SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.27 número82Interrelação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinalDislexia e processamento sintático índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Revista Psicopedagogia

versão impressa ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.27 no.82 São Paulo  2010

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Conhecimento das regras de correspondência grafo-fonêmicas por escolares de 1ª a 4ª série com e sem dificuldades de aprendizagem

 

Knowledge of grafo-phonemic rules by students from 1st to 4th grades with and without learning difficulties

 

 

Natália FuscoI; Simone Aparecida CapelliniII

IFonoaudióloga pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (FFC/UNESP), Marília, SP. Bolsista de Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP
IIFonoaudióloga. Doutora e Pós-Doutora em Ciências Médicas pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP), Campinas, SP. Docente do Departamento de Fonoaudiologia e Programa de Pós-Graduação em Educação da FFC/UNESP, Marília, SP

Correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: Este estudo teve por objetivos caracterizar e comparar o nível de conhecimento dos escolares de 1ª a 4ª com e sem dificuldades de aprendizagem quanto ao uso das regras de correspondência grafema-fonema do português brasileiro.
MÉTODO: Participaram deste estudo 120 escolares de escola pública municipal, de 1ª e a 4ª série, de ambos os gêneros, na faixa etária de 7 a 10 anos e 11 meses de idade. Os escolares foram distribuídos por série em 8 grupos, sendo do GI ao GIV composto por escolares sem dificuldades de aprendizagem e do GV ao GVIII composto por escolares com dificuldades de aprendizagem. Foi aplicado o Protocolo de Avaliação de Leitura, composto por 6 subtestes: prova de palavras regulares, prova de palavras irregulares, prova de palavras regulares incorretas com trocas visuais, prova de palavras regulares incorretas com trocas fonológicas, prova de palavras incorretas homófonas e prova de pseudopalavras.
RESULTADOS: OOs resultados revelaram que os escolares dos GI, GII, GIII e GIV obtiveram desempenho superior em relação aos GV, GVI, GVII e GVIII nos subtestes de Palavras Incorretas com Troca Fonológica, Palavras Regulares, Pseudopalavras e Palavras Incorretas com Troca Visual e os escolares do GIV obtiveram desempenho superior ao GVIII nas categorias de Palavras incorretas com Troca Fonológica, Palavras Irregulares e Pseudopalavras.
CONCLUSÃO: OOs resultados evidenciaram que os escolares dos grupos com dificuldades de aprendizagem apresentaram falhas no conhecimento e reconhecimento de regras ortográficas se comparada aos escolares sem dificuldades de aprendizagem.

Unitermos: Aprendizagem. Leitura. Avaliação educacional. Escolaridade.


SUMMARY

OBJECTIVE: This study aimed to characterize and compare the level of knowledge of students from 1st to 4th grade with and without learning disabilities regarding the use of rules of grapheme-phoneme correspondence in Brazilian Portuguese.
METHODS: A number of 120 students from public school participated in this study, from 1st to 4th grades, both genders, aged 7 to 10 years and 11 months old, divided according to their grades in 8 groups, being GI to GIV composed by students without learning difficulties and GV to GVII composed by students with learning difficulties. The protocol of Reading Assessment was used, consisting of 6 subtests: Regular Word, Irregular Word, Incorrect Regular Words with Visual substitutions, Incorrect Regular Words with Phonological Substitutions, Homophones Incorrect Word and Non Words.
RESULTS: The results revealed that the students from GI, GII, GII and GIV achieved superior performance compared to groups GV, GVI, GVII and GVIII in the Words with Incorrect Regular words with phonological substitutions subtest, Regular Word subtest, Non words subtest and Incorrect Regular Words with Visual substitutions subtest, and the students from GIV showed a superior performance in reading subtests in relation to GVII in the subtests of Incorrect Regular words with phonological substitutions subtest, Irregular Word subtest and Non words subtest.
CONCLUSION: The results showed that the school groups with learning difficulties showed gaps in knowledge and recognition of spelling rules when compared to students without learning difficulties.

Key words: Learning. Reading. Educational measurement. Educational status.


 

 

INTRODUÇÃO

Para a aquisição da leitura em uma língua cujo sistema de escrita é alfabético, necessita-se entender que as letras correspondem a segmentos sonoros menores, ou seja, é preciso compreender o princípio alfabético da correspondência grafofonêmica1,2. A compreensão de que existe relação entre letras e sons da fala é, segundo vários pesquisadores, o modelo ideal de ensino do sistema alfabético3,4. Entretanto, na língua portuguesa existem várias situações nas quais nem sempre existe correspondência única, acarretando confusões quanto à escolha do grafema a ser decodificado ou simbolizado no ato da leitura1,5,6.

Para que haja compreensão do princípio alfabético da correspondência grafo-fonêmica, a criança necessita entender que as letras correspondem a segmentos sonoros sem significados. A linguagem escrita tem, assim, estreita relação com a linguagem falada. Apesar de, para a maioria das crianças, ser relativamente fácil aprender a ler e a escrever, as habilidades linguísticas e cognitivas básicas, necessárias para que aprendizagem possa ocorrer, são numerosas e complexas7.

Um dos fatores que exercem influência no desempenho da linguagem escrita é a sua ortografia. As palavras de escrita irregular podem produzir mais erros que aquelas de escrita regular e entre estas, melhores desempenhos podem ser observados com palavras de transparência ortográfica do que com as de opacidade. Entretanto, o efeito de regularidade pode ser observado de formas diferentes para a leitura e para a escrita de palavras e pseudopalavras. Na abordagem cognitiva, a leitura e a escrita são atividades complexas compostas por múltiplos processos interdependentes, o desempenho na leitura/escrita de pseudopalavras é usado para inferir o uso da rota fonológica de leitura e escrita e o desempenho nas palavras irregulares, cuja correspondência entre fonemas e grafemas é ambígua, exigindo conhecimento prévio do estímulo para a precisão da resposta, que é usado para analisar o uso da rota lexical8,9.

As dificuldades de leitura implicam normalmente uma falha no reconhecimento, ou a compreensão do material escrito. O reconhecimento é o mais básico dos processos, já que o reconhecimento de uma palavra é prévio a sua compreensão10. Todavia, as dificuldades de aprendizagem englobam uma vasta gama de perturbações em um ou mais processos psicológicos e linguísticos e se manifesta por atrasos na compreensão ou utilização da leitura, escrita, soletração, cálculo, escuta e pensamento, em crianças que não apresentam deficiências visuais, auditivas, motoras, mentais ou alterações evidentes de ordem emocional11,12.

Com base no exposto acima, este estudo teve porobjetivo caracterizar e comparar o nível de conhecimento dos escolares de 1ª a 4ª série com e sem dificuldades de aprendizagem quanto ao uso das regras de correspondência grafema-fonema do português brasileiro.

 

MÉTODO

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - CEP/FFC/UNESP, sob o protocolo número 3643/2008.

Participaram deste estudo 120 escolares, de pública municipal da cidade de Marília-SP. Foram distribuídos 8 grupos de 30 escolares de ambos os gêneros, na faixa etária de 6 anos a 10 anos e 11 meses de idade. Cada um desses grupos corresponde a uma das 4 séries do ensino fundamental, com a seguinte distribuição:

Grupo I (GI): 18 escolares da 1ª série do ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 9(50%) do gênero feminino e 9 (50%) do masculino;

Grupo II (GII): 22 escolares da 2ª série do ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 8 (36%) do gênero feminino e 14 (64%) do masculino;

Grupo III (GIII): 20 escolares da 3ª série do ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 9 (45%) do gênero feminino e 11 (55%) do masculino;

Grupo IV (GIV): 25 escolares da 4ª série do ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 10 (40%) do gênero feminino e 15 (60%) do masculino;

Grupo V (GV): 12 escolares da 1ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 5 (42%) do gênero feminino e 7 (58%) do masculino;

Grupo VI (GVI): 8 escolares da 2ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 3 (37,5%) do gênero feminino e 5 (62,5%) do masculino;

Grupo VII (GVII): 10 escolares da 3ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 4 (40%) do gênero feminino e 6 (60%) do masculino;

Grupo VIII (GVIII): 5 escolares da 4ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 1 (20%) do gênero feminino e 4 (80%) do masculino.

Como critério de exclusão, foi considerada a presença de deficiência sensorial, motora ou cognitiva descrita em prontuário escolar e como critério de inclusão foi considerada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e ausência de queixa auditiva ou visual e presença de deficiência sensorial, motora ou cognitiva descritas nos prontuários escolares dos participantes deste estudo.

Para a realização deste estudo, foram utilizados os seguintes procedimentos:

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido: conforme resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS 196/96, anteriormente ao início das avaliações, os pais ou responsáveis pelos escolares selecionados assinaram o Termo de Consentimento autorizando a aplicação dos procedimentos deste estudo;

Protocolo de Avaliação de Leitura9: baseado nas regras de decodificação do português brasileiro e elaborado a partir de estudo descrito na literatura3. Este protocolo é composto por 76 palavras regulares, 20 irregulares, 10 pseudopalavras e 68 figuras distribuídas em 6 subtestes: Palavras Regulares, Palavras Irregulares, Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais, Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas e Pseudopalavras. Cada subteste foi composto por figuras e palavras, sendo que as categorias 1 e 2 foram compostas de 2 figuras e 1 palavra e as demais categorias, por 1 figura e 2 palavras.

Para a realização da prova, o avaliador mostrou ao escolar a folha contendo as ilustrações com as respectivas palavras sob as figuras. As palavras estavam dispostas em itens: 1 e 2. O avaliador mostrou a figura e solicitou ao escolar que a nomeasse. Depois da resposta correta, o avaliador perguntava ao escolar qual era a forma correta de se escrever o nome da figura, se igual à palavra de número 1 ou à palavra de número 2. Em caso de resposta incorreta, o avaliador falava o nome da figura. Foram consideradas respostas corretas quando o escolar apontou para a palavra ou quando falou o número a que a palavra escolhida correspondia.

Este Protocolo foi composto pelos seguintes subtestes:

Pseudopalavras: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, quais das palavras não era uma pseudopalavra;

Palavras Irregulares: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, quais das palavras não era escrita de forma irregular/regular incorreta;

Palavras Regulares: o escolar teve que identificar, com base na palavra regular escrita, qual das duas figuras de mesma classe semântica correspondia à palavra;

Palavras Regulares Incorretas com Troca Visual: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, quais das palavras não apresentavam inversão de letras;

Palavras Regulares Incorretas com Troca Fonológica: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, a palavra correta que não apresentava substituição fonológica;

Palavras Homófonas: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, a palavra correta, cuja grafia difere da fonologia.

As palavras deste estudo foram selecionadas do banco de palavras elaborado com base em livros didáticos da Língua Portuguesa utilizados pelos professores de escola pública municipal do Município de Marília, SP. As palavras foram selecionadas segundo os princípios psicolinguísticos de decodificação das regras do sistema alfabético do português do Brasil6: D1 (Regra de correspondência grafofonêmica independente do contexto) e D2 (Regra de correspondência grafofonêmica dependente do contexto).

Os resultados foram analisados por meio do Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, com o intuito de verificar possíveis diferenças entre o escore esperado e obtido em cada categoria do protocolo, o Teste de Mann-Whitney, com o intuito de verificar possíveis diferenças entre as séries dos grupos de escolares deste estudo e o Teste de Kruskal-Wallis, para comparar o desempenho dos cinco grupos concomitantemente e o Teste de Friedman, para verificar possíveis diferenças dos 8 grupos em relação ao tempo de realização de leitura em cada subteste do Protocolo.

Para a análise estatística, foi adotado o nível de significância de 5% (a = 0,050), marcado com asterisco. A análise dos dados foi realizada utilizando o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 13.0.

 

RESULTADOS

Comparando-se o desempenho dos escolares do GI e GV, utilizando-se o Teste de Mann-Whitney verificamos que ocorreu diferença estatisticamente significante, indicando desempenho superior dos escolares do GI em relação ao GV nos subtestes: Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Regulares, Pseudopalavras e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais (Tabela 1).

Na Tabela 2, encontra-se a comparação do desempenho dos escolares do GII e GVI no Protocolo de Decodificação. Aplicando-se o Teste de Mann-Whitney, observamos que não ocorreu diferença estatisticamente significante, indicando desempenho semelhante entre os GII e GVI nos subtestes do Protocolo, independente do grupo ter ou não dificuldades de aprendizagem.

A Tabela 3 apresenta a comparação do desempenho dos escolares do GIII e GVII no Protocolo de Decodificação. Aplicando-se o Teste de Mann-Whitney, observamos que não ocorreu diferença estatisticamente significante, indicando desempenho semelhante entre os GIII e GVII nos subtestes avaliados, independente do grupo ter ou não dificuldades de aprendizagem.

A comparação do desempenho dos escolares do GIV e GVIII no Protocolo de Decodificação está disposta na Tabela 4. Aplicando-se o Teste de Mann-Whitney observamos que ocorreu diferença estatisticamente significante, indicando desempenho superior do GIV em relação ao GVIII, nos subtestes Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Irregulares e Pseudopalavras do Protocolo.

O desempenho inferior foi atribuído a dois grupos de escolares com dificuldade de aprendizagem, são eles GV e GVIII, nos seguintes subtestes: Palavras Regulares Incorretas com Troca Fonológica, Palavras Regulares Incorretas Homófonas, Palavras Regulares e Pseudopalavras.

Quando utilizado o Teste de Kruskal-Wallis, para comparar o desempenho dos oito grupos deste estudo quanto ao tempo de realização de leitura em cada subteste do Protocolo, verificamos que ocorreu diferença estatisticamente significante para todos os subtestes (Tabela 5).

Para identificarmos qual grupo apresentou menor tempo para realização da leitura dos subtestes do Protocolo foi aplicado o Teste de Mann-Whitney. Os resultados revelaram diferença estatística do grupo GIV, que obteve as maiores médias nos subtestes, Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas, Palavras Irregulares, Pseudopalavras e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais e do GV, que obteve as menores médias nos subtestes: Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas, Palavras Irregulares, Pseudo Palavras e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais (Tabela 6).

Estes resultados indicaram que o aumento da seriação influiu no tempo de realização de leitura dos escolares, isto é, quanto maior a seriação escolar, menor o tempo de realização da leitura de palavras regulares, irregulares e homófonas e identificação de palavras incorretas com troca visual e troca fonológica, tanto para os grupos de escolares com e sem dificuldades.

 

DISCUSSÃO

Para os escolares sem dificuldades de aprendizagem, o aumento da seriação representou a melhora no reconhecimento de palavras e melhora no seu vocabulário visual, o que proporcionou a melhora nas habilidades de processamento fonológico e ortográfico para a decodificação e reconhecimento da palavra durante a leitura, corroborando a literatura especializada4,9,13. Isto porque, os escolares se tornaram mais hábeis em decodificar novas palavras usando a relação letra/som, utilizando esta conversão para ajudá-los a ler pseudopalavras4.

Segundo a literatura14, os resultados da primeira série deste estudo podem ser explicados pelo fato da leitura por decodificação grafofonêmica, no início, ser muito lenta, podendo apresentar erros em palavras com irregularidade nas relações entre as letras e os sons. Diversos países de língua alfabética compreenderam rapidamente que, para evitar dificuldades em leitura e escrita, as crianças deveriam ser ensinadas, de forma explícita e sistemática, a manipular fonemas, pois quanto mais desenvolvida essa habilidade, melhor a compreensão da relação fonema-grafema9,15.

Os escolares das séries intermediárias, ou seja, segunda e terceira séries, seja com presença ou sem dificuldades de aprendizagem, não apresentaram diferença estatisticamente significante quando realizada a comparação intergrupos. Este fato discorda da literatura16, entretanto, isto pode ser justificado pelo fato dos escolares não estarem expostos em sala de aula a situações de contato com as regras ortográficas de forma progressiva ao longo da seriação, pois sabemos que esta exposição depende muito do enfoque à ortografia que o professor em sala de aula oferece às crianças ao longo das seriações.

Os melhores desempenhos foram obtidos pelos escolares do grupo GIV, nos subtestes de leitura de Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais. Os escolares do GVIII obtiveram desempenho inferior em relação os escolares com dificuldades de aprendizagem de séries anteriores na maioria dos subtestes do Protocolo, os escolares do GVIII só foram superiores aos escolares do GV. Assim, estes achados evidenciam que uma mesma sala de aula, com escolares com e sem dificuldades de aprendizagem, pode demonstrar a disparidade que se encontra o domínio das regras ortográficas, uma vez que os escolares com dificuldade de aprendizagem encontram-se, quanto ao desempenho no Protocolo, em nível semelhante a escolares de séries iniciais.

Quanto ao tempo de leitura, este estudo correspondeu com os achados da literatura9, os quais mostraram uma relação indiretamente proporcional à seriação, pois quanto maior a seriação, menor o tempo dedicado pelos escolares para a realização da leitura.

O grupo GIV dispendeu o menor tempo em todos os subtestes do protocolo, em contrapartida, o grupo GV dispendeu o maior tempo dentre todos. Com relação entre tempo de latência e a escolarização, a partir do aumento da frequência entre o contato do escolar e a palavra escrita, se aprende as regras ortográficas, as representações (fonológicas, ortográficas e de significado), as quais se estabilizam e possibilitam uma recuperação cada vez mais rápida e automática da palavra escrita. Por outro lado, ao ler palavras novas ou pouco frequentes, extensas, homófonas e com irregularidades ainda não aprendidas ou em fase de aprendizagem, o escolar terá de utilizar regras de conversão grafema-fonema e ou realizar uma busca no léxico à procura da representação correspondente ao input, o que diminui ainda mais o tempo de recuperação17.

 

CONCLUSÃO

O Protocolo de Avaliação de Leitura aplicado neste estudo permitiu conhecer o perfil dos escolares de 1ª a 4ª série com e sem dificuldade de aprendizagem quanto às categorias de leitura de palavras avaliadas.

Os achados deste estudo permitem concluir que os escolares sem dificuldade de aprendizagem apresentaram desempenho superior no conhecimento e uso das regras ortográficas na leitura, assim como na velocidade de decodificação, o que pode ser justificado pelo aumento da seriação escolar e, consequentemente, o aumento da frequência do contato com a palavra por meio da maior exposição à leitura de textos.

Entre os escolares com dificuldade de aprendizagem, os pertencentes ao GV e GVIII obtiveram os desempenhos inferiores aos demais grupos nos subtestes do protocolo de leitura referentes à leitura de palavras regulares, irregulares, homófonas, pseudopalavras, com troca visual e troca fonológica.

Os escolares com dificuldade de aprendizagem apresentaram maior dificuldade para leitura de palavras incorretas homófonas, palavras irregulares e palavras incorretas com troca fonológica, enquanto que os escolares sem dificuldade de aprendizagem apresentaram maior dificuldade para leitura de palavras incorretas homófonas, palavras irregulares e palavras incorretas com troca fonológica.

 

REFERÊNCIAS

1. Cunha VLO, Capellini SA. Desempenho de escolares da 1ª à 4ª série do ensino fundamental nas provas de habilidades metafonológicas e de leitura - PROHMELE. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(1):56-68.         [ Links ]

2. Smythe I, Everatt J, Al-Menaye N, He X, Capellini SA, Gyarmathy E, et al. Predictors of word-level literacy amongst grade 3 children in five diverse languages. Dyslexia. 2008;14(3):170-87.         [ Links ]

3. Holopainen L, Ahonen T, Lyytinen H. Predicting delay in reading achievement in a highly transparent language. J Learn Disab. 2001;34(5):401-13.         [ Links ]

4. Phillips BM, Clancy-Menchetti J, Lonigan CJ. Successful phonological awareness instruction with preschool children. Top Early Child Spec Educ. 2008;28:3-17.         [ Links ]

5. Santos MTM, Navas ALGP. Distúrbios de leitura e escrita: teoria e prática. Barueri:Manole;2002.         [ Links ]

6. Scliar-Cabral L. Princípios do sistema alfabético do português do Brasil. São Paulo:Contexto;2003.         [ Links ]

7. Gindri G, Keske-Soares M, Mota HB. Memória de trabalho, consciência fonológica e hipótese de escrita. Pró-Fono R Atual Cient. 2007;19(3):313-22.         [ Links ]

8. Paolucci JF, Avila CRB. Competência ortográfica e metafonológica: influências e correlações na leitura e escrita de escolares da 4ª série. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(1):48-55.         [ Links ]

9. Fusco N, Capellini SA. Comparação do nível de conhecimento das regras de correspondência grafofonêmicas entre escolares do 1º ao 5º ano do ensino fundamental. Rev Psicopedagogia. 2009;26(80):220-30.         [ Links ]

10. Zucoloto KA. A compreensão da leitura em crianças com dificuldade de aprendizagem na escrita [Dissertação de Mestrado]. Campinas:UNICAMP;2001.         [ Links ]

11. Hammill DD. On defining learning disabilities: an emerging consensus. J Learn Disab. 1990;23(2):74-84.         [ Links ]

12. Sisto FF. Dificuldade de aprendizagem em escrita: um instrumento de avaliação (Adape). In: Sisto FF, Boruchovitch E, Fini LDT, Brenelli RP, Martinelli SC, orgs. Dificuldades de aprendizagem no contexto psicopedagógico. Petrópolis:Vozes;2001. p.190-213.         [ Links ]

13. Fuchs LS. Peer-assisted learning strategies: promoting word recognition, fluency, and reading comprehension in young children. J Spec Educ. 2005;39(1):34-44.         [ Links ]

14. Capovilla AG, Joly MA, Ferracini F, Caparrotti NB, Carvalho MR, Raad AJ. Estratégias de leitura e desempenho em escrita no início da alfabetização. Psicol Esc Educ. 2004;8(2):189-97.         [ Links ]

15. Capovilla, AGS, Capovilla, FC. Problemas de leitura e escrita: como identificar, prevenir e remediar numa abordagem fônica. São Paulo:Memnon;2003.         [ Links ]

16. Zucoloto KA. Dificuldades de aprendizagem em escrita e compreensão em leitura. Interação em Psicologia 2002;6(2):157-66.         [ Links ]

17. Stivanin L, Scheuer CI. Tempo de latência para a leitura: influência da frequência da palavra escrita e da escolarização. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):206-13.         [ Links ]

 

 

Correspondência:
Simone Aparecida Capellini
Avenida Hygino Muzzy Filho, 737 - Marília, SP
CEP 17525-900
E-mail: sacap@uol.com.br

Artigo recebido: 10/11/2009
Aprovado: 8/1/2010

 

 

Trabalho realizado na Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - FFC/UNESP, Marília, SP.

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons