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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

 ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.14 no.1 Florianópolis mar. 2014

 

Viés de confirmação em entrevista de seleção: evidências em estudantes universitários

 

Confirmation bias in selection interview

 

 

Maria Emília Barroso de Oliveira AraújoI,1; Ronaldo PilatiII,1

IUniversidade de Brasília
IIUniversidade de Brasília

 

 


RESUMO

Viés de confirmação refere-se a uma tendência que os entrevistadores possuem em confirmar suas impressões prévias após a realização de entrevistas. Os objetivos dessa pesquisa são: a) analisar a ocorrência do viés de confirmação, por meio da relação entre as análises prévias e posteriores à entrevista; e b) analisar o impacto do nível de confiança dos entrevistadores no viés de confirmação ao avaliarem os candidatos. Foram aplicados dois questionários, antes e após a entrevista, para quatro entrevistadores avaliarem 25 candidatos. Os resultados demonstram que o viés de confirmação obteve maior impacto no entrevistador mais experiente. De modo geral, todos os entrevistadores se sentiram mais confiantes após a realização da entrevista do que após a primeira etapa da seleção. Além disso, a confiança não mostrou ter impacto na ocorrência do viés de confirmação. As sugestões e limitações da pesquisa são listadas, além de questões que precisam de maior aprofundamento.

Palavras-chave: Entrevista de seleção; viés de confirmação; confiança.


ABSTRACT

The perception process that occurs between interviewers and applicants has been largely analyzed in the literature. The aim of this study is to analyze the occurrence of confirmation bias in selection interviews, as well as interviewers' confidence in their evaluation of applicants. Confirmation bias refers to a tendency that interviewers have to confirm their prior impressions after conducting interviews. Questionnaires evaluated impressions of 25 applicants formed before and after interviews by 4 interviewers. The results show higher impact of confirmation bias in the more experienced interviewers. Confidence was higher after the interview than after the first selection phase. In addition, confidence had no impact on the occurrence of confirmation bias. The suggestions and limitations of the research are listed, as well as issues that need further elaboration.

Keywords: Selection interview; confirmation bias; confidence


 

 

A entrevista é um dos métodos mais utilizados em processos de seleção no Brasil (Godoy & Noronha, 2005; Torres, 1991) e no exterior (Dougherty, Turban, & Callender, 1994). Estudos internacionais têm se esforçado para investigar o processo de percepção que resulta da interação entre os candidatos e os entrevistadores, bem como sua influência nas propriedades psicométricas, ou seja, na confiabilidade e na validade da entrevista.

Segundo Posthuma, Morgeson e Campion (2002), estudos sobre entrevista de seleção têm se focado em fatores sociais, cognitivos, individuais, em medidas e os resultados advindos dela. Dentre os fatores sociais, ganha destaque o que Snyder e Swann Jr. (1978) denominam de viés de confirmação ou confirmação da expectativa. Esse tipo de viés se expressa pelo fato de a por meio da tendência do comportamento e da cognição do entrevistador serem guiados de modo a confirmar as impressões ou atribuições previamente formadas (Darley & Fazio, 1980; Dipboye, 1982, Dougherty et al.1994; Florea, 2007; Gilbert, 1994).

Embasado na teoria da profecia autorrealizadora (Darley & Fazio, 1980; Gilbert, 1994), o modelo explicativo de Dipboye (1982) afirma que as expectativas do entrevistador influenciam as expectativas e o comportamento do entrevistado, bem como a conduta do entrevistador durante a entrevista e o seu processamento cognitivo no momento da coleta de informações (Dipboye, 1982; Dipboye, Fontenelle, & Garner, 1984; Phillips & Dipboye, 1989; Swam & Ely, 1984).

As expectativas do entrevistador são moderadas, dentre outras variáveis, pelo grau de confiança em relação à informação adquirida (Phillips & Dipboye, 1989). Nesse sentido, Webster (1964, conforme citado em Tucker & Rowe, 1977) avalia que quanto maior o grau de confiança em relação à informação adquirida, maior a probabilidade desse tipo de viés acontecer. Por influenciar as expectativas dos entrevistadores, a quantidade de informações obtidas previamente acerca do candidato também está diretamente relacionada à ocorrência do viés de confirmação (Macan & Dipboye, 1988).

Dipboye (1982) classifica o viés de confirmação em cognitivo e comportamental, sendo estes considerados como possíveis mediadores dos efeitos das impressões iniciais nas decisões finais. Os vieses cognitivos ocorrem quando há distorção de informações para que as primeiras impressões sejam confirmadas devido aos efeitos da atenção seletiva e da recordação (Dipboye, 1982; Dougherty et al.1994).

Os vieses comportamentais referem-se à conduta que o entrevistador adota para confirmar suas impressões prévias sobre o candidato, podendo ser não verbais e verbais (Dipboye, 1982; Florea, 2007; Imada & Hakel, 1977). Os vieses comportamentais não verbaissão os contatos visuais, os movimentos de cima para baixo com a cabeça, o sorriso no momento da interação, a postura, a distância interpessoal e a orientação corporal (Dipboye, 1982; Imada & Hakel, 1977).

Nesse sentido, Imada e Hakel (1977) acharam um efeito significativo dos comportamentos não verbais nas impressões e nas decisões subsequentes à entrevista. Nas interações com pessoas que possuem necessidades especiais e com negros também foram encontrados comportamentos não verbais que não refletiam abertura e responsividade por parte do entrevistador. Tais comportamentos podem influenciar significativamente a performance do candidato, de forma que o seu desempenho tende a ser melhor quando os entrevistadores emitem comportamentos não verbais positivos (Liden, Martin, & Parsons, 1993). Por isso, a contaminação inadvertida das percepções pode ser evitada por meio da padronização do comportamento do entrevistador (Washburn & Hakel, 1973).

São considerados vieses comportamentais verbais as características paralinguísticas, o tempo que o entrevistador gasta na interação com o candidato e os tipos de questões destinadas a ele. De forma geral, as características paralinguísticas dizem respeito às opiniões favoráveis em relação ao candidato que são expressas em momento imediato às suas verbalizações, por meio do tempo de reação curto em relação à resposta do candidato e da baixa frequência ao interromper a sua fala (Dipboye, 1982). No que diz respeito à duração da entrevista, Macan e Dipboye (1988) e Yzerbyt e Leyens (1991) mostram que o tempo gasto em entrevistas com candidatos previamente analisados de forma positiva foi maior. Contudo, Philips e Dipboye (1989) não obtiveram relação positiva com a formação prévia de impressões favoráveis, o que demonstra ser uma questão ainda em aberto na literatura.

Snyder e Swann Jr. (1978) mostram que, quando o sujeito tem a impressão prévia sobre um indivíduo ser extrovertido, o mesmo escolhe perguntas tendenciosas para confirmar a sua expectativa prévia. Tendência similar ocorre nos casos em que o sujeito possui a expectativa do indivíduo ser mais introvertido, na medida em que o mesmo responde a perguntas influenciadas por tais premissas.

Nesse sentido, Macan e Dipboye (1988) mostram que o foco das questões pode ser negativo quando são destinadas aos candidatos com baixa qualificação. Sobre a quantidade de informações recolhidas, esta é menor daqueles candidatos sobre os quais são formadas impressões mais positivas, conforme estudo de Philips e Dipboye (1989). Não somente a quantidade de questões, mas os seus graus de dificuldade dependem da qualificação do candidato, de modo que questões com alto grau de dificuldade foram destinadas, com maior frequência, aos candidatos com baixa qualificação do que àqueles sobre os quais não foram formadas impressões prévias (Macan & Dipboye, 1988). Esses resultados corroboram o observado por Dougherty et al. (1994), que destacam a relação positiva entre a primeira impressão obtida do candidato com o uso de estilos positivos de entrevista, de voz e de oferta de trabalho.

Ademais, Binning, Goldstein, Garcia e Scattaregia (1988) sugerem que tais perguntas confirmatórias ocorram durante as entrevistas tanto com entrevistadores homens como com mulheres. Quando os entrevistadores estavam com candidatos do mesmo sexo, notou-se quantidade maior de questões enviesadas positivamente para aqueles sobre os quais há uma impressão prévia positiva. Esse tipo de comportamento confirmatório pode ter efeito maior quando é resultado da ativação automática de expectativas (Snyder & Stukas Jr., 1999).

Por outro lado, quando o entrevistador possui sexo oposto ao do candidato, houve aumento de perguntas positivas (desconfirmatórias) para candidatos que obtiveram impressões prévias negativas. Algumas explicações para a realização de perguntas desconfirmatórias perpassam pelos efeitos da leniência ou de equidade, e pelo desconforto em ser visto como preconceituoso em relação ao candidato do sexo oposto (Binning et al., 1988).

É preciso sublinhar que o viés de confirmação ocorrido por meio das questões formuladas não é consenso na literatura. Trope e Bassok (1982) chamam atenção para a estratégia diagnóstica na coleta de informações. Diferentemente do que ocorre no viés de confirmação, o sujeito procura diagnosticar o indivíduo selecionando questões que guardam características relacionadas às suas hipóteses, bem como às hipóteses alternativas. Além do mais, Snyder e Stukas Jr. (1999) apontam que, no contexto no qual o objetivo principal é selecionar ou avaliar indivíduos, há maior probabilidade dos entrevistadores não eliciarem automaticamente comportamentos confirmatórios. Inclusive, estudos confirmam que aqueles avaliadores que tinham maior motivação em analisar o candidato de modo acurado foram os mais propensos a eliciar comportamentos desconfirmatórios (Neuberg, 1989).

Assinala-se, ainda, o que Gilbert (1994) aponta como consequência do viés de confirmação, a maior probabilidade de o candidato confirmar premissas do entrevistador, visto que não foram dadas oportunidades para o primeiro demonstrar o contrário ou algo diferente do esperado pelo segundo. Assim, o viés pode impedir que informações acuradas sejam obtidas e que avaliações fidedignas sejam realizadas, o que resulta em julgamentos não válidos (Dipboye et al. 1984). Contudo, a validade da entrevista depende de outras características como o grau de estruturação, o tipo de perguntas utilizadas (situacionais ou comportamentais) e se é conduzida por indivíduos devidamente treinados (Bozionelos, 2005; Hough & Oswald, 2000).

Até o presente momento, não foram encontradas pesquisas brasileiras sobre a ocorrência do viés de confirmação em entrevistas de seleção, o que torna desejável que estudos desse tipo sejam realizados de forma a analisar o processo de formação de impressão em entrevistas de seleção. Dessa maneira, o objetivo dessa pesquisa é avaliar a ocorrência do viés de confirmação por meio da relação entre as análises prévias e posteriores à entrevista, bem como a confiança dos entrevistadores ao avaliarem os candidatos. Para tanto, foi realizado um estudo empírico exploratório a fim de levantar eventuais implicações a serem consideradas em estudos posteriores sobre o assunto.

 

MÉTODO

Para alcançar os objetivos da pesquisa, foi realizada uma pesquisa com entrevistadores de uma empresa júnior que seleciona novos membros para sua diretoria por meio de um processo seletivo composto por 3 etapas: recrutamento, simulação e entrevista. A pesquisa abrangeu as etapas da simulação e da entrevista por competência, posto que durante a simulação os membros da diretoria de Recursos Humanos (RH) da empresa observam o desempenho dos candidatos formando, assim, a primeira impressão sobre eles. Este trabalho foi desenvolvido respeitando-se os princípios éticos de pesquisa com seres humanos, como consentimento informado e anonimato dos participantes.

Participantes

Para o presente estudo utilizou-se amostra de conveniência composta por 4 entrevistadores de 25 candidatos que almejavam fazer parte da empresa júnior do curso de psicologia. Os entrevistadores são, em sua maioria, do sexo feminino, sendo apenas um do sexo masculino. Possuem entre 20 e 22 anos, sendo que dois estão no 3º e 5º semestre e os outros no 7º e 9º semestre do curso de graduação. Três participaram duas ou mais vezes como entrevistadores e avaliadores em simulação.

Instrumentos

As impressões prévias dos candidatos foram coletadas por meio de questionários com 27 itens. Os itens contemplam, de modo geral, a avaliação que o entrevistador faz após a simulação, em relação ao ajuste do candidato ao cargo pretendido, às competências exigidas e à confiança em relação às suas repostas. A avaliação para cada item se deu em uma escala Likert de 5 pontos, que variou de 0 a 4, com as extremidades ancoradas em "Não demonstrou" e "Demonstrou muito", respectivamente, para 23 itens. O item que versa sobre o ajuste do pretendente ao cargo pretendido foi ancorado em "Não se ajustou" (0) e "Ajustou-se muito" (4); a escala do item que aborda o quanto o selecionador recomenda o candidato para aquele cargo varia de "Não é recomendável" (0) até "É recomendável" (4); e os itens que tratam sobre a confiança em recomendar o indivíduo e nas suas respostas tiveram suas extremidades ancoradas em "Não estou confiante" (0) e "Muito confiante" (4). Os itens de ajuste e de confiança foram acrescidos aos itens relacionados às competências necessárias para integrar a empresa júnior, anteriormente elaborados pelo RH.

Os itens dos questionários anteriores e posteriores à entrevista guardavam correspondência entre si. Ou seja, os itens do segundo questionário são similares aos do primeiro, divergindo somente no que tange ao momento do processo seletivo que remetia aos entrevistadores avaliarem os pretendentes após a entrevista.

Procedimento

A simulação, que visa avaliar os pretendentes ao cargo quanto às competências, foi realizada pela equipe de RH durante dois dias pelo período da manhã, com duração de cerca de 4 horas cada dia. A simulação consiste em atividades programadas e relacionadas ao trabalho, dando subsídio para avaliação dos comportamentos dos indivíduos.

Logo após a simulação, foi aplicado o primeiro questionário para cada selecionador avaliar cada candidato. Após a entrevista, o segundo questionário foi aplicado e os entrevistadores o preencheram antes de discutir ou conversar sobre o candidato entrevistado.

Em ambos os momentos, os entrevistadores levaram entre 5 e 10 minutos para o preenchimento dos questionários para cada candidato. Convém destacar que, no momento da entrevista, os avaliadores tinham em mãos um roteiro de perguntas confeccionado por eles mesmos. Os entrevistadores não precisavam seguir o roteiro à risca, caracterizando uma entrevista semiestruturada. Destaca-se ainda que as entrevistas eram feitas em dupla, sendo que apenas um entrevistador interagia frequentemente com o candidato.

Os dados foram analisados com o software estatístico SPSS (versão 16.0), sendo obtidas as estatísticas descritivas de cada item: média (M) e desvio padrão (DP). Foram realizadas análises Teste-T (t) com cada par de itens para cada entrevistador.

Por fim, foi realizada uma ANOVA (Análise de Variância) para detectar a diferença do grau de confiança entre os avaliadores após a entrevista. Como não foi detectada a homogeneidade (ao nível de p<0,05) da amostra pelo teste de Levene para os itens que versam sobre confiança em recomendar o candidato para aquele cargo e nas suas respostas (p=0,045 e p=0,02, respectivamente), o teste Dunnett T3 foi utilizado para apontar quais entrevistadores se diferenciavam dos demais.

 

RESULTADOS

A análise da Tabela 1 permite verificar as médias e os desvios padrão para cada item do questionário. A maior média encontrada em momento anterior e posterior à entrevista (M=3,68 e DP= 0,51; M=3,70 e DP=0,65, respectivamente) diz respeito ao item que avalia a adequação da comunicação do candidato às normas da língua portuguesa, enquanto a menor média antes e depois da entrevista (M= 0,48 e DP= 1,09; M=1,94 e DP= 0,91, respectivamente) diz respeito à habilidade do candidato de fornecer feedback aos demais participantes.

Com vistas ao primeiro objetivo da pesquisa, a verificação de indícios que sinalizem a ocorrência de viés da confirmação, foi realizada uma comparação de médias par a par - Teste-T - entre os itens que avaliavam as competências dos candidatos antes e depois da entrevista para cada entrevistador (ao nível de p <0,05).

Nota-se que o ajuste ao cargo não sofreu variação significativa nas avaliações dos Entrevistadores 1 e 4, diferentemente do observado nas avaliações dos Entrevistadores 2 e 3. Logo, é provável que o viés da confirmação tenha influenciado os entrevistadores 1 e 4 nesse quesito.

Em relação aos itens que avaliam as competências dos candidatos, é observado que o Entrevistador 4 confirmou mais suas avaliações prévias em relação aos demais entrevistadores, visto que dos 23 pares de itens, 19 não apresentaram diferenças significativas. Contudo, não pode ser dito o mesmo para o segundo entrevistador com mais tempo de experiência (Entrevistador 1), já que este apresentou diferenças significativas em 9 pares de itens, similarmente ao Entrevistador 2. O terceiro, por sua vez, apresentou diferenças entre as avaliações prévias e posteriores à entrevista em 6 pares de itens.

No que diz respeito à confiança da avaliação, todos os entrevistadores se sentiram mais confiantes após a realização da entrevista em comparação ao momento posterior à simulação. Contudo, apenas o Entrevistador 2 apresentou diferença significativa nesse quesito.

No que tange ao cumprimento do segundo objetivo, avaliou-se o grau de confiança na decisão final do entrevistador em relação ao candidato. A análise da Tabela 4 mostra que o Entrevistador 1 apresentou maior grau de confiança (p<0,05) em relação aos demais, com exceção do Entrevistador 3, cuja diferença não foi significativa. E, por fim, relativo ao grau de confiança em suas respostas, apenas o Entrevistador 1, o segundo mais experiente, se diferenciou significativamente dos demais.

 

DISCUSSÃO

Com relação aos resultados das análises prévias e posteriores à entrevista, é observado tanto o viés de confirmação ou de expectativa (Darley & Fazio, 1980; Dipboye, 1982, Dougherty et.al, 1994; Gilbert, 1994; Snyder & Swan Jr., 1978) quanto a avaliação diagnóstica explicada por Trope e Bassok (1982).

O viés de confirmação em relação ao ajuste do candidato ao cargo é observado nos entrevistadores com mais tempo no curso de graduação e com mais experiência em processos seletivos, podendo ser um indicativo de que quanto maior a experiência do selecionador, mais propenso ele estará em cometer esse tipo de viés. Uma possível explicação para tal resultado se deve ao fato do profissional mais experiente eliciar comportamentos confirmatórios de forma mais automática, tendo em vista sua larga atuação em processos seletivos. Tal eliciação ocorreria mesmo se o profissional estiver em um contexto no qual haja maior probabilidade dos indivíduos utilizarem estratégias desconfirmatórias para melhor avaliação do sujeito em questão (Snyder & Stukas, Jr., 1999). Contudo, é interessante averiguar se, de fato, o efeito da automaticidade é maior do que a força da situação na qual os entrevistadores se encontram.

Ainda em relação ao ajuste do candidato ao cargo, a avaliação diagnóstica pode ter sido mais utilizada pelos entrevistadores com menos tempo no curso, visto que houve diferença significativa entre a avaliação prévia e posterior à entrevista em grande parte dos itens. Uma possível explicação para tal resultado é que o roteiro de perguntas utilizado apresenta questões mais neutras, ou seja, que não fazem o candidato responder em uma determinada direção. Esses tipos de perguntas propiciam a consideração, por parte do entrevistador, não somente de suas hipóteses prévias, mas também de suas alternativas.

Dentre as limitações enfrentadas nesse estudo, há a falta de controle em relação às perguntas realizadas durante a entrevista pelos avaliadores, o que poderia indicar com mais clareza a utilização de perguntas confirmatórias, desconfirmatórias e neutras. Nesse caso, o ideal seria a observação das entrevistas para que houvesse não apenas a compilação das perguntas feitas, mas também a classificação por juízes quanto ao seu grau de viés. O controle poderia ter sido efetivo durante a simulação, já que podem ter ocorrido breves comentários entre os avaliadores que pudessem ter enviesado a percepção do comportamento do candidato, bem como sua opinião sobre ele, o que prejudicou a análise prévia à entrevista. A análise das respostas foi prejudicada devido ao fato do questionário utilizado não ter apresentado variabilidade e independência local para a realização da Análise Fatorial, o que também constitui outra limitação a ser pontuada.

 

Tabela 2

 

 

Tabela 3

 

No que diz respeito à avaliação das competências, apenas o entrevistador mais experiente apresentou avaliações constantes. Uma justificativa é que com o aumento da idade e, por consequência, da experiência do entrevistador, pode haver o aumento da probabilidade de criar expectativas e utilizar mecanismos (comportamentais ou cognitivos) que as endossem, tais como a realização de perguntas enviesadas ou recordação de informações fornecidas pelos candidatos (Dipboye, 1982; Dougherty et al., 1994). Entretanto, esse resultado deve ser analisado com cautela, pois estudos anteriores apontam para um efeito covariante relativamente baixo desse tipo de variável (Posthuma, Morgeson, & Campion, 2002).

Sobre os demais entrevistadores, é provável que eles tenham mudado de ideia sobre o candidato após a discussão em grupo, o que explica a alteração de suas avaliações antes e após a entrevista. Ainda, pode ter ocorrido que eles ou seus colegas tenham utilizado perguntas diagnósticas e/ou desconfirmatórias durante a entrevista. As perguntas desconfirmatórias, em especial, podem ter sido utilizadas devido ao fato de serem estudantes entrevistando estudantes, como resultado do efeito da leniência (Binning et. al. 1988).

É conveniente destacar que a quantidade de sujeitos analisados constitui aspecto limitador, visto que foram analisadas respostas de apenas quatro entrevistadores. Esse problema também persiste em pesquisas publicadas sobre entrevista de seleção, o que faz com que o poder estatístico seja menor em amostras com poucos sujeitos (Hough & Oswald, 2000).

Ademais, apenas dois sujeitos entrevistaram os 25 candidatos. Ou seja, nas avaliações prévias todos os avaliadores se manifestaram em relação a todos os candidatos, o que não aconteceu na avaliação posterior à entrevista, visto que apenas duas avaliações foram obtidas nesse momento para cada candidato. Assim, sugere-se que entrevistas no formato de painel sejam investigadas, nas quais todos os avaliadores emitam parecer sobre todos os candidatos, em momento anterior e posterior à entrevista, pois aquelas tendem a ser mais imparciais que aquelas realizadas por um entrevistador apenas (Torres, 1991).

O fato dos sujeitos não serem formados, sendo ainda estudantes de graduação, constitui outra limitação a ser considerada. Seria interessante replicar tal estudo em profissionais devidamente formados para verificar se, de fato, resultados similares são encontrados. Atrelada a essas considerações, a limitação sobre o tempo de experiência é aqui destacada, visto que o profissional experiente é aquele que realizou mais do que três processos seletivos. Mas, como a amostra se trata de estudantes, mais que três processos seletivos realizados sinalizam alguma experiência com entrevistas de seleção.

A própria área de formação, por sua vez, pode ser analisada, visto que nesse estudo apenas participaram entrevistadores que serão futuros psicólogos. Desse modo, pode ser interessante a participação de sujeitos de outras áreas de formação, como administradores e economistas.

Destaca-se, por fim, a análise das respostas dos entrevistadores quanto à sua confiança em relação às suas respostas ao questionário, bem como em relação à decisão final de rejeitar ou não o candidato. Diferentemente do encontrado por Webster (1964 conforme citado em Tucker & Rowe, 1977), o Entrevistador 4 apresentou a menor média de confiança em suas respostas em relação aos outros.

O motivo pelo qual tal média tenha sido a menor pode ser devido às suas opiniões terem se confrontado com as dos demais colegas antes da entrevista, o que faz com que ele tivesse menos confiança em suas respostas. De forma semelhante, ao comparar-se a média desse entrevistador com os demais em relação à confiança na rejeição ou não do candidato após a entrevista, percebe-se que a média não se diferiu dos demais colegas menos experientes, destacando-se apenas em relação ao segundo mais experiente.

Apesar de a diferença dos itens que versavam sobre confiança na avaliação não ser significativa para a maioria dos entrevistadores, todos se sentiram mais confiantes após a entrevista. Por ser uma possibilidade o entrevistador interagir com o candidato, sendo que o primeiro tem como principal objetivo tomar decisões acuradas sobre o segundo (Dipboye, 1982, conforme citado em Florea, 2007), é compreensível que após a entrevista os sujeitos da pesquisa tenham se sentido mais confiantes em suas análises, corroborando o papel importante dessa técnica em processos seletivos (Godoy & Noronha,2005).

A partir do presente estudo pode ser mostrado que há indícios de que tanto o viés de confirmação quanto a estratégia diagnóstica podem ser utilizadas pelos entrevistadores. A entrevista mostrou ser uma técnica que tende a prover segurança aos entrevistadores no momento da decisão final, apesar de ser propensa a vieses na obtenção e recordação de informações. Por isso, se faz necessária a investigação desses tipos de vieses e de sua influência negativa sobre as características psicométricas da entrevista.

 

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Recebido em: 14.11.2011
Aprovado em: 12.03.2013

 

 

1 Universidade de Brasília, Instituto de Psicologia, Departamento de Psicologia Social e do Trabalho. Campus Universitário Darcy Ribeiro ICC Sul Instituto de Psicologia Asa Norte 70910-900 - Brasília, DF - Brasil Telefone: (61) 33072625 Ramal: 608 Fax: (61) 3272-2293. E-mail: maria.emiliaraujo@gmail.com; rpilati@unb.br