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Acta Comportamentalia
versão impressa ISSN 0188-8145
Acta comport. vol.21 no.2 Guadalajara 2013
ARTIGOS
Controle condicional sobre a produção de sentenças: efeitos da ordem de treino do tipo de sentença.
Conditional control over sentence production: effects of the order of sentences' types in training
Pedro Felipe dos Reis Soares;1 Grauben José Alves de Assis;2 Ana Leda de Faria Brino3
Universidade Federal do Pará (Brasil)
RESUMO
Estudo recente demonstrou que um método automatizado de ensino por sobreposição foi efetivo em ensinar o controle condicional de cores sobre a construção de sentenças (na voz ativa e passiva) para quatro crianças com histórico de fracasso escolar. Entretanto, as crianças não construíram novas sentenças sob controle condicional, quando era exigida a recombinação de palavras das sentenças ensinadas. As crianças construíram corretamente novas sentenças apenas na voz ativa. O objetivo deste estudo foi investigar se a ordem de treino dos dois tipos de sentenças teria efeito sobre a emergência e manutenção de controle condicional sobre repertório de construção de novas sentenças. Quatro participantes foram expostos ao ensino de sentenças na voz ativa, seguido pelo ensino na voz passiva; para outros quatro, a ordem de ensino foi invertida. Corroborando o estudo anterior, todos os participantes aprenderam a construir as sentenças sob controle condicional. Contudo, o treino foi insuficiente para produzir repertório recombinativo de construção de novas sentenças sob controle condicional para todas as crianças. Os participantes construíam corretamente um ou outro tipo de sentença. Estudos posteriores podem envolver primeiramente testes de emergência de novas sentenças de tipos diferentes antes da exposição ao ensino e teste de controle condicional.
Palavras-chave: Ensino por sobreposição, produção de sentenças, controle condicional, sentenças na voz ativa e passiva, crianças com histórico de fracasso escolar.
ABSTRACT
Recent study has demonstrated automatized overlapping words procedure as an effective method to teach colors conditional control on the active and passive voice sentence construction for four children that have learn problems at school. However, children did not shown conditional control over construction of new sentences, when recombination of the words presented in directed trained sentences was required; children were able to construct only active voice new sentences. The objective of the present study was investigate if the training order of two types of sentences could have an effect over the conditional control emergency and maintenance on the new sentences construction repertory. Four participants were first exposed to teaching of active voice sentence followed by passive voice sentence. Other four participants learned first passive voice sentence and then active one. According to the previous study all the participants learned how to construct sentences under conditional control. Therefore, the training was insufficient to all children produce a combinative repertory in new sentences under conditional control. The participants have correctly composed one or another type of sentence. Further studies may first comprehend different types of emergence tests of new sentences, before get evolved with teach and conditional control tests.
Keywords: overlapping words procedure, sentence production, conditional control, active and passive voice, children.
As sentenças usadas em nossa comunicação são compostas por classes gramaticais como artigo, sujeito, verbo, objeto. Diversas sentenças apresentam usualmente uma ordem comum, de modo que cada palavra pode passar a exercer uma função discriminativa baseada em sua ordem na sentença, por exemplo, de primeira, segunda, terceira posição e assim por diante. Nesse sentido, a formação de classes ordinais compostas por palavras se constitui como objeto de análise para a compreensão do fenômeno da produtividade de sentenças sintaticamente apropriadas. Alguns autores têm investigado a produção de sentenças com diferentes procedimentos de ensino (ver Sampaio, Assis, & Baptista, 2010), dentre eles os procedimentos de encadeamento de respostas ou sobreposição de palavras.
No ensino por sobreposição de palavras (conforme o paradigma de Green, Stromer, & Mackay, 1993), após duas palavras serem apresentadas simultaneamente (por exemplo, O e RATO), o participante deve escolher a palavra O e posteriormente a palavra RATO, para produzir consequências positivas. Após essa tarefa, a primeira palavra é removida da sequência e uma nova palavra é introduzida (por exemplo, RATO e MORDEU). Novamente, ambas as palavras são apresentadas simultaneamente e o participante precisa responder primeiro à palavra RATO e depois à nova palavra da sequência, MORDEU, para produzir as mesmas consequências anteriores. O ensino segue desta forma, acrescentando-se uma nova palavra a cada fase até que todas as palavras da sentença tenham sido apresentadas em pares. Terminado o ensino, testes de construção da sentença são aplicados.
Nos estudos desta área, os testes envolvem a recombinação de palavras de ambas as sentenças em posições consistentes com aquelas ocupadas nas sequências ensinadas. A habilidade em recombinar componentes de sentenças distintas em ordem "correta" (em acordo com a usada na comunidade verbal do participante), indica a formação de classes de estímulos ordinais entre os membros que ocupam a mesma posição nas diferentes frases (Mackay & Fields, 2009; Verdu, de Souza, & Lopes Junior, 2006).
Uma proposta seminal para o estudo de classes sintáticas (cf. Skinner, 1992) e das relações ordinais entre estímulos que compõem sequências foi apresentada por Green et al. (1993) em um estudo conceitual. Os autores descreveram o paradigma de relações ordinais, propondo dois arranjos experimentais diferentes para o ensino de sequências (encadeamento e sobreposição de estímulos), identificando as relações entre estímulos de uma mesma sequência e de sequências diferentes, e apresentando testes comportamentais específicos delineados para verificar as propriedades relacionais indicativas de formação de classes ordinais.
As propriedades de uma relação ordinal propostas por Green et al. (1993) têm base em definições matemáticas ilustradas por Stevens (1951), quais sejam: 1) irreflexividade, que sugere que uma relação ordinal é explicitamente não reflexiva, não sendo verdadeira uma sequência A → A, ou seja, A não "vem antes de" A; 2) assimetria, que indica que uma relação entre os estímulos de uma sequência é unidirecional, isto é, se A→B, B→A não é verdade; 3) transitividade, em que dadas as relações sequenciais A→B e B→C, então A→C é produto, possível pela correlação com o estímulo "B", presente em ambas as sequências ; e 4) conectividade, em que todos os estímulos de uma sequência são passíveis de serem relacionados em uma dada ordem, tendo em vista que as propriedades de irreflexividade e de assimetria devem ser respeitadas, por exemplo, se A→B→C é treinado, então A→B, A→C e B→C são relações derivadas.
Ensinando-se sequências distintas, que devem apresentar as propriedades acima descritas, a observação da formação de classes ordinais depende de testes de verificação de substituibilidade entre elementos que ocupam a mesma posição nas diferentes sequências treinadas. A formação de classes ordinais parece ser um fenômeno subjacente à aprendizagem da sintaxe e, consequentemente, à produtividade de novas sentenças para além daquelas às quais as crianças são expostas em sua comunidade verbal. Os desempenhos em testes de substituibilidade demonstram a produtividade como propriedade crítica da sintaxe. A demonstração de produtividade significa que após um indivíduo ter aprendido um pequeno número de sentenças em uma dada estrutura sintática, um grande número de novas sentenças emergirá sem ensino direto, e cada nova sentença conterá um conjunto novo de palavras produzidas em uma ordem apropriada. Essa produtividade aponta que o indivíduo adquiriu uma sintaxe relacional refletida pela produção de novas sentenças gramaticalmente corretas (Mackay & Fields, 2009).
Para isso, a ordem de apresentação dos estímulos, torna-se a principal variável de controle (Miccione, Assis, & Dias, 2010) sobre a formação das classes de primeiros, segundos, terceiros e assim por diante, por meio de contingências de reforçamento diferencial que demandam respostas de ordená-los numa sequência programada experimentalmente (por exemplo, Assis, Corrêa, Souza, & Prado, 2010; Assis, Magalhães, Monteiro, & Carmo, 2011; Green et al., 1993; Souza, Assis, Magalhães, & Prado, 2008; Stromer & Mackay, 1993 - Experimento 2; Verdu, et al, 2006).
A ordem das palavras em uma sentença é variável relevante no controle de respostas específicas dos ouvintes de determinada língua (ver Sella & Bandini, 2012, para uma discussão mais extensa dessa questão). Por exemplo, a expressão "Busque minha bolsa, por favor", usualmente controla a resposta do ouvinte de buscá-la, obviamente se outras variáveis motivacionais não estiverem controlando o comportamento do ouvinte no momento. No entanto, se alguém disser "Minha favor bolsa por busque", caso o ouvinte responda de acordo com a frase anterior, no mínimo, sua resposta será emitida após maior latência. No entanto, algumas construções frasais que contém um conjunto muito similar de palavras expressas em ordens distintas podem controlar o mesmo padrão de responder. Por exemplo, sentenças na voz ativa ("O magistrado proferiu a sentença") e na voz passiva ("A sentença foi proferida pelo magistrado") podem controlar respostas comuns do ouvinte, embora o arranjo ordinal das palavras não seja o mesmo. O fato de os indivíduos de determinada comunidade verbal usarem uma ou outra construção em condições muitas vezes distintas nos sugere que a produção de sentenças em uma ou outra ordem sofre controle condicional.
O controle condicional da construção de sentenças foi estudado por Yamamoto e Miya (1999) que usaram um procedimento informatizado de ensino e de testes utilizando palavras como estímulos para a construção de sentenças e imagens como modelos. Os autores conduziram dois estudos para avaliar as condições suficientes para a produção de sentenças em três autistas com comportamento vocal restrito. No primeiro estudo, após o ensino da construção de sentenças com quatro palavras cada, na presença de uma imagem correspondente, os participantes foram capazes de construir novas sentenças gramaticalmente corretas quando novas imagens eram apresentadas como modelo. No segundo estudo, unidades específicas da língua japonesa foram incluídas como escolhas em tarefas de construção das sentenças; a posição de tais unidades era condicional à ordem, passiva ou ativa, da sentença. Quando apresentadas uma figura e uma palavra da classe gramatical sujeito como modelo, cabia ao participante selecionar uma ordem X de partículas e outras palavras (das classes objeto e verbo) para completar a frase; se uma figura e uma palavra da classe gramatical objeto eram modelo, uma ordem Y de partículas e outras palavras deveriam ser selecionadas para completar a frase. Novamente, o ensino resultou na produção de novas sentenças gramaticalmente corretas na presença de estímulos condicionais correlacionados no treino à construção na voz passiva ou ativa. O procedimento utilizado por Yamamoto e Miya demonstra a importância da informatização como ferramenta de ensino e apresenta refinamento experimental pelo uso de quatro palavras em cada sentença, com especificação de voz por estímulos condicionais, promovendo um avanço no arranjo experimental no que concerne à complexidade do repertório ensinado.
De acordo com Mackay e Fields (2009), utilizando-se o paradigma de classes ordinais proposto por Green et al. (1993) e fazendo uso de tecnologia informatizada como contexto de treino de controle de estímulos, é possível ensinar sentenças com componentes gramaticais e realizar testes para avaliar se ocorre a produção de sequências nas quais os membros apresentam posições indicativas de igualdade de classe de estímulos, ou seja, gramática e sintaticamente corretas. Adicionalmente, os autores assumem alterações na ordem das palavras como forma de aproximação de contextos cotidianos. Portanto, por essa via há a ampliação do escopo analítico ao colocar a produção de sentenças também sob controle condicional (Mackay & Fields, 2009).
Nesse campo de investigação, Corrêa, Assis e Brino (no prelo) investigaram os efeitos do ensino por sobreposição de palavras sobre a produção de sentenças na voz ativa e passiva. Adicionalmente, os autores investigaram a extensão do controle condicional de cores sobre a construção de sentenças nas duas ordens. Seis crianças com história de fracasso escolar e idades entre 6 e 10 anos participaram do estudo e aprenderam a construir duas sentenças na voz ativa e duas na voz passiva. No treino, o responder sequencial foi treinado primeiramente para gerar repertório de construção de sentenças na voz ativa, e depois de sentenças na voz passiva. Após a aquisição da construção das sentenças, a resposta de construção de um ou outro tipo, ativa ou passiva, foi correlacionada à presença da cor verde e vermelha como modelo, respectivamente. Testes de substituibilidade aplicados em seguida verificaram o controle condicional das cores sobre a construção de oito novas sentenças, quatro na ativa e quatro na passiva, que envolviam a recombinação das palavras das quatro sentenças diretamente treinadas (ver sentenças na Tabela 2). Segundo os autores, nem todos os participantes responderam consistentemente na tarefa de construir as novas sentenças sob controle condicional. Um participante alcançou 87,5%, dois obtiveram 75% e para os demais, a porcentagem de acerto foi de 62,5%, 50% e 37,5%. Os desempenhos próximos ou inferiores a 50% de acertos não indicavam controle condicional parcial, mas que as crianças construíam corretamente apenas as sentenças na ordem ativa.
Um segundo experimento foi conduzido por Corrêa et al. (no prelo), envolvendo maior número de tentativas de treino de controle condicional sobre a construção de sentenças da linha de base e critério de desempenho mais exigente antes da aplicação dos testes; as três crianças que obtiveram os menores índices de acertos acima apresentados participaram desse segundo experimento. Nos testes de substituibilidadedessa replicação, dois participantes obtiveram 100% e 87,5% de acerto. No entanto, quando os testes de substituibilidade foram aplicados após 45 dias do encerramento de ambos os experimentos,somente um participante manteve seu repertório. Os dados indicaram que as sentenças construídas corretamente envolviam somente a ordem da voz ativa.
No estudo acima descrito, a ordem de treino de sentenças envolveu, sempre, primeiramente as sentenças na voz ativa e, posteriormente, as sentenças na voz passiva. Embora a voz ativa pareça ser mais usualmente empregada pela comunidade verbal, o que poderia explicar a manutenção somente desse repertório observada nos testes de manutenção do estudo previamente descrito, levantou-se a hipótese de se a ordem de treino do tipo de sentença, ativa-passiva ou passiva-ativa, seria uma variável capaz de afetar o desempenho e produzir controle condicional por permitir a manutenção das respostas de construção também das sentenças na voz passiva.
O presente estudo é uma replicação sistemática de Corrêa, et al (no prelo) cujo objetivo foi verificar o efeito da ordem de treino de sentenças, na voz passiva e na voz ativa, sobre a construção de relações sintáticas sob controle condicional em pré-escolares. Avaliou-se ainda a manutenção do desempenho de controle condicional sobre a construção de sentenças na ativa e passiva após um período sem contato com as contingências de ensino e de testes de sentenças.
MÉTODO
Participantes
Participaram do estudo oito crianças do ensino fundamental, recrutadas em uma instituição não-governamental de apoio a populações carentes, na cidade onde o estudo foi realizado. Um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (protocolo no 022/09 – CEP-ICS/UFPA), conforme exigência da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, contendo especificações acerca dos objetivos e demais informações sobre o estudo, foi assinado pelos responsáveis dos participantes, autorizando-os a participar do estudo. A Tabela 1 apresenta a relação dos participantes, por idade, escolaridade e sexo.
Ambiente Experimental e Equipamento
As sessões experimentais foram conduzidas em uma sala reservada da instituição, com iluminação artificial, climatizada e relativo isolamento acústico. Cada participante permanecia sentado em frente a um notebook, com o experimentador ao seu lado monitorando a sessão.
Utilizou-se um notebook com tela de 15'' e o software PROLER (Assis & Santos, 2010 - em versão 5.2), elaborado em linguagem Java, a partir de versões anteriores. O software apresentava os estímulos, números de tentativas programadas, as posições de cada estímulo na tela do monitor e registrava as respostas corretas e incorretas, apresentando um relatório de sessão ao término de cada passo de ensino ou teste programado. A tela do computador estava dividida em duas áreas principais. A parte superior da tela com oito "janelas", fundo da cor cinza, foi denominada "área de construção", na qual eram apresentados os estímulos, dispostos lado a lado, após se deslocarem da "área de escolha", localizada na parte inferior da tela. Na área de escolha, o programa reservou doze "janelas" de 2,5 cm x 2,5 cm nas quais os estímulos que formavam cada sentença eram apresentados de forma randomizada.
Estímulos
Duas cores, verde e vermelho, foram usadas como estímulos condicionais às respostas de construção de sentenças na voz ativa ou na voz passiva, respectivamente. Um quadrado de cor verde ou vermelha, medindo 2 x 2 cm, era apresentado na porção superior da tela do computador quando o ensino ou o teste envolvia o controle condicional.
Além dos estímulos condicionais, as palavras que constituíam as quatro sentenças diretamente treinadas ou testadas no estudo poderiam ser apresentadas na tela do computador. As sentenças deveriam ser construídas na voz ativa ou na voz passiva. A Tabela 2 a seguir apresenta as sentenças usadas nas condições de ensino com o objetivo de construir repertório de linha de base (LB) para a aplicação dos testes.
Procedimento
Inicialmente, no recrutamento uma avaliação de leitura das sentenças que seriam usadas neste estudo foi aplicada, com o objetivo de medir o nível de leitura fluente dos alunos. Essa avaliação consistiu na exposição de cada aluno às quatro sentenças apresentadas na Tabela 2. Cada sentença era apresentada no computador em tela cheia, sendo solicitada à criança a leitura em voz alta de cada uma delas. Verificada soletração, alta latência na verbalização das sentenças, indicativo de verbalização não fluente de sentenças, o aluno era recrutado para o estudo.
O procedimento de ensino iniciava com o treino por sobreposição de repertório construção de cada uma de quatro sentenças, duas na voz ativa (constituídas de cinco palavras) e duas na passiva (constituídas de seis palavras). O procedimento por sobreposição era caracterizado pelo ensino de pares de palavras de uma mesma sentença, seguido de sondas intercaladas para verificar a construção de cada par de palavras pelo participante. Após o ensino por sobreposição seguido da sonda de construção de cada par de palavras que compunha uma sentença, testes de construção de cada sentença completa eram aplicados. Após o estabelecimento de cada par de sentenças, uma na voz ativa e outra na voz passiva, apresentava-se o ensino de relações condicionais cor-sentença para um dos pares e, posteriormente, testes de controle condicional emergente sobre a construção das sentenças do segundo par. O teste de controle condicional emergente era seguido por um teste de substituibilidade envolvendo repertório de recombinação das palavras das quatro sentenças sob controle condicional; após o teste de substituibilidade, os participantes foram expostos a uma sessão de teste de leitura com compreensão, envolvendo figuras correlacionadas às quatro sentenças da linha de base (Tabela 2); finalmente, testes de verificação de manutenção de desempenho foram aplicados 45 dias após o término do estudo.
Para o ensino de cada par de palavras, o experimentador fornecia a seguinte instrução ao participante: "Toque em uma palavra de cada vez". Requeria-se também do participante que ele nomeasse cada palavra após tocá-la. Durante a tarefa de toque nas palavras, se o participante não nomeasse a palavra ou se nomeasse a palavra incorretamente, o experimentador fornecia o modelo verbal e solicitava ao participante que repetisse oralmente o modelo verbal apresentado; se o participante apresentasse a oralização correta da palavra ou da sequência, a resposta era seguida por elogios do experimentador. Em todas as fases de treino, o experimentador poderia fornecer uma dica verbal, por exemplo, "preste atenção", "você está certo que é esta palavra?" e outros do tipo, de forma que o repertório do participante pudesse ser estabelecido com o mínimo de erros. Ao fim das sessões experimentais, que ocorriam três vezes por semana, os participantes recebiam "brindes" (brinquedos e jogos educativos), independente de seu desempenho.
Os oito alunos selecionados para o estudo foram distribuídos aleatoriamente em dois grupos experimentais com quatro participantes cada. Os participantes do Grupo 1 (POL, LUC, DAN, STU) foram expostos ao ensino de construção de sentenças na voz ativa (cinco palavras), seguido do ensino na voz passiva (seis palavras) e testes alternados e consecutivos; os participantes do Grupo 2 (DAV, SAM, ERI, EVE) foram expostos à ordem de ensino de voz passiva-ativa, também alternados e seguidos pelas condições de teste. As condições de ensino e teste são descritas com mais detalhes a seguir e fazem referência à ordem de exposição relativa ao Grupo 1; para o Grupo 2,como acima citado, a exposição ao ensino se iniciava com a sentença em voz passiva (Sentença 2 seguida de Sentença 1 e, posteriormente, Sentença 4 seguida de Sentença 3).A Tabela 3, apresentada após a descrição das condições, resume a sequência de condições aplicada para cada grupo de participantes.
Condição 1. Ensino por sobreposição com a Sentença 1 (voz ativa). Na primeira tentativa, duas palavras eram apresentadas em qualquer das "células" que estavam disponíveis na "área de escolha". Na primeira tentativa, as palavras "O" e "RATO" eram apresentadas em duas "células", enquanto as demais "células" permaneciam desativadas e o toque sobre elas não tinha consequência diferencial programada.A topografia de resposta de tocar na palavra produzia seu deslocamento da "área de escolha" para a "área de construção", na parte superior da tela.As palavras se deslocavam da "área de escolha", uma de cada vez, para a parte superior da tela (área de construção), da esquerda para a direita, onde permaneciam por 5s. Uma animação gráfica era apresentada contingentemente à construção de sequências corretas na tela do computador, juntamente com o reforço social do experimentador "Muito bem, você acertou!", ou "Parabéns!", "Legal você conseguiu!". Quando a ordem da sentença construída pelo participante era diferente da programada, por exemplo, RATO →O, a tela se escurecia por 3s e um procedimento de correção era aplicado em que os mesmos estímulos reapareciam na "área de escolha" na mesma posição para que novas escolhas ocorressem. O participante era exposto a cada par da sequência até no máximo seis vezes. Caso continuasse a não formar a sentença prevista, o participante deveria retornar à fase imediatamente anterior do procedimento.
Após atingir o critério de acerto de ordenar corretamente as duas primeiras palavras da sentença em três tentativas consecutivas, outro par de palavras da sentença era apresentado em qualquer uma das células, "RATO" e "MORDEU", e a tarefa do participante era tocar a palavra "RATO" e em seguida a palavra "MORDEU"; as mesmas consequências descritas acima eram programadas para as respostas corretas e incorretas. A ordenação dos demais pares de palavras da sentença foi ensinada no mesmo formato.
A cada par ensinado da sentença, o participante era submetido às sondas. As sondas eram uma mesma tentativa de ensino, porém sem consequência diferencial programada para a resposta de construção de sentença. Ainda que a resposta na tentativa de sonda fosse incorreta, o participante avançava nas fases do estudo, dado que o principal objetivo das sondas era a exposição dos participantes a condições sem reforçamento programado, que ocorreriam nas fases de teste subsequentes.
Condição 2. Teste de construção de Sentença1. Este teste tinha como objetivo verificar a efetividade do procedimento de sobreposição sobre o ensino da construção de sentenças e também avaliar se as relações ensinadas apresentavam ordinalidade. Nesta condição, o participante era submetido ao teste de produção de sentenças com as palavras que formavam a Sentença 1. Todas as palavras que formavam a Sentença 1 eram disponibilizadas simultaneamente em "células" dispostas lado a lado, randomicamente, na "área de escolha". O experimentador dizia ao participante:"Olhe para as palavras. Agora você terá que tocar uma palavra de cada vez".
O participante deveria tocar em todas as palavras apresentadas até que nenhuma mais restasse na "área de escolha". A tarefa do participante era similar aos parâmetros adotados para as sondas, sem consequência diferencial para as respostas. Em caso de construção de uma sentença diferente da ensinada, o participante era exposto novamente ao ensino por sobreposição daquela sentença e, em seguida, novamente ao teste correspondente.
Condição 3. Ensino por sobreposição com a Sentença 2 (Voz Passiva).O ensino por sobreposição com as palavras que formavam a Sentença 2 seguiu os mesmos passos descritos para o ensino da Sentença 1. A tentativa de sonda para cada par de palavras que formavam a Sentença 2 seguiu os mesmos passos descritos para a Sentença 1.
Condição 4. Teste de construção de Sentença 2. Este teste seguia os mesmos parâmetros de teste aplicado com a Sentença 1.
Condição 5. Ensino de controle condicional de cores (verde e vermelho) sobre as respostas de construção das Sentenças 1 e 2. Nessa condição, houve revisão de linha de base das respostas de construção das Sentenças 1 e 2, nas vozes ativa e passiva,durante o ensino de controle condicional das cores verde e vermelho sobre as respostas de construção dessas duas sentenças. A cada tentativa, uma das duas cores era apresentada na parte superior da tela do computador em uma janela centralizada. O participante era solicitado, pela instrução verbal "Que cor é esta?", a nomear a cor presente. Após a nomeação adequada da cor, as palavras que compunham as Sentenças 1 e 2 eram apresentadas randomicamente na área de escolha e o participante deveria tocar as palavras na ordem da Sentença 1 ou 2, de acordo com a cor presente. Na presença da cor verde, a construção da Sentença 1 (voz ativa) era programada como resposta correta e, na presença da cor vermelha, a resposta de construção da Sentença 2 (voz passiva). Em caso de acerto na produção da sentença, o desempenho era seguido de reforço social, como já descrito; em caso de erro, não havia consequência social e o participante era exposto à sentença seguinte.
Nesta fase estavam previstas dez tentativas por sessão, cinco para cada cor como estímulo condicional; as tentativas eram apresentadas de forma randomizada no decorrer da sessão, com o objetivo de estabelecer o controle condicional da cor presente sobre a produção da sentença. O critério de desempenho exigido no ensino para a exposição posterior aos testes consistiu de 90% de acertos em três blocos consecutivos de 10 tentativas, ou seja, permitia-se que o participante apresentasse apenas uma resposta de construção incorreta a cada 10 tentativas, em 3 blocos consecutivos.
Condição 6. Ensino por sobreposição com Sentença 3 (voz ativa). O ensino por sobreposição com as palavras que formam a Sentença 3 seguiu os mesmos passos descritos para o ensino das Sentenças 1 e 2.
Condição 7. Teste de construção de Sentença 3. O ensino seguiu os mesmos parâmetros dos testes de construção das Sentenças 1 e 2.
Condição 8. Ensino por sobreposição da Sentença 4 (voz passiva). O ensino por sobreposição com as palavras que formam a Sentença 4 seguiu os mesmos passos descritos para o ensino das três sentenças anteriores. O teste de sondagem com as palavras que formam a Sentença 4 seguiu os mesmos passos descritos para os testes de sondagem das sentenças previamente ensinadas.
Condição 9. Teste de construção da Sentença 4. Este teste seguiu os mesmos parâmetros dos testes das sentenças anteriores.
Condição 10. Retomada de linha de base de controle condicional sobre a construção das Sentenças 1 e 2. A revisão de linha de base com as sentenças 1 e 2 (Condição 5) era retomada para garantir pré-requisito de controle condicional, pois, caso o participante não apresentasse essa linha de base, obviamente os testes de extensão do controle seriam negativos. Em caso de erro na produção de qualquer uma das sentenças dessa condição, o participante era exposto novamente a um bloco da Condição 5 e somente quando atingisse 90% de acerto retornaria à esta Condição 10. Esta condição era aplicada até que o participante apresentasse o desempenho de 100% de acertos na produção das sentenças sob controle condicional. O desempenho de 100% era pré-requisito para a exposição de cada participante ao teste seguinte, de expansão de controle condicional.
Condição 11. Teste e treino de extensão de controle condicional das cores sobre as Sentenças 3 e 4. Nesse teste, oito tentativas compunham a sessão, com quatro tentativas para cada cor como estímulo condicional, distribuídas randomicamente durante a sessão. Não havia consequência diferencial programada para a construção de sentenças na primeira tentativa de cada cor como modelo; as outras três tentativas eram reforçadas diferencialmente. Os critérios a serem atendidos nessa condição eram os mesmos descritos para a Condição 5.
Condição 12. Retomada de linha de base de controle condicional sobre a construção das Sentenças 1 e 2, e das Sentenças 3 e 4. Na revisão de linha de base final, os participantes foram expostos novamente à tarefa de produzir uma sentença prevista condicionalmente à cor apresentada. As palavras contendo duas dentre as quatro sentenças do estudo eram apresentadas de forma randomizada; em duas tentativas, as palavras das Sentenças 1 e 2 estavam disponíveis na área de escolha e em outras duas tentativas, as palavras das Sentenças 3 e 4. As Sentenças 1 e 3 (voz ativa) deveriam ser construídas na presença do quadrado verde, e as Sentenças 2 e 4 (voz passiva) na presença do quadrado vermelho. Em casos de erro na produção das Sentenças 1 e 2, o participante era exposto novamente a um bloco da Condição 5 e quando atingisse 90% de acertos,retornava às tentativas de teste envolvendo as Sentenças 1 e 2; em caso de erros na produção das Sentenças 3 e 4, o participante era exposto novamente a um bloco da Condição 11 e quando atingisse 90% de acerto retornava às tentativas envolvendo as Sentenças 3 e 4. Este procedimento era repetido até que o participante apresentasse o desempenho de 100% de acertos na produção das sentenças desta condição, considerado pré-requisito para o Teste de Substituibilidade, aplicado na sequência.
Condição13. Teste de Substituibilidade. Nesta condição, testou-se se os participantes seriam capazes de produzir novas sentenças sob controle condicional das cores, a partir da recombinação das palavras de todas as quatro sentenças diretamente ensinadas. Oito novas sentenças poderiam ser produzidas, quatro na voz ativa e quatro na voz passiva (ver Tabela 2, Sentenças 5 a 12).Uma tentativa era programada para cada uma das oito novas sentenças com as cores como estímulo condicional à construção na voz ativa (cor verde) ou na passiva (cor vermelha).Não havia reforçamento diferencial programado para as respostas de construção.
Por exemplo, as palavras das Sentenças 1 e 2 eram apresentadas randomicamente na "área de escolha" ,"O→RATO→MORDEU→UMA→FRUTA" e "UMA→FRUTA→FOI→ MORDIDA→PELO→RATO", em "células" dispostas lado a lado. Na presença de todos os estímulos na "área de escolha", o experimentador solicitava a nomeação da cor. Em seguida, fornecia instruções mínimas ao participante "Toque uma palavra de cada vez". O participante deveria selecionar as palavras compondo uma sentença de acordo com a cor presente (voz ativa ou passiva). O participante precisava tocar em todas as palavras que compunham uma sentença e a sentença permanecia por 5s na tela do computador.
Condição 14. Teste de compreensão de leitura. Nesse teste, uma das quatro sentenças de linha de base, Sentença 1,2,3 ou 4, era apresentada na tela do computador e o participante deveria selecionar dentre três fotografias, uma ao lado da outra, aquela que correspondia à sentença apresentada como modelo. Uma tentativa de cada sentença constituía a sessão de teste e não havia consequência diferencial para as escolhas.
Condição 15. Teste manutenção da substituibilidade. O teste aplicado na Condição 13 foi reaplicado após um período de 45 dias do término da Condição 14.
RESULTADOS
A avaliação de leitura das sentenças usadas no recrutamento, com o objetivo de medir o nível de leitura fluente dos alunos, consistiu na exposição de cada aluno às quatro sentenças apresentadas na Tabela 2. Para todos os alunos recrutados verificou-se soletração, alta latência na verbalização das sentenças, indicativo de verbalização não fluente de sentenças.
Todos os participantes aprenderam a construir as quatro sentenças de linha de base por meio do treino por sobreposição (Condições 1, 3, 6 e 8), variando-se entre os sujeitos o número de exposições necessárias para alcance de critério para cada par de palavras das quatro sentenças. Por exemplo, para os participantes do Grupo 2, o treino por sobreposição foi bem mais extenso para a primeira sentença ("Um queijo foi mordido pelo rato") em que o número total de exposição aos pares de palavras foi de 51 para o participante DAV e de 149 para EVE. No ensino das três frases seguintes, os participantes precisaram de um número inferior de exposições. DAV precisou de 25e EVE de 47 exposições aos pares de palavras da Sentença 2 ("O rato mordeu um queijo") para atingir o critério.
Nos testes de construção de cada uma das quatro sentenças (Condições 2, 4, 7 e 9), os participantes precisaram ser expostos a um mínimo de três e máximo de dez tentativas de construção de cada sentença.
Após atingiremos critérios nas condições de ensino por sobreposição das Sentenças 1 e 2, e responderem corretamente nos testes de construção dessas sentenças, os participantes dos dois grupos experimentais foram expostos à Condição 5, de treino de controle condicional das cores verde e vermelho sobre a construção de sentenças na ativa e passiva, respectivamente. Os resultados são exibidos na Figura 1. No geral, os participantes do G1, que receberam primeiramente o treino na voz ativa, necessitaram de um número menor de sessões para atingir o critério de desempenho igual ou superior a 90% de acertos em três blocos consecutivos de 10 tentativas cada.
Um número ainda menor de tentativas (mínimo de 1 e máximo de 2) foram necessárias para alcançar o critério nas condições de treino por sobreposição das Sentenças 3 e 4, e nos testes de construção dessas sentenças, para todos os participantes. Na retomada de LB de controle condicional com as Sentenças 1 e 2(Condição 10), apenas o participante EVE, do Grupo 2, precisou de mais uma exposição ao treino de controle condicional pela cor verde sobre a construção da Sentença 1 (voz ativa). Os outros sete participantes responderam corretamente em todas as tentativas.
No teste e treino de extensão de controle condicional das cores sobre a construção das Sentenças 3 e 4 (Condição 11), com exceção de EVE, os participantes de ambos os grupos precisaram de um número similar de sessões para atingirem o critério de três blocos sucessivos com desempenho igual ou superior a 90% de acertos (ver Figura 2). A percentagem de acertos na primeira sessão demonstra que nenhum participante apresentou extensão de controle condicional emergente nesse momento do estudo. Somente o participante DAN apresentou 80% de acertos na primeira sessão, acertando inclusive a primeira tentativa de controle condicional sobre a construção de cada sentença, na voz ativa e na passiva. Os demais participantes acertaram apenas a construção das sentenças na voz ativa, na presença da cor verde; o participante STU respondeu incorretamente a construção de ambos os tipos de sentenças.
Na retomada de LB de controle condicional sobre a construção das quatro sentenças (Condição 12), os participantes do primeiro grupo necessitaram de menos exposições às tentativas cor-sentença para emitirem a resposta correta em todas elas. Em função da construção incorreta das Sentenças 1 e 2, três dos participantes foram expostos novamente à Condição 5, na qual o participante STU (G1) obteve 100% de acertos, SAM (G2) obteve 50% de acertos no primeiro bloco de treino, 100% no segundo e 90% no terceiro; ERI (G2) obteve 60% de acertos e 90% no segundo bloco. Na nova exposição à Condição 11, que envolvia o controle condicional das Sentenças 3 e 4, o participante LUC (G1) obteve 100% de acertos, DAV (G2) obteve 90% e SAM (G2), 100% de acertos logo na primeira sessão.
A Figura 3 demonstra o desempenho dos participantes dos dois grupos no Teste de Substituibilidade (Condição 13) e no Teste de Manutenção (Condição 15), nos quais os participantes eram solicitados a produzir novas sentenças sob controle condicional, fazendo uso das palavras das sentenças de linha de base para formar recombinações. No geral, os participantes do Grupo 1 apresentaram melhor desempenho que os participantes do Grupo 2. A maior parte das construções corretas dos participantes do Grupo 1 ocorreram na presença da cor verde, correspondente à voz ativa. Houve grande variabilidade de desempenho entre os participantes do Grupo 2, sendo que um deles construiu corretamente todas as sentenças na voz ativa, e outro, todas as da voz passiva. Considerando-se o total de tentativas de todos os participantes, um número maior de sentenças na voz passiva foi construído corretamente.
No Teste de Manutenção da Substituibilidade, aplicado após 45 dias sem contato com as contingências programadas no estudo, nota-se deterioração de desempenho em ambos os grupos de participantes. Do Grupo 1, DAN e STU apresentaram bom desempenho, 75% de acertos nas construções das sentenças na ativa e na passiva. Um dado interessante do Grupo 2 foi que o participante ERI apresentou construção correta de todas as sentenças na voz passiva, e que outros participantes desse grupo (SAM e EVE) responderam corretamente em metade das sentenças na passiva. Esses dados sugerem que a ordem de treino pode favorecer o desempenho de construir sentenças na voz passiva, embora não possamos inferir controle condicional, em função da baixa percentagem de acertos no total de tentativas.
No Teste de leitura com compreensão (Condição 14), seis dos oito participantes emitiram escolhas corretas em todas as tentativas; os outros dois participantes escolheram incorretamente em duas das quatro tentativas, sendo que os erros ocorreram, para ambos, nas tentativas das Sentenças 1 e 3, na voz ativa. O procedimento foi efetivo em produzir a leitura com compreensão em crianças que iniciaram este estudo com repertório mínimo de reconhecimento de algumas letras.
DISCUSSÃO
Inicialmente, levantou-se a hipótese de se a ordem de treino do tipo de sentença, ativa-passiva ou passivaativa, seria uma variável capaz de afetar o desempenho e produzir controle condicional por permitir a manutenção das respostas de construção também das sentenças na voz passiva.
Os resultados do presente estudo corroboram aqueles obtidos por Corrêa et al. (no prelo) no que diz respeito à eficácia do procedimento de sobreposição de palavras para o ensino de construção de sentenças. No presente estudo e no de Corrêa e colegas, as sequências envolviam palavras cuja ordenação seguia o formato de sentenças na voz ativa e na voz passiva.
Observou-se adicionalmente que o procedimento foi efetivo em gerar a leitura fluente e com compreensão das frases diretamente ensinadas. A ocorrência de leitura com compreensão pode estar correlacionada com algumas características do procedimento de ensino por sobreposição, que requeria do participante a nomeação de cada palavra após a emissão do toque na tarefa sequencial. Nos casos em que o participante não era capaz de nomeara palavra, o experimentador fornecia o modelo verbal e solicitava ao participante que repetisse oralmente o modelo verbal apresentado e se a oralização fosse correta, a resposta era seguida por elogios do experimentador.
No entanto, no que concerne à construção de novas sentenças sob controle condicional, os resultados foram parcialmente satisfatórios, mas, coerentes com as suposições descritas por Mackay e Fields (2009) e das propriedades relacionais, conforme o paradigma de Green et al.(1993). O critério de desempenho exigido na construção das sentenças de linha de base, envolvendo índices de 90% ou mais de acertos, não foi suficiente para produzir repertório emergente em todas as crianças do estudo. No Teste de Substituibilidade, dentre as oito crianças, quatro foram capazes de construir novas sentenças na voz ativa e na voz passiva sob controle condicional das cores; três delas pertenciam ao Grupo 1, de ensino de construção na ordem voz ativa-passiva (LUC, DAN e STU), e apenas uma delas pertencia ao Grupo 2, de ensino voz passiva-ativa (EVE). No Estudo 2 de Corrêa et al. (no prelo), duas das três crianças apresentaram resultados positivos nesses testes. Os dados desse e do presente estudo indicam que o treino na voz passiva-ativa (Grupo 2 do presente estudo) não favoreceu desempenho emergente de construção de novas sentenças, na voz ativa e passiva, sob controle condicional de cores. No geral, as crianças expostas ao treino na sequência ativa- passiva apresentaram melhor desempenho nos testes.
Das quatro crianças que apresentaram bom desempenho no Teste de Substituibilidade, apenas duas (DAN e STU) apresentaram manutenção desse repertório após 45 dias do encerramento do estudo, sendo que ambas pertenciam ao Grupo 1 ativa-passiva (Estamos considerando manutenção de repertório um índice de acertos de 75%, ou seja, as crianças construíram corretamente três de quatro sentenças na voz ativa e três de quatro sentenças na passiva, na presença das cores verde e vermelho, respectivamente, em oito tentativas distribuídas aleatoriamente).
Uma diferença adicional nos dados de comparação entre os grupos pôde ser observada nos resultados dos Testes de Manutenção da Substituibilidade. Para o Grupo 1 (treino ativa-passiva), as quatro crianças acertaram entre 50% a 75% das tentativas em que as sentenças deveriam ser construídas na voz ativa; contrariamente, uma dessas crianças acertou apenas 25% de construção de sentenças na voz passiva e outra errou em todas as tentativas. Esses dados são consistentes com os resultados de Corrêa et al. (no prelo), em que, em média, as crianças construíram corretamente no mínimo o dobro de sentenças na voz ativa comparando-se ao desempenho na voz passiva. Para o Grupo 2 (passiva-ativa) do presente estudo, os dados foram inversos, os participantes responderam ligeiramente melhor a construção de sentenças da voz passiva (50% de acertos em média) em relação às sentenças na voz ativa (37,5% em média). Os resultados sugerem que a ordem de treino do tipo de sentença pode reduzir o viés observado no desempenho do Grupo 1 deste estudo e nos participantes do estudo de Corrêa e colegas, de construir corretamente apenas sentenças na voz ativa.Ainda assim, dada a ausência de repertório de construção de ambas as sentenças nos testes de substituibilidade e de manutenção, os dados dos experimentos citados indicam que o controle condicional sobre a construção de novas sentenças não resultou do ensino de todas as crianças.
No entanto, o repertório de todas elas foi indiscutivelmente ampliado; os participantes deste estudo eram crianças com histórico de fracasso escolar cujo repertório no início do estudo envolvia somente o reconhecimento de letras, algumas sílabas e poucas palavras. Essas crianças aprenderam a construir sentenças, na voz passiva e ativa, na presença de duas cores, cada uma correlacionada a um tipo de sintaxe. Além disso, elas foram capazes de selecionar figuras representativas correspondentes às sentenças como modelos em testes de emparelhamento ao modelo, demonstrando leitura com compreensão. Quatro delas construíram novas sentenças sintaticamente corretas, a partir da recombinação das palavras usadas nas sentenças de linha de base. As novas sentenças foram construídas na forma ativa ou passiva, dependendo do estímulo condicional apresentado, a cor verde ou vermelha, demonstrando também extensão de controle condicional das cores sobre o repertório de construção de novas sentenças.
Os resultados deste estudo demonstraram que o estabelecimento de controle condicional sobre respostas de construir sentenças em condições de ensino automatizadas é plenamente viável. A extensão desse controle para a construção de novas sentenças é que não ocorreu para todos os participantes. Para grande parte das crianças, observamos respostas corretas de construção de novas sentenças envolvendo apenas um ou outro tipo de ordenação, principalmente nos testes de manutenção de substituibilidade aplicados 45 dias após o estudo. A aprendizagem da resposta de construir um ou outro tipo de frase, ativa ou passiva, e não ambos os tipos, impede testes de controle condicional. Se a resposta de construção de dada ordem não foi devidamente estabelecida, como propuseram Miccione, et al (2010), não há como produzir controle condicional sobre a resposta. Esses dados são consistentes com os resultados que Yamamoto e Mya (1999) observaram em seu Experimento I, sobre o qual discutem que as crianças possivelmente haviam adquirido apenas uma estratégia de ordenar as palavras (word-order strategy).
Uma questão importante a ser discutida em relação ao uso de sentenças na voz ativa e passiva no presente estudo e à observação de manutenção de um ou outro repertório em nossos participantes diz respeito ao estabelecimento do comportamento do ouvinte. De acordo com a análise de Stemmer (1992), o repertório efetivo de ouvinte antecede necessariamente o repertório de falante competente. Discutindo a suposição acima, Souza, Miccione e Assis (2009) afirmam que, ao estabelecerem o repertório de ouvinte, as ‘contingências ostensivas' também alteram a probabilidade da emissão de respostas verbais relacionadas àquelas contingências. A partir da sua emissão essas respostas poderão ser reforçadas diferencialmente pela comunidade verbal. Pode-se inferir de alguns dados (Oliveira & Capellini, 2010) que a comunidade verbal não utiliza com mesma frequência sentenças na voz ativa e passiva, e que, portanto, o repertório de ouvinte de voz passiva pode não ser bem instalado por meio de contingências ostensivas fora da escola, já que o uso de sentenças desse tipo não ocorre com frequência. Isso dificultaria a emissão de respostas do falante usando a mesma estrutura de sentença, no caso, a ordenação na voz passiva. O estudo de Oliveira e Capellini (2010) relativo ao desempenho de leitura de escolares identificou que na prova de estruturas gramaticais foi observado que os escolares de primeira e na segunda série acertaram com maior frequência as frases em voz ativa enquanto que os escolares de terceira e quarta séries acertaram frases em voz ativa e passiva. Isso é um indício de que o processo de educação formal parece ser condição necessária ao fortalecimento de repertório de leitura na voz passiva.
No caso do presente estudo, o procedimento aplicado para um dos grupos iniciava o ensino com sentenças na voz ativa. Esse grupo produziu sentenças sintaticamente corretas nesta disposição de voz nos testes de substituibilidade (ver Figura 3, Grupo 1). Este dado foi também observado no teste de extensão de relações condicionais, no qual a maioria dos participantes de ambos os grupos ordenou corretamente as palavras para as sentenças na voz ativa nas tentativas sem consequência diferencial.
Em relação aos participantes do Grupo 2, cuja ensino era iniciado com frases na voz passiva seguido de frases na voz ativa, no geral, os desempenhos no teste de substituibilidade não indicaram uma regularidade na produção correta de sentenças em uma voz específica, embora uma quantia maior de acertos tenha ocorrido nas tentativas envolvendo a ordem passiva, para três dos quatro participantes.No teste de manutenção da substituibilidade, a variabilidade apresentada entre os sujeitos foi grande, embora, no total de tentativas, tenha havido um número ligeiramente maior de construções corretas de sentenças na ordem passiva. O fato é que, em ambas as ordens de ensino, o controle condicional não foi possível porque seu pré-requisito, construir sentenças em ordem ativa e passiva não foi bem estabelecido.
A possível variável extra experimental, referente à frequência de uso de sentenças de um ou outro tipo pela comunidade verbal do participante, poderia ser minimizada com estudos envolvendo o uso de sentenças afirmativas e interrogativas que, aparentemente, são usadas com a mesma frequência na comunidade verbal da língua portuguesa. Adicionalmente, dadas as possibilidades de escolha por exclusão quando apenas duas palavras compõem cada fase de treino de uma frase no ensino por sobreposição, planejamentos futuros devem acrescentar uma terceira palavra nas fases de ensino por sobreposição que sirva como um estímulo distrator na tarefa de escolha.
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Received: June 14, 2012
Accepted: November 12, 2012
1 Bolsista de Iniciação Científica (PIBIC/CNPq.)
2 Doutor em Psicologia pela Universidade de São Paulo. Docente do Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq. Endereço para correspondência: Rua Jerônimo Pimentel, 426-1801 Bairro do Umarizal, Belém-Pará. 66.055.000. ggrauben@gmail.com
3 Doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará. Docente do Núcleo de Teoria e Pesquisa do Comportamento.