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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641Xversão On-line ISSN 2175-3601

Rev. bras. psicanál v.41 n.2 São Paulo jun. 2007

 

ARTIGOS

 

A perversão nossa de cada dia

 

Our daily perversion

 

La perversión nuestra de cada día

 

 

Miguel Marques1

Sociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto
Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Partindo de modelos clínicos, o autor busca elementos mentais que, conjugados, dêem significação ao que ele formula como “perversão nossa de cada dia”. Nesse sentido, seleciona alguns aspectos que possam oferecer evidências de que uma ação perversa está em curso em determinado momento, seja na relação analítica, seja nas experiências emocionais cotidianas.

Palavras-chave: Objetos inexistentes; Cooptação; Espectro perverso; Pensamento perverso.


ABSTRACT

From clinical models, the author seeks mental elements which combined can give signification to what he calls “our daily perversion”. In this sense, he selects some aspects, which can offer evidences that a perverse action is taking place at any given moment, either in the analytic relation or in daily emotional experiences.

Keywords: Inexistent objects; Co-optation; Perverse spectrum; Perverse thought.


RESUMEN

A partir de modelos clínicos, el autor busca los elementos mentales que, al ser conjugados, puedan darle significación a lo que él formula como “la perversión nuestra de cada día”. En este sentido, selecciona algunos aspectos que puedan ofrecer evidencias de que una acción perversa está en curso en un determinado momento, ya sea en la relación analítica o en las experiencias emocionales de la vida cotidiana.

Palabras clave: Objetos inexistentes; Cooptación; Espectro perverso; Pensamiento perverso.


 

 

Edificações geridas no inferno pelo descriador de mundo.

Adélia Prado, “Ex-voto”

 

Introdução

Frente a uma ação perversa, quais são as chances de nos mantermos mentalmente vivos e presentes psiquicamente?

Pretendo investigar um conflito que, de acordo com minhas observações, acontece nas interações humanas cotidianas. Procuro por aspectos mentais que, destacados dos modelos teóricos e clínicos a serem apresentados, possam nos remeter a uma conjunção constante de elementos que denomino “perversão nossa de cada dia”. Minha intenção é a de que eles sirvam de guia para a compreensão dessa situação emocional, uma vez que ela medra no dia-a-dia em nosso convívio comum, sem que seja facilmente discernível.

A expressão “manter-se vivo” é usada por mim do ponto de vista de se alcançar e sustentar a cada momento um senso de existência e, conseqüentemente, um espaço mental no qual dores e emoções sejam sentidas, bem como pensamentos que provejam significados às faltas inerentes à condição humana sejam elaborados. Nesse sentido, estar vivo mentalmente tem a ver com sustentar ativamente uma existência, isto é, uma noção de ser alguém e de estar presente significativamente dentro do tempo e das vicissitudes que compõem o universo humano. A condição humana pressupõe uma tolerância a certas verdades básicas, tais como a dependência de um vínculo afetivo e o fato de se ter nascido de uma conjunção criativa de um casal, além da noção de finitude (Money-Kyrle, 1996).

Esses fatos básicos que estruturam e delimitam a existência humana geram freqüentemente situações e vivências nas quais a precariedade e a falta se evidenciam de forma dolorosa e muitas vezes insuportável para todos nós. Nesses momentos, a condição de estar vivo e vinculado a um objeto animado2 pode ser mantida pela significação dessas faltas, o que por sua vez propicia a sustentação das precariedades e insuficiências que caracterizam o ser e suas relações.

O conceito psicanalítico contemporâneo de uma mente multifacetada (Meltzer, 1996) mostra-nos que a cada instante nos expomos a diferentes formas de existência mental, desde as mais toscas e sensorializadas às elaboradas subjetividades do ser, bem como as formas não humanas de existência. Refiro-me àquilo que, sendo “não-existente”, isto é, fruto de obediências automatizadas e regras lógicas, burocratizadas e propagandísticas, substitui o que poderia vir a ser uma existência humana, fruto de interações íntimas com uma outra mente.

Neste trabalho, interesso-me particularmente pela maneira como a captação da experiência emocional, a partir de operações mentais perversas, participa da identidade do ser em seu cotidiano. Acredito que todos nós, com diferentes níveis de exposição e aderência aos estados mentais evocados por essas vivências, transitamos no espectro de atos perversos e recebemos mentalmente seu impacto desvitalizante. Entendo por desvitalizar o movimento que visa substituir a existência possível, dentro de um universo humano, pela não-existência, o que implica a oposição aos vínculos com objetos animados e existentes.

 

Considerações sobre os objetos inexistentes

Localizarmos no tempo e espaço, em um momento de uma vida humana, a própria personalidade e a de um outro é um feito de magníficas proporções. Uma vez que vivemos imersos em um oceano de estímulos e sensações, quais dentre eles podem carregar em seu bojo elementos significativos e indicativos da presença de uma mente, a própria e a de outro? Além do que, vivemos um contínuo trânsito, de um momento para o outro e de um estado mental para outro. Os referenciais internos para nos localizarmos como portadores de uma mente são efêmeros; nossos sentimentos e emoções são passageiros, transmudam-se num curto período de tempo. Por isso a manutenção dos vínculos3 é para nós imprescindível, sendo o único fio condutor, organizador e orientador na colheita de elementos em meio ao caos, a partir dos quais nos constituímos mentalmente e interagimos como seres humanos.

Nossa grande dificuldade é a manutenção dos vínculos na ausência, na falta, o que nos impõe a habilidade para lidar com objetos não presentes, a não-coisa, o não-seio, o pensamento, quando buscamos a manutenção de um vínculo com algo que não está presente. Acompanhando as sugestões de Bion (1991), penso que a mente se forma a partir do lugar onde o seio estava; o ponto onde o seio desapareceu passa a conter a gênese do pensamento.

A não-coisa mantém o espaço vazio; o que antes era uma presença passa a ser um espaço mantido pelo registro de uma ausência. O não-seio, agora um pensamento, pode ser utilizado para sustentar o espaço da falta, sem preenchê-lo, aguardando o retorno do seio. O pensamento é, portanto, um representante do espaço mental.

É aqui que se inserem as grandes dificuldades de existência do ser humano, mesmo porque a falta é onipresente. Não há um encontro ou presença que não desvele ausências e faltas. Imediatamente a um momento apaixonado insinuam-se os medos, a angústia pela separação e dúvidas a respeito daquele momento (Meltzer, 1988/1995).

Ao buscarmos desenvolver essas habilidades para mantermos vínculos na ausência do objeto, também criamos estratégias e manobras que tentam dar conta desse problema sem o ônus do pensar. Bion (1991/2000) pontuou, em algum de seus escritos, que a mente era um fardo muito pesado para a frágil e titubeante matéria humana. O homem, na busca de registrar para si mesmo e para outro a sua frágil existência, lança mão de todos os ardis possíveis e imagináveis para não ter que se haver com o peso de sua própria mente, dos pensamentos e dos vínculos com o outro.

A dificuldade é que, para reencontrarmos o vínculo com o objeto perdido, não basta a evidência de uma presença concreta. Uma mãe com seu filho ao colo não determina um encontro. A presença de uma mãe, mesmo que dedicada, pode não ser suficiente para acalmar o choro do bebê. É necessária uma sintonia, uma captação que extrapole o concreto e o físico, e essa interação só pode acontecer se estiverem presentes aspectos mentais, tais como o sonhar e o pensar.

O encontro só pode se efetivar a partir de uma experiência na qual estejam presentes e identificáveis, para ambos, emoções diversas derivadas da busca interessada de um e do acolhimento íntimo de outro. Tal condição, como toda e qualquer relação humana, desperta, nos termos de Bion (1991), um conflito entre emoções as quais ele considera amor, ódio e conhecimento e as antiemoções, anticonhecimento e antivida. Desse complexo de experiências perceptuais, pelo menos uma forma de representação é elaborada, possibilitando uma significação primária, broto simbólico que inicia a construção imaginativa de um mundo: o espaço interno.

Essas formas simbólicas funcionam como matrizes que contêm a evocação de um vínculo e que podem ser significadas a cada momento para reencontrar evidências do objeto desejado tanto na sua ausência como em sua presença. Isso significa que o encontro humano acontece por meio da condição simbólica que é um hiato sempre presente entre mim e o outro e entre mim e quem eu sou a cada momento.

Para encontrar o outro, tocar, cheirar, ouvir, gritar e olhar não se constituem por si sós recursos suficientes. Além dessas experiências sensoriais são necessários instrumentos formulados a partir da notação de elementos mentais que chamem a atenção sobre a falta e permitam uma indagação sobre o objeto ausente. Se houver uma tolerância a essa ausência, é possível alcançar e reter significados que sustentem uma investigação a partir do “lugar onde a coisa estava”, isto é, “o lugar onde um seio ou outro objeto perdido estava”. Somente assim é possível suportar um trânsito no mundo imaginativo interno em busca do outro.

A falência desses instrumentos deve-se a uma profunda intolerância às emoções incipientes mobilizadas pela falta. Nesse caso, tais emoções, ao invés de serem percebidas como evidências da ausência do objeto desejado, são tomadas como evidências de uma presença. O diferente, as emoções ligadas à falta naquele momento, passam a ser percebidas como expressões de uma presença, na tentativa de preencher o espaço ocupado por uma emoção vinculada (K, L, H) ao seio anteriormente presente.

Se as emoções incipientes da falta forem investidas para cumprir a função de uma presença (objetos inexistentes), não se prestam mais a se compor como elementos que contenham o registro da ausência. Ao contrário, esses objetos inexistentes ficam a serviço da eliminação qualquer evidência que vá além desse universo concreto e hermético formado pela não-coisa, agora com atributos de uma presença.4

A localização da própria mente em uma interação com outra é para nós uma empreitada vital e ao mesmo tempo sujeita a distorções grotescas e desencontros. É mesmo possível que, no tempo de uma vida, uma pessoa não experimente o que é um encontro humano no qual estejam presentes duas mentes distintas entre si e ligadas pelo vínculo das emoções.

A meu ver, a existência humana só pode ser acessada a partir de uma pré-concepção, cuja realização é função do vínculo de ligação. O preenchimento do espaço da falta com objetos inexistentes impede que um vínculo de intimidade forneça os elementos que comporiam uma trilha organizadora para o alcance de outras experiências emocionais e, conseqüentemente, novas aquisições cognitivas. Tal impedimento torna possível a existência do homem por meio de outras formas que não a humana.

São formas que poderíamos caracterizar como extra ou subumanas e que privilegiam não o viver, mas o sobreviver; não o vínculo com o objeto vivo, mas com os objetos inanimados; não o aprender com a experiência, mas a adaptação automática; não as turbulências de uma mente viva em constante transformação, mas as certezas de uma mente computadorizada (Meltzer, 1992/1994). São situações nas quais a mente e a sua expansão são equacionadas à morte, enquanto a sensorialidade bruta e a excitação são percebidas e tomadas como vida.

Esses distúrbios do pensamento, entre os quais destaco o perverso, interditam a relação humana como uma fonte de experiências emocionais que propiciam vivências de intimidade e engendram alterações de amplo espectro nos relacionamentos adultos, em áreas representadas por termos tais como capacidade para amar, compreensão e significação.

 

O pensamento perverso

As experiências (anti)emocionais advindas de ações perversas se impõem sutilmente em nossas relações interpessoais por meio do que qualifico estratégias de distorção. Elas visam à sustentação da existência em um mundo paralelo, extra ou subumano que tanto se sobrepõe como imita o humano.

A perversão é baseada, entre outras coisas, no splitting do ego, tornando compreensível que diferentes níveis do seu comprometimento existam em cada manifestação perversa. Um dos resultados dessa divisão é que partes do ego desenvolvem-se até a maturidade (suportam K) e outras partes mantêm-se envolvidas com ansiedades primárias, tornando-se veículos para a perversão (produzem -K), impedindo que outras partes se desenvolvam livremente.

Para Bion (1991), conhecimento (K) é uma emoção e -K é o que se opõe a K, uma antiemoção. No espaço K (transformações em conhecimento) acontecem as manifestações que são veiculadas pelo eixo simbólico5 da personalidade. O espaço -K pode ser concebido como o lugar em que uma emoção costumava estar, agora preenchido com objetos inexistentes,6 violenta e avidamente invejosos de qualquer qualidade que sustente a existência de um outro objeto, distinguível do próprio ser.

Chamo de experiências antiemocionais a um processo em que o antipensamento, gerado pelas partes da mente que transitam em -K, irradia-se tanto para os vínculos com a própria personalidade como para os outros, forjando antivínculos como se fossem vínculos. Dessa forma estou me referindo a um tipo de desordem do pensamento que poderíamos chamar de pensamento perverso.

No meu modo de entender, as transformações em conhecimento (K) evoluem por meio de sucessivas significações em que uma serve de pré-concepção para a outra. Assim, a partir de uma experiência emocional, certos elementos poderão ser conjugados e significados de forma que possibilitem a existência psíquica em uma concepção de mundo que tenha como base a natureza humana e suas verdades básicas.

Por outro lado, o pensamento perverso é a tentativa de juntar um número de elementos que ofereçam uma outra versão dos fatos psíquicos presentes através de uma cadeia de pseudocausalidade engendrada por moralidade superegóica. A agregação desses elementos em -K, o anticonhecimento, invalida qualquer progressão dos significados em direção às concepções humanas. Bion (1962) pontuou essa condição a partir de um estado mental limítrofe, no qual a intolerância à frustração não é excessiva a ponto de ativar mecanismos de fuga psicóticos, mas suficientemente intensa para impedir o predomínio do princípio da realidade. Nessa situação a personalidade adota a onisciência como um substituto do aprender com a experiência.

Embora Bion considere a onisciência como uma função da psicose, ele propõe uma situação intermediária entre a intolerância e a tolerância à frustração. Assim, se a pessoa não pode suportar a realidade e se evade dela, sucumbe à psicose. Mas se a suporta recorrendo à onisciência, a meu ver, ela está vivenciando elementos mentais emanados de uma estrutura perversa. Uma das características da perversão é a distorção da verdade a partir de vínculos forjados pelo anticonhecimento (-K), um modo de vinculação que propicia o alcance de onisciência.

Bion (1989) propõe uma formulação impactante a respeito da imbricação desses dois tipos de transformações quando nos fala que a continuidade, isto é, o animado obtido através da reprodução por divisão celular (extensões de + K) conduz ao inanimado obtido por fissão nuclear (-K). Ao contrapor esses eventos, podemos vislumbrar o quanto são intensos e factuais esses modos de transformações em nosso mundo.

A sustentação da existência por meio da significação da falta e da possibilidade de experimentar os sentimentos que provêm da percepção dolorosa de um vínculo com uma outra mente, que não está presente ou que se apresenta precariamente, pode ser instantaneamente pulverizada. Quando essa “fissão” acontece, estamos transitando em áreas de “catástrofe nuclear”; a vida e o animado foram substituídos por matéria psíquica morta. Nessas condições, couraças, aparências e comportamentos que mimetizam a humanidade são sustentados por intelectualidade robótica, moralidade fundamentalista e excitação megalomaníaca triunfante.

A meu ver, K e -K organizam diferentes universos que se superpõem e criam interfaces, dentro das quais nos tornamos quem somos em cada momento da nossa existência.

 

Modelos clínicos

Utilizarei modelos que acredito contenham elementos para ilustrar e compreender o que estou pontuando. Para tanto, delinearei três deles destacados da clínica. Descrevo esses modelos como narrativas articuladas a partir de um núcleo de formulações expressivas que puderam sustentar uma ordenação temporária dos eventos emocionais em trânsito naquelas situações. Nessas narrativas, dou relevância a certas evidências na intersubjetividade do par analítico, entremeadas com abstrações extraídas daquele contexto.

Não me estenderei nas descrições de um trabalho interpretativo mais profundo de cada caso, mas vou me ater apenas a destacar os movimentos que me interessam para ilustrar o que estou propondo. Utilizo-me desses modelos e dessa forma de apresentação, não para discutir determinadas correlações teórico-clínicas que possam advir deles, mas somente para delinear uma área de investigação em que seja possível uma colheita de elementos que sustente o tema deste trabalho.

 

As cartas

Edna, uma jovem mulher, procurou-me após um acontecimento dramático em sua vida. Seu único filho homem sofreu um acidente de carro bastante grave que culminou com sua castração radical, além de ter causado outros problemas que foram corrigidos com várias cirurgias. Ele sobreviveu, mas seu relacionamento conjugal e o controle que mantinha sobre seu cotidiano no sentido de manter as aparências de um lar estruturado e de uma família “feliz” se esvaíram.

“A experiência de um orgasmo sexual não faz parte de minhas vivências; mantive-me fiel a esse esposo por conveniência; ansiei toda minha vida por um encontro apaixonado que não aconteceu”. Essas eram as formulações que apresentava a si mesma de forma peremptória, como acusações de um juiz implacável. Suportava sua vida doméstica e social mantendo-se em uma postura altiva, pragmática e pretensamente lúcida, mas intimamente sentia-se traída: “Cuidei a vida inteira do meu casamento, dos filhos e da minha casa! Veja o que recebi!”. 

Em suas ações cotidianas, em diferentes ambientes e condições sociais, mantinha um tipo de flerte contínuo com vários homens, nunca chegando a ter com eles algum tipo de intimidade física. A perspectiva de tê-los a seus pés, correndo atrás dela como “cães ávidos atrás de uma cadela no cio” por si só bastava. “Quando os percebo muito interessados por mim, eu os desprezo. Meu filho era quem eu queria poupar, mas foi o único atingido! Isso parece um castigo!”.

Nossos encontros são permeados por uma ira contida que se expressa ora por uma sedução através de trajes sensuais, cruzadas de pernas e posturas lânguidas, ora por um comportamento frio, distante e altivo como uma rainha no trato com seus serviçais. Em vários momentos vislumbro sua face pétrea e altiva rearranjar-se em uma aparência plácida e afável, como uma atriz que, frente a um espelho em seu camarim, ensaiasse formas expressivas de suas diferentes faces.

Nesses termos trocamos experiências, pois me acusa de ser um “profissional” que cultiva sordidamente diferentes formas de atrelar os incautos que caem em minhas mãos.

Nos momentos em que emoções começam a se insinuar entre nós, a partir das quais tenhamos evidências de que somos duas pessoas engajadas em um relacionamento humano de intimidade, os “profissionais” são imediatamente evocados. Através de um olhar ou de um tênue esboço de um riso sarcástico e mesmo um ajeitar de cabelos, anuncia-me que, de seu ponto de vista, os “profissionais” estão presidindo nossa conversa.

Ao longo de nossos encontros, oferece-me um modelo que nos ajuda a nomear esses eventos: “Guardei durante muito tempo as cartas de meu primeiro namorado, cartas apaixonadas, que eu lia para mim mesma em vários momentos. Um dia, essas cartas desapareceram do lugar onde as guardava. Não pude atinar com o que aconteceu. Em meu aniversário ganhei de meu marido um volumoso álbum ricamente encadernado. Eram as minhas cartas ordenadas por datas e com cabeçalhos indicativos, agora oferecidas com a dedicatória dele. Nunca mais as li.”

Lembra-se de uma época em que, juntamente com sua irmã, foram internas em um colégio de freiras: “Minha irmã chorava muito, sentindo a falta dos meus pais. Eu nunca chorei e, em minhas cartas para eles, escrevia laconicamente: Estou muito bem, não preciso de nada! Nesse tempo recebia as cartas desse meu primeiro namorado, mas não as respondia”.

Nossas conversas nos aproximaram progressivamente de uma estrutura paralela responsável por uma função classificatória e esvaziadora, assim como aconteceu com as cartas, que juntavam elementos afetivos emocionais como uma coleção de objetos inanimados e definidos segundo uma regra quantitativa e cronológica, compondo uma coletânea inanimada e submetida por uma dedicatória única: “Viveremos felizes desde que você não me toque”. Toda e qualquer possibilidade de significação se vê toldada por esse sentido único e estático ao qual estávamos submetidos.

 

O roubo

Rui vivia uma ameaça em relação aos nossos encontros. Em vários momentos nos aproximamos de uma ambigüidade que se expressava pela idéia de que o que conseguisse com a análise não se sustentaria, pois revelaria uma farsa mantida por nós dois, fruto de um conluio no qual o aspecto principal seria a manutenção de um clima agradável de dois amigos usufruindo de uma intimidade, em detrimento de um trabalho analítico.

Tal concepção impunha-se nos momentos em que, após uma separação por feriado ou por sua ausência nas sessões, entrava em contato com a falta que sentia de mim.

Em vários momentos, principalmente em finais de semana, recorria a masturbações bimanuais (ânus-pênis); referia-se a esse ato nos seguintes termos: “Dessa forma me restabeleço!”.

Nessas condições, os momentos que havíamos experimentado como uma intimidade compartilhada, na qual as emoções em trânsito alcançaram alguma nomeação, eram banalizadas e degradadas.

Esses momentos eram vistos por ele como fruto de um arranjo espúrio e o trabalho e a experiência analítica eram descaracterizados, tornando-se vazios e sem sentido. A partir disso, estar ali seria uma perda de tempo, uma vez que o que tínhamos não se diferenciava de um encontro qualquer entre amigos, o que poderia acontecer em qualquer lugar. Esses aspectos puderam alcançar algum sentido e serem nomeados entre nós após o seguinte episódio:

Rui descreve uma cena em que estava a fazer compras em um supermercado, escolhendo ingredientes para um prato que faria. Vem a sua mente uma idéia: a de que estivesse agindo como alguém que roubava mercadorias das gôndolas, situação esta que experimentara furtivamente algumas vezes. Continua a fazer compras, mas agora seus atos são cuidadosamente articulados para que alguém que o observe não tenha dúvidas de que ele só estava escolhendo os alimentos. A partir desse momento, sua mente ficava sob o domínio de uma excitação, pois seu comportamento também visava determinar e controlar o que um outro poderia pensar, saneando qualquer dúvida que alguém pudesse ter a respeito do caráter dúbio de suas intenções em relação àquele ato naquele momento.

Lembra-se de uma piada em que havia um homem internado em um hospício que puxava por uma corda um tijolo. Ao ser indagado se aquele era o seu cachorrinho, dizia: “Você está louco, é apenas um tijolo”. Quando o outro se afastava impactado, o homem voltava-se para o tijolo e dizia: “Enganamos ele, hein, Totó!”.

A partir dessas associações começamos a alcançar evidências da ação de um ponto de vista que provê um vértice excitante e espúrio a toda e qualquer condição que contenha em si uma perspectiva criativa e nutrícia, semelhante ao que acontece quando está escolhendo os alimentos no supermercado e lhe vem a idéia do roubo. Percebo que há um movimento contínuo em direção ao triunfo sobre intervenções ou propostas que contenham elementos de sinceridade, tanto minha quanto dele.

 

Gases

Xênia, uma jovem mulher de 28 anos, filha única e solteira, vem para a análise movida por um impasse em sua vida familiar e profissional. Para dar continuidade ao seu desenvolvimento profissional deverá afastar-se do convívio cotidiano com seus pais, com os quais vive até aquele momento. Sente-se em uma encruzilhada: de um lado a vida de uma jovem “casadoira”, filha única que precisa se prestar a um casamento entre famílias tradicionais e, de outro, uma carreira profissional dedicada, a jovem cientista que abre mão de seus desejos de casar-se e ter filhos em prol da ciência. Um pseudoconflito romântico, cinematográfico, mas que sustentou sua vinda para a análise.

Ao longo de nossos encontros o estado mental no qual Xênia se encontra aprisionada vai se desvelando entre nós e ocupando espaço. Entretém uma obstipação intestinal crônica que, em seus termos, toma a seguinte voz: “Vivo empalada!”.

Sua vida sexual se atém a masturbações contínuas e exaustivas com o “pau da cama”, a cabeceira de seu leito, cujas bordas pronunciadas sugerem um pênis com o qual se estimula arduamente madrugadas a dentro. Não se aproximou intimamente de nenhum homem até hoje, mas vive assustada com a possibilidade de ter perdido a virgindade em suas orgias masturbatórias. A verificação minuciosa da integridade de seu hímen através de um espelho dá ensejo a novas demandas masturbatórias através das quais preenche suas noites.

Por outro lado, seus dias transcorrem de forma aparentemente produtiva através de uma atividade profissional e acadêmica promissoras. Essa rotina é quebrada em momentos nos quais se envolve em ruidosas discussões com os pais a respeito do encaminhamento de sua vida pessoal, que culminam muitas vezes em agressões físicas mútuas. Testemunho essas ações a partir dos hematomas que são exibidos por ela nessas ocasiões, como provas preciosas que são coletadas para um julgamento meu no qual sua integridade, boa fé e “superioridade de sentimentos” pretendem ser reconhecidas.

Em nossos encontros comporta-se como uma boa menina empenhada em agradar e granjear meu reconhecimento. Cada sessão é uma “prova” em que deverá alcançar uma boa nota e meu reconhecimento é avidamente rastreado em meu tom de voz, minha postura e meus silêncios, na forma como me cumprimenta na entrada ou se despede na saída. Essa condição nunca é explícita e, quando apontada, é percebida como fruto de minha zanga e de minhas exigências para que ela se torne cada vez melhor em seu empenho de não me desagradar. Dessa forma, nossa relação também compunha esse universo hermético e inacessível, assim como com seus pais.

Pudemos nos aproximar desses eventos e iniciar uma nomeação a partir da evidência de um expediente de que ela lançava mão com certa freqüência:

Em vários momentos, por ocasião de recebê-la para iniciar suas sessões, pude sentir um odor desagradável que emanava da minha sala de espera e adentrava meu consultório juntamente com sua pessoa. Esse impacto inicial era parcialmente obliterado por um vivo estender de suas mãos em um cumprimento que me parecia ávido pelo contato com a minha pele e com a minha mão.

Só pude me aperceber desses movimentos de uma forma retrospectiva e a partir de idéias e preocupações dela em relação à contaminação de sua vagina por excreções anais e por preocupações de que não tivesse efetuado sua higiene pessoal devidamente e sujasse meu divã com fezes. Dizia nesses momentos: “E se a flora vaginal for substituída por minha flora intestinal?” Outras vezes associou que, quando criança, costumava colocar na boca suas secreções nasais.

Progressivamente foi se desvelando entre nós uma estratégia complexa que envolvia fezes no banheiro e flatos na sala de espera que invadiam meu consultório, adentravam minhas narinas e que pretendiam ser furtivamente colocados em contato comigo através das nossas mãos. A partir desses elementos, um outro mundo era construído no qual as regras já estavam previamente estabelecidas; toda e qualquer chance de algo novo e diferente se insinuar entre nós estava irremediavelmente definido pelas regras desse mundo, criado a partir de seus flatos e de suas secreções. Nossas conversas e minhas interpretações eram vivenciadas como emanações desse universo e não alcançavam a perspectiva de abrir algo novo para ambos, uma vez que sua dor e angústias indizíveis não eram tocadas pelas minhas intervenções.

Esses movimentos visavam o estabelecimento de um universo fecal, no qual flatos e secreções pretendiam fecalizar e homogeneizar insidiosamente qualquer perspectiva de turbulências frente a novas experiências e suas significações, ao mesmo tempo em que tentava manter as aparências de uma experiência nova, limpa de contaminações.

Compactuávamos a aparência de um processo analítico vivo.

 

O processo perverso

Na notação dos elementos do pensamento perverso, vou me ater às descrições de determinados movimentos que transitam pela dupla e que a meu ver constituem o cenário perverso. Quero salientar que esses movimentos podem ser detectados tanto como oriundos da mente do analisando quanto da mente do analista. Prefiro referir-me ao que transita entre as duas mentes num determinado momento como algo que tem uma qualidade de experiência que não contempla de imediato duas mentes, mas uma “mente entre duas”. E a mente, eu a entendo como um acontecimento interpessoal, antes de ser intrapsíquico e pessoal.

Em cada modelo apresentado há evidências de uma estrutura mental paralela, atribuindo a todo elemento afetivo da experiência emocional em curso um tipo de valor que se opõe aos significados que delineiam uma relação de intimidade. Sendo assim, qualquer benefício conseguido como resultado do trabalho analítico é invalidado. Isso se dá ou por serem indistinguíveis de falhas do analista/analisando e atribuídas às ações, frutos de acting-outs (elementos evacuados tanto pelo analista, quanto pelo analisando), ou por serem expressões de uma capacidade para compaixão que mobiliza angústias insuportáveis para a dupla, uma vez que torna possível, pelo menos por uma fração de tempo, a percepção de uma outra mente à qual se está vinculado.

A partir daí, parece ocorrer uma espécie de transmutação produzida através de uma distorção em que os elementos mentais que poderiam gerar esse reconhecimento são conjugados pelo paciente como manipulação e propaganda por parte do analista, ou, pelo contrário, os movimentos autênticos do analisando são equacionados a tentativas de controle e evacuações pelo analista. Portanto essas duas formulações constituem-se como fronteiras ou pontos de viragem. Penso que, durante um período de tempo, permanecemos imersos num certo meio de cultura perversa, dentro da qual os movimentos mentais fazem parte de uma rede interacional que aprisiona a dupla em conluios que impossibilitam desenvolvimentos mentais.

Esses pontos e estratégias de viragem foram nomeados nos títulos dos modelos clínicos e esboçados nas suas descrições: As cartas; Gases e O roubo. Esses são os enunciados a partir dos quais pretendo alcançar formulações com algum significado que me permitam mapear algumas das estratégias em trânsito nas relações cotidianas, consideradas por mim como “distorções perversas”. As manobras perversas visam a evasão, exclusão e substituição das experiências, por meio das quais a notação da falta e da precariedade da existência tornam-se inevitáveis,impossibilitando sua significação. Porém tal situação por si só não se constitui como uma ação perversa, já que são movimentos comuns às transformações em alucinose já descritas por Bion (1991). O que possivelmente nos aproxima um pouco mais do conceito de perversão é a “organização”, isto é, a articulação sofisticada7 de elementos degradados que se prestam à evacuação e que se aglutinam por compressão e não por elos de significação e que, por sua vez, apresentam-se como uma fachada falsamente refinada no lugar de um pensamento.

O que descrevi acima é somente um passo do processo e não uma característica única e essencial do “pensamento perverso”, uma vez que a condição de estar vivo pode, em diversos momentos, transitarsomente pela imitação e organização de sensações ou mesmo por posturas automatizadas e adaptativas, não se constituindo necessariamente em perversões.

O que chama minha atenção no processo perverso é o movimento progressivo e inexorável em direção ao inumano. O inanimado é eleito como o núcleo irradiador de uma pseudovida e, para que isso se dê, aquilo que se constitui como um “objeto morto” deve ganhar vida a partir de uma veneração, de uma idolatria.

Essa é a manobra mais astuta da perversão: aquilo que deveria se apresentar como terror e agonia logo se dissipa para dar lugar a degradação e morte dos objetos vivos que são então aplacados e depois reanimados a partir da crença em sua vitalidade. Os objetos mortos, não existentes, ganham atributos de onipotência e onisciência e são adorados (Bion, 1991/2000). Esses movimentos mentais estão na base das idéias de Freud sobre o fetichismo, nas quais fica evidente a substituição de uma relação com objetos vivos que albergam verdades insuportáveis, por uma relação com objetos mortos e pela própria interação com o objeto degradado e morto, mas valorizado e idolatrado.

A configuração de elementos que contêm a eleição de um objeto degradado e morto como centro idealizado das ações mentais está presente em um grande número de situações do cotidiano. A escolha por um grande contingente de jovens pela vida virtual em detrimento da vida real, penso que pode ser uma de suas expressões. Em nível institucional e social, a resolução de problemas de desenvolvimento e conflitos humanos exclusivamente por meio de burocracias, manipulações e regras é outra de suas manifestações.

A própria condição econômica de mercado mundial, em que a mercadoria e o dinheiro são o centro de todas as ações, esvaziando qualquer ação significativa que provenha da promoção e cuidados para com a existência de seres humanos caracteriza a astúcia perversa e estupidificante dessas manobras. 

Pressionando onipotente e oniscientemente a mente do analista, aponto uma situação bastante comum nos cenários psicanalíticos institucionais: formulações sobre aquilo em que consiste a verdadeira psicanálise. A idéia de que tudo aquilo que extrapola a transferência-contratransferência e a interpretação rigorosa da transferência não é psicanálise; o que não puder contemplar esses aspectos é lixo psicoterapêutico. Tal situação pode impedir e violentar a autonomia criativa do pensar psicanalítico, propondo a formação de guetos teóricos idealizados e, conseqüentemente, o enquadre da vivência na sessão em alguma formulação teórica consagrada.

Nessas circunstâncias, acredito que, para muitos de nós, o trabalho teórico-clínico implícito dá suporte à crença de que a perversão existe somente na mente do paciente e não nos movimentos provindos da mente do analista. Destaco uma formulação de Searles (1981) a respeito da literatura psicanalítica de que seria justo dizer que a mesma foi formulada com a assunção de que o analista é sadio e de que não necessitaria de ajuda psicológica do próprio paciente, que é considerado incapaz para oferecer tal apoio. Quando tal concepção é assumida pelo analista, muitos dos movimentos no trabalho com situações perversas são desconsiderados e importantes áreas de sofrimento e dores mentais são insensibilizadas e negadas, prejudicando sobremaneira o desenvolvimento do processo analítico nesses casos. Nessas condições, aquilo que poderia vir a evidenciar-se como elemento de um cenário perverso compartilhado é equacionado a formulações interpretativas por parte do analista, privilegiando a agressividade e ataques sádicos do paciente ao “bom objeto”. 

Nesse contexto, idéias discriminatórias e sustentadas em argumentações megalomaníacas ganham proeminência sobre as que estão baseadas na observação e aprendizado com a experiência. Essas ocorrências, no meu modo de ver, podem constituir-se em evidências de que estamos sob a égide do espectro perverso.

O que denomino espectro perverso tem a ver com a condição de que, frente a ações que envolvam desconsideração e evasão das dores humanas e verdades acerca de si mesmo e do outro, estabelecem emanações ou ondas provindas de formas de comunicação que carregam em si o pressuposto de que seja desnecessário buscar e aprender da verdade em relação a si mesmo e aos demais.

Enfatizo esse aspecto, pois, exercendo a função analítica, quando estamos sob a égide do espectro perverso, não nos encontramos com uma personalidade que tenha acesso a um senso de existência (T. H. T Marques, 2005) que propicie um encontro de duas mentes, mas com um arranjo, uma articulação de fragmentos aglomerados para sustentar fachadas (-K). Acredito que tal condição seja fruto de um desastre emocional do qual ficam destroços que se evidenciam por partículas comunicativas e que carregam em si um movimento de busca do outro, de caráter parasitário e que fazem parte do modo pelo qual a comunicação se estabelece naquele momento.

Esse desastre se refere ao colapso dos vínculos com o seio, fato que comprometeu a sustentação da vida mental a partir de movimentos criativos, isto é, foram perdidas as referências de um objeto acolhedor e modulador das dores mentais. O objeto que se expressa na relação é parte de um seio primitivo intolerante à identificação projetiva e que, por isso, força uma reintrojeção. Essa situação tem a qualidade de uma hostilidade, tendendo a se estender a qualquer forma de comunicação. O que subsiste na interação são elementos ávidos para esvaziar qualquer evidência da existência do outro.

Penso que, nesse tipo de relação, o analista experimenta angústias inomináveis relativas a dúvidas a respeito da sua função, uma vez que suas referências a respeito de si mesmo e de seus valores, bem como de sua formação, encontram-se em xeque. A inacessibilidade ao humano provoca uma dor atroz e uma reação que anseia pela inexistência. Poderia remeter-me a essa condição, formulando-a da seguinte forma: “Tudo o que poderia acalmar-me relaciona-se com afastar-me da condição de vir a ser psicanalista”. O ódio à psicanálise, sentimento profundo e arraigado em todo psicanalista, apresenta-se nessas ocasiões com toda a sua exuberância. Nessas circunstâncias, as formulações interpretativas do analista são contaminadas por uma moralidade superegóica cruel.

Como detectar, em uma conversa ou interação, o momento em que os movimentos mentais não mais provenham de uma intimidade compartilhada, mas sim de uma idéia supervalorizada, um preconceito ou uma alucinação, ou mesmo um “objeto inexistente?”.

Esse questionamento guarda relações com o que penso ser um dos aspectos do que denominei cooptação8 perversa que de certa forma se constitui por movimentos que se aproximam do conceito de enactement (Jacobs T, 1986).A experiência emocional de uma realidade alternativa é então criada. Nela juntam-se ações que visam o enredamento do self e da interação com o outro em uma situação de ambigüidade, na qual um único ato adquire caráter dúbio: é a efetivação do equívoco e, ao mesmo tempo, a prova em contrário.

Bion propõe que, se o paciente formula manifestações tipo -L (antiamor) ou -K (anticonhecimento), pelo menos em teoria o analista e o paciente estão em conflito. O paciente em particular, se tem uma inteligência refinada, tenta persuadir o analista, em todos os sentidos, a fazer interpretações que mantenham suas defesas intactas para finalmente aceitar a mentira como um princípio básico de sua efetiva superioridade. Penso que aqui se inserem também os vínculos do analista com uma análise ideal e com o grupo de referência, quando se tornam muito superiores à atenção, ao bem estar do paciente e às suas aflitas e repetidas mensagens de dor mental. Nessas circunstâncias, o que se apresenta é a realização de um engodo em que há evidências de ações que estão a serviço de duas realidades: uma aparentemente óbvia e outra obscuramente espúria. A perspectiva de elucidação de tal engodo é continuamente impossibilitada, uma vez que as ações espúrias são contidas e camufladas pelas ações óbvias.

Curiosamente, visita minha mente a lembrança de que recentemente o Vaticano reconheceu e canonizou uma mulher que autorizou a evolução de uma gestação em seu útero (extensões de K) em concomitância com um tumor (-K) que poria fim a sua vida. Como esse tumor era dependente dos hormônios que também mantinham a gravidez, tal situação culminou com a sua morte na ocasião do nascimento do bebê, condição esta já sabida de antemão pela mãe. Nessa situação, a ambigüidade se expressou pela idolatria da morte como base para a sustentação da vida.

Esse modelo corresponde em nível mental a uma ação de dupla face na qual, por um lado, dar continuidade a uma determinada situação expressa a realização de uma condição que está a serviço da morte e também se constitui na prova do contrário, propiciar a vida. Tudo isso tanto mobiliza quanto é sustentado por uma exaltação excitante, que se constitui como o cerne da experiência, uma vez que o objetivo final é a sustentação da existência a partir da excitação promovida por uma realização de duplo significado e que é tomada como exemplo idealizado (santificado) de vida.

A excitação, a meu ver, provém de um tipo de tensão gerada por essa contraposição de realidades, que visa substituir o que poderia vir a ser o espaço da falta, isto é, angústias e frustrações que poderiam evoluir para dores mentais e sofrimento humano, ligados à percepção de si e de um outro ser separado ao qual se está vinculado afetivamente. Penso que aqui valem as formulações propostas por Gaddini (1992) a respeito da imitação como um processo relacionado a fantasias onipotentes inconscientes em que, através de estímulos excitantes e de modificações em seu próprio corpo, o sujeito re-estabelece de uma forma mágica e onipotente um vínculo de fusão com o objeto, suprindo dessa forma o que ainda não se constituiu como movimentos de introjeção em direção a um processo de identificação, na experiência de uma real dependência do objeto.

Os vários movimentos que se seguem são impregnados de triunfo sobre a percepção das faltas e da vivência humana comum, uma vez que o risco de ser “flagrado” no anseio básico pela busca de ligações humanas amplia a excitação da fuga e evasões. As sutilezas que constituem as formas de escape e sua camuflagem freqüentemente sofisticada passam a ser vividas como um triunfo. Isso significa que ocorre uma disputa vaidosa entre essas estratégias e o risco de ser apresentado para si mesmo como um ser humano comum.

Há uma formulação significativa sobre tal condição em que Bion (1977/1997) pontua que “muitas aparências se salvam pelo infortúnio que as convertem em uma ruína triunfante”. Nesse contexto, o sujeito triunfa sobre a perspectiva de irrupção para um novo estado mental. Sendo assim, devemos considerar tanto essa condição intrapsíquica de auto-enredamento como a intersubjetividade, na qual alguém realmente funciona como o observador que impõe uma definição prévia dos atos que observa, cabendo ao outro, o observado, o ônus da prova. 

Essa me parece uma outra face da “cooptação perversa”: atribuir a alguém ou situação uma nomeação espúria que determine de antemão os elementos que vão compô-la. Há uma inversão do que seria a evolução natural de um pensamento no qual, a partir dos elementos disponíveis no momento, alcança-se uma nomeação inicial que liga aspectos dispersos a um fato comum e invariante, tornando possível a evolução até um nível mais desenvolvido do pensar (Bion, 1979/1991).

Na condição de cooptação, os elementos a serem encontrados já estão definidos previamente e são “colhidos” na situação vigente para confirmar a nomeação previamente efetivada com atributos de onisciência e onipotência. Algo que se aproxima, na realidade externa, de frases que escutamos cotidianamente: “Eu conheço muito bem aquele sujeito!”; “Eu sei quem é você!” ou a célebre frase “Você sabe com quem está falando?” ou ainda “Eu sei o que você está querendo!”, “ Isso não é a verdadeira psicanálise!”. Cada uma dessas frases, seguidas por sentenças explicativas e argumentos de cunho moral ou mesmo por olhar pretensamente arguto e movimentos de cabeça recriminadores, que define o sujeito ou a situação, exclui a possibilidade de um encontro de duas mentes diferentes numa experiência.

Por esse motivo, penso que o transcorrer de uma análise, na qual o analista ocupa uma posição previamente estabelecida de conhecimento, pode se constituir em uma grande oportunidade de se forjar cooptações que mantenham estruturas paralelas e intocáveis. Esse é um risco que corremos: impor ao analisando, a partir de uma visão teórica ou adesão a escolas psicanalíticas, uma interpretação que mais afirme a posição de superioridade e conhecimento do analista do que o acolhimento e significação do sofrimento do analisando.

O que chama a atenção nesses movimentos é a possibilidade de transmutação, na qual qualquer ato, por mais banal e espontâneo que seja, pode adquirir essa outra face que se expressa sob a tutela de uma estrutura paralela e inacessível.

Charles Baudelaire (1985) imortalizou um outro aspecto desse movimento em um poema que nomeou “Reversibilidade”, no qual antepõe a cada face uma outra:

Ó anjo de alegria, já viste a desgraça?
Ó anjo da bondade, já viste o rancor?
Ó anjo de saúde, já viste os Delírios?
Ó anjo de beleza, as rugas já não viste?

Nesse movimento que estou discutindo, a transmutação tem por função negar e contrapor diferentes realidades que nunca alcançam a condição de serem nomeadas juntas, como no poema, muito embora garantam que elas nunca possam se confrontar. Tal condição extinguiria a excitação proveniente tanto de uma “quase integração” como da convivência de duas realidades em paralelo, impedindo que a “reversibilidade” apontada pelo poeta seja alcançada. Na situação perversa uma das faces constitui a camuflagem e a negação da outra face. Amparado por esse tema e em nome de uma publicação que se pretende científica, desculpo-me por realizar a degradação que se segue dessa obra poética. No contexto que estou investigando, aponto as seguintes contrafaces:

• desgraça: é negada pela fútil excitação, confundida com alegria;
• rancor: seria dissimulado por manipulações que simulam cuidados e bondade;
• delírios: seriam transmudados numa busca alucinada pelo corpo saudável;
• rugas: seriam expurgadas pela beleza artificial, acima de tudo.

Uma outra “chave” das perversões, na minha concepção, reside nesse aspecto de entreter duas realidades em paralelo e a partir de um mesmo ato. Esse ato passa a ser um ato “mágico”, uma espécie de portal privilegiado que forja dois universos naquele momento de sua expressão. Tal situação oferece condições para que um determinado ponto de vista seja mantido ao mesmo tempo e em consonância com a realidade vigente e aparente, mas a serviço de uma outra idéia, espúria e degradada, porém com atributos de onisciência e onipotência.

A partir desses aspectos, sugiro que aquilo que caracterizaria a expressão de uma situação tridimensional, isto é, a participação em uma experiência emocional com um outro, e ao mesmo tempo a possibilidade de observação dessa relação a partir de um outro ponto de vista (a situação edípica), cuja realização é o pensar, é colapsada e distorcida. Essa distorção mimetiza a tridimensionalidade e é substituída por algo que caracterizo como uma “excitação voyeurista”, isto é, a partir de uma divisão, uma parte do self escuta e observa uma outra, ridicularizando-a e degradando-a. Constitui-se como um ponto de vista do voyeur que, distanciado da relação que observa, usa essa observação para outros fins que não a de uma interação humana genuína. Geralmente esse ponto de vista em si é excitante e um produto de evacuações alucinatórias, no sentido de que a observação é vivenciada como uma ação concreta, isto é, alcança o estatuto de um ato que visa estritamente ao triunfo, degradando a cena observada e transformando-a em uma outra cena, agora dentro dos parâmetros pré-definidos pelo observador.

Aqui também se insere o que penso ser um splitting na comunicação entre psicanalistas: a comunicação pública das suas idéias de base atém-se a um hábito de seguir um tipo de roteiro escolástico, seguindo uma determinada proposta teórica pasteurizada, ao passo que possivelmente, em seu consultório, comportam-se mais elasticamente. Nessas circunstâncias, cada qual afirma publicamente sua postura terapêutica, convicto de que somente quem teve uma análise bastante boa (a dele!) pode compreender e sustentar a profunda natureza destrutiva do ser humano. Nesse contexto, o que poderia vir a ser uma troca entre pares passa a ser uma afirmação triunfante de superioridade, que visa a banalização e degradação de pontos de vista diferentes dos consagrados pela teoria clássica psicanalítica.

 

As propostas interacionais perversas

Essas pessoas apresentam-nos a partir dessas propostas (as ações perversas e as interações perversas da dupla) um splitting estático ao qual elas estão submetidas. Essas estratégias impõem, no momento do encontro, um arranjo interacional que remete a dupla a uma repetição daquilo que constitui o cerne traumático dessas vivências: a impermeabilidade às angústias, aos apelos e à dor do vir a ser humano.

Os pacientes dos casos descritos não apresentavam uma perversão constituída a partir de atuações sexuais grotescas, comuns às graves perversões, embora na relação houvesse a possibilidade de um enactement que só poderia ser vivido e visualizado por meio dessas formulações mais sutis que pretendi descrever. A cena e o cenário propostos são os de uma criança profundamente angustiada e abandonada, frente à impermeabilidade de um adulto que distorce, banaliza e burocratiza o que poderia vir a ser movimentos de uma interação viva. Essas pessoas só podem sentir-se existindo a partir dessas estratégias, uma vez que nelas está contido tanto o momento em que se perderam de si mesmas como também o único no qual se reconhecem. Tal condição se repete e é estimulada nas diferentes relações e interações do cotidiano.

A experiência emocional que transitava na dupla podia ser captada e encaminhada para + K, até o ponto em que se delineava o outro e a necessidade do vínculo. Nesse momento vislumbrava-se o desastre, a tragédia do abandono cruel e a dor insuportável, impossível de ser contida. A partir daí, outro cenário se impunha; as apreensões afetivas e prenhes de significados que transitavam na experiência emocional daquele momento adquiriam uma tonalidade superegóica, violenta e moralista e esvaziavam-se, pavimentando o trânsito na dupla através do cenário perverso.

O momento do enactement é a condição pela qual se evidencia o congelamento do “vir a ser”, violenta interrupção da aventura do trajeto em direção a O.

O risco na abordagem do analista é reforçar essa denegação, interpretando os aspectos destrutivos e sádicos, atribuindo-os ao intrapsíquico do paciente. Tal situação impõe ao paciente, mais uma vez, a repetição do traumático, alijando-o da possibilidade de compreender o abuso que foi perpetrado contra a criança em seu íntimo e que produz uma indelével vivência de indignidade.

Estamos frente a pessoas cujas experiências, além de qualquer patologia que possam manifestar, tiveram relação com o ter de ser inexistentes para poder ser, senão amados, ao menos aceitos por pais que odiavam a vida e por ela eram aterrorizados.

Seria uma grave injustiça atribuir principalmente a elas, mesmo que em nome da transferência, a atmosfera morta e mortífera e inquietantemente perversa que elas propõem ao analista. Essas pessoas vieram para a análise para enfrentar sua triste história, na esperança de encontrar alguém que pudesse acreditar nelas e pensar sobre elas, mostrando-lhes talvez — e freqüentemente é assim — que aquilo que lhes pareceu sadismo e ferocidade mental de seus pais não era mais do que a tentativa de eles eliminarem sua existência da vida. Pois era a vida que eles não suportavam, e portanto atacavam. Não a eles, mesmo que obviamente, enquanto crianças, eles fossem os mais evidentes representantes da vida.

Muitos dos pacientes difíceis que recebemos para análise, os que se utilizam principalmente de estratégias perversas, viveram, a meu ver, experiências de aniquilamento psíquico, desleais, sutis e difíceis de decodificar; e freqüentemente não lhes foi concedido existir como pessoas individualizadas, mas somente como apêndices de algum outro, contra sua própria vontade. As suas necessidades de base foram, portanto, ignoradas e não receberam uma real tutela e cuidado.

O paciente, segundo a nossa atitude em relação a ele, seja ela verbal ou não-verbal, pode-se manifestar essencialmente e em muitas situações, esterilizado e morto psiquicamente, mesmo que ocorra uma mudança na linguagem por meio da qual ele estabelece a sua auto-suficiência e ausência de emoções e preocupações. Pode também lentamente acordar e levar sua vida e seus acasalamentos mentais e físicos de um novo modo e com novos desenvolvimentos.

Minha vivência íntima com esses pacientes remeteu-me à criança totalmente ignorada, ludibriada e cruelmente manipulada. A raiva terrível, dor, desolação e resignação letal, freqüentemente experimentadas por mim nesses encontros, aproximaram-me da idéia de como eles haviam vivido. Nesse contexto, aproximo-me de uma outra formulação que me auxiliou a compreender os meus sentimentos e a aprofundar a compreensão de minhas abordagens com esses pacientes. O analista, nesses casos, somente pode auxiliá-los se alcança a condição de “estar presente” (Eshel, 2005). A condição do analista de estar com o paciente dentro desse tipo de experiência, com a possibilidade de vivenciá-la e conter o que até aquele ponto era insuportável, dissociado ou congelado, pode criar um processo transformativo que não somente reviva a situação original, mas torne-a parte de uma realidade atual no vínculo analítico.

Algo que uma paciente citada por Franco Borgogno (2004) descreve pode aproximar-se disso:

Se alguém descobre que tem efeito sobre o outro, é real, existe; portanto também os outros existem para ele e são reais. É isto que o senhor me dá. Não é um barulho indistinto que não se conhece e não se sabe de onde vem; não é um gemido que te atormenta porque você não consegue se opor e não sabe o que fazer, não é um eco que te propõem e repropõem a tua própria dor. É alguma coisa que chega a “retumbar” por dentro, que é vivo e não é morto e te faz ressurgir.

Acredito que, com esse tipo de paciente, é fundamental a disponibilidade ao procurar reconhecê-lo, ao experimentar a confusão e a inversão de papéis, aos quais foi real e continuamente submetido, e as conseqüentes vivências de ultraje e de violência aos próprios pensamentos, às próprias emoções, aos próprios dotes e propensões.

 

Conjunção constante

Quais elementos podem ser destacados como pertencentes a uma conjunção constante que nos remeteria à condição nomeada como “perversão nossa de cada dia?” Nesse intento, a partir dos modelos por mim escolhidos e considerando que os mesmos carreguem em si os elementos que eu procuro, quais são eles?

Uma vez definido esses elementos em conjunção constante, esta suportaria abstrações progressivas que permitiriam nos aproximarmos de ações e comportamentos banais do cotidiano que possam ser representativos da condição nomeada no título deste trabalho? Destaco os seguintes elementos como passíveis de suportarem uma progressão de significados que permitiam, a meu ver, o reconhecimento de que há uma ação perversa em curso:

1. ações de dupla face
2.  movimentos de cooptação
3.  objetos não-existentes (inanimados) com atributos de onipotência e onisciência
4.  evidências do espectro perverso
5.  triunfo e excitação

Proponho que esses sejam os elementos a serem “amarrados” pela nomeação “perversão nossa de cada dia”. Como essa nomeação já conteve para mim outros níveis de significado em outros momentos (Marques, 2000, 2004), hoje eu a reconheço como um universo delineado com esse nome, mas que está em evolução e propõe que novas concepções venham a ser realizadas.

 

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Endereço para correspondência
Miguel Marques
Rua Dr. Granadino de Baptista, 412 – Sen. Salgado Filho
17502-180 – Marília – SP
Tel.: 14 3454-1637
E-mail: mimarq@terra.com.br

Recebido em 18.10.2006
Aprovado em 8.11.2006

 

 

1 Membro efetivo da SBPSP; membro efetivo e analista didata da SBPRP.
2 A relação com objetos animados depende basicamente da sustentação, dentro do espaço mental, de registros provenientes da presença e da ausência de um outro ser que não eu mesmo.
3 No capítulo 5 de Transformações, Bion coloca, segundo meu entendimento, que o vínculo é a causa que leva ao anseio pela presença.
4 São formulações que visam manter a ilusão equivocada da presença constante do objeto.
5 Condição nas quais as evidências da falta do objeto são usadas em conjunções significativas que permitem o reencontro do vínculo com o objeto perdido.
6 Evidências da falta agora investidas como elementos saturados, com atributos de presença cuja vinculação entre si é a causalidade moral e superegóica.
7 Qualidade de sofi sticado; adulterado, o que não é natural; falsamente refinado.
8 Cooptar: agregar, associar; unir-se a alguém como companheiro, parceiro ou cúmplice, para um empreendimento ou ação conjunta.

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