Psicologia Ensino & Formação
ISSN 2177-2061 ISSN 2179-5800
Psicol. Ensino & Form. vol.8 no.2 São Paulo jul./dez. 2017
https://doi.org/10.21826/2179-58002017815362
Artigos
O Uso do Mapa Conceitual na Formação de Futuros Professores em Disciplina de Estágio Supervisionado: um Relato de Experiência
The Use of Conceptual Maps in the Education of Future Professors in the Course of Supervised Practice: an Experience Report
El Uso del Mapa Conceptual en la Formación de Futuros Profesores en Asignaturas de Prácticas Tuteladas: un Relato de Experiencia
Natália Moraes GóesI, Evely BoruchovitchII
I Universidade Estadual de Campinas. Apoio CAPES.
II Universidade Estadual de Campinas. Apoio CNPq.
Resumo
Pensar na formação do futuro professor requer não só pensá-lo como professor, mas também, como estudante, por isso, promover a autorreflexão sobre a própria aprendizagem torna-se essencial. Por reconhecer a importância desta prática e por acreditar que ela não seja comum entre futuros professores, propõe-se o trabalho com as estratégias de aprendizagem. Assim sendo, o objetivo deste estudo é descrever um dos encontros oriundo da disciplina de Estágio Supervisionado I em que foi trabalhado o Mapa Conceitual como uma estratégia de ensino e de aprendizagem, com alunos advindos de diferentes cursos de Licenciatura. A disciplina ocorreu no segundo semestre de 2017 e contou com a participação de 22 estudantes. De modo geral, foi possível observar que os estudantes compreenderam as diferentes formas pelas quais o mapa conceitual pode ser utilizado e conseguiram pensar em situações em que poderiam utilizá-lo para aperfeiçoar a própria aprendizagem e a de seus futuros alunos.
Palavras-chave: mapas conceituais, aprendizagem significativa, futuros professores, estratégias de aprendizagem.
Abstract
Thinking about the education of future professors requires not only thinking about him/her as a professor, but also as a student. Therefore, it is essential to think about their very learning process. The work with learning strategies has been proposed due because of the relevance of such practice, and believing it is not current among future professors. Therefore, the goal of this study is to describe the meetings of the course Supervised Training 1 where the Conceptual Map was presented as a teaching and learning strategy for students who come from different teaching majors. The course took place during the second semester of 2017, and 22 students participated in it. In a general way, it was possible to observe that the students understood the different ways in which the conceptual map can be used, and they could think of situations of usage to improve their own learning and the learning of their students.
Keywords: conceptual maps, meaningful learning, future professors, learning strategies.
Resumen
Pensar en la capacitación del futuro profesor exige no solamente pensarlo como profesor, sino también como estudiante, y por eso promover la autorreflexión sobre el propio aprendizaje pasa a ser esencial. Por reconocer la importancia de esta práctica, y por creer que no sea común entre futuros profesores, es que se propone el trabajo con las estrategias de aprendizaje. De esa manera, el objetivo de este estudio es describir uno de los encuentros provenientes de la asignatura de Prácticas Tuteladas I, en el cual fue trabajado el Mapa Conceptual como una estrategia de enseñanza y de aprendizaje, con alumnos de diferentes cursos de Profesorado. La asignatura fue dada en el segundo semestre del 2017 y contó con la participación de 22 estudiantes. De forma general, fue posible observar que los estudiantes comprendieron las diferentes formas en que se puede utilizar el mapa conceptual y consiguieron pensar en situaciones en que podrían utilizarlos para perfeccionar el propio aprendizaje y el de sus futuros alumnos.
Palabras-clave: mapas conceptuales, aprendizaje significativo, futuros profesores, estrategias de aprendizaje.
Nos dias de hoje, espera-se que os estudantes aprendam de forma significativa. De acordo com a teoria da aprendizagem significativa de David Paul Ausubel (2003), a aprendizagem só é significativa quando o aprendiz consegue relacionar um conteúdo novo a ser aprendido com outro já existente em sua estrutura cognitiva, tornando, assim, esse conhecimento prévio mais sofisticado, específico e rico.
Ao aprender de forma significativa, os estudantes conseguem desenvolver relações mais sofisticadas entre os conhecimentos em sua estrutura cognitiva, facilitando o momento do resgate dessas informações e o melhor aproveitamento desses conhecimentos em situações cotidianas. Assim, nessa teoria, a estrutura cognitiva existente é o principal fator que influencia a aprendizagem (Moreira, 2013; Paixão & Ferro, 2009).
Outro tipo de aprendizagem discutida por Ausubel é a aprendizagem mecânica que consiste na memorização do conhecimento, sem que haja uma relação entre a nova informação e aquela que o estudante já sabe. Na aprendizagem mecânica, a aprendizagem acontece de forma literal e arbitrária. A ausência de elo entre o conteúdo a ser aprendido e o que já se sabe conduz ao esquecimento da informação em um curto espaço de tempo (Moreira, 2013; Paixão & Ferro, 2009).
Embora a aprendizagem significativa e a mecânica apresentem características distintas, autores como Paixão e Ferro (2009) defendem que elas não podem ser vistas como sendo completamente dicotômicas e exemplificam que, em conteúdos inteiramente novos, por exemplo, a aprendizagem mecânica é inevitável, mas, posteriormente, essa aprendizagem pode e deve tornar-se significativa.
Apesar de se almejar que os estudantes aprendam de forma significativa, observa-se que o ensino, nos diferentes níveis de escolarização, ainda é pautado somente na aprendizagem mecânica. Os conteúdos são transmitidos aos estudantes de forma descontextualizada, sem que haja a preocupação de relacioná-los àquilo que eles já sabem (Paixão & Ferro, 2009).
Na aprendizagem significativa, o conhecimento já presente na estrutura cognitiva servirá como ponto de ancoragem para a aprendizagem da nova informação. Nessa perspectiva, aprender uma nova informação (conceito, ideia ou preposição) envolve que ela se ancore em aspectos relevantes da estrutura cognitiva preexistente do indivíduo. Não são todos os conhecimentos prévios que o indivíduo já tem na sua estrutura cognitiva que servirão de ancoragem para a nova informação. Servirão somente aqueles específicos que se relacionam, de alguma forma, com a nova informação a ser aprendida. A esses conhecimentos prévios específicos dá-se o nome de subsunçores (Ausubel, 2003; Ausubel, Novak, & Hanesian, 1980; Moreira, 2012). A partir dessa perspectiva, a aprendizagem significativa geraria alterações na estrutura cognitiva daquele que aprende, modificando os conceitos que o indivíduo já tem e formando novas ligações entre eles. Na aprendizagem significativa, a estrutura cognitiva está em constante reestruturação. A construção do conhecimento se dá em processo dinâmico (Moreira, 2012; Souza & Boruchovitch, 2010).
Para que a aprendizagem significativa ocorra, não basta apenas que o material a ser aprendido se relacione com algum aspecto relevante da estrutura cognitiva. Ele deve ser potencialmente significativo e precisa, de alguma forma, relacionar-se à estrutura cognitiva do sujeito. Por último, e não menos importante, o estudante deve apresentar disposição positiva para a aprendizagem significativa. Espera-se que ele apresente uma atitude ativa diante da sua aprendizagem e controle da sua atenção e da motivação (Paixão & Ferro, 2009).
Na literatura, são encontradas três formas de aprendizagem significativa: a subordinada, a superordenada e a combinatória (Moreira, 2012, 2013; Paixão & Ferro, 2009). A aprendizagem subordinada é a mais comum e mais fácil. Nela, a nova informação se subordina e se ancora nas informações preexistentes na estrutura cognitiva. Neste processo, (...) o novo conhecimento adquire significado e o prévio fica mais diferenciado, mais estável, mais claro, mais rico em significado (Moreira, 2013, p.8).
A aprendizagem superordenada não é tão comum quanto a subordinada. Envolve uma reorganização cognitiva, em que um conhecimento passa a ser hierarquicamente superior a outro. Assim, quem aprende percebe relações cruzadas, não só de subordinação entre os conhecimentos que já adquiriu, mas também de superordenação, na qual um determinado conhecimento passa a abranger outro. Já a aprendizagem combinatória é a mais difícil e a menos frequente. O significado de um novo conhecimento decorre de uma ampla interação cognitiva com um conjunto de conhecimentos prévios. No entanto, ela só é possível se o indivíduo tiver um bom domínio do conhecimento recém-aprendido.
O papel do professor na teoria da aprendizagem significativa de Ausubel vai muito além da simples transmissão do conteúdo aos alunos. Cabe a ele identificar quais são os conhecimentos prévios que os alunos já têm sobre o assunto para que, assim, possa auxiliá-los a criar relações dos conhecimentos novos com os já existentes na estrutura cognitiva. A escolha do material também deve ser cautelosa. O professor precisa ter em mente que o material que ele fornecerá aos alunos precisa ser potencialmente significativo. No entanto, se esse material promoverá ou não a aprendizagem significativa, dependerá da forma em que será trabalhado. Além disso, deve-se considerar que o estudante precisa estar interessado em estabelecer as relações entre os novos conhecimentos e os já presentes em sua estrutura cognitiva, ou seja, aprender significativamente. Também compete ao professor perceber quando os alunos não têm os conhecimentos prévios necessários sobre o conteúdo trabalhado (Moreira, 2012).
Diante da ausência de conhecimentos prévios sobre um determinado assunto, os professores podem utilizar uma estratégia para suprir essa carência. Podem lançar mão de organizadores prévios, que são conceituados na literatura como materiais introdutórios, mais abstratos e inclusivos, de maior nível de abstração, generalidade e inclusividade do que o novo material que será aprendido. Para que o organizador prévio cumpra o seu principal objetivo, ele deve ser utilizado sempre antes de introduzir o novo conteúdo. Ao desempenhar a função de preencher o espaço entre aquilo que o aprendiz já conhece e o que precisa conhecer, os organizadores prévios são conhecidos como uma estratégia que facilita a aprendizagem significativa (Paixão & Ferro, 2009; Moreira, 2012).
A literatura também reconhece outro facilitador da aprendizagem significativa conhecido como mapa conceitual. Joseph Novak, na década de 1970, desenvolveu o mapa conceitual, conceituando-o como um diagrama que indica relações entre conceitos ou entre palavras (Ausubel et al., 1980; Moreira, 2012, 2013). O mapa conceitual tem sido utilizado no contexto educacional brasileiro de uma forma bem flexível. Entre as possibilidades de utilizá-lo, destacam-se as que se seguem: como uma estratégia metodológica inovadora, como uma estratégia de aprendizagem, como uma ferramenta avaliativa e como um organizador curricular.
Como uma estratégia metodológica inovadora, o professor pode adotar o uso do mapa conceitual para explicar os conteúdos e a forma como eles se relacionam (Silva, Lima, & Santos, 2017). Como estratégia de aprendizagem, os estudantes podem utilizar o mapa para aprender de maneira mais significativa o conteúdo, buscando estabelecer relações entre os conceitos a serem aprendidos. Como uma ferramenta avaliativa, o professor pode utilizá-lo para avaliar a aprendizagem dos alunos. Nesse caso, é importante que seja dada aos alunos a oportunidade de apresentar o mapa conceitual, para que seja possível examinar se houve compreensão das relações estabelecidas. Por fim, como organizador curricular, o professor pode organizar os conteúdos que serão trabalhos durante o ano letivo em um mapa conceitual, para que os alunos consigam compreender as relações entre os conteúdos a serem trabalhados, o que nem sempre conseguem sem um organizador prévio (Souza & Boruchovitch, 2010).
Como mencionado anteriormente, o mapa conceitual pode ser utilizado como uma estratégia de aprendizagem. Esse é o enfoque adotado no presente estudo. As estratégias de aprendizagem foram definidas por Dembo (1994) como técnicas ou métodos utilizados pelos alunos para adquirir uma informação. Na literatura são encontradas inúmeras taxionomias para o construto de estratégias de aprendizagem, descritas detalhadamente em Boruchovitch (1999) e revisitadas em Boruchovitch e Santos (2006). As mais empregadas dividem as estratégias de aprendizagem em dois grupos distintos: as estratégias cognitivas e as metacognitivas. As estratégias cognitivas são sequências direcionadas de ações que representam o que estudantes fazem para aprender e para se lembrarem dos conteúdos ou informações de modo geral. Incluem as estratégias de ensaio, de elaboração e de organização.
As estratégias de ensaio consistem na repetição daquilo que o aluno está tentando aprender. São exemplos desse tipo de estratégias: repetir várias vezes a definição de um conceito novo, utilizar cartões de memória, ouvir gravações e escrever inúmeras vezes um novo conceito. Essas estratégias podem ajudar a entender e selecionar informações importantes, no entanto, elas não refletem um nível de processamento profundo. As estratégias de elaboração requerem um processo cognitivo ativo por parte do aprendiz e envolvem adicionar ou modificar o material de forma que ele se torne mais significativo ou memorável. Como exemplo, pode-se citar parafrasear, sumarizar, criar analogias, criar perguntas e respostas e ensinar o conteúdo a outras pessoas. Por fim, as estratégias de organização apresentam o foco na reorganização e na elaboração do novo material, elencando as ideias principais do texto em algum tipo de forma de gráfico, como diagramas de causa e efeito, mapas mentais e mapas conceituais (Pintrich, 1999; Weinstein, Acee, & Jung, 2011).
As estratégias metacognitivas são procedimentos orientados para o automonitoramento, o autocontrole e a autoavaliação da atividade cognitiva e podem ser subdivididas em estratégias de planejamento, de monitoramento e de regulação. (Pintrich, 1999; Boruchovitch, 2012). As estratégias de planejamento auxiliam os aprendizes a planejarem o uso de estratégias cognitivas e a ativarem aspectos importantes do conhecimento anterior, tornando mais fácil a organização e a compreensão do material. São exemplos de estratégias de planejamento: estabelecer metas, analisar o texto e elaborar questões antes da leitura. Estratégias de monitoramento alertam o aprendiz quanto às falhas na atenção ou na compreensão. Destacam-se entre elas: acompanhar a atenção enquanto lê um texto ou ouve uma palestra e o autoteste por meio de questões sobre o material do texto para verificar a compreensão do conteúdo. Já as estratégias de regulação envolvem retomar o comportamento avaliado no momento do monitoramento e deixá-lo alinhado com as metas e critérios estabelecidos; é estratégia de regulação: diminuir o ritmo da leitura diante de um texto difícil ou menos familiar (Pintrich, 1999).
O mapa conceitual é considerado na literatura como uma estratégia de aprendizagem cognitiva de organização passível de ser ensinada. Ao utilizá-lo, o estudante confere uma nova organização ao material a ser aprendido, de forma a torná-lo mais significativo (Weinstein et al., 2011). Apesar de, há algumas décadas, a literatura nacional e a internacional reconhecerem os benefícios de ensinar as estratégias de aprendizagem para estudantes, independentemente do nível escolar em que se encontram, são poucos os cursos de formação de professores que inserem em seus currículos o ensino dessas habilidades (Boruchovitch, 2014; Boruchovitch & Machado, 2017). Assim, com base em experiências prévias bem-sucedidas (Boruchovitch & Ganda 2013; Boruchovitch & Machado, 2017), partiu-se da expectativa de que algumas estratégias facilitadoras da aprendizagem, embora muito relevantes para a formação de professores, poderiam ainda não ter sido trabalhadas com os estudantes que se matricularam em uma disciplina de Estágio Supervisionado I.
Nesse sentido, elaborou-se uma proposta autorreflexiva para o ensino e a aplicação de estratégias de aprendizagem, tendo como eixo norteador um convite ao futuro professor para examinar a si próprio como estudante e como futuro professor (Boruchovitch & Ganda, 2013; Ferreira &Veiga Simão, 2012; Zimmerman, 2002). Autores como Staley e Dubois (1996) defendem que, para que a formação exerça impacto na prática docente do futuro professor, primeiramente ele precisa ser sensibilizado e influenciado como estudante. Assim, o objetivo deste estudo é descrever a experiência de um dos encontros da disciplina de Estágio Supervisionado I, em que foi trabalhado o mapa conceitual como uma estratégia de ensino e de aprendizagem, com alunos advindos de diferentes cursos de Licenciatura.
A experiência com os mapas conceituais em sala de aula: procedimentos e resultados
A proposta que será relatada ocorreu em uma universidade pública localizada no interior do estado de São Paulo, no segundo semestre de 2017, com 22 alunos matriculados na disciplina de Estágio Supervisionado I, provenientes de diferentes cursos de Licenciatura: Matemática, Química, Filosofia, Geografia, Educação Física, Arte e Sociologia.
A disciplina constituiu-se de quinze encontros, dos quais seis foram destinados ao ensino das estratégias de aprendizagem. Iniciou-se pelas estratégias metacognitivas, para que os estudantes já pudessem desenvolver uma consciência metacognitiva ao longo do processo e, assim, ao entrar no conteúdo das estratégias cognitivas que eles já tivessem maior consciência sobre como eles aprendem e quais as estratégias de aprendizagem mais adequadas para o seu estilo de aprendizagem. Foram ensinadas as estratégias metacognitivas de planejamento (estabelecimento de metas), monitoramento (autoquestionamento) e regulação (regulação da motivação, da emoção e da ansiedade). As estratégias de ensaio (sublinhar), elaboração (resumir) e organização (mapas conceituais) foram as estratégias cognitivas trabalhadas na disciplina. O recorte do presente estudo é o encontro 6, destinado ao ensino do mapa conceitual.
Os encontros com os alunos da disciplina de Estágio Supervisionado I seguiram sempre a mesma dinâmica: (a) supervisão da prática dos estudantes nos seus respectivos campos de estágio; (b) questões autorreflexivas sobre o assunto a ser abordado na aula; (c) revisão dos conteúdos estudados até o momento; (d) fundamentação teórica e (e) reflexão e aplicação do conhecimento adquirido no encontro, em si e, se possível, na prática pedagógica, de modo semelhante às dinâmicas relatadas e desenvolvidas em estudos prévios (Boruchovitch, 2014; Boruchovitch & Ganda, 2013; Machado & Boruchovitch, 2017).
Ao seguir essa dinâmica, o primeiro momento dos encontros sempre se iniciava com a supervisão da prática dos estudantes no campo de estágio. Esse momento consistia em conversas sobre como estava sendo o estágio, quais eram as dificuldades encontradas, as experiências que estavam sendo vivenciadas e o compartilhamento de dúvidas. O segundo momento consistia na realização e na discussão das questões autorreflexivas, que sempre se relacionavam à estratégia de aprendizagem que seria trabalhada no dia. Por exemplo: no dia em que foi trabalhada a estratégia de organização (Mapas Conceituais), os estudantes responderam as seguintes questões autorreflexivas: Quando você está lendo um texto de estudo, você busca dar uma nova organização às informações contidas no texto? Se sim, por que você faz isso?. Você tem algum critério para criar essa nova organização para o texto?. Você já ouviu falar sobre mapas conceituais? Sabe do que se trata? Por meio dessas questões, esperava-se que os estudantes pensassem sobre a estratégia e de que forma a utilizavam ou não.
No terceiro momento, era realizada uma revisão dos conteúdos estudados até então. Essa revisão, na maioria das vezes, era feita utilizando o recurso do Data Show, com auxílio de diagramas para mostrar aos alunos as relações entre os conceitos trabalhados.
No quarto momento, definido como o da fundamentação teórica, eram explicitados os objetivos da estratégia de aprendizagem trabalhada naquele dia, os benefícios de utilizá-la, como utilizá-la, em quais momentos utilizá-las e orientações de como ensiná-las aos futuros alunos. Para finalizar o encontro, no quinto momento, os estudantes eram instigados a pensar de que forma poderiam ensinar esses conteúdos aos seus futuros alunos, levando em conta a área de conhecimento em que eles atuarão e como poderiam aplicar essas estratégias de aprendizagem na vida deles como estudantes.
É essencial lembrar que a proposta da disciplina tem como eixo norteador trabalhar com as estratégias de aprendizagem, visando não apenas à sua utilização pelos alunos como estudantes, mas também como futuros professores. Além disso, buscou-se estimular nos alunos a autorreflexão acerca da própria aprendizagem e do uso que fazem das estratégias de aprendizagem, tendo em vista a potencialização de sua própria aprendizagem.
O trabalho com o mapa conceitual ocorreu no sexto encontro da disciplina, dividido em dois momentos distintos, sendo o primeiro deles de natureza teórica. Tratou-se da teoria que embasa os mapas conceituais, dos conceitos-chave, dos benefícios, de quando utilizar, de como construir e de como avaliá-los. O segundo momento envolveu a confecção dos mapas conceituais a partir de um texto, lido anteriormente pelos estudantes, que discutia a motivação dos adolescentes. Para a realização da atividade, os alunos se dividiram em grupos, cada um com quatro participantes. Antes de iniciar a construção dos mapas conceituais, foram retomados os passos para a sua construção.
As respostas obtidas nas questões autorreflexivas foram analisadas utilizando-se a Análise de Conteúdo de Bardin (2004).
Estudiosos convergem quanto à necessidade de trabalhar práticas autorreflexivas com futuros professores, para que tenham um processo de ensino e aprendizagem mais eficiente e exerçam maior consciência sobre esse processo (Boruchovitch, 2014; Bembenutty, 2015; Boruchovitch & Machado, 2017). Seguindo esse referencial, buscou-se, em todos os encontros, fortalecer esse aspecto, principalmente por meio das questões autorreflexivas.
Ao aplicar as questões autorreflexivas sobre o mapa conceitual, os estudantes, em sua maioria, relataram ter o costume de organizar o texto de uma forma diferente, buscando conferir maior significado e entendimento de seu conteúdo. Entre os critérios apontados por eles, apenas dois estudantes disseram que buscam estabelecer relações entre aquilo que já leram e/ou que já sabem e a informação a ser aprendida, um dos princípios da aprendizagem significativa (Moreira, 2012, 2013).
Ao questionar os estudantes se eles já tinham ouvido falar sobre mapas conceituais, metade deles informou já ter ouvido falar. No entanto, a maioria não soube explicar do que se trata. Muitos disseram que nunca haviam confeccionado um. É interessante relatar que essa mesma questão foi feita para alunos do Ensino Médio, em um momento anterior, e, ao questioná-los se eles conheciam os mapas conceituais, a maioria indicou que sim, que já haviam sido ensinados a utilizar o recurso pelos professores de História e de Biologia e até conseguiram conceituar, da forma deles, o que é um mapa conceitual.
A situação relatada propicia a reflexão sobre alguns pontos, entre eles: como é possível que estudantes que estão se formando para serem futuros professores desconheçam uma ferramenta tão importante para fomentar a aprendizagem significativa. Entre as hipóteses para responder a essa questão pode-se aventar que os cursos de Licenciatura estão mais preocupados com a formação conteudista dos futuros professores, em vez de uma formação para o ensino de práticas que possam auxiliá-los a promover e facilitar a aprendizagem em seus alunos. Outra questão a ser pensada é que, embora os cursos de formação de professores frequentemente não insiram em seus currículos o ensino de estratégias de aprendizagem (Boruchovitch, 2014; Boruchovitch & Ganda, 2013; Boruchovitch & Machado, 2017), há algumas iniciativas entre alguns professores, como relatado pelos alunos do Ensino Médio, de ensinar essas estratégias. Ainda assim, ficam os questionamentos sobre em que momento de formação esses professores tiveram conhecimento acerca dos mapas conceituais, ou se essa aprendizagem se deu a partir das suas experiências quando alunos.
No momento da fundamentação teórica, buscou-se não apenas trabalhar o mapa conceitual, mas, também, resgatar a teoria que embasa a ferramenta, de forma a mostrar aos estudantes que há um referencial teórico e pesquisas relacionadas ao tema que mostram a sua eficácia e a sua importância para a promoção da aprendizagem significativa. Ao discorrer sobre os benefícios do uso do mapa conceitual cientificamente constatados, buscou-se estimular os estudantes a utilizarem a ferramenta. Após apresentar aos estudantes a teoria da aprendizagem significativa de David Ausubel, cujas formulações iniciais datam dos anos de 1960, e os conceitos-chave que embasam a teoria, partiu-se para as definições de mapa conceitual, quando utilizá-lo, de que forma, seus benefícios, como avaliá-lo e o passo a passo de como construí-lo a partir do que a literatura aponta sobre o tema. De modo geral, os alunos demonstraram bastante interesse na teoria da aprendizagem significativa, principalmente pela forma, defendida pela teoria, em que a aprendizagem acontece.
Na segunda parte da aula, os mapas conceituais foram confeccionados. No encontro anterior à aula, foi informado aos alunos que seria enviado via Teleduc um texto para que lessem em casa para o próximo encontro e trouxessem o texto impresso, já lido e grifado. Para a construção dos mapas conceituais, primeiramente os estudantes selecionaram as palavras e conceitos-chave do texto. Na sequência, eles ordenaram os conceitos, dos mais gerais para os mais inclusivos. O terceiro passo foi pensar nas palavras que ligariam os conceitos selecionados, conhecidas por palavras de ligação. A partir desse momento, os estudantes começaram a montar os seus mapas conceituais. Primeiramente, desenvolveram-no em uma folha de rascunho, depois passaram para o papel Kraft, tendo à disposição para confeccioná-lo canetões, papéis coloridos, tesoura e Post-it.
Em uma primeira tentativa de construção dos mapas conceituais, foi possível observar que os estudantes estavam preocupados em saber se estavam construindo corretamente ou não o mapa conceitual. Mesmo depois de ter sido ressaltado na fundamentação teórica que não existiam mapas conceituais errados, assim como afirma Moreira (2012), todos os grupos pediram para que a professora e a estagiária olhassem as primeiras tentativas de construção do mapa conceitual a fim de verificar se estavam corretos ou não. Essa atitude dos estudantes revela o quanto eles ainda estão imersos em um tipo de avaliação tradicional, que se preocupa apenas com o certo e o errado, ou seja, apenas com o produto final, sem levar em consideração o que estavam aprendendo e construindo.
Durante a construção do mapa, professora e estagiária passaram em todos os grupos para ouvir as discussões dos alunos. De modo geral, verificou-se que os alunos não apresentaram dúvidas em distinguir os conceitos mais gerais e os mais específicos presentes no texto. A escolha das palavras-chave também se deu de forma tranquila, por meio da discussão nos grupos. No entanto, o processo de escolha das palavras de ligação (palavras ou termos curtos que ligam um conceito a outro) foi mais trabalhosa, pela dificuldade dos estudantes de sintetizarem como os conceitos se relacionavam em poucas palavras. Muitos grupos, ao invés de escolherem palavras para utilizar como palavras de ligação, incluíram frases grandes, evidenciando que ainda não haviam compreendido completamente alguns conceitos trabalhados no texto. Diante disso, foram realizadas interferências indicando aos estudantes que retomassem o texto e tentassem simplificar o que estavam querendo dizer.
Em síntese, pode-se constatar que os alunos compreenderam todas as partes componentes dos mapas e construíram mapas conceituais com estruturas e organizações bem diferenciadas, selecionaram as palavras e conceitos-chave que realmente demonstravam a ideia principal do texto. Todos os grupos estabeleceram conexões no mínimo bidimensionais entre os conceitos, o que demonstra aprofundamento e compreensão do texto.
No encontro seguinte, os estudantes apresentaram os mapas conceituais confeccionados. Esse momento foi extremamente rico, porque eles visualizaram que todos os mapas conceituais tiveram uma construção diferente, mesmo se tratando de um mesmo texto. Possibilitou que pensassem e verificassem, na prática, que a aprendizagem é individual, como também é a construção do conhecimento. Cada um constrói o conhecimento conforme as suas vivências e conhecimentos prévios, assim como defende a teoria da aprendizagem significativa (Ausubel, 2003; Moreira, 2013).
Outro fator de destaque também observado pelos alunos foi que, mesmo depois de uma semana da construção do mapa conceitual, eles não precisaram reler o texto para fazer a apresentação. Os estudantes apenas revisaram o mapa conceitual e, a partir disso, conseguiram recuperar as informações contidas no texto. Essa observação é extremamente importante, uma vez que demonstra que o mapa conceitual foi utilizado realmente como uma estratégia de aprendizagem. As estratégias de aprendizagem funcionam com se estivessem interconectadas com a informação. Inicialmente, recupera-se a estratégia utilizada no momento do armazenamento da informação para depois recuperar a informação pretendida. Assim, se, no momento do armazenamento e da codificação da informação, os indivíduos fizerem uso de estratégias de aprendizagem, a recuperação da informação ocorrerá mais facilmente. Ao conseguirem recuperar a informação utilizando apenas o mapa conceitual, fica claro que os estudantes conseguiram estabelecer associações que propiciaram a recuperação dessas informações. Como relata Bzuneck (2010), quanto mais associações são feitas no momento do armazenamento, mais fácil será a busca e a recuperação das informações armazenadas.
Considerações Finais
A experiência de construção do mapa conceitual com alunos de diversos cursos de Licenciatura foi extremamente gratificante, porque eles estavam muito motivados a realizar a atividade prática e a aprender como utilizar o mapa conceitual. Essa motivação se manteve até o final do encontro e no seguinte, quando fizeram as apresentações de seus mapas. Muitos estudantes relataram que iriam construir mapas conceituais para a próxima prova. Outros já pensaram em tentar propor na escola em que realizam o estágio uma atividade com mapas conceituais. O mais importante foi que eles perceberam que o mapa pode ser utilizado em diferentes disciplinas e que eles podem incorporá-lo à sua prática de estudante e de futuro professor.
Entre os alunos que disseram que construiriam o mapa conceitual para a próxima prova, uma aluna relatou a sua experiência. Ela está se graduando no curso de Matemática e resolveu construir o mapa conceitual para estudar para uma prova de uma disciplina em que, desde o início do semestre, não estava indo bem. A estudante relatou que construiu o mapa conceitual de toda a matéria que cairia na prova e estudou para prova a partir dele. Ela mencionou que ficou mais fácil compreender o conteúdo, especialmente porque ela conseguiu entender as relações entre os itens. Ao sair o resultado da prova, ela veio agradecer, pois tirou nota 7, apresentando uma melhoria grande, visto que até então a sua nota mais alta na disciplina havia sido 4.
Este relato, assim como outros que podem ser encontrados na literatura sobre os benefícios do uso do mapa conceitual e das estratégias de aprendizagem, de modo geral, indica a importância de ensinar os estudantes a utilizarem estas estratégias, bem como futuros professores e professores em atuação, para que possam fazer uso e ensinar seus alunos a utilizarem esse recurso (Boruchovitch & Ganda, 2013; Costa & Boruchovitch, 2009; Gomes & Boruchovitch, 2011). Espera-se, com este trabalho, sensibilizar os cursos de formação de professores quanto à importância de inserir em seus currículos as contribuições das pesquisas relacionadas à Psicologia da Educação.
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Submissão: 19/12/2017
Aceite: 10/01/2018