seja, o homem livre não seria determinado por outros agentes. Porém, a ação do homem livre não seria causada por outros fatores a não ser a própria vontade do agente. A ficção da liberdade de vontade torna-se desnecessária, pois o homem é causado, é determinado, embora diante disso ele tenha escolha. Há juristas que defendem que o homem é responsável pelos atos que pode escolher e não é responsável se não o escolheu. Mas Kelsen nos adverte que "Afirmar que o homem é livre não traduz senão a sua consciência de poder agir como quer (ou deseja)" (1998, p. 68), quer dizer, isso nada nos diz sobre as causas que o impeliram a determinada ação.
O jurista vai ainda mais longe, afirmando que a consciência de agir como se deseja nada mais é do que a consciência de que nossa vontade causa a ação e que, entretanto, trata-se de outra questão, que "[...] não é a de saber se a nossa ação é causada pela nossa vontade - isso não nega o indeterminismo -, mas a de saber se a vontade é ou não causalmente determinada" (p. 68). Do mesmo modo, pensa-se que os homens são imputáveis porque têm vontade livre, já os animais, por exemplo, não a têm. Mas, na verdade, são imputáveis os homens porque as normas jurídicas tratam de ações humanas, e isso ocorre precisamente pelo fato de que, pela existência dessas normas, é possível causar vontade no ser humano de segui-las. Desse modo, a imputabilidade se dá não pela liberdade do homem, mas exatamente pelo contrário, pela possibilidade de determinação de seus atos.
Temos então que a norma jurídica não traz uma causalidade obrigatória, podendo ser cumprida ou não e, com isso, ser ou não aplicada uma sanção. Isso é bem diferente de, por exemplo, uma obrigatoriedade. Bobbio (2003) cita o exemplo da temperatura de fervura da água, que é de 100º Celsius. Em condições normais de pressão, o aquecimento da água aos 100º Celsius irá causar a sua ebulição. Isso é uma lei física. É diferente, por exemplo, quando falamos em violação de direito da criança: a sanção à família (a medida protetiva de acolhimento e suspensão do poder familiar) pode ou não ser aplicada.
Isso nos remete, então, ao fato de que a lei se propõe a ser universal, enquanto congrega a todos os cidadãos uma mesma norma (nunca universal em termos da aplicação da lei, já que a relação entre a norma e a sanção é de um "dever-ser" e não de um "ser"); porquanto a justiça pressupõe a igualdade de direitos. Nem sempre a aplicação estrita do texto alcança uma decisão justa. Damos relevo ao fato de que a aplicação da lei nunca é estrita ao texto. A lei é universal, mas sua aplicação só é justa quando aplicada singularmente no caso a caso, daí a ideia de interpretação do texto jurídico pelo juiz. Aquele que propõe a lei não a sanciona, e nem é o mesmo que a aplica.
Ao circunscrevermos a teoria ao tema da medida protetiva, observamos ser recorrente o estabelecimento de um nexo causal, entre a violação de direitos e medida protetiva de acolhimento, que considera apenas o caráter mais objetivo da pobreza e não a pobreza como apenas um dos determinantes na construção do vínculo, seja este de pertencimento à família ou à sociedade. A vinculação, nos argumentos jurídicos, se dá entre pobreza e medida protetiva, embora não necessariamente de modo explícito, mas maquiado, como nos alerta Nascimento (2008). Essa autora conclui em suas pesquisas sobe os motivos do acolhimento que a situação da negligência é, por vezes, estratégia de sobrevivência, quando, por exemplo, crianças ficam sozinhas em casa enquanto a mãe trabalha ou vai fazer compras. Quer dizer, para a autora, a situação de negligência legitima a medida protetiva de acolhimento, mas na verdade serve para mascarar uma situação de pobreza. Assim, não aparece como motivo para acolhimento a pobreza, embora uma análise mais profunda demonstre que seja ainda disso que se trata em muitos casos designados como negligência.
Ainda apontamos que de fato a medida nem sempre é aplicada, mas pomos em foco a questão da imputabilidade, como responsabilização. É possível responsabilizar e julgar como negligente uma família que deixa seus filhos sozinhos em casa para trabalhar? Será que a medida protetiva de acolhimento de fato tem servido para possibilitar à família uma reorganização para receber seu filho ou tem servido como prática segregacionista, paternalista e higienista? Que consideração há, do ponto de vista do pensamento jurídico, sobre os atos de vontade ou que tipo de determinação sofre a família violadora, e o que causaria seus atos? Vale lembrar que a negligência é entendida como um ato deliberado contra outro sujeito incapaz de cuidar de si próprio, estando excluídos, por exemplo, os atos por ignorância de suas consequências ou por impossibilidade do cuidador em oferecer o cuidado específico.
Entendemos que, quando a medida de acolhimento é aplicada em face de uma situação de pobreza e suas consequência, muitas vezes designada por negligência, desconsidera-se a causalidade como imputabilidade, como propõe Kelsen (1998), precisamente por desconsiderar a dimensão da vontade, em detrimento de uma objetividade que "é".
A RADICALIDADE DA REALIDADE PSÍQUICA: O ESTATUTO DO DESEJO E A CAUSA EM PSICANÁLISE
Com a Psicanálise, questionamos a aplicação da medida protetiva, tal como vem sendo empregada, uma vez que vemos uma tensão entre a lei e sua aplicação. Observamos que a disponibilidade para o cuidado e a promoção do desenvolvimento da criança são pensadas em sua dimensão concreta. Essa percepção pressupõe que a pobreza impediria o desenvolvimento e a disponibilidade do cuidado pela família, deixando de lado a consideração sobre a dimensão afetiva, quando a família assume uma função estruturante no desenvolvimento infantil. Isso que falta a ser considerado é a apreensão singular da situação pelos envolvidos e a dimensão afetiva.
Em termos de constituição psíquica ou de desenvolvimento infantil, vemos entrar em questão outra dimensão em relação à causa. Primeiro devemos salientar a linha entre o normal e o patológico, que na Psicanálise assume outras feições. Freud se debruçou sobre a causa (a etiologia) das neuroses desde seus primeiros estudos até suas últimas formulações psicanalíticas. A noção de causa se faz importante, pois permite perceber a nova nuance que se delineia entre o normal e o patológico. O que causaria a neurose como disfuncional seria não a cena em si, mas sua significação pelo sujeito como traumática. A fronteira entre o normal e o patológico se dissolve com essa concepção da neurose.
No texto "Estudos sobre histeria" (Freud, 1892/1996), considerado texto inaugural da Psicanálise, o tema central é a histeria e sua etiologia. A etiologia da neurose será apontada como multicausal. Em um primeiro momento, salientamos, pensávamos a neurose como sendo causada por lembranças de cenas reais (somente em 1897 é que Freud começa a se dar conta da existência das fantasias neuróticas) e o não esmaecimento dessas lembranças (quer dizer, a não descarga dos afetos ligados às lembranças), por isso o valor das reminiscências para as histéricas. Haveria ainda alguns estados peculiares que impediriam essa descarga de afetos, como os estados hipnoides, além do fator relativo ao conteúdo da lembrança. Supomos ser possível incluir nesses estados a condição peculiar de desenvolvimento da criança, ou seja, o momento de sua constituição psíquica, quando as possibilidades de trato com algumas situações se fazem impossíveis, dando ênfase ao fator infantil na formação da neurose.
Em resumo, o texto inaugural da Psicanálise propõe que a neurose seria causada por situações traumáticas e, não havendo uma descarga adequada do afeto gerado nela (uma resposta, um ato motor, etc.), ficaria impedido o esmaecimento da lembrança. Em contrapartida, os autores Freud e Breuer destacam que os próprios traumas psíquicos levam à impossibilidade de uma reação (Freud, 1892/1996). Freud também já admite um fator constitucional da neurose, que futuramente será explicado por fixações da libido, que tornaria impossível a ab-reação (Freud, 1892/1996).
O editor do texto nos adianta que, mesmo com a noção de cena real traumática como causa da histeria, já estava presente no texto a concepção dinâmica do princípio da constância - mantido mesmo após a reformulação do modo de funcionamento do aparelho psíquico no texto "Além do princípio de prazer" (Freud, 1920/1996), sob a forma do caráter conservador da pulsão. Essa concepção dinâmica permite colocar em consideração a questão das quantidades, em que, na cena traumática, o que aconteceria seria um grande afluxo de energia que não poderia ser dissipada adequadamente e causaria a neurose. Quando Freud abandona a concepção da realidade da cena, ele já tem um solo propício para incluir a questão da sexualidade infantil no tema, como fantasia. Abordaremos mais detalhadamente a questão da fantasia adiante, tomando-a em relação ao estatuto da realidade em Psicanálise.
Em sua Conferência XXIII, Freud (1916-1917/1990) atribui a causação da neurose à conjunção de dois fatores: a experiência traumática, que seria casual; e o fator constitucional, que seria a fixação da libido do adulto. Esse fator seria subdividido em dois: a constituição sexual (pré-histórica) e a experiência infantil. Continua no centro a questão das experiências infantis na causação da neurose, pois deixam atrás de si fixações da libido, que regridem na idade adulta. Em relação à realidade das experiências, Freud considera que tanto as cenas reais quanto as fantasiadas são determinantes, cabendo distinguir o peso de cada uma delas em cada caso.
Para a Psicanálise, a causa não está em relação direta com uma consequência como a ciência positiva moderna considera. Freud nos traz, no texto "Análise terminável e interminável" (1936/1996), um comentário sobre a noção de trauma apresentada por Otto Rank. Para esse teórico, o trauma do nascimento seria paradigmático de todas as experiências traumáticas. Consequentemente, a elaboração desse trauma seria o cerne da cura da neurose. Freud afirma com precisão que colocar em prática essa suposição é não fazer mais "[...] do que faria o Corpo de Bombeiros se, chamado para socorrer a uma casa que se incendiara por causa de uma lâmpada a óleo emborcada, se contentasse em retirar a lâmpada do quarto em que o fogo começara" (Freud, 1937/1996, p. 231). Extirpar a lâmpada não resolve o fogo que já se alastrou.
A releitura de Lacan vai acrescentar outras considerações à noção de causa em psicanálise, que seria, a partir de sua leitura, concebida causa como algo que "parece não obedecer a leis" (Fink, 1998, p. 79), pois há sempre um tropeço entre o evento suposto causador e o evento suposto consequência. A repetição vem romper a causalidade linear dos fatos. Em se tratando, por exemplo, de desenvolvimento ou constituição psíquica, não há determinação ou uma lei que assegure os efeitos de um determinado ambiente familiar sobre a criança. Em se tratando do sujeito e de seu porvir, trabalhamos sempre com um campo de indeterminação.
A formulação sobre a causa, ou etiologia, da neurose apresenta estreita relação com o estatuto da realidade na formação desta. É em "A Interpretação dos sonhos" (1900/1996), quando Freud apresenta sua formulação sobre o aparelho psíquico, fica claro que a realidade é sempre construída e se sustenta no desejo. O desejo é uma moção que orienta o aparelho psíquico para a percepção na realidade de um traço que permita satisfação outrora alcançada. Quer dizer: a percepção do mundo externo se orienta internamente pelas moções de desejo. Isso significa dizer que a realidade é, paradoxalmente, uma ficção, uma construção, que não deixa de ter seu caráter de verdade. Porém, essa verdade não é universal, mas singular para cada sujeito.
Inicialmente, Freud supunha a realidade das cenas causadoras da neurose. Em 1897, em cartas a Flies, ele começa a desconfiar de sua neurótica, supondo que, na verdade, as cenas que causariam as neuroses seriam cenas da fantasia. Ele reitera a dificuldade de distinguir uma da outra e radicaliza: a fantasia é uma realidade psíquica e é a realidade do sujeito (1900/1996).
Essa concepção também não é novidade, ela está presente desde o "Projeto para uma Psicologia científica" (1895/1996) e se ratifica na obra A interpretação dos sonhos (1900/1996). A experiência de satisfação seria o que, ficcionalmente, guiaria o sujeito na busca de objetos, de modo que essa procura seria inicialmente regida pelo princípio do prazer (alucinação) e, posteriormente, pelo princípio de realidade (um convencerse de que o objeto da satisfação encontra equivalente externamente, evitando o desprazer da alucinação). Assim, fica claro que a percepção da realidade é psiquicamente orientada, estando a realidade em estreito laço com o desejo.
Lacan formulará, posteriormente, a noção de objeto a, que ele considera como sua contribuição mais consistente à teoria psicanalítica. O objeto a seria exatamente o que cai da divisão do sujeito do pelo Outro, que resulta um sujeito dividido, um outro também dividido, e o objeto a, correlato à fantasia enquanto realidade psíquica (Fink, 1998). Esse objeto seria o que coloca o aparelho psíquico em movimento, é o objeto causa de desejo, quer dizer, o que impulsiona o sujeito à realização de desejo (Lacan, 1964/2008).
A Psicanálise eleva o estatuto de realidade psíquica à realidade do sujeito e, em conformidade com a sua centralidade, coloca em destaque o mito, a ficção (o próprio conceito de pulsão é uma ficção), em oposição à materialidade objetiva e ao método da ciência: observação, experimentação e falseabilidade. A verdade do sujeito é um mito, as fases subsequentes do desenvolvimento são ficções.
O mito, na obra de Freud, se apresenta ora como universal, que se apresenta para o sujeito como romance familiar, se pensarmos o mito de Édipo. Freud é o autor de um mito moderno, Totem e Tabu (1912-13), do qual extrai também considerações sobre a organização psíquica dos sujeitos e o advento da proibição do incesto. Conceber um início no qual somente haveria o princípio do prazer também é uma ficção, e Freud afirma isso em "Interpretação dos sonhos" (1900/1996). A própria fantasia é uma construção, inventada, não apreensível por completo, não toda acessível à consciência, como Freud nos apresenta em seu texto "'Uma criança é espancada': uma contribuição ao estudo da origem das perversões sexuais" (1919/1996). Toda a psicanálise se funda quando se supõe a verdade do sujeito como uma construção de um saber sobre o Inconsciente, e não uma verdade pautada nos dados sensíveis da realidade.
Quando apontamos a importância desse singular é para salientar que se trata de considerar, para cada família, algo além das condições objetivas, de perceber se, e como, as funções familiares estão preservadas, muito mais do que a conformação fenomênica da família. Lacan (1969/2003) vem apontar que a função de resíduo da família garante uma transmissão que não é da ordem da satisfação das necessidades, mas de uma constituição, e se funda sob um desejo que não é anônimo. Em suas palavras,
A função de resíduo exercida (e, ao mesmo tempo, mantida) pela família conjugal na evolução das sociedades destaca a irredutibilidade de uma transmissão - que é de outra ordem que não a da vida segundo as satisfações da necessidade, mas é de uma constituição subjetiva, implicando a relação com um desejo que não seja anônimo. É por tal necessidade que se julgam as funções da mãe e do pai. Da mãe na medida em que seus cuidados trazem a marca de um interesse particularizado, nem que seja por intermédio de suas próprias faltas. Do pai, na medida em que seu nome é vetor de uma encarnação da Lei no desejo. (Lacan, 1969/2003, p. 369)
Quer dizer, a função da família que permite o desenvolvimento e a constituição psíquica pressupõe algo da ordem do desejo. O que vai determinar a constituição psíquica é a possibilidade da preservação dessas funções materna e paterna. A preservação dessas funções vai garantir para a criança algo em torno do qual ela irá se estruturar: o desejo do Outro. Contudo, é difícil prever de que modo o sujeito se apropriará desse substrato parental: não há uma causalidade linear nem uma relação de "dever-ser", como temos no âmbito do Direito.
Por fim, citamos a questão da prevenção, muito cara à Psicanálise, pois identificamos que há um ideal preventivo subjacente à medida protetiva de acolhimento. Para a Psicanálise, essa prevenção nunca pode se dar, por exemplo, como uma prevenção médica, em que se pretende ter conhecimento da causa específica de uma doença conseguindo evitá-la. Quando pensamos na constituição psíquica, não podemos identificar o efeito de uma, ou outra, experiência do sujeito.
Em sua conferência XXIII (191619277/1996), Freud aponta que a tentativa de prever a neurose pelo cuidado infantil carece
Em sua conferência XXIII (1916- 19277/1996), Freud aponta que a tentativa de prever a neurose pelo cuidado infantil carece de validade, pois as experiências infantis são apenas um dos três elementos etiológicos da neurose, há ainda a pré-história do sujeito, bem como os fatores casuais da vida adulta. Freud ainda aponta que a criança está exposta a experiências traumáticas incontornáveis, que podem ser tidas ou não como patológicas, a depender de cada sujeito, por exemplo, o desmame. Isso nos leva a considerar que as experiências são traumáticas a depender de uma série de outros fatores, sendo difícil prever linearmente, ou ter certeza dos efeitos que, por exemplo, um acolhimento terá para o sujeito: proteção ou desamparo?
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De modo semelhante ao Direito, a Psicanálise não leva o universal da teoria às últimas consequências, de forma que a teoria, enquanto universal, de nada vale se não estiver circunscrita a um caso. O modo como se articulam as relações entre filhos e pais, teorizadas por Freud, se apresentam para cada sujeito em forma de um romance familiar (1909/1996). Nesse romance, o sujeito assume um lugar diante do Outro e o coloca em um lugar também, de modo que a cada caso se funda uma nova Psicanálise. Insistimos nesse ponto em que a realidade do sujeito é sempre construída, inventada, ficcional, não correspondendo de todo com a realidade objetiva. Dessa feita, torna-se ineficaz em seus efeitos protetivos o acolhimento decidido apenas pela consideração estrita da realidade objetiva em detrimento da consideração sobre a vinculação e o afeto da família para com a criança.
Neste trabalho traçamos um paralelo entre as noções de causalidade e realidade no Direito e na Psicanálise. Encontramos que nenhuma das duas disciplinas trabalha com a causalidade linear como encontramos nas demais ciências naturais, embora também não coincidam. Também difere o conceito de realidade. Salientamos ainda a necessidade de consideração mais detida sobre o que de fato é condição ou não para o desenvolvimento da criança, principalmente em casos em que a pobreza se torna preponderante. A pobreza é um determinante para a formação do vínculo da criança com a família, mas não é o único, há de se considerar a disponibilidade dos pais para a parentalidade e cuidado. Encontramos também uma aproximação no que tange à relação entre a lei e sua aplicação no Direito, que desliza do universal para o caso a caso, e a relação entre a teoria (universal) e caso (singular), a partir de uma atualização enquanto romance familiar.
Apontamos a necessidade de acrescentar ao paradigma de causa-efeito - "há violação de direitos, logo há incapacidade familiar, logo há medida protetiva de acolhimento" - a consideração sobre o singular. A causalidade precisa estar vinculada à singularidade da aplicação da lei e não ao universal da norma jurídica: a proteção ocorre quando se determina para cada criança contra o que a protegemos e as circunstâncias da violação de direito.
Salientamos a importância de incluir a consideração sobre o afeto na aplicação das medidas protetivas. Embora preconizado por lei, é perceptível o lugar marginal que ocupa no âmbito jurídico, no qual predominam ainda preconceitos acerca da pobreza como empecilho para construção e manutenção do vínculo afetivo entre criança e adulto cuidador.
Por fim, ressaltamos que o acolhimento é lugar de proteção em que, por vezes, a violação de direitos da criança faz imperioso o afastamento dela de sua família e, nesses casos, é indiscutível que tal medida protetiva seja aplicada, embora nunca sem considerar a interpretação que faz a criança de toda essa violação, do seu vínculo com os envolvidos. Porém, questionamos mais fortemente neste trabalho a aplicação da medida protetiva diante de situações em que pesa sobre a família a condição de pobreza e em que nem sempre ocorre violação de direitos, embora tenha se tentado equivaler, na história do Brasil, essas duas situações, o que, para nós, indica a desconsideração sobre a dimensão subjetiva em favor da realidade material e objetiva.
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Recebido em:21/07/2014
Aceito em:01/04/2016
1 Contato: emilieboesmans@hotmail.com