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Barbaroi
versão impressa ISSN 0104-6578
Barbaroi no.39 Santa Cruz do Sul dez. 2013
ARTIGOS
Juventude e trabalho: emprego e desemprego entre jovens no município de Santa Cruz do Sul (RS)
Youth and work: employment and unemployment among young people in Santa Cruz do Sul (RS)
Juventud y trabajo: el empleo y el desempleo entre los jóvenes de Santa Cruz do Sul (RS)
Marco André CadonáI; César Hamilton GóesII
IUniversidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) - Rio Grande do Sul - Brasil
IIUniversidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) - Rio Grande do Sul - Brasil
RESUMO
O artigo analisa a situação de emprego e de desemprego entre jovens no município de Santa Cruz do Sul, registrando que se reproduz neste município gaúcho um processo de precarização do trabalho que caracteriza a situação do jovem no mercado de trabalho no Brasil. A condição precária de inserção e de permanência do jovem no mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que compromete uma perspectiva de construção de futuro através do trabalho formal, coloca-se como um desafio para o pensar e para o fazer políticas de trabalho para os jovens.
Palavras-Chave: Emprego e desemprego. Jovens no mercado de trabalho. Precarização do trabalho.
ABSTRACT
This study analyzes the situation of employment and unemployment among young people in the municipality of Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul State. Statistical data show for this municipality a widely process that characterizes the situation of young people in the brazilian labor market. The precarious condition of insertion and permanence of young people in the labor market reveal simultaneously an uncertain future related to get a formal job and a challenge to build effective job policies.
Keywords: Employment and unemployment. Young people and labor market. Precarization of labor.
RESUMEN
Este artículo analiza la situación de empleo y desempleo de los jovenes em la municipalidad de Santa Cruz do Sul (Rio Grande do Sul - BR). Se destaca que, en este lugar, ocurre un proceso de precarización del trabajo, lo que caracteriza la situación de los jóvenes en el mercado laboral. Esta frágil condicion de accesso y permanencia, al mismo tiempo que compromete la perspectiva de construción de su futuro atravez del trabajo formal, se pone como un desafio para el pensar y hacer políticas laborales para los jóvenes..
Palabras Clave: Empleo y desempleo. Jóvenes y mercado laboral. Precarización del trabajo.
Introdução
Este artigo apresenta dados de uma pesquisa realizada com o objetivo de diagnosticar a situação de emprego e de desemprego entre jovens de Santa Cruz do Sul (RS), indicando e analisando a condição insegura e de precariedade que caracteriza a inserção dos jovens no mundo do trabalho nas sociedades contemporâneas.
Já de início, é importante destacar que, principalmente a partir das duas últimas décadas do século XX, o modo de produção capitalista vem apresentando transformações profundas. Ainda que empresas, setores econômicos, regiões, mesmo países, sejam atingidos e ajam (reajam) de forma diferenciada, as estratégias utilizadas nesse processo histórico de "reestruturação capitalista" têm um núcleo comum: incorporação de novas tecnologias, aproveitando-se da terceira revolução técnico-científica, com ênfase nas tecnologias da informação; adoção de novas formas de organização do processo produtivo e de trabalho, mais "flexíveis e adaptáveis" ao mercado; maior competitividade em nível de mercado mundial; atuação cada vez mais mundializada das grandes empresas; deslocamento da produção para espaços que oferecem maiores e melhores condições para a valorização do capital; privatização de empresas públicas; redefinição do papel do Estado, com forte desmantelamento de suas funções sociais; pressão, junto aos estados nacionais, para execução de políticas de proteção ao capital e de desproteção ao trabalho (flexibilização nas formas de contratação e de uso da força de trabalho); subordinação de políticas econômicas nacionais à lógica de reprodução do capital financeiro (taxas de juros elevadas, liberalização financeira, endividamento dos Estados etc.) (CASTELLS, 1999; CHESNAIS, 1996).
As consequências desse processo histórico de reestruturação do capitalismo, para as pessoas que vivem do trabalho já há muito tempo, se manifestam por meio de uma intensificação no grau de precarização das condições e das relações de trabalho. Observa-se uma crescente insegurança no mundo do trabalho que se expressa de diferentes formas: em primeiro lugar, é uma insegurança no mercado de trabalho, dado o desemprego (de longa duração) que caracteriza as sociedades contemporâneas (mesmo aquelas que, num período anterior, perseguiram políticas de pleno emprego); em segundo lugar, é uma insegurança no emprego, em virtude do crescimento de formas vulneráveis de empregabilidade, tais como os empregos de meio expediente, temporários, estagiários, terceirizados; em terceiro lugar, é uma insegurança na renda, decorrente do aumento do desemprego e das formas vulneráveis de empregabilidade, do descomprometimento do poder público em relação a políticas de emprego e de proteção aos trabalhadores; em quarto lugar, é uma insegurança na contratação do trabalho, dada a tendência de negociação individualizada e promocional, que ocorre em detrimento de formas coletivas de negociação, e da flexibilização das leis trabalhistas, quase sempre marcadas pela diminuição de direitos sociais e trabalhistas conquistados através de lutas históricas dos trabalhadores (ANTUNES, 1999; MÉSZÁROS, 2006).
Esse quadro histórico de precarização do trabalho, no entanto, não atinge a todas as pessoas que vivem do trabalho da mesma forma. Em diferentes partes do mundo, é possível identificar determinados grupos de pessoas que mais dramaticamente vivenciam situações de desemprego, de precarização nos empregos, de baixos salários, de ausência de proteções legais no e para o trabalho. São grupos que, em muitos locais, podem ser identificados e nomeados: são as mulheres, são os imigrantes (em muitos países europeus, por exemplo), são os negros (no Brasil, em particular), são os jovens.
No caso específico dos jovens, é significativo registrar que na Europa, uma região do mundo conhecida por ter perseguido políticas de pleno emprego no período posterior à Segunda Guerra Mundial e por ter se preocupado com os jovens, procurando elevar sua escolaridade como forma, inclusive, de diminuir a pressão social sobre os empregos (políticas de incentivo para que o jovem estudasse mais, retardando sua entrada no mercado de trabalho), atualmente convive com taxas de desemprego superiores aos 20% entre jovens com idades de até 25 anos; na Espanha, onde a situação é mais grave, mais de 45% dos jovens com menos de 25 anos estão desempregados. 1
Trata-se de uma condição histórica que permite afirmar que, em muitos daqueles países, se há décadas os jovens partiam da condição socioeconômica de seus pais e havia grande possibilidade de melhorarem aquela condição, atualmente têm muita sorte se conseguem manter a condição socioeconômica que herdaram de seus pais.
No Brasil, a realidade dos jovens não é menos desanimadora. Em estudo publicado pelo DIEESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos) sobre a "ocupação dos jovens nos mercados de trabalho metropolitanos" do País (mais especificamente nas regiões metropolitanas de Porto Alegre, São Paulo, Belo Horizonte, Distrito Federal, Salvador e Recife), com base em dados levantados em 2005, os jovens (pessoas com idades entre 16 e 24 anos) aparecem, em todas as regiões metropolitanas pesquisadas, com percentagens de desemprego muito superiores àquelas observadas na população economicamente ativa com idades acima dos 25 anos. Em Porto Alegre, por exemplo, enquanto 10,6% das pessoas com idade superior aos 25 anos estavam desempregadas, entre os jovens essa percentagem chegava aos 26,3%; em São Paulo, enquanto a taxa de desemprego entre as pessoas com mais de 25 anos era de 11,9%, entre os jovens era de 29,8%; em Salvador, enquanto a taxa de desemprego entre as pessoas com mais de 25 anos era de 18,3%, entre os jovens era de 41,4% (DIEESE, 2006).
Em 2005, um em cada cinco jovens brasileiros estava inserido no mercado de trabalho (seja na condição de ocupado, seja na condição de desempregado); porém, a baixa capacidade do País em criar empregos, mais as dificuldades em manter o jovem empregado por um longo tempo, resultava numa condição histórica em que períodos de ocupação caminhavam lado a lado com períodos de desemprego, negando-se, assim, para muitos jovens, a possibilidade de construção de "uma trajetória ocupacional segura de ascensão social" (POCHMANN, 2007, p. 04).
Se a situação no mercado de trabalho para a juventude brasileira é de precariedade, é muito mais para os jovens de famílias com menor renda. Como indica o estudo do DIEESE, anteriormente indicado, em geral o jovem ocupado nas regiões metropolitanas no País é do sexo masculino, possui ensino médio completo, concilia com dificuldades estudo e trabalho, está mais vinculado ao setor de serviços, tem longas jornadas de trabalho, é assalariado e tem carteira assinada (DIEESE, 2006, p. 15). Porém, "é nítida a desigualdade de oportunidades ocupacionais quando se leva em consideração o grupo de renda familiar a que pertence esse jovem ocupado" (IDEM, Ibid., p. 15). Os jovens de famílias mais pobres, em sua grande maioria, "apenas trabalham e não estudam", possuem baixa escolaridade e recebem rendimentos inferiores ao salário mínimo (IDEM, Ibid., p. 15).
Não somente a condição de renda da família condiciona as formas de inserção e de permanência do jovem no mercado de trabalho, mas, também, a condição escolar. A maioria dos jovens ocupados, segundo o referido estudo do DIEESE, tem dificuldades para conciliar estudo e trabalho, havendo uma proporção maior de jovens que somente trabalham, em relação aos jovens que estudam e trabalham. Entre os jovens oriundos de famílias de baixa renda, porém, uma proporção maior de jovens somente trabalha e, por outro lado, uma proporção menor de jovens estuda e trabalha.
Assim, a título de exemplo, tome-se o caso da região metropolitana de Porto Alegre: enquanto entre os jovens pertencentes aos 25% de famílias com menor renda 24,2% estudavam e trabalhavam e 75,8% somente trabalhavam (dados de 2005), entre os jovens pertencentes aos 25% das famílias com maior renda 45,5% estudavam e trabalhavam e 54,5% somente trabalhavam (DIEESE, 2006, p. 08). De modo que o jovem pertencente a famílias com baixa renda no País tem uma condição histórica que o condiciona a escolher, desde muito cedo, pelo trabalho, comprometendo sua vida escolar e, assim, distanciando-o de um bem cultural que poderia lhe garantir maior autonomia no mercado de trabalho. É um círculo de exclusão social: porque precisa trabalhar deixa de estudar; mas, porque deixa de estudar, compromete sua capacidade para trabalhar.
Condição de renda de suas famílias e formação escolar (e qualificação profissional) são questões importantes, portanto, para a compreensão da situação do jovem no mercado de trabalho brasileiro; em decorrência, para processos reflexivos e de atuação no sentido de definir políticas públicas voltadas à população jovem do país. Pensar e agir em favor de políticas públicas de integração através do trabalho, diminuindo as desigualdades sociais que se produzem e se reproduzem no mercado de trabalho, implica, assim e necessariamente, um olhar diferenciado e especial à população jovem.
Preocupações nessa direção alimentaram a reflexão que a Comissão Municipal de Emprego do município de Santa Cruz do Sul (RS) realizou durante o ano de 2011, impulsionando o interesse por um maior conhecimento acerca da "situação do jovem no mercado de trabalho" do município e resultando esse interesse na realização de uma pesquisa que levantou dados sobre a situação de ocupação dos jovens, sobre as formas de desigualdades sociais implicadas nessa situação, sobre a relação entre formação escolar e condição de ocupação, sobre os desafios que se colocam ao pensar e ao fazer políticas de qualificação profissional destinadas aos jovens. 2 É a partir dessa pesquisa que o presente artigo analisa a situação dos jovens no mercado de trabalho, com destaque para a condição de emprego e de desemprego.
Os jovens no mercado de trabalho no município de Santa Cruz do Sul
A pesquisa que levantou informações sobre a situação dos jovens no mercado de trabalho no município de Santa Cruz do Sul foi realizada na segunda quinzena do mês de novembro de 2011. A partir de um conjunto de procedimentos adotados visando garantir uma representatividade estatística para a pesquisa, foi aplicado um formulário de pesquisa junto a 337 (trezentos e trinta e sete) jovens residentes nas regiões (bairros e distritos) que constituem o espaço urbano do município de Santa Cruz do Sul. Nessa direção, no planejamento da pesquisa foi considerado (a partir dos dados do Censo Demográfico de 2010) o universo de jovens residentes no espaço urbano do município de Santa Cruz do Sul com idades entre 16 e 29 anos e, a partir desse universo, foi definida uma amostra estatística que pudesse garantir a representatividade dos dados levantados dentro de uma margem de cinco pontos percentuais, com um nível de confiança de 95%. Uma vez definida essa amostra geral, a mesma foi dividida entre os bairros que constituem o espaço urbano de Santa Cruz do Sul, considerando-se, ainda, o sexo e as idades dos jovens (distribuição entre os seguintes grupos de idade: 16 - 17 anos; 18 - 21 anos; 22 - 24 anos; 25 - 29 anos), respeitando-se, evidentemente, a proporcionalidade de gênero, de cada bairro e de cada grupo de idade no universo total da população considerada pela pesquisa. Cabe notar, ainda, que o formulário de pesquisa aplicado contemplou questões agrupadas a partir das seguintes dimensões: a) perfil socioeconômico; b) a situação no mercado de trabalho (emprego e desemprego); c) as condições de trabalho dos jovens ocupados; d) a experiência e a formação profissionais; e e) as expectativas dos jovens em relação ao mercado de trabalho.
Uma rápida definição do perfil dos jovens pesquisados, considerados a partir da amostra construída para a pesquisa, aponta para uma realidade caracterizada por uma maioria constituída por mulheres (50,5% da amostra), com idades distribuídas entre diferentes grupos de idade (19,6% com 16 e/ou 17 anos; 23,4% com idades entre 18 e 21 anos; 23,7% com idades entre 22 e 24 anos e 33,3% com idades entre 25 e 29 anos), a maioria (72,7%) solteira, grande parte (61,7%) inserida em famílias com rendas médias mensais de até três salários mínimos, com uma escolaridade concentrada entre ensino médio incompleto e superior incompleto, embora a escolaridade se diferencie significativamente entre os diferentes estratos de renda familiar (aumentando na medida em que a renda das famílias aumenta).
A análise da situação desses jovens no mercado de trabalho permite indicar que muitos deles enfrentam dificuldades não somente no ingresso ao mercado de trabalho (encontrarem uma ocupação permanente), mas, também, para permanecerem ocupados; quando ocupados, suas condições variam em função do setor econômico em que atuam, das relações de trabalho que encontram, das continuidades e das descontinuidades que caracterizam suas trajetórias ocupacionais, de suas jornadas de trabalho, dos salários que recebem.
A questão destacada neste artigo está diretamente relacionada à porcentagem de jovens que, no período de realização da pesquisa, estavam ocupados e/ou se encontravam desempregados no mercado de trabalho de Santa Cruz do Sul. Esses dados estão apresentados na tabela a seguir, indicando, por um lado, que 49,6% estavam "trabalhando de forma permanente num local de trabalho" (considerando a margem de erro da pesquisa, isso significa que entre 44,3% e 54,9% dos jovens da cidade de Santa Cruz do Sul tinham uma ocupação permanente).
E a outra metade? O maior grupo (15,1%) estava numa situação de "desemprego aberto", ou seja, eram jovens que procuraram trabalho de maneira efetiva nos últimos 30 dias anteriores ao da pesquisa e não exerceram nenhum trabalho nos últimos sete dias também anteriores ao da pesquisa; o segundo grupo (10,1%) estava numa situação de "desemprego oculto por desalento", ou seja, eram jovens que não procuraram e não trabalharam nos últimos trinta dias anteriores ao da pesquisa, tendo procurado no último ano sem ter conseguido um emprego permanente e remunerado (ainda que possam ter realizado atividades remuneradas de forma esporádica nesse período); o terceiro maior grupo (9,2%) foi constituído pelo que se pode denominar de "inativos", ou seja, jovens que, embora pudessem estar realizando algum tipo de trabalho esporádico (de forma excepcional, portanto, porque lhes sobrou tempo de seus afazeres principais), não estiveram procurando trabalho, nem trabalharam no último ano; o quarto grupo (8,6%) foi constituído pelos jovens que estavam numa situação de "desemprego oculto pelo trabalho precário", ou seja, jovens que procuraram trabalho nos últimos trinta dias anteriores ao da pesquisa e realizaram, esporadicamente, alguma atividade remunerada.3
Note-se, portanto, que, somados, os jovens que estavam desempregados (desemprego aberto, desemprego oculto por desalento e desemprego oculto pelo trabalho precário) representam 33,8% do universo de jovens pesquisados: 15,1% de desemprego aberto, 10,1% de desemprego oculto por desalento e 8,6% de desemprego oculto pelo trabalho precário. Se considerada a margem de erro da pesquisa, isso significa que na cidade de Santa Cruz do Sul entre 28,5% e 39,1% dos jovens com idades entre 16 e 29 anos estavam desempregados no final de 2011 (Quadro 01).
Pela importância desses dados, é relevante que se analise como os ocupados e os desempregados se distribuem a partir do sexo, da idade, da escolaridade e da renda familiar dos jovens pesquisados.
A análise a partir da idade dos jovens pesquisados permite notar que há uma tendência de os que têm mais idade estarem numa condição mais segura de empregabilidade (trabalho permanente). O quadro a seguir apresenta esses dados, indicando que, entre os jovens com idades entre 16 e 18 anos 21,2% estavam trabalhando de forma permanente, subindo essa porcentagem para 48,1% entre os jovens com idades entre 19 e 21 anos, para 65% entre os jovens com idades entre 22 e 24 anos e para 56,2% entre os jovens com idades entre 25 e 29 anos. Por outro lado, considerando-se os jovens desempregados (desemprego aberto, desemprego oculto por trabalho precário e desemprego oculto por desalento), observa-se que se trata de um fenômeno presente com maior significado entre os jovens com idades entre 16 e 18 anos e entre jovens com idades entre 25 e 29 anos: entre os jovens com idades entre 16 e 18 anos, 37,9% estavam desempregados; essa porcentagem diminui para 34,1% entre os jovens com idades entre 19 e 21 anos, para 26,3% entre os jovens com idades entre 22 e 24 anos e volta a subir para 36,6% entre os jovens com idades entre 25 e 29 anos (Quadro 02).
Sob o ponto de vista do sexo, os dados sobre emprego e desemprego indicam que, assim como se observa nas regiões metropolitanas, as mulheres têm maiores dificuldades de conseguir um emprego permanente e, ao mesmo tempo, estão mais sujeitas ao desemprego. O quadro a seguir apresenta esses dados, indicando que enquanto 55% dos homens estavam trabalhando de forma permanente num local de trabalho, entre as mulheres essa porcentagem diminui para 48,2%; enquanto 17,9% dos homens estavam desempregados (aberto, oculto pelo trabalho precário e oculto pelo desalento), entre as mulheres essa porcentagem foi de 25,9% (Quadro 03).
A análise da condição no mercado de trabalho a partir da escolaridade dos jovens indica que quanto maior a escolaridade maior é a possibilidade de um trabalho permanente num local de trabalho. Assim, por exemplo, quando se considera os jovens que estavam trabalhando de forma permanente num local de trabalho, observa-se que entre os jovens que têm o ensino fundamental (incompleto e completo) 34,89% estavam nessa condição no mercado de trabalho; essa porcentagem subiu para 51,7% entre os jovens com ensino médio (incompleto e completo) e para 64,5% entre os jovens com ensino superior (incompleto ou completo).
Por outro lado, quanto menor a escolaridade maior a possibilidade de estar desempregado. Assim, considerando os jovens que estavam desempregados (desemprego aberto, desemprego oculto por trabalho precário e desemprego oculto por desalento), observa-se que 48,3% dos jovens com ensino fundamental (incompleto e completo) estavam nessa condição, diminuindo essa porcentagem para 30,6% entre os jovens com ensino médio (incompleto e completo) e para 22,6% entre os jovens com ensino superior (incompleto e completo) (Quadro 04).
Por fim, cabe ainda analisar a condição dos jovens no mercado de trabalho a partir da renda familiar desses jovens. A tabela a seguir apresenta esses dados, apontando, com muita clareza, que quanto maior a renda familiar maior é a inserção do jovem no mercado de trabalho na condição de "trabalhador permanente": entre os jovens pertencentes a famílias com renda de até dois salários mínimos 37,5% estavam trabalhando de forma permanente num local de trabalho; essa porcentagem aumentou para 62,8% entre os jovens de famílias com renda superior aos dois até cinco salários mínimos; para 73,9% entre os jovens de famílias com renda superior aos cinco até dez salários mínimos; e para 100% entre os jovens de famílias com renda superior aos dez salários mínimos.
Por outro lado, quanto menor a renda familiar maior é a porcentagem de jovens que se encontra desempregada: considerando-se os diferentes tipos de desemprego, entre os jovens de famílias com renda de até dois salários mínimos 50,7% estavam desempregados, diminuindo essa porcentagem para 19,7% entre os jovens de famílias com renda superior aos dois até cinco salários mínimos e para 4,3% entre os jovens de famílias com renda superior aos cinco salários mínimos (Quadro 05).
Esse conjunto de dados diz, portanto, que a empregabilidade em Santa Cruz do Sul tem idade, tem sexo, tem escolaridade e tem renda. Ou seja, as possibilidades de encontrar um trabalho de forma permanente são maiores entre os homens, entre os jovens com mais idade, entre os que têm maior escolaridade e entre os que pertencem a famílias com rendas superiores. Por outro lado, a realidade do desemprego está mais próxima para as mulheres, para os que têm menor escolaridade e para os que pertencem a famílias com rendas inferiores.
Cabe, ainda, o registro que para os jovens que afirmaram que procuraram trabalho nos últimos 30 dias e não encontraram, não tendo realizado nenhuma atividade remunerada nos últimos sete dias que antecederam ao da pesquisa, foi perguntado há quanto tempo estavam procurando trabalho. A tabela a seguir apresenta esses dados. Note-se que o número de jovens, que se encontravam na situação pressuposta para a resposta à pergunta, não permite uma análise estatística. Nesse sentido, não se pode daí alcançar conclusões acerca do tempo médio que os jovens precisavam para encontrar um emprego em Santa Cruz do Sul. De qualquer forma, segundo os dados da pesquisa, há uma tendência de a procura de emprego superar o período de um mês: 54,9% dos jovens desempregados afirmaram que estavam procurando emprego há mais de um mês, enquanto 31,4% afirmaram que estavam procurando trabalho num período inferior a um mês (Quadro 06).
Considerações finais
Os dados apresentados neste artigo foram levantados numa pesquisa realizada no período final do ano de 2011. Trata-se, portanto, de uma "fotografia" da situação do jovem no mercado de trabalho no município de Santa Cruz do Sul naquele período. De qualquer forma, o levantamento realizado tem diferentes significados, tanto sob o ponto de vista da construção do conhecimento quanto sob o ponto de vista da definição de políticas públicas voltadas ao trabalho e ao emprego de jovens.
É importante destacar que a pesquisa realizada foi uma primeira experiência realizada em Santa Cruz do Sul de um tipo de pesquisa que, de modo geral, tem sido realizada somente nas grandes regiões metropolitanas do País. Amplamente conhecida, a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada pelo DIEESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos), é a única pesquisa que sistematiza regularmente dados sobre mercado de trabalho no Brasil (com dados, inclusive, sobre a situação dos jovens); contudo, é uma pesquisa que contempla apenas as grandes regiões metropolitanas do País (mais precisamente, as regiões metropolitanas de Porto Alegre, São Paulo, Salvador, Distrito Federal, Belo Horizonte, Recife e Fortaleza). Não existem, portanto, dados precisos, levantados através de pesquisas periódicas, sobre os mercados de trabalho de regiões interioranas do País. A pesquisa realizada, na medida em que constitui um esforço inicial de pesquisadores da UNISC (Universidade de Santa Cruz do Sul) e de representantes da Comissão Municipal de Emprego do município de Santa Cruz do Sul no sentido de "formatar" uma metodologia de pesquisa para um maior e melhor conhecimento do mercado de trabalho do município, tem um caráter pioneiro no País.4
Há de se destacar, igualmente, a importância de uma pesquisa dessa natureza na discussão e na execução de políticas públicas de trabalho e de emprego nos municípios. Ela nasceu, inclusive, da preocupação de uma Comissão Municipal de Emprego no sentido de instrumentalizar, com dados e informações sobre o mercado de trabalho local, o processo dialógico a partir do qual são oferecidos cursos de formação profissional no âmbito municipal, dentro das políticas públicas de trabalho e de renda existentes no País.
Mas os dados apresentados neste artigo sobre emprego e desemprego entre os jovens de Santa Cruz do Sul têm uma importância ainda maior. Eles traduzem uma condição histórica vivenciada pela população jovem não somente no Brasil, mas, também, em diferentes partes do mundo. Como afirmado no início deste texto, o fantasma da desestruturação dos mercados de trabalho e, principalmente, da precarização do trabalho assombra trabalhadores e trabalhadoras no mundo contemporâneo. Mas assombra de forma mais assustadora determinados grupos de trabalhadores e de trabalhadoras, entre os quais os jovens.
A realidade dos jovens apresentados neste artigo não é diferente, pois parcelas significativas deles encontram-se desempregados. Vivenciam, portanto, a condição de precariedade que os jovens no mundo encontram no mercado de trabalho. E os jovens, de famílias com menores rendas, com menor escolaridade, vivenciam essa condição de modo ainda mais intenso.
É importante concordar, no final deste artigo, com a afirmação de Marília Pontes Sposito (2005), segundo a qual "o trabalho também faz a juventude". Não o trabalho precário, resultante de uma condição insegura que caracteriza a experiência de ingresso e de permanência de muitos jovens no Brasil e no mundo, mas o trabalho enquanto condição humana de transcendência, de desenvolvimento das potencialidades humanas, de inserção positiva e criativa em processos interativos, de realização de projetos individuais e coletivos. Desvendar as especificidades que constituem o ser "jovem trabalhador" certamente é um desafio importante para que se possam constituir agendas capazes de dar respostas à condição precária que constitui a experiência de muitos jovens no mundo do trabalho e, portanto, para que se possam alimentar perspectivas positivas de os jovens executarem seus projetos de vida.
Referências
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Data de recebimento: 26/05/2012
Data de aceite: 22/12/2013
Sobre os autores:
Marco André Cadoná é Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professor na Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), onde atua no Departamento de Ciências Humanas e no Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Desenvolvimento Regional. Endereço Eletrônico: mcadona@unisc.br.
César Hamilton Góes é Doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor na Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), onde atua no Departamento de Ciências Humanas e no Programa de Pós-Graduação (Mestrado) em Educação. Endereço Eletrônico: cgoes@unisc.br.
1 Em agosto de 2011, o Escritório de Estatística da União Europeia (Eurostat) publicou dados sobre o desemprego em 27 países-membros da União Européia, indicando que, nesses países, havia uma média de 20,5% de desempregados entre os jovens com idades entre 15 e 24 anos. Em três países a situação era mais grave: Espanha, onde 45,7% dos jovens estavam desempregados; Grécia, onde 38,5% dos jovens estavam desempregados; e Eslováquia, onde 33,3% dos jovens estavam desempregados. Mariana SANTOS. DW WORLD DE Deutsche Welle. In: http://www.dw-world.de\dw\article\0,,15311929,00.html. Consulta em 23 de dezembro de 2011.
2 Cabe observar que pesquisas sobre emprego e desemprego no Brasil são realizadas, de modo geral, somente nas regiões metropolitanas do País. Nesse sentido, a pesquisa realizada constituiu uma experiência de mobilização de recursos e de pessoas, visando criar uma cultura de construção de conhecimentos sobre emprego, desemprego, situação do mercado de trabalho num município do interior do Estado.
3 Essa definição de desemprego é utilizada pelo DIEESE, em suas pesquisas mensais de emprego e desemprego (PED) em sete regiões metropolitanas do País: Porto Alegre, São Paulo, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Recife e Fortaleza. Conforme a metodologia utilizada pelo DIEESE, "desemprego aberto" é a situação no mercado de trabalho que caracteriza as pessoas "que procuraram trabalho de maneira efetiva nos 30 dias anteriores ao da entrevista e não exerceram nenhum trabalho nos sete últimos dias" (DIEESE, Principais Conceitos da Pesquisa de Emprego e Desemprego. In: www.dieese.org.br\ped\pedmet.xml). Consulta em 19 de dezembro de 2011.
4 A pesquisa realizada insere-se numa discussão (realizada durante o segundo semestre de 2011) sobre a importância de Santa Cruz do Sul ter levantamentos periódicos sobre a situação do mercado de trabalho no município, realizada no âmbito da Comissão Municipal de Emprego e contando com a participação dos autores deste artigo. Como resultado daquela discussão, estão programados dois novos levantamentos para o ano de 2012.