Introdução
Iniciamos as reflexões propondo pensar sobre o desalojamento provocado pela vivência da pandemia de covid-19 em todas e todos nós. Quer -estejamos na condição de cidadãs e cidadãos que buscamos apoio psicológico para lidar com essa experiência de “desterro” tão disruptiva, quer estejamos no lugar de profissionais atendendo a demandas da população para lidar com as dificuldades oriundas de tal experiência, fomos, todas as pessoas, afetados de algum modo. Não há um outro lado; nessa perspectiva, estamos de um mesmo lado, embora com diferenças profundas nas condições socioeconômicas de acesso a bens e serviços para a travessia desses tempos tão difíceis.
Como profissionais da Psicologia, deparamo-nos com uma situação que nos convocou a rever posições e conhecimentos pautados em determinantes apriorísticos e a assumir de maneira radical um posicionamento que diz do nosso constante lugar de aprendizagem. Independentemente da área em que atuamos e dos pressupostos que adotamos no vasto campo da Psicologia, tivemos a possibilidade de nos guiar, também, pelas orientações do Ministério da Saúde, por meio da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e pelas regulamentações e diretrizes implantadas pelo Sistema Conselhos - Conselho Federal de Psicologia (CFP) e Conselhos Regionais de Psicologia (CRPs).
As reflexões e pistas aqui evidenciadas são oriundas de escutas clínicas de coletivos de trabalho realizadas durante o ano de 2020, no contexto da pandemia de covid-19 e do consequente trabalho home office, a partir de demanda de uma instituição sediada na cidade do Recife. Com fundamento teórico-metodológico na Cartografia concebida por Deleuze e Guattari (1980/2011), procuramos intervir nesses coletivos levando em conta, também, orientações contidas em cartilhas expedidas pela Fiocruz (2020a, 2020b, 2020c, 2020d), as regulamentações do CFP, por meio das Resoluções CFP n. 11/2018 e n. 04/2020, além de discutir com nossos pares, de modo a viabilizar a criação de um ethos possível para dar os primeiros passos em direção ao inesperado.
Uma construção em que a cartografia se destacou como uma rica e oportuna abordagem, em face de sua proposição de abertura ao devir, da ideia de produção conjunta de conhecimento entre a/o profissional ou equipe que propõe a escuta e o coletivo participante, e da dimensão ético-estético-política que orienta o fazer clínico cartográfico. Assim, fomos forçadas a abrir mão de nossos pressupostos mais enraizados, do conforto do setting planejado para as diversas modalidades de escuta clínica que realizamos, e tivemos de reinventar fazeres e espaços de acolhimento, em face do sofrimento desencadeado pela situação inusitada que vivemos.
Nessa direção, encontramos no trabalho de Laura Quadros et al. (2020) uma perspectiva de acolhimento, reconhecendo-o “enquanto uma prática de cuidado, constituindo-se, assim, na afirmação da vida e da saúde num contexto em que o outro é posto como fonte de ameaça, e a morte está sendo trivializada” (2020, p. 3). As autoras propõem ressignificar a ideia de acolhimento, tomando-o como “um dispositivo de afeto e afetações” - um recurso interventivo que se estabelece, nesse momento, por meio de relações mediadas por aparelhos eletrônicos.
Comungamos com a concepção de acolhimento defendida pelas autoras, apostando na possibilidade de encontros potentes com os coletivos de trabalho, trilhando pistas cartográficas já conhecidas, além daquelas que vão surgindo na caminhada. Partilhamos, também, do entendimento sobre a banalização da morte. O presidente do país, além de adotar uma postura pública de descrédito, em relação às orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do então primeiro-ministro da saúde de seu governo, quanto ao uso de máscaras e ao distanciamento social, foi ineficiente no tocante ao papel do governo federal na criação de uma política de prevenção e combate à pandemia de covid-19.
Mais do que isso. De acordo com relatório elaborado pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário (CEPEDISA, 2021), da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), houve uma intenção governamental em disseminar a covid-19 no Brasil, apostando-se na ideia da imunidade de rebanho pelo contágio, e não pela vacinação, conforme preconiza a OMS. A disposição de salvar a economia, em detrimento de um programa para salvar vidas, além das ações no intuito de promover a imunidade de rebanho por contágio, leva-nos a acreditar no exercício da necropolítica, conforme define Mbembe (2003/2018), como ação deliberada do governo federal. “O sistema capitalista é baseado na distribuição desigual da oportunidade de viver e de morrer . . . Essa é a lógica do sacrifício que sempre esteve no coração do neoliberalismo, que deveríamos chamar de necroliberalismo”, afirma o filósofo camaronês (Folha de São Paulo, 2020). Para Mbembe, trata-se de um sistema que sempre se pautou por um “aparato de cálculo”, classificando as pessoas, de modo que umas valem mais do que outras. As menos valiosas podem ser descartadas, o que aponta, por sua vez, para um recorte de raça, classe social e gênero.
Por conseguinte, além de lidarmos com o medo da finitude, que nos ameaçou de modo consciente ou inconsciente, e com a impossibilidade de vivermos a experiência do luto em suas intensidades ritualísticas as mais diversas, defrontamo-nos com a ausência de uma política pública no âmbito federal que pudesse minorar o nosso sentimento de desamparo. A falta de uma diretriz nacional que produzisse um alinhamento de ações nas esferas estaduais e municipais trouxe grande prejuízo à população. De acordo com os dados da Johns Hopkins University & Medicine, temos nos mantido como a nação que contabiliza o terceiro lugar em número de casos confirmados e o segundo em número de óbitos, vítimas da covid-19. Até o fechamento deste artigo (17/07/2021), contávamos com um total aproximado de 19,31 milhões de casos confirmados e de 540,4 mil óbitos, consoante os dados da situação epidemiológica da covid-19 no Brasil, divulgados pelo Ministério da Saúde em portal específico para essa finalidade, igualmente registrados no Portal da Johns Hopkins University & Medicine.
Possibilidades de agenciamentos coletivos de enunciação
Antunes, em entrevista reproduzida no portal da Rádio Brasil de Fato (2020), reafirma suas ideias sobre o que vem chamando de “pandemia do capital”. Segundo o professor e sociólogo do trabalho, a pandemia de covid-19, mesmo não sendo responsável pela profunda crise no mundo do trabalho, escancarou os resultados dos caminhos trilhados pelo capitalismo, especialmente no século 21. Ele se refere ao desenvolvimento de “uma forma de trabalho pautada pela combinação complexa e nefasta entre alto índice de digitalização das tecnologias de informação e comunicação”. Os efeitos dessa combinação impactam sobre a classe trabalhadora, empurrando-a “para a flexibilização, a terceirização, e mais acentuadamente nesse período, a informalidade e a intermitência”.
Diante de cenário tão desestabilizador, vimos eclodir campanhas de solidariedade em todo o território nacional, alimentando a esperança de que poderemos reaprender a nos organizar para combater a pobreza e atitudes preconceituosas de toda ordem: racistas, homofóbicas, de desvalorização da vida, que emergiram e alcançaram maior visibilidade nesses tempos de pandemia. Acreditamos e torcemos para que as novas subjetividades possibilitadas pelos agenciamentos coletivos de enunciação possam renovar as formas de luta por um mundo melhor, com espaço para a manifestação de nossa pluralidade racial, de gênero, de religião, entre outros marcadores, com equidade.
Tais agenciamentos dizem dos processos de criação produzidos no entre, ou seja, na relação entre todas as pessoas e os múltiplos agentes. No caso da crise sanitária atual, ações de governo, evolução pandêmica, descobertas da ciência, condições social, econômica e cultural da população, entre tantas matrizes agenciadoras que fazem parte de nosso território e se entrecruzam para a produção de algo. Um caminho possível a partir da noção de rizoma, de Deleuze e Guattari (1980/2011), esse traçado de linhas que se misturam e se conectam em todas as direções, no emaranhado do jogo de forças presente em todo e qualquer campo, em face das heterogeneidades que o compõem.
Agenciamentos coletivos de enunciação que produzem novas subjetivações e processos de reterritorialização, possibilitando a abertura ao novo, ao sentimento de estranheza que nos habita, além da compreensão do não saber e da necessidade de, desde as pessoas mais simples àquelas especialistas, aprendermos juntas. E, nessa perspectiva, a Cartografia se constitui como uma abordagem bem oportuna, em função do princípio rizomático que lhe dá sustentação.
Sobre a Cartografia
O termo é oriundo da geografia e, nessa esfera do saber, acompanhamos a concepção de Joly (1985/2013, p. 11). O geógrafo francês compreende a cartografia como uma linguagem, uma vez que “exprime, por meio do emprego de um sistema de signos, um pensamento e um desejo de comunicação com outrem”.
Já nas ciências humanas, o termo foi apresentado por Deleuze e Guattari (1980/2011, p. 29) como um dos princípios do rizoma, em contraposição ao princípio de decalcomania. O mapa, a cartografia, é da ordem da criação, da vida pulsante que experimentamos por meio das conexões nos vários campos pelos quais transitamos; é da ordem dos deslizes, dos desvios, da fluidez; é da ordem do devir, do rizoma, da pluralidade de conexões; é do curso da performance, que se constitui no “ato”, a partir da interação com o meio; é da força do outramento. O princípio do decalque, por sua vez, diz respeito à reprodução em detrimento da produção - da criação com.
Os mapas cartográficos não se constituem como circuitos fechados. Eles são instáveis, fluidos, operam no inter, em constante devir. Não representam realidades, mas produzem realidades em um incessante movimento. Compõem-se por meio de alianças e lutas que constituem relações de força; por isso, são instáveis, em face das multiplicidades existentes nos campos de força que empurram, deslocam, absorvem, traçando novos acordos, novas configurações cartográficas.
A partir dessas referências, na busca de compreender e intervir nas situações em que somos demandadas com fundamento na Cartografia, temos nos guiado por pistas que vão se apresentando no caminho. Algumas vão surgindo na própria caminhada e, muitas vezes, dizem respeito às especificidades do campo em que estamos transitando. Outras, já percorridas e desenhadas por pessoas pesquisadoras estudiosas do assunto, podem ser novamente trilhadas quando se mostram importantes para nosso tema de estudo ou experiência de intervenção. Assim, temos a obra Pistas do método da cartografia, em dois volumes, o -primeiro organizado por Eduardo Passos, Virgínia Kastrup e Sílvia Tedesco (2015), e o v. 2 (2014) por Eduardo Passos, Virgínia Kastrup e Liliana da Escóssia, como um estudo consistente, ao qual estamos sempre recorrendo; porém, atentas aos vestígios que vão nos levando a percorrer outras pistas na tessitura de cada novo mapa cartográfico.
Dentre todas as pistas enunciadas na obra organizada por esse coletivo docente e pesquisador, traremos seis delas (as seis primeiras a seguir). Embora não estejamos tratando, neste artigo, de uma pesquisa no sentido estrito, podemos pensá-la no sentido amplo, pois, a cada intervenção, pesquisamos também, uma vez que perscrutamos sobre o nosso fazer, avaliando, discutindo a melhor forma de intervir, escutando e observando o que o campo nos aponta. Ademais, podemos considerar, ainda, como um ato de pesquisa, escrever sobre a experiência; discutir sobre a potência da abordagem cartográfica a partir de uma intervenção, como estamos fazendo nesse momento.
Dito de outro modo, se “toda pesquisa é intervenção”, consoante afirmam Eduardo Passos e Regina Barros (2015, p. 17), em face da “inseparabilidade entre conhecer e fazer, entre pesquisar e intervir”, podemos pensar que toda intervenção é, também, uma pesquisa, na medida em que nos faz questionar procedimentos, reafirmar outros e agregar um quantum de conhecimento extraído da experiência de intervir.
Assim, transitamos por pistas já conhecidas que se entrelaçam e fomos encontrando outras, próprias dos contextos espaço-temporais das intervenções. Não sem hesitar, recuar, mas novamente seguir, por compreendermos a importância de incorporar novos atalhos, ampliando as possibilidades de conexões e agenciamentos. Dentre as novas pistas que emergiram na escuta coletiva de grupos de trabalho nesses tempos pandêmicos, traremos as cinco que se tornaram mais consistentes.
As pistas do caminho
A cartografia como método de pesquisa-intervenção
Por meio dessa pista, Eduardo Passos e Regina Barros (2015, pp. 17-31) explicam que não há uma prescrição metodológica para a pesquisa-intervenção fundamentada na cartografia; no entanto, não se trata de um trabalho sem rumo. Apenas propõem uma inversão do termo, pois não seguimos passos estabelecidos para chegar a um determinado fim - um metá-hódos -, mas nos orientamos por pistas, observando sempre os efeitos de nossas ações sobre o coletivo objeto da pesquisa-intervenção. Um processo que se pauta, portanto, pela constante interlocução com o campo, possibilitando transitar pelos atalhos que só são descobertos no percurso, favorecendo a construção e a reconstrução dos caminhos.
A proposição é para que adotemos um hódos-metá, ou seja, sabendo para onde estamos caminhando, que optemos por desenhar e redesenhar o percurso ao longo da caminhada, com abertura para as possibilidades que se apresentam e aprendendo em conjunto com o coletivo participante da pesquisa-intervenção. Nessa perspectiva, o conhecimento se dá na concomitância do fazer - conhece-se fazendo e se faz conhecendo. Uma pista fundamental, ao nosso ver, para quem se propõe a trabalhar com a cartografia. Mais imprescindível no contexto atual, uma vez que, de certa forma, todas as pessoas, mesmo sem o saberem, tiveram de adotar, em alguma medida, um hódos-metá para reorganizarem suas vidas, ante as experiências de desalojamento provocadas pela pandemia de covid-19.
O funcionamento da atenção no trabalho do cartógrafo
Virgínia Kastrup (2015, pp. 32-51), ao propor a pista que trata da atenção no trabalho cartográfico, reporta-se à “atenção flutuante” descrita por Freud e ao “reconhecimento atento”, formulado por Bergson, aliando esses conceitos a outras referências contidas “no campo das ciências cognitivas contemporâneas” (pp. 32-33). Para Freud, a atenção flutuante é o modo como o analista deve fazer a escuta no exercício da clínica psicanalítica, não privilegiando qualquer dos elementos particulares do discurso e deixando que seu próprio inconsciente funcione da forma mais livre possível nessa escuta (Laplanche & Pontalis, 1987/1998). Já o reconhecimento atento, segundo Bergson (1939/1999), seria pautado por movimentos de recondução ao objeto, utilizando as lembranças-imagens - aquelas análogas à percepção presente - que retornam fazendo uma fusão com essa compreensão atual, abandonando, para isso, muitos detalhes. Sobre estudos recentes alusivos à cognição, Kastrup remete-se à perspectiva construtivista para nos fazer entender que não há coleta de dados no campo, mas sim uma produção conjunta de dados.
Nas experiências que serviram para a discussão neste artigo, havia algo de novo sobre o funcionamento da atenção - algo que tivemos de aprender nesses tempos, embora já praticado por profissionais que conhecíamos, em situações específicas de atendimentos individuais. Não tínhamos acesso, até então, a experiências de escutas clínicas de coletivos de trabalho na modalidade on-line. Uma escuta que exigiu uma atenção, para nós, mais desafiadora, em face do enquadramento de cinco a nove pessoas em uma tela de computador. Ademais, não pudemos fazer uso de outros recursos que interferem nos processos de afetação de modo significativo, como o tátil, o olfativo, por exemplo.
Ainda, tivemos de dividir a atenção entre a tela e o chat, espaço importante em que as pessoas interagiam, tornando-se, em alguns casos, o ambiente em que se manifestavam mais frequentemente. Julgamos importante mencionar esses aspectos, pois eles nos remetem, também, às nossas dificuldades em fazer a escuta coletiva mediada por aparelhos eletrônicos, tratando-se, portanto, de uma aprendizagem conjunta, como preconiza a cartografia.
Uma outra questão bem mais desafiadora, pois não estava em nosso alcance resolvê-la, diz respeito às interrupções nas falas por conta das paralisações inesperadas nos serviços de internet. Como se tratou de algo discutido antecipadamente, estávamos, todas as pessoas participantes do processo, cientes dessa possibilidade, o que muito contribuiu para minimizarmos as perdas decorrentes da quebra de uma narrativa, nas vezes em que isso aconteceu. Contudo, todas essas situações exigiram uma atenção mais focalizada, referendando as formulações da autora sobre a complexidade do tema da atenção, pois, se em um primeiro momento nos reportamos à atenção sem focalização, ela “pode assumir diferentes funcionamentos: seletivo ou flutuante, focado ou desfocado, concentrado ou disperso, voluntário ou involuntário, em várias combinações . . .” (p. 33).
Cartografar é Acompanhar Processos
A partir desse enunciado, Barros e Kastrup (2015, pp. 52-75) destacam que, ao chegar ao campo, vamos encontrar processos em andamento, e isso nos exige uma disposição para a integração, para habitar um território até então desconhecido. Nas experiências em -comento, o território se apresentava como duplamente desconhecido, por se tratar de novos espaços concretos a transitarmos, mas, também, de um ambiente virtual - um território a explorar. Fez-nos necessário, portanto, uma disponibilidade para vivenciarmos o estranhamento - atitude que demarca a abertura para o novo - deixando-nos levar, em alguma medida, pelos campos de força, de modo a compor com as heterogeneidades presentes nesses campos.
A disponibilidade em flanar por esse novo habitat, alinhada a outros elementos característicos das demais pistas, constituiu-se como um rico recurso, ajudando-nos a mapear a rede de forças e a compreender as conexões, com atenção para as modulações e movimentações constantes nessa rede. Movimentações em plena vivência da pandemia de covid-19 e do consequente distanciamento físico, mas viabilizadas por outra rede - a internet -, constituída como agente de importância crucial para as composições que desaguaram nos agenciamentos coletivos de enunciação.
Cartografar é Traçar um Plano Comum
Em associação às ideias das pistas anteriores, Kastrup e Passos tratam da pista do Comum (2014, pp. 15-41), lembrando que, ao transitarmos por um território desconhecido, o plano comum deverá ser desenvolvido e acessado por todas as pessoas envolvidas, levando-se em conta as singularidades, além dos interesses de cada grupo. Um plano comum, de modo a possibilitar o protagonismo das diferenças, é o que mobiliza e garante a participação do coletivo.
O acesso a um plano comum comporta uma dimensão paradoxal, uma vez que busca a construção de um mundo comum, comportando as heterogeneidades. Uma produção que procura abarcar o que é comum e o que difere, promovendo, assim, um certo tensionamento. Trata-se de algo que não está dado - só acontece na experiência e “porta o duplo sentido de partilha e pertencimento” (p. 21), por isso, é tão importante para o engajamento no processo.
Construir o plano comum foi fundamental para garantir o engajamento de grupos de trabalho em uma atividade que não era obrigatória e que, por vezes, afastava as pessoas de suas rotinas e demandas com prazos exíguos para conclusões. Um comum que possibilitava a participação coletiva com a inclusão das dimensões “fora-grupo” tão singulares e heterogêneas, concorrendo, desse modo, para a produção de um duplo efeito. Por um lado, gerava bem-estar individual e, por outro, repercutia nos grupos que, na ação de acolher as diferenças, juntavam-se e se fortaleciam. Assim, vivenciamos partilha, pertencimento e engajamento na construção coletiva de conhecimento/soluções para o enfrentamento de dificuldades pessoais ou do trabalho, contingenciadas pela vivência da pandemia.
A Formação do Cartógrafo é o Mundo: Corporificação e Afetabilidade
Na pista da formação, Laura Pozzana (2014, pp. 42-65) lembra, a partir de escritos de seus pares, que o aprendizado cartográfico “se faz sempre por inscrição corporal, e não apenas por adesão teórica” (p. 42). Não ignoramos o fundamento teórico; ele está presente, dialogando com a experiência, mas é o resultado desse diálogo com o campo que se constitui como uma aprendizagem, a qual se inscreve no corpo como lugar de afetabilidade - de corporificação da experiência.
Como nas demais pistas, o processo de formação na cartografia se dá a partir da abertura para o devir, com atenção ao plano de forças coletivo em movimentação no território que passamos a habitar. Constitui-se como um aprendizado, resultante de múltiplas práticas que vão produzir “habilidades e rigor ético” (p. 49). Essas habilidades se configuram como uma espécie de conhecimento tácito, em contrapartida ao conhecimento alcançado pela técnica. E o lugar depositário desse conhecimento é o corpo inteiro, no qual reflexão e ação se inscrevem em sua totalidade.
Com base nesses pressupostos, podemos dizer que a cada experiência pautada nos fundamentos cartográficos, vamos afinando o instrumento. A inserção e a busca de aprofundamento na cartografia têm nos possibilitado in-corporar habilidades que refletem a ideia de composição assegurada “por práticas compostas por afetos em trânsito” (p. 49), auxiliando-nos na propositura de estar e produzir com o outro e não sobre o outro.
O Ethos da Confiança na Pesquisa Cartográfica: Experiência Compartilhada e Aumento da Potência de Agir
A pista da Confiança, enunciada por Sade et al. (2014, pp. 66-91), está relacionada à construção e ao manejo dos vínculos com as pessoas participantes do trabalho. Uma concepção que se distancia da ideia de pensar ações deliberadas para tais finalidades. Antes, comporta a disponibilidade para a afetação e, por consequência, está associada às transformações mútuas que advêm dessa afetação. Novamente, a ideia de compor, de compartilhar: “con fiar - fiar com, tecer com, composição e criação com o outro/outrem” (p. 69).
A construção de um plano de experiência compartilhada, em que interesses e pontos de vista plurais possam estar postos, e sejam acolhidos e valorizados exatamente naquilo que diferem, produz afetações, novas conexões. O entendimento é o de que essa construção fomenta o ethos de confiança, aumentando a potência de agir.
E como se dá essa construção em um ambiente em que as ressonâncias corporais precisam encarar o desafio de transitar por rede de computadores? Que sentidos aprendemos a acessar para que os afetos pudessem fluir nessas condições, em coletivos com perfis tão díspares, oriundos de lugares tão distintos e, por vezes, tão distantes fisicamente? São questões que ainda nos atravessam e sobre as quais estamos discutindo e buscando respostas. Podemos, contudo, reafirmar, de pronto, a imprescindibilidade da abertura ao devir; da abertura para a fluidez dos afetos. Condição que implica na disponibilidade para conhecer; para se deixar levar pelo encantamento diante de narrativas tão singulares; para aprender com. Tudo isso compõe afetos e afetações que contribuem para a produção do ethos de confiança e aumento da potência de agir.
A Cartografia dos Novos Tempos de Planejamento e de Experimentação dos Modos de Ser e de Fazer
O desalojamento provocado pela pandemia de covid-19 nos convocou a nos reorganizarmos em novos modos de existir e habitar o mundo - processos de subjetivações contínuos, contingentes, produzindo modos de ser e de fazer a todo momento. Atravessamentos que nos levaram a lançar mão, constantemente, do conhecimento tácito, de modo a buscar referências que pudessem nos oferecer alguma moldura.
Nesse contexto, passamos a ouvir, com muita frequência, que os tempos dos planejamentos mudaram; que era necessário planejar para curto prazo, monitorar e avaliar de modo mais recorrente. Trata-se de um novo aprendizado do corpo, uma vez que precisamos abrir mão dos caminhos conhecidos, dos espaços em que trabalhávamos, dos cronogramas mais rígidos, enfim, dos marcadores constituintes dos sistemas que davam alguma organização à vida - por vezes já encarnados -, acessíveis à maioria de nós que mantemos vínculos de trabalho regulamentados.
A compreensão da vulnerabilidade que nos circunda parece ter sido fundamental para que pudéssemos avançar nesses tempos. A partir das experiências em nossos próprios grupos de trabalho e naqueles que acompanhamos, vimos o quanto tivemos de juntar forças, discutir e decidir a partir do coletivo. O quanto tivemos de apurar a escuta, acolher as diferenças, deixar reverberar pelo tempo necessário a produção de algo, as indagações que ouvimos e nos fizemos. O quanto tivemos de aprender novas linguagens, derrubar paredes; o quanto tivemos de nos reinventar, tornar mais flexíveis as linhas historicamente enrijecidas e salvaguardadas com zelo, visando à manutenção de determinadas posições.
Especificamente em relação às pessoas trabalhadoras que escutamos, vimos que a disponibilidade para vivenciar o estranhamento, para se entregar à experiência de desalojamento, uma vez ancorada pelos grupos, parece ter produzido um aquecimento nos processos criativos; uma maior coletivização da ação e do pensamento, gerando saber compartilhado e mudanças de contexto. Dito de outro modo, a abertura ao devir possibilitou a produção de agenciamentos coletivos de enunciação com múltiplas ressonâncias, a partir das infindáveis conexões rizomáticas.
Cartografia do Luto: Novas Possibilidades Organizativas Diante da Dor da Perda
De um modo geral, todos e todas tivemos perdas em razão da pandemia causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), quer de parentes, quer de pessoas amigas ou mesmo daquelas que admirávamos. Em princípio, vimos que a disposição para discutir e acolher, coletivamente, os sinais e sintomas que emergiram em decorrência dessas perdas, parece ter contribuído para a produção de novos modos de viver a dor e os ritos, ante a finitude. Sabemos da importância da vivência dos rituais fúnebres, muito diversos em nosso país, em razão de nossa pluralidade cultural, religiosa e das condições socioeconômicas da população, que também interferem nessas situações. Esses rituais de despedida se constituem como uma experiência organizadora, tanto para as pessoas da família como para aquelas que estão incluídas nas amizades próximas, ajudando-as na elaboração do luto e retomada da vida.
Diante do sofrimento e da impossibilidade de honrar nossos ritos de despedida dos entes queridos, vimos florescer novas maneiras de vivenciar as cerimônias fúnebres e o luto. As afetações mútuas na experiência da dor produziram saídas com vistas a minorar os efeitos da solidão desses momentos tão difíceis. Assim, assistimos a iniciativas virtuais de toda ordem, desde a criação de sítio na internet para homenagear as vítimas da covid-19, a rituais fúnebres e religiosos.
Contudo, vimos que a possibilidade de acesso a esses recursos escancara, mais uma vez, como o marcador da pobreza impacta as vidas humanas desde o primeiro até último suspiro, especialmente em uma situação de pandemia como essa que estamos vivendo. E isso se -estende para as experiências alusivas aos ritos funerários. Em princípio, as imagens grotescas dos sepultamentos em valas comuns, veiculadas nos noticiários de TV, chocaram-nos de modo incomum e pareciam querer reafirmar a busca pela “naturalização” de um processo fundamentado em uma lógica genocida - em uma racionalidade necropolítica, conforme já mencionado.
Ainda assim, não podemos deixar de valorizar as iniciativas encontradas para minorar os efeitos da ausência dos rituais fúnebres costumeiros. Urge, porém, que o governo federal, por meio do Ministério da Saúde, adote medidas, se não reparadoras (não é possível reparar os danos causados pela negligência à saúde do povo brasileiro), que atendam ao que preconiza a ciência, tanto na prevenção - testagem, vacina e medidas de distanciamento físico - quanto no tratamento das pessoas infectadas com o novo coronavírus. Se, mesmo assim, persistirem óbitos, que os familiares das vítimas da covid-19 possam acessar, se lhes fizerem sentido, as novas formas ritualísticas criadas com o intuito de auxiliar na vivência e elaboração do luto.
Cartografia em Movimento Relativa à Divisão de Trabalho Doméstico e de Cuidados com as Crianças em Contextos Específicos
A disponibilidade para vivenciar o estranhamento pode ser traduzida como entrega, inclusive, a entrega ao silêncio interior - parar e dar-se conta dos afetos em trânsito. O retorno a casa para quem tem condições de poder exercer as atividades na modalidade home office parece ter produzido isso: um reencontro consigo. Mesmo diante da sobrecarga e do estresse causado pela necessidade de responder às demandas institucionais, por vezes sem as condições apropriadas e o preparo técnico adequado para isso. Ter a oportunidade de escutar o que diz o silêncio, perscrutar a intimidade de um reencontro familiar possibilitado pela vivência do trabalho remoto, nesses tempos de pandemia, parece ter trazido o reconhecimento de aspectos importantes alusivos às relações com o parceiro ou parceira, com os filhos e as filhas, com a divisão de trabalhos domésticos, entre outros.
Em nossa experiência, acolhemos narrativas de pessoas trabalhadoras que dão conta de algo em marcha; alguma movimentação dos parceiros em busca de suavizar, em alguma medida, a sobrecarga feminina. O incômodo e o desconforto, em face de uma compreensão mais encarnada a esse respeito, parecem ter dado lugar a um movimento efetivo dos parceiros (em casais héteros) em direção à divisão do trabalho doméstico e de cuidados com as crianças (filhos e filhas). Mudanças nos quadros há muito pendurados nas paredes, deixando sombras atrás em razão da ausência de luz nos espaços em que há longo tempo foram fixados, podem significar o início ou o fomento de um processo de transformação nas relações - novas subjetividades em construção.
É importante ressaltar, contudo, que tais afetações se produziram em contextos específicos e para os quais havia uma condição dando alguma moldura aos grupos - trabalhavam em uma mesma organização, ou seja, comungavam de valores e propósitos assumidos institucionalmente, ainda que pertencessem a classes sociais distintas e possuíssem diferentes graus de escolaridade. Em outras palavras, não se trata de algo observado com qualquer pretensão generalista, contudo, achamos interessante mapear essa pista, uma vez que apareceu de modo recorrente nos espaços de discussão com as pessoas trabalhadoras que -pudemos escutar, nesses tempos de pandemia.
A Escuta Cartográfica como um Recurso de Dimensão Ético-Estético-Política
Poderíamos dizer que a escuta cartográfica tem o objetivo de possibilitar a fluidez dos afetos, de modo a dar passagem àquilo que está em vias de diferir, àquilo que está próximo de se tornar linguagem - as inúmeras formas de linguagem possíveis, inclusive a linguagem do silêncio, dos sinais e sintomas, das artes de um modo geral, entre tantas. Uma escuta que se move na direção de acolher a diferença; que não busca consensos homogeneizantes, ao contrário, possibilita o ressoar das diferenças, dos discursos e das posturas dissonantes.
Um recurso bem oportuno para nossos tempos, em que grupos minoritários lutam para sair da invisibilidade, dessa vez com o compartilhamento e algum compromisso de outros não minoritários. Instáveis também, mas em movimento, posto que estão em busca da abertura para o devir. “Um mundo embrionário em vias de nascer”, como afirma Suely Rolnik, em webinar conduzido por Valdete Severo (2020). Um mundo em que não se suporta mais a “ideia delirante de uma hierarquia imaginária de cor, de gênero, de classe social” ou de qualquer forma de opressão.
O acolhimento coletivo dos sentimentos oriundos dos diferentes modos de habitar, em razão da diversidade representativa nos grupos, também contribuiu para que se firmassem novos pactos, fossem buscados novos caminhos, novas estéticas de existência, de modo a sustentar outros posicionamentos nos espaços pelos quais se transita. Um deslocamento que atesta as dimensões ética, estética e política imbricadas na escuta cartográfica, uma vez que possibilita uma construção permanente de si no processo de fazer escolhas, no trânsito pelas linhas que se vai trilhando ao longo da vida. Movimento que funda novos ethos constantemente, indicando uma renovação estética que se constrói e se reconstrói o tempo todo, e faz afirmar novas posições no mundo, na relação com o outro, assegurando, assim, uma dimensão política a esse processo.
A Cartografia como Fundamento Teórico-Metodológico para a Escuta Clínica do Trabalho
Por último, trazemos como pista em que estamos trafegando - a ideia de utilização da cartografia como fundamento teórico-metodológico para a escuta clínica de grupos de trabalho, priorizando as questões relativas ao contexto laboral. Frisamos a ideia de priorizar (e não de delimitar), porque, de outro modo, estaríamos nos distanciando do princípio maior que demarca a escuta clínica cartográfica - a abertura ao devir. Ademais, sabemos que não há fronteiras bem demarcadas entre o pessoal e o profissional. Nos espaços de trabalho, as questões pessoais irrompem com força, assim como o mundo do trabalho impacta a vida fora dele, derrubando a ideia fantasiosa de que podemos separar o que diz respeito a cada um desses domínios. Mais uma falácia que a vivência da pandemia de covid-19 vem desconstruindo, uma vez que trouxe para muitas pessoas, literalmente, o trabalho para dentro de casa.
A proposta de nos apoiarmos teórica e metodologicamente na cartografia para a realização da escuta clínica do trabalho nasce da intensificação de nossos estudos teóricos e empíricos, os quais têm fornecido elementos que nos mostram o alcance dessa abordagem. Trata-se de uma experiência recente, mas que já nos aponta para a possibilidade de produção de agenciamentos coletivos de enunciação bem oportuna, em conformidade com esses tempos tão disruptivos.
Os espaços de reflexão construídos com apoio na cartografia, sempre de modo muito peculiar em cada grupo de trabalho, têm possibilitado que os matizes culturais, religiosos, geográficos, para citar alguns, os quais dizem respeito aos modos de ser e de estar no mundo, encontrem um locus de manifestação privilegiado. E, por compreendermos o humano como uma unidade indissociável, em que o pessoal impacta o profissional e vice-versa, não há delimitações para se tratar, nesses espaços, somente de questões relativas ao trabalho, embora não se constitua como terapia de grupo. A intenção é priorizar o trabalho, sim, mas compreendendo que, se algo de pessoal fluiu no grupo, é porque as afetações decorrentes dos fluxos emergentes poderão produzir alguma coisa em prol do coletivo, interferindo, por conseguinte, no ambiente laboral.
A criação desses espaços de reflexão em ambientes institucionais (ainda que virtuais) tem o intuito de propiciar, às pessoas participantes, a expansão da capacidade de afetar e de serem afetadas, de modo a movimentar, alterar a direção dos ventos e, assim, oxigenar a atmosfera e fazer florescer novas possibilidades de resolução para questões do cotidiano de trabalho. Os relatos nas escutas que fizemos com base na cartografia, nesses tempos de pandemia, dão conta de uma ampliação da capacidade de ressoar com o outro, produzindo, assim, uma maior abertura comunicacional que favorece os ambientes laborais - um dado que nos estimula a seguir com o objetivo de sedimentar uma prática de escuta clínica cartograficamente posicionada nos contextos de trabalho.
Considerações Finais
A pandemia de covid-19 trouxe à tona algo que sempre soubemos, mas que, não raro, nos esquecemos, diante da crescente valorização dos aspectos cognitivos da inteligência, do desenvolvimento da racionalidade científica, do avanço tecnológico, entre outras características de nossos tempos. Diz respeito à nossa condição de vulnerabilidade ante o que irrompe sem dar tempo de nos prepararmos, constituindo-se, por vezes, como um trauma coletivo. Esses fenômenos/acontecimentos (epidemias, pandemias, abalos sísmicos, entre outros) escancaram nossa condição de finitude e as desigualdades sociais, mas trazem, também, a oportunidade de renovação, de construção de novos modos existir, mesmo que as estruturas microfascistas, sempre presentes nos indivíduos e nos grupos, segundo Deleuze e Guattari (1980/2011), tentem a todo custo restabelecer a ordem do que lhes é familiar - a manutenção das condições de privilégio, a manutenção do status quo.
O fato é que, durante a vivência da pandemia, vimos processos embrionários, alguns de longa gestação, romperem a casca do ovo, nascerem ou se reafirmarem com força. Movimentos que pediam passagem - que resistiram por muito tempo, mantendo-se em pé, contrariando a gravidade. Movimentos que seguiram por linhas de força, possibilitando composições - novas subjetividades e agenciamentos coletivos de enunciação. Algo possível, a partir da abertura para o devir, quando renunciamos ao roteiro previamente estabelecido e nos lançamos ao imprevisível, ao descontínuo, ao estranho em nós.
Nessa direção, a Cartografia, como campo das ciências humanas, oferece recursos potentes para lidarmos com o novo, com aquilo que pede passagem. Ante a ausência de premissas rígidas, ela se sustenta em pressupostos, em pistas que construímos a cada caminhada, seguindo os vestígios deixados pelas mudanças de paisagens - ainda que possamos fazer uso de algumas pistas já mapeadas por pessoas estudiosas da temática, como o fizemos. Contudo, sempre atentando para as modulações de cada campo, por vezes alterando o percurso dessas pistas já mapeadas e, sobretudo, trilhando novas pistas, posto que se tratará, invariavelmente, de um campo novo - mesmo que estejamos revisitando-o -, em razão das especificidades espaçotemporais que o circundam.
As intervenções realizadas com fundamento na abordagem cartográfica partem do pressuposto de que é acompanhando os processos em andamento, implicando-nos nele, que podemos conhecê-los e, ao mesmo tempo, produzir com. Nessa interação, melhor dizendo, nessa composição, estará em jogo nossa capacidade de afetar e ser afetada ou afetado, na condição de profissional ou equipe responsável pelo trabalho. Uma intervenção, portanto, que se faz por regime de afetação, de modo a nos expandirmos em nossas habilidades compreensivas e comunicacionais e contribuirmos para a expansão de todo o coletivo objeto da intervenção.
A escuta clínica de coletivos de trabalho, utilizando-nos da cartografia, durante a pandemia de covid-19, com seus efeitos maximizados pela ameaça do desemprego estrutural, da crescente força de trabalho informal, do enfraquecimento das organizações representativas das classes trabalhadoras, entre outros aspectos, tem nos mostrado a engenhosidade dessa abordagem. Os processos de ampliação da capacidade de afetação mútua, incluindo-nos nessa construção, evidenciaram, durante o percurso interventivo, o aumento da potência de agir coletivamente, na produção de saídas possíveis para lidar com os impasses vividos pelos grupos de trabalho nesses tempos.