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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641Xversão On-line ISSN 2175-3601

Rev. bras. psicanál v.41 n.3 São Paulo set. 2007

 

ARTIGOS

 

Confiança: a experiência de confiar na clínica psicanalítica e no plano da cultura

 

Trust: the experience of confidence in the psychoanalytic treatment and in the cultural space

 

Confianza: la experiencia de confiar en la clínica psicoanalítica y en el plano de la cultura

 

 

Luís Claudio Figueiredo1

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A partir das elaborações teóricas e clínicas de psicanalistas como M. Balint, D. Winnicott e A. Green e com base em uma interpretação da vida social e cultural contemporânea (A. Giddens e A. Elliott, entre outros), será focalizado o tema da confiança. Trataremos das condições sociais e psíquicas que dão suporte aos processos de constituição da confiança e, de outro ângulo, da confiança no ambiente e no objeto primário como condição para a saúde mental. Em especial, será apresentada uma visão acerca de como o processo de cura em psicanálise enfrenta hoje o desafio da desconfiança na relação terapêutica e de como a desconfiança incide nos tratamentos e nos diversos elementos do setting analítico na clínica contemporânea.

Palavras-chave: Confiança; Desconfiança; Risco; Modernidade; Balint; Winnicott; Green.


ABSTRACT

There are social and psychic conditions that support the process of trust. The problem of trust can be dealt with in the field of the primary object as a condition of mental health. These are the theoretical and clinical contributions made by psychoanalysts like M. Balint, D. Winnicott and A. Green. Another source of knowledge on the theme is the interpretations of contemporary social and cultural life by Anthony Giddens and Anthony Elliot, among others. A special presentation is made of how the process of cure in psychoanalysis faces today the challenge of mistrust in the therapeutic relationship and of how mistrust is present in the diverse elements of the analytic setting in contemporary clinical psychoanalysis.

Keywords: Trust; Mistrust; Risk; Modernity; Balint; Winnicott; Green.


RESUMEN

A partir de las elaboraciones teóricas y clínicas de psicoanalistas como M. Balint, D. Winnicott y A. Green, y además, con base en una interpretación de la vida social y cultural contemporánea, será considerado el tema de la confianza. Vamos teorizar sobre las condiciones sociales y psíquicas que pueden sostener los procesos de constitución de la confianza. Desde otro ángulo, trataremos de la confianza en el entorno y en el objeto primario como condiciones de la salud mental. En particular, se presentará una visión acerca de como el proceso de cura en psicoanálisis afronta hoy el desafío de la desconfianza en la relación terapéutica y de como la desconfianza alcanza los tratamientos y los varios elementos del setting analítico en la clínica contemporánea.

Palabras clave: Confianza; Desconfianza; Riesgo; Modernidad; Balint; Winnicott; Green.


 

 

Eis que um pai– mas pode ser a mãe– atira sorridente o bebê para o alto e o aguarda de volta, para que ambos, às gargalhadas, se encontrem no abraço seguro e confortável. A cena se repete muitas vezes, com a criança se divertindo cada vez mais e podendo cada vez mais fruir os momentos do susto, do vôo livre e da reconciliação final. A brincadeira se repete a pedidos do pequeno interessado.

Agora se trata de um jovem atirando-se do alto do viaduto que passa sobre a avenida Sumaré, em São Paulo. Mas ele não é suicida nem deverá estatelar-se 40 metros abaixo no asfalto, pois um forte laço elástico o mantém atado, pelos pés, a uma base sólida sobre o viaduto. Trata-se de uma brincadeira emocionante, o bungee jump. Em geral, submetendo-se a ele ou apenas assistindo ao exercício bem-sucedido, passa-se pelos momentos do medo pânico e do final feliz, no balanço dependurado no forte elástico, o que ajuda a confirmar a confiança no equipamento, no instrutor e na brincadeira. Mas nem sempre a brincadeira termina bem. Alguns desastres já ocorreram, para horror dos espectadores e, supõe-se– pois não puderam dar seu testemunho–, para o curto horror das vítimas.

O bungee jump talvez apenas encene de forma muito dramática uma série de experiências bastante comuns na rotina de uma cidade contemporânea: sair de casa– e mesmo dormindo dentro de casa pode-se ser alcançado por uma bala perdida, o que não é raro para quem mora perto dos morros cariocas– pode ser uma aventura emocionante em que o final feliz não está, infelizmente, garantido. Dos desastres no trânsito às atividades do PCC, o “estar solto no espaço” faz parte da vida de qualquer um de nós e mina o que foi chamado por um sociólogo, A. Giddens, de “segurança ontológica”, um nome para a confiança no ambiente e em si mesmo que permite que a vida seja vivida com algum prazer e tranqüilidade, com uma disposição de entrega relativamente relaxada. Desemprego, reflexos de guerras em lugares remotos, gripe aviária, novas bactérias etc. tornam a existência cotidiana um exercício involuntário de bungee jump: altas voltagens, pois as promessas de sucesso e gratificação são igualmente intensas, com a expectativa de final feliz nem sempre realizada.

Mantendo em mente aquelas cenas, passemos ao que dizem alguns psicanalistas, Michael Balint, Donald Winnicott e André Green. Da obra dos dois primeiros faremos um recorte bem específico, destacando a presença da questão da confiança e da desconfiança na constituição do psiquismo e no tratamento analítico. Os termos relativos à confiança nem sempre estiveram explícitos nos trabalhos de Balint e apenas aos poucos foram sendo explicitados nos textos de Winnicott. No entanto, parece-nos que a questão é não apenas presente, mas determinante nos dois autores. Quanto a Green, iremos buscar nele algumas noções metapsicológicas que nos servirão para elaborar a problemática da confiança e da desconfiança de uma forma mais consistente.

Vamos, então, ao que podemos aprender com eles.

 

1. A partir de Balint [1896-1970]

Algumas citações de Michael Balint irão nos servir de guia e disparador:

Qualquer um de nós poderia citar vários casos em que os sintomas neuróticos mais notáveis desapareceram ao longo do tratamento em relativamente pouco tempo, mas permaneceu uma completa ou acentuada incapacidade para amar […]

Trata-se da incapacidade para entregar-se ao objeto “amado” (e as aspas indicam a dificuldade justamente de desenvolver relações amorosas nessas condições) e render-se aos impulsos amorosos, libidinosos, revelada por alguns pacientes.

Além disso, somos freqüentemente procurados por gente que já na primeira consulta apresenta justamente este quadro. É difícil colocá-los sob qualquer rubrica diagnóstica. Sua queixa principal é que não conseguem encontrar seu lugar na vida. Nada está efetivamente errado com eles, ou, no máximo, têm alguns sintomas neuróticos insignificantes; mas não têm prazer com coisa alguma.

Esses pacientes não estão seguros, não se sentem confortáveis, não podem desfrutar plenamente do repouso, e permanece neles uma inquietação de fundo. No período em que o texto foi escrito (final da década de 1920 e início da seguinte), estão sendo descobertas e submetidas à análise as chamadas “neuroses de caráter”, ou seja, transtornos profundos na constituição narcísica dos indivíduos.

Essas considerações, que podem nos parecer ainda tão atuais, são, na verdade, bem antigas, datam de mais de setenta anos (Balint, 1932-39/1985 e 1934-35/1985). O que preocupa o autor são os pacientes “desconfiados” e o tratamento analítico que requerem. Nesse contexto, Balint forja a noção de “novo começo” (new beginning).

A teoria elaborada diante desses casos pode ser expressa de modo condensado da seguinte forma: na saída do “narcisismo primário”, o que Balint denomina de amor primário– para acentuar que não se trata de um estado anobjetal ou pré-objetal, mas que, ao contrário, a ligação com o objeto é aí determinante e absoluta–, o indivíduo está totalmente vulnerável às falhas dos objetos primários e às eventuais desproporções entre excitação e continência devidas ao grau primitivo de constituição psíquica no bebê e às falhas da mãe na função de escudo protetor (Khan, 1963). Instala-se então uma desconfiança básica do indivíduo diante do ambiente, de seus objetos mais significativos, de seus vínculos amorosos e de seus próprios impulsos libidinosos, pois estes, se liberados, podem deixá-lo à mercê de objetos não-confiáveis.

O tema será mais desenvolvido adiante, mas cabe já assinalar: a desconfiança básica é uma suspeita paranóica que abala as bases da confiança e da capacidade de confiar. Não é apenas o não-confiar, mas um ataque à confiança já instalada ou apenas possível. Essa suspeita paranóica de fundo não seria prerrogativa de pacientes paranóicos– indivíduos psicóticos, com delírios de perseguição manifestos; a desconfiança desses pacientes pode vir associada a diferentes quadros psicopatológicos e estar, portanto, muito generalizada na clínica psicanalítica, segundo Balint.

A interpretação do quadro por esse autor é bastante original: “Estes pacientes simplesmente não podem suportar, ou suportam com grande dificuldade, a elevação de sua excitação sexual”.

Tal dificuldade ou incapacidade deve-se, de acordo com Balint, ao que Ferenczi (1933/1992)2 acabava de denominar “confusão de línguas”: a língua amorosa da ternura do bebê era violentada pela língua amorosa da paixão dos adultos:

Usualmente foram adultos que, por suas ações, evocaram excitação sexual, produzindo no bebê indefeso quantidades de prazer ainda insuportáveis. Estas ações podem ter sido diretamente sexuais e, mesmo no sentido genital, mais freqüentes do que tendemos a crer, mas não precisa ter sido assim. Mesmo as chamadas carícias inocentes, tais como beijinhos, abraços, brincadeiras de jogar a criança para o alto, balançá-la e rodopiá-la podem ter o mesmo infeliz resultado.

No início da década de 1930, Ferenczi e, de forma ainda mais incisiva, Balint, no texto acima transcrito, anunciam a descoberta que Laplanche faria com grande alarde muitas décadas depois, a sedução generalizada. Para aqueles autores, contudo, um problema surgia apenas quando ao nível das práticas excitantes não correspondia o nível de desenvolvimento de uma estrutura psíquica mais organizada na criança (inevitavelmente ausente em um bebê). A não-correspondência e a desproporção são para eles os elementos decisivos para a criação de um adoecimento de base na forma de uma desconfiança. Os resultados dessa desproporção podem, assim, ser resumidos a:

1.  ocorrem falhas no pára-excitação e nas barreiras intrapsíquicas de contenção;

2.  dá-se a constituição de um superego excessivamente rigoroso que emitirá um sinal de angústia continuamente acionado e capaz de inibir todos os processos de prazer, excitação e satisfação libidinal, o que vai caracterizar uma grave neurose; e/ou

3.  adotando e agora a linguagem winnicottiana, ainda desconhecida por Balint, mas que retrata muito bem seus pacientes, ocorre a constituição de um falso-self, com suas características de falta de espontaneidade, falta de contato emocional e sabotagem do prazer.

Para Balint, não está clara nesse momento a diferença entre as alternativas 1, 2 e 3, pois apenas bem mais tarde ele irá se referir aos “pacientes da falha básica”, casos borderline que se diferenciam dos neuróticos, mesmo os mais graves.

As manifestações clínicas mais evidentes da desconfiança em todos esses indivíduos (neuróticos, borderline e esquizóides) são, além das fantasias paranóicas mais óbvias (mas nem sempre manifestas), as inibições severas, a frigidez, a impotência, a ejaculação precoce, a impulsividade e também a insônia crônica, pois tais pacientes têm grandes dificuldades de entrega despreocupada e relaxada ao bem-estar indefeso do sono.

Uma conjetura plausível, a ser investigada, é a de que certas doenças alérgicas também correspondam a um estado de “desconfiança orgânica”: o sistema imunológico, nesses casos, operaria em regime de alerta máxima e suspeita alarmada diante de alguns elementos do ambiente, anteriormente experimentados como familiares mas que, a partir de certo momento, são identificados como não-eu e potencialmente hostis. A reação alérgica traduziria o medo e a propensão ao ataque a essa alteridade inimiga “familiar”, em sua inquietante estranheza. Indo ainda mais longe nessa direção, veríamos as doenças auto-imunes como situações extremas de desconfiança em que partes do próprio organismo são atacadas, como se, apesar de totalmente familiares, se tornassem estranhas.3

Para Balint, o resgate da confiança primária é fundamental no tratamento analítico desses casos, e um caminho terapêutico se perfila diante de nós:

Estas pessoas desconfiadas– pois elas sofrem de desconfiança na capacidade do objeto primário suportar, acolher e corresponder na medida das possibilidades psíquicas do bebê, posto que exercem exageradamente e de forma unilateral sua função estimulante e sexual e não respeitam os limites do psiquismo infantil– precisam aprender no curso do tratamento a se entregar novamente ao amor, ao prazer, à curtição [enjoyment], tão sem medo e tão inocentes como eram capazes na primeira infância [grifos meus].

Não se trata de retornar a um estado paradisíaco de existência não-sexual, mas de o adulto poder respeitar uma modalidade de experiência sexual propriamente infantil. Trata-se, em acréscimo, de um movimento regressivo a ser conduzido de forma a permitir ao paciente a retomada de sua trajetória da sexualidade infantil precoce a uma sexualidade adulta e genital.

Em outras palavras, eles [os pacientes em apreço] devem ser levados ao ponto em que possam exercitar de novo certas funções pulsionais [instintivas] que até então não podiam ser desempenhadas de forma nenhuma ou apenas com muita ansiedade [por conta de um superego rigoroso] ou, se isentas de ansiedade, sem prazer [caso em que se desenvolveu um falso-self].

A criação de uma atmosfera adequada à restauração da confiança do bebê nos objetos e, mais ainda, no ambiente será uma questão técnica decisiva, tal como pensado por Balint desde a década de 40 (Balint, 1949/1985). Mais do que interpretações reveladoras ou desconstrutivas, o tratamento requer a instalação do clima de confiança recíproca entre paciente e analista. Aí, para esse autor, reside a maior dificuldade no trato analítico com indivíduos desconfiados, posto que a presença do analista e as peripécias da análise– em especial, as devidas ao desenvolvimento da transferência– tenderão a produzir excitações excessivas e, eventualmente, insuportáveis. Como veremos adiante, tal dificuldade tende a crescer no contexto de uma situação histórico-cultural em que a desconfiança paranóide passa a ser um traço dominante nas subjetividades.

Em alguns textos posteriores, Balint (1949/1985; 1952/1985) focaliza a trajetória que vai da desconfiança à confiança no processo analítico: delineiam-se aí alguns dos desafios para a clínica, fazendo com que essa trajetória seja muito longa e sinuosa. Segundo o autor, a maior parte do trabalho analítico é dedicada às elaborações necessárias a esse percurso tortuoso, com suas idas e vindas.

“Para manter esta atmosfera mutuamente confiante entre paciente e analista é necessário muito tato e uma habilidade especial cuidadosa.” Ainda assim, as vicissitudes são inúmeras e em grande parte inevitáveis. Ao longo do processo analítico, que se configura como uma sucessão de estados de vulnerabilidade crescente e que precedem a entrega confiante ao objeto e ao ambiente, irão emergir com força total a desconfiança e as defesas contra as falhas do objeto.

Assim, em primeiro lugar, o processo de regressão e de entrega ao objeto será obstruído, muito provavelmente e de maneira quase inevitável, por um surto paranóide: fantasias persecutórias e retraimento irão se manifestar na transferência, justamente quando as primeiras defesas fundadas na desconfiança estiverem sendo demolidas e as demandas e exigências de gratificação começarem a ser expressas sem rebuços.

Em seguida, caso esse primeiro obstáculo possa ter sido transposto,4 pode se verificar um surto depressivo no processo analítico: a desconfiança desloca-se da referência ao outro para a referência ao próprio. O próprio indivíduo passa a se sentir responsável pela incapacidade de conquistar a atenção e as boas graças do ambiente, passa a se culpar pelo fato de que seus objetos primários falharam e continuam falhando. Novamente, muitos processos analíticos podem ser aqui interrompidos, deixando o paciente à mercê de ansiedades extremamente dolorosas.

Apenas após a ultrapassagem das ansiedades paranóides e das depressivas– o que pode levar muito tempo e exigir muito trabalho e paciência, pois o processo está longe de ser linear– é que pode ocorrer o new beginning e a instalação/recuperação da confiança primária, ao término da análise.

Para sintetizar minha experiência clínica (deixando de lado as dificuldades técnicas): o novo começo significa a capacidade de uma entrega não-suspeitosa, confiante, e de auto-abandono relaxado a uma relação de objeto. Há duas condições necessárias sem as quais uma fase propriamente de “novo começo” não pode se desenvolver. Estas são: a) o abandono da atitude paranóide, o reconhecimento de que as ansiedades paranóides não têm fundamento ou ao menos são muito exageradas; b) a aceitação, sem ansiedade indevida, de um certo grau de depressão como uma condição inevitável da vida, a confiança de que é possível– para não dizer, certo– que se vai emergir desta espécie de depressão como um ser humano melhor.

Em 1959, no livro Thrills and regression, Balint retorna à problemática da confiança e da desconfiança. Na saída do amor primário para as primeiras formas de relação de objeto propriamente ditas– pois no amor primário a relação com o ambiente é pré-objetal–, constitui-se, simultaneamente, a condição para a confiança e para a desconfiança. O conceito de thrill refere-se às vicissitudes da confiança primária na saída do “amor primário”, mas diz respeito, também, aos momentos decisivos para a instalação da confiança primária. Na primeira das cenas com que se abre este artigo– a do bebê que é lançado para cima e recolhido nos braços da mãe ou do pai–, está ocorrendo justamente isto: produzem-se os afetos intensos da excitação e do medo, sucedidos pela segurança do abraço, e instala-se assim, progressivamente, a confiança.

O thrill, nas primeiras atividades lúdicas, está associado tanto ao despertar pulsional como ao exercício de entrega ao “objeto sob medida” e na “hora certa”: balanços, rodopios, galopes, cócegas, sustos etc. propiciam as experiências alternadas de tensão e distensão, excitação e relaxamento que sempre terminam no seguro abraço de adultos alegres, amorosos e protetores. Thrills fazem parte, dessa maneira, da “educação sentimental” dos humanos e da difícil tarefa de articular alguma desconfiança, o preço incontornável da separação e da autonomia, com a confiança básica no ambiente e nos objetos, sem a qual se adoece. Thrills continuarão para sempre, ao longo da vida e em todas as culturas, a fazer parte das atividades socialmente valorizadas, seja em parques de diversão, nos esportes radicais (o bungee jump já mencionado, por exemplo) ou nos filmes de suspense, os thrillers. Isso revela a importância das experiências de thrill na instalação deste elemento essencial da saúde psíquica que é a confiança primária.

Em todos os divertimentos e prazeres desta espécie três atitudes características são observáveis: a) algum aumento do medo consciente ou, ao menos, uma percepção do perigo externo real; b) uma exposição voluntária e intencional da pessoa a este perigo e ao medo correspondente; c) uma confiança maior ou menor de que se pode esperar o fim do perigo, de que o medo será tolerado e dominado e que se retornará ileso à segurança. Esta mistura de medo, prazer e esperança confiante são os elementos fundamentais dos thrills (Balint, 1959/1985) [grifo meu].

Ou seja, a confiança nasce de uma sucessão feita de entrega (que evoca excitação– muitas crianças se molham com o excesso de prazer quando são arremessadas para o alto), susto, medo e conforto recuperado. Esse jogo entre intensidades afetivas e conforto final é a essência do thrill e a base experimental necessária para a instalação da confiança primária. É mais do que o ir-e-vir, o sair-e-voltar, o Fort-Da do objeto, pois no caso do thrill os distanciamentos e aproximações implicam aquelas intensidades elevadas– prazer excitado e medo– seguidas do momento de conforto e segurança. É mais, igualmente, do que o simples holding da dependência absoluta, tal como descrito por Winnicott, o que veremos mais adiante. Na experiência do thrill, o vôo livre é tão essencial quanto o abraço seguro, inclusive porque ele se contrapõe a outro motivo de desconfiança: a de que o abraço seja um claustro, uma prisão, um engolfamento mortífero.

Mas, como essa passagem do amor primário (indiferenciação entre sujeito e objeto) às relações de objeto (objetos diferenciados e separados) comporta ambivalência– de um lado, o prazer excitado e o medo; de outro, a esperança confiante–, ela é sempre sujeita a muitas vicissitudes. Balint identifica duas atitudes fundamentais que organizam nossas primeiras formas de interação com o mundo de objetos: a ocnofilia e o filobatismo.

Na ocnofilia, predomina o medo de vazios e de ausência e separação; daí decorre o clinging (os franceses chamam de agrippememt) sobre o objeto, um apego ansioso e obsessivo. Já no filobatismo, predomina o medo de ligação e de dependência, o medo de objetos excessivamente próximos, poderosos e invasivos e incertos; em decorrência, emerge um estado de desconexão afetiva– equivalente ao que outros autores reconhecem como esquizoidia. Ao longo da vida, os indivíduos marcados por essa atitude sentem-se continuamente em vôo livre sobre o vazio, e os objetos de que se aproximam, e que tentam controlar, têm o valor de “equipamentos”, extensões narcísicas de si no enfrentamento solitário dos vastos espaços do mundo. O exemplo do saltador no bungee jump representa bastante bem a atração pelo vazio e a confiança cega no equipamento a que o indivíduo está atado.

Alguns indivíduos, os que hoje chamamos de borderline e que o próprio Balint, mais tarde (em 1969), classificou como “pacientes de falha básica”, ao longo de toda a vida estarão organizados em torno de uma das atitudes fundamentais e das oscilações que delas decorrem, pois cada uma delas comporta também uma alta dose de oscilação. As duas angústias características do borderline, tais como identificadas por Green– a de separação e a de invasão–, estão claramente associadas às duas atitudes fundamentais descritas por Balint.

Há modalidades de ambivalência, fobias e desconfianças características de cada uma das atitudes básicas. De uma parte, temos a ambivalência ocnofílica feita de apego excessivo, ódio e desconfiança do objeto. Os objetos ocnofílicos, inevitavelmente, serão tanto “amados” quanto odiados pelo que trazem de decepção e de incertezas e de ameaça de aprisionamento. Já na posição filobática, o desapego aos objetos e a desconfiança diante deles– o que produz a necessidade de mantê-los à distância e sob controle– deverá coexistir com o apego aos “equipamentos” a serem adotados, mantidos e desfrutados como partes do si-mesmo. Cada uma das atitudes extremas traz consigo uma ambivalência cruel em que amor, raiva, apego e distanciamento se mesclam e se confundem. A desconfiança não cede; ao contrário, é potencializada. As ansiedades típicas dos quadros borderline podem encontrar aí suas raízes, bem como aí se originam as brutais oscilações de humor desses pacientes sobre um fundo crônico de angústia e desespero. Esses, enfim, são os percalços e desesperos associados às duas atitudes extremadas (em termos kleinianos, pertinentes à posição esquizo-paranóide) e assim se caracteriza a psicopatologia dos “pacientes difíceis”, os profunda e precocemente desconfiados.

Para sair desses extremos e conseguir alcançar uma posição mais equilibrada, menos ambivalente, será necessário que atravessem um movimento regressivo, de forma a promover o resgate da confiança primária (entrega incondicional ao ambiente “pré-objetivo”), para de novo ser cuidado pelo objeto e atravessar de outra maneira o início do processo de diferenciação.

Apenas o trabalho analítico na transferência (no sentido ampliado– uma transferência sobre todos os “objetos” implicados no setting, incluindo o enquadre ele mesmo, e não apenas sobre o analista) será capaz de propiciar a superação dialética das duas atitudes fundamentais, a passagem da posição esquizo-paranóide à depressiva e, em seguida, o novo começo. Teremos antão a constituição de uma confiança madura. O que chamamos de confiança madura– a expressão não é adotada por Balint, mas o estado que descreve merece esse nome– se dá em oposição à desconfiança básica e à confiança idealizada e indiscriminada, à credulidade que se verifica nas duas atitudes básicas: o ocnofílico acredita ingenuamente na bondade do objeto (para em seguida desconfiar dele) e o filobático acredita com a mesma ingenuidade na ausência de perigo dos espaços vazios (para em seguida apostar ingenuamente na eficácia de seus “equipamentos”). A passagem da confiança defensiva para a desconfiança é abrupta e muitas vezes imotivada. Qualquer aspecto decepcionante e incerto no objeto e na situação pode dar margem à irrupção da desconfiança. Já na confiança madura, como veremos adiante, a dinâmica é diferente e a convivência com o não-confiável se torna possível.

 

2. O paralelo com Winnicott [1896-1971]

Winnicott foi um contemporâneo perfeito de Balint– ambos nasceram no mesmo ano e morreram com um ano de diferença. No entanto, Balint o precedeu em diversos aspectos e, em particular, na ênfase na problemática da confiança e da desconfiança. Como vimos, desde o começo da década de 30 Balint orientava suas elaborações nessa direção. Mas também é notável a presença dessa mesma questão em Winnicott. Os termos reliability, confidence e trust aparecem continuamente em seus textos e mostram-se essenciais para a sua concepção dos diferentes estágios da constituição do psiquismo. Presentes já em textos anteriores, eles se tornam ainda mais conspícuos no derradeiro livro de Winnicott, Playing and reality (1971).5

Tanto a criação da confiança como o trajeto que pode levar da confiança à desconfiança dependem dos “acertos” e das falhas da mãe, basicamente de sua confiabilidade (reliability). É nessa condição que ela pode funcionar como “escudo protetor” (Khan, 1963) e transmitir ao bebê uma confiança básica no ambiente (confidence in the environment), uma forma de “crença na confiabilidade do objeto” (belief in reliability).6 Essa confiança é a condição essencial do habitar e existir no próprio corpo– enraizar-se no soma e personalizar-se (Winnicott, 1970)–, do brincar e da criação do espaço potencial (capacity to play and potential space; Winnicott, 1971).

Algumas citações de Winnicott podem nos ser úteis. Comecemos com uma de um texto escrito em 1970:

As duas coisas, portanto, andam juntas no desenvolvimento sadio: o senso de segurança em um relacionamento [baseado na confiabilidade– reliability– da mãe] mantendo a oportunidade para a anulação repousante dos processos integrativos, ao mesmo tempo em que facilita a tendência geral herdada que a criança tem no sentido da integração, e, como estou acentuando neste artigo, na questão da morada ou habitação do corpo e o funcionamento corporal (Winnicott, 1970).

Vale dizer: a confiabilidade do objeto, base do que nas linhas anteriores Winnicott denominara de “relações em que há a confiança máxima” [maximal trust] tanto favorece o render-se ao ambiente, o repousar sem esforço integrativo, como, na outra direção, o habitar o e no corpo e seus processos naturais, evitando a dissociação entre soma e mente, com seu excesso de intelectualização.

As próximas citações provêm do livro de 1971, Playing and reality.

No estado de confiança [confidence], que cresce quando a mãe pode fazer esta coisa difícil [brincar de ser encontrada quando e onde a onipotência infantil a “cria” e, ao mesmo tempo, ser ela mesma à espera deste encontro], (mas não se ela é incapaz de fazer isto), o bebê desfruta das experiências baseadas no “casamento” da onipotência dos processos intrapsíquicos com o controle infantil da realidade. A confiança[confidence] na mãe constitui-se aqui em um playground intermediário, onde se origina a idéia de mágica, já que o bebê numa certa medida experimenta a onipotência […] Chamo isto de playground porque o brincar começa aqui (Winnicott, 1971).

Ou seja, a confiança se origina na reliability da mãe– com o holding materno na fase da dependência absoluta–, mas vai além da mera estabilidade, incluindo a capacidade da mãe de estabelecer com o bebê uma relação harmônica e ritmada em que ela pode ser “inventada” pelo bebê e, ao mesmo tempo, ser ela mesma, relativamente fora da área da onipotência: este o jogo primordial.

O fracasso na condição dependente [dependability] ou a perda do objeto significa, para o bebê, uma perda da área do brincar, e a perda do símbolo significativo [um objeto transicional]. Em circunstâncias favoráveis, o espaço potencial é preenchido com produtos da própria imaginação criadora do bebê. Em circunstâncias desfavoráveis, o uso criativo de objetos está ausente ou é relativamente precário […] Há casos, com o fracasso prematuro da confiabilidade do ambiente, em que emerge um perigo alternativo, o de que o espaço potencial seja preenchido com o que é injetado nele por alguém que não o próprio bebê. Parece que o que quer que esteja neste espaço que não provenha do bebê será sentido como persecutório, e o bebê não terá meios de rejeitá-lo. Os analistas devem estar conscientes de que, a menos que criem um sentimento de confiança [confidence] e uma área intermediária em que o brincar possa ter lugar, o que injetarem nesta área ou as interpretações com que a inflarem, de fato serão provenientes de sua própria imaginação criativa (Winnicott, 1971).

A confiança num ambiente responsivo e empático desdobra-se, assim, na confiança num ambiente não-intrusivo, não-persecutório e capaz de oferecer ao bebê o espaço e o tempo necessários à eclosão da sua criatividade.

A palavra confiança [trust] neste contexto revela uma compreensão do que eu quero dizer com construção de confiança [confidence] baseada na experiência, na época da dependência máxima, antes da fruição e uso da separação e independência (Winnicott, 1971).

O termo trust, emprestado por Winnicott de um autor jungiano, tende a tomar um aspecto ainda mais decisivo: além da confiabilidade do objeto e da confiança no ambiente, trust refere-se a uma condição internalizada de confiança primária, adquirida com base em boas experiências.

Localizei esta importante área de experiência no espaço potencial entre o indivíduo e o ambiente, que inicialmente tanto junta quanto separa o bebê da mãe quando o amor materno, exercitado ou tornado manifesto em termos de confiabilidade [reliability] humana, de fato dá ao bebê um senso de confiança [a sense of trust or of confidence] no fator ambiental (Winnicott, 1971).

Se em alguns trechos Winnicott faz menção, como já verificamos, a uma “crença na confiabilidade” dos objetos, aqui ele se refere a um “senso de confiança” [sense of trust], o que parece mais apropriado ao nível muito primitivo da experiência que ele está examinando: tudo indica (o que será retomado à frente) que o sense of trust se constitui num plano pré-representacional, não envolvendo crenças de nenhuma espécie. Talvez fosse mais correto dizer que o sense of trust constitui-se numa matriz simbólica para a representação de objetos e relações confiáveis, não sendo ele mesmo da ordem representacional. A confiança [trust], nesse plano, é um “objeto interno” com características dinâmicas muito especiais. Precisaremos das elaborações de André Green sobre a “estrutura enquadrante” para nos aproximarmos de uma compreensão desse termo e desse processo.

O espaço potencial entre o bebê e a mãe, entre a criança e a família, entre o indivíduo e a sociedade depende da experiência que leva à confiança. Ele pode ser visto como sagrado pelo indivíduo na medida em que é aqui que ele experimenta o viver criativo.

O “viver criativo”– desde a criatividade primária até os mais sofisticados processos de sublimação– requer a instalação do espaço potencial, um espaço vazio, mas acolhedor e estimulante, baseado na confiança intransitiva [trust]: “A confiança do bebê na confiabilidade da mãe, e desde então, na de outras pessoas e coisas, torna possível uma separação entre o não-eu e o eu” (Winnicott, 1971). Winnicott refere-se aqui à possibilidade de que no espaço potencial se formem os fenômenos e objetos transicionais, a primeira possessão não-eu do bebê, e, em seguida, os diversos produtos da cultura.

Além das menções à constituição de uma confiança básica na fase da dependência absoluta– em contraposição à perda dessa confiança ou sua não-instalação por falta de confiabilidade do objeto– e da importância atribuída por Winnicott a essa confiança na criação da área do brincar e na emergência dos fenômenos e objetos transicionais, a questão também aparece no plano do “uso de objetos”. Para que a criança possa efetivamente lidar com objetos “objetivos”, aproveitar-se deles, alimentar-se deles, usá-los para suas ações efetivas no mundo e sobre ele, é necessário que o objeto seja minimamente confiável. Nesse caso, ele deve ser capaz de suportar a carga de agressividade vital intrínseca a essas ações sem perecer e sem retaliar. A “resiliência” do objeto, sua capacidade de sobrevivência e de não-retaliação são as bases para o desenvolvimento da confiança nessa nova etapa da constituição psíquica, embora nesse contexto não haja uma alusão mais explícita a confidence e trust.

Ainda assim, no capítulo correspondente (“The use of an object and relating through identifications”), referindo-se à espera cuidadosa pelo analista da emergência e desenvolvimento da transferência no paciente, Winnicott menciona a “growing trust” no enquadre e na técnica psicanalítica. Qualquer precipitação do analista será vivida como invasiva e adubará, portanto, as raízes da desconfiança. Será difícil e talvez impossível vir a “usar” um analista intrusivo que estará repetindo as velhas falhas do ambiente, embora com as melhores intenções e oferecendo as mais perspicazes interpretações.

Tal precaução é decisiva no atendimento de pacientes traumatizados, desconfiados e protegidos por um falso-self. Nesses casos, como já apontara Balint desde 1932, a regressão terapêutica num ambiente de extrema confiabilidade será necessária para a recuperação ou mesmo a instalação de uma confiança básica a partir do ponto em que ela fora quebrada ou desperdiçada. Esse foi o tema do grande artigo de 1954, “Metapsychological and clinical aspects of regression within the Psycho-Analytical set-up”.

Num rápido balanço, podemos dizer que Winnicott enriquece a temática da confiança na psicanálise assinalando a importância da confiabilidade do objeto na origem da instalação de uma confiança básica no ambiente– um senso de confiança, como ele diz em certo momento. Podemos ver, assim, como essa confiabilidade é indispensável para: 1) a morada no corpo, a integração psique-soma e a personalização; 2) para a instalação de uma área de brincar– o espaço potencial; 3) vimos também como essa mesma confiança é necessária para que esse espaço seja preenchido inicialmente com os produtos criativos da onipotência infantil (fenômenos e objetos transicionais, a primeira possessão não-eu); 4) finalmente, vimos como essa confiança deve ser confirmada pela capacidade do objeto sobreviver à agressividade inerente ao “uso”, o que inclui o não-retaliar.

Winnicott, igualmente, acentua a confiabilidade do analista e do enquadre– o que Balint (1969) chamou de analista não-intrusivo (Balint, 1985/1969)– e a recuperação e instalação da confiança em pacientes difíceis e muito desconfiados.

Por outro lado, perde-se com Winnicott toda a questão da sexualidade infantil em oposição à sexualidade adulta, a desproporção entre elas e as dificuldades do adulto para respeitar a capacidade de o bebê conter e canalizar a própria excitação. Deixa de lado, igualmente, a generalidade, se não a universalidade, das falhas na passagem do amor primário para as primeiras relações objetais, o que dá lugar, segundo Balint, às duas atitudes básicas– ocnofilia e filobatismo–, cada uma delas capaz de gerar uma escalada de desconfianças e suspeitas atrozes que se refletirão também na marcha dos processos de análise, gerando os momentos paranóides e os depressivos praticamente inevitáveis.

Certamente, a descrição dessas duas atitudes extremas, a consideração das vicissitudes de cada posição e sua permanência na sintomatologia dos pacientes desconfiados– pacientes da falha básica ou borderline– foi uma contribuição de Balint sem paralelo na literatura psicanalítica. No entanto, sua contribuição decisiva parece ter sido a consideração da experiência de thrill, com suas altas intensidades afetivas– prazer excitado e medo– em relação dialética com os momentos de segurança, conforto e paz, como ingredientes essenciais à instalação da confiança primária. Posto que a passagem do amor primário às relações de objeto não se dá sem tropeços e descontinuidades, a experiência do thrill torna-se decisiva. Essa é, provavelmente, a razão de ela ser tão universal e tão permanente– não dependendo da idade– quanto Balint apontou.

Em que pesem as diferenças de ênfase, seria justo dizer que Balint e Winnicott são os dois autores da psicanálise mais significativos na consideração da questão da confiança e da desconfiança na constituição do psiquismo e nos adoecimentos, sendo ainda mais correto assinalar a notável precedência e riqueza das contribuições do primeiro. Foram, afinal, quarenta anos de psicanálise– de 1932 a 1971– em que ambos trouxeram a problemática da confiança para a frente do palco da teoria e da clínica.

 

3. Funções e vicissitudes do objeto primário segundo André Green

A partir das posições de André Green (1984), desenvolveremos agora algumas das idéias dos dois autores já examinados num plano metapsicológico para, em seguida, retornarmos às questões da confiança e da desconfiança. Green é assumidamente um admirador– com ressalvas– de Winnicott, deixando Balint um pouco fora de foco. No entanto, sua ênfase na dimensão da sexualidade e, mais amplamente falando, na dimensão pulsional, articulando-a à questão das relações de objeto, às origens dessas relações e suas formas mais primitivas, torna-o de certa forma muito mais próximo de Balint que de Winnicott. Para Balint, muito mais que para Winnicott, sexualidade e relações de objeto não podem ser separadas. O mesmo se dá para André Green.

Vai nos interessar em Green a noção de “objeto primário” e suas funções: o ambiente, a mãe, o casal parental com suas diferenciações de gênero– funções materna e paterna– recebem o foco de seus holofotes teóricos tanto na condição de alvos da pulsão quanto na de suas condições de emergência.

Uma das funções essenciais do objeto primário é, efetivamente, a de despertar e revelar a pulsão. Não se trata de implantar a pulsionalidade, à la Laplanche, mas também não se supõe uma pulsão sem a participação do objeto, como seria o caso numa concepção biologizante e solipsista. Sem objeto, a pulsão não vem à tona, não se constitui. No entanto, contraditoriamente e ao mesmo tempo, outra função essencial do objeto primário é a de conter e transformar a pulsão, conforme as idéias de proveniência kleiniana e mais desenvolvidas por Bion (containment) e Winnicott (holding).

Com isso enriquece-se a idéia de desproporção, que em Ferenczi e Balint referia-se apenas à desproporção entre a sexualidade infantil e a adulta. A partir de Green, podemos ver como essa desproporção é sobredeterminada pela desproporção entre as próprias funções do objeto primário, a do despertar e a do conter as pulsões. O equilíbrio entre elas é sempre contraditório e instável e as possibilidades de desequilíbrio são onipresentes. O objeto primário suficientemente bom– parafraseando Winnicott– é o que consegue se manter, apesar de tudo, em certo equilíbrio dinâmico, o que ajuda a moderar a desproporção entre as sexualidades infantil e adulta. Do contrário, a desproporção se potencializa e passa a ter efeitos traumáticos. É nesse contexto que se entende a importância da experiência de thrill: ela encena a dupla condição do objeto, e será da encenação repetida do confronto entre as intensidades (excitação prazerosa e medo) e o momento do retorno à segurança e conforto que vai emergir e se instalar a confiança primária.

Quando o objeto primário se mostra “suficientemente bom”– excitando e contendo–, ele permite deixar-se esquecer, ser recalcado: este é o “trabalho do negativo” exercido pelas pulsões sobre o objeto primário suficientemente bom– o que pode ser encontrado num razoável estado de funcionamento e saúde. Produz-se então uma “alucinação negativa” do objeto. Nesse caso, o “bom objeto” desaparece enquanto tal, submetido ao recalcamento primário, e vem a ser internalizado como estrutura enquadrante.7

A estrutura enquadrante é o objeto primário em negativo, participando da constituição psíquica e dos processos de identificação pela via da introjeção. A isto se opõe a identificação pelas vias da incorporação ou da adesão. Como estrutura enquadrante, o objeto primário é internalizado como funções, tempos e espaços psíquicos, oferecendo os limites externos e internos do aparelho, necessários às modulações afetivas e ao bom desempenho das operações cognitivas da mente. Já nas formas da incorporação e da adesão, as identificações com o objeto primário saturam (para usar um termo de Bion) os espaços e tempos mentais. Como estrutura enquadrante, o objeto primário é a base para o exercício da função objetalizante (Green, 1984), que é o investimento pulsional de coisas, pessoas, relações e processos intrapsíquicos e intersubjetivos, os quais virão a funcionar, dentro de certos limites, como objetos substitutivos do desejo e do prazer. Os processos sublimatórios, por exemplo, dependem essencialmente da função objetalizante.

Com base nessas idéias, retomemos o tema da confiança e da desconfiança.

Chamaremos de confiança primordial a expectativa de encontro do objeto primário suficientemente bom. Trata-se de uma pré-concepção vazia, à espera de realização (Bion), uma possibilidade que não chega a ser experimentada como confiança, nem se confronta com a desconfiança. Mas, se não realizada, essa pré-concepção se converte, fundamentalmente num plano inconsciente, mas às vezes também consciente, em desconfiança básica, em ataque às possibilidades de confiar. Em contraposição, no plano da consciência, pode se manifestar uma confiança defensiva, idealizada, um estado de credulidade obtusa. Essa “pseudoconfiança” encobre, no caso, a desconfiança básica crônica.

Chamaremos de “confiança primária” o que se constitui quando a pré-concepção se realiza e ocorre a internalização do objeto suficientemente bom sob a forma de estrutura enquadrante como condição para a função objetalizante.

Por fim, vamos designar como confiança madura a que se apresenta e se sustenta diante dos objetos do desejo ausentes, o que pressupõe justamente a capacidade de manter a função objetalizante, a capacidade de representar e investir representações na ausência do objeto e mesmo na ausência de objetos plenamente confiáveis. Essa “confiança madura”– o trust, nas palavras de Winnicott– diferencia-se tanto da desconfiança básica como da credulidade infantilizada diante de objetos idealizados. Ela comporta a capacidade de avaliação de riscos e perdas motivados pelas insuficiências dos objetos e pelas inaptidões do sujeito. Ou seja, a confiança madura supõe a ultrapassagem das posições esquizo-paranóide e depressiva em que as desconfianças correspondentes afloram com facilidade. Na confiança madura há lugar para o “não-confiar” baseado na experiência e para o “não-confiar ainda” por falta de experiência com o objeto, sem que a não-confiança se transforme, paranoicamente, em desconfiança do outro ou, depressivamente, em desconfiança de mim.

No campo da sociologia (a que recorreremos na próxima seção), Anthony Giddens, fortemente influenciado por Winnicott, denominou de segurança ontológica o conjunto do que estamos sugerindo como sendo as três formas de confiança acima delineadas, e contrapôs a segurança ontológica à ansiedade existencial persistente e a uma espécie de fobia generalizada, tal como a observa nos dias de hoje em termos de fenômeno de massa.

Mas antes de passarmos ao plano da cultura e da sociedade algumas observações se fazem necessárias.

Em primeiro lugar, cabe retomar a diferença já mencionada entre as “confianças” e as crenças e representações: o “senso de confiança” (expressão de Winnicott) é da ordem de uma sensibilidade, não de uma “idéia”, e deixa o espaço vazio, sem objeto e sem representação de objeto. A noção de Green do bom objeto primário internalizado como estrutura enquadrante vem a calhar. Não são idéias, representações ou crenças sobre o mundo e seus objetos confiáveis o que importa. As “confianças” abrem um tempo e um espaço de encontro e produção de objetos, e esse tempo e espaço são vazios, o que não ocorreria se já estivessem ocupados por crenças ou qualquer coisa do gênero. Dizer, kleinianamente, que a confiança depende da introjeção do bom objeto também não ajuda, se não formos capazes de entender o estatuto do bom objeto primário internalizado: não se trata absolutamente de um “objeto”, mas de uma condição da função objetalizante, ela mesmo irrepresentável.

A rigor, a confiança em qualquer de suas modalidade é sempre “sem objeto”, seja como confiança primordial no objeto ainda não encontrado, seja como confiança primária no objeto necessário encontrado, mas já “perdido”, seja como confiança madura no objeto ausente do desejo. Falar em “confianças” é, portanto, sempre falar em vazio, aspiração e desejo, e também em incerteza. O que faz com que a confiança permaneça necessariamente nas cercanias da desconfiança, mas enfrentando-a e, quando as coisas dão certo, ultrapassando-a. Quando as margens entre confiança e desconfiança desaparecem, é porque estamos diante de uma pseudoconfiança, diante da confiança defensiva depositada num objeto idealizado.

Em contrapartida, a proliferação de “pacientes desconfiados”, desde Balint, “esquizóides” e “falsos-selves”, desde Winnicott, e borderline indica a importância do que Green denominou de posição fóbica central (Green, 2000) no atendimento dos casos difíceis. Todo o processamento psíquico fica então determinado pela suspeita e pela impossibilidade de fazer contato com o intolerável e assustador. Algo bem mais sério do que uma fobia neurótica.

 

4. O cenário sociocultural: superexcitação (sedução e rivalidade) e não-continência

A transição do plano da clínica psicanalítica para o da cultura em ampla escala é sempre um risco. Afinal, qual seria a tese? O que vem antes e o que explica o quê? Fenômenos clínicos particulares e singulares são determinados ou determinantes do que se verifica em escala coletiva e institucional? Para não sermos obrigados a sustentar nenhuma tese forte em qualquer das direções, vamos supor apenas uma certa e reconhecível ressonância entre os planos e passar rapidamente por essa questão metodológica na direção do que interessa: a desconfiança tornou-se um fato sociológico digno de atenção, ao mesmo tempo– talvez um pouco depois– que a desconfiança impôs-se como um fato da clínica psicanalítica. Algum cruzamento deve haver e precisa ser considerado entre esses dois planos. Por isso, sentimo-nos à vontade para iniciar esta seção com um autor que foi apenas e tão-somente um psicanalista clínico, embora hoje sirva de base para elaborações sobre a vida grupal e institucional: Ronald Fairbairn. Sua contribuição para o entendimento do mal-estar contemporâneo já nos ajudou em outro momento (Figueiredo, 2003) e pode nos ajudar agora. Em seguida, focalizaremos as idéias de alguns sociólogos contemporâneos, muitos dos quais, inclusive, lançam mão de idéias psicanalíticas.

Nosso recurso a Fairbairn dirige-se às suas idéias sobre as duas faces do “mau objeto” necessário, um objeto primário muito falho, excessivamente desviante do que deveria ser um objeto suficientemente bom. Fairbairn, na verdade, não era muito otimista: para ele, o objeto primário é sempre muito falho e decepcionante, e será sempre a partir de suas imensas falhas que participará da constituição do aparelho psíquico. Não admira que, para ele, haja sempre um núcleo esquizóide em operação em todo psiquismo “normal”. Não o acompanharemos em todas as suas formulações, mas tentaremos tirar partido de suas idéias para nos referirmos ao que acontece quando de fato o objeto primário é excessivamente inadequado e defeituoso.

Esse mau objeto, quando internalizado, apresentará inevitavelmente duas faces: a da tentação e a da persecutoriedade.8 São, como se sabe, as duas faces do demônio. Não se deve, portanto, pensar que a face tentadora, estimulante e atraente seja “boa”. É tão “mᔠe não-confiável quanto a que persegue e ameaça. É na figura do grande sedutor– uma bela figura– que o diabo é mais digno de nossa desconfiança.

Nos termos de André Green, bem menos pessimista que Fairbairn, nem sempre o objeto primário é tão inadequado; como “objeto primário mau”, contudo, ele será de fato “inesquecível” e então as descrições de Fairbairn ajustam-se como uma luva. Como objeto de uma identificação por incorporação (mas não introjetado, conforme afirmam Abraham e Torok), tal objeto interno promove uma busca incessante e repetitiva do sempre mesmo mau objeto tentador e ameaçador. Como o lobo mau da canção, “promete tudo, até amor”, mas cobra o preço de uma insegurança ontológica e da escravidão.

Por aí nos aproximamos dos thrills sem oportunidade de regressão, sem descanso final, continência, sustentação e apaziguamento, tais como se fabricam e se vendem no que tem sido chamado de sociedade de risco (Guidens, Beck & Lash, 1997; Giddens, 1991; Lash, 2004, etc.). Os riscos estão associados a condições extremas de concorrência e promessas sedutoras de gozo que geram um estado crônico de superexcitação e medo. A indústria da propaganda e do marketing é o exemplo mais vivo e evidente dos dispositivos de excitação excessiva.

A noção de risco (acidente, desastre) veio a caracterizar as sociedades ocidentais contemporâneas. Como “sociedade de risco”, nossas formas de sociabilidade exibem uma infinidade de manifestações: fala-se em grupos de risco, áreas de risco, investimentos de risco, comportamentos de risco, e essas são expressões que se aplicam às mais diversas condições e situações. Uma “área de risco” tanto pode ser aquela sujeita a desastres naturais, como a que está sob controle do narcotráfico ou submetida a bombardeios de Israel, no Líbano. Uma “população de risco” tanto pode ser identificada pelos hábitos como pelas preferências sexuais, pela idade etc.

Na esteira dos infinitamente variados discursos sobre os riscos, os discursos e práticas acerca dos “seguros” proliferam. Mas, em geral, os discursos e práticas voltadas para o seguro quase sempre dependem de uma confiança incerta em sistemas nada confiáveis. O caso dos convênios médicos é exemplar. O apego ao “ligado” e aos “sistemas abstratos” de segurança, longe de resolver o problema, ajudam a potencializá-lo: nada mais arriscado do que confiar nos sistemas de seguro e nos programas de previdência– oficiais ou privados. Isso abala radicalmente o que poderia ser a “segurança ontológica” dos indivíduos e coletividades, e faz do risco uma presença tentacular e generalizada. Tenta-se muitas vezes recuperar uma confiança mais personalizada– no corretor de seguros ou no consultor de investimentos, por exemplo, que estão sempre nos tentando com seus produtos magníficos–, mas nada impede que, naufragando os sistemas abstratos, perca-se da mesma forma toda a sustentação. Ou seja, os riscos em todas as suas modalidades permanecem de tocaia e reaparecem de surpresa, mantendo os indivíduos em estado crônico de desconfiança.

No plano social, os problemas com a “segurança ontológica” têm decorrências bastante notáveis A seguir, recensearemos algumas dessas manifestações, sem a pretensão de esgotar a lista.

Observa-se a irrupção de uma forte angústia existencial: o “sinal de angústia” pode se tornar ininterrupto, o que o desqualifica para as funções de ativação de defesas egóicas e tende a torná-lo um desorganizador do funcionamento psíquico de indivíduos e coletividades; o pânico em forma latente ou manifesta ocupa um lugar importante na vida emocional contemporânea e pode irromper pelos mais diversos incidentes, alastrando-se de forma rápida e incontrolável. Em São Paulo, os ataques atribuídos do PCC em 2006 são um bom exemplo.

Uma das formas de combate às suspeitas e aos medos que emergem e irrompem em rápida e irracional proliferação é a ocorrência dos surtos de “manias coletivas” manifestas– festas, carnavais (na época e fora de época), raves, “paradas”; tais surtos, além de se contrapor aos medos e pânicos, perfilam-se em oposição aos estados melancólicos e ao tédio, decorrentes das perdas irrecuperáveis dos objetos insubstituíveis e mesmo do não-encontro de objetos primários minimamente aptos.

Observamos, igualmente, movimentos individuais e coletivos de entrega indefesa (melancólica) e /ou triunfante (maníaca) ao “inseguro” e ao “desligado”; de tais movimentos– e na lista vamos do unsafe sex e da promiscuidade aos esportes radicais– esperam-se, ao que parece, efeitos antidepressivos, mas no fundo jaz a questão da desconfiança, aqui colocada de forma paradoxal: confiar-se ao não-confiável como modo de se defender– pela via da negação– da desconfiança básica.

Provavelmente, as dependências (vícios) derivam, em parte, do clinging generalizado e indiscriminado sobre alguns objetos mágicos e onipotentes em que se deposita uma confiança absoluta– metaforicamente, é o elástico do bungee jump– em meio à desconfiança universal. Vale dizer que esses mesmos “objetos”– a exemplo dos demônios– apresentam a dupla face da tentação e da perseguição, como é obviamente o caso das drogas, um dos objetos paradigmáticos da sociedade contemporânea.

Também as adições e as compulsões situam-se na mesma seara, a do que se dá além do princípio de prazer. A dominância da desconfiança básica, marcando o fracasso profundo do objeto primário, deixa como seqüela um funcionamento psíquico primitivo: não se formam as ligações básicas de afetos e representações, a função desobjetalizante– a de desinvestimento– predomina sobre a objetalizante, o sujeito é movido pela necessidade de reencontrar o objeto primário falho, escravizado aos seus maus objetos, não se abrindo para ele o campo do desejo e do prazer, do repouso e da satisfação duradoura.

Finalmente, a apatia, a “falta de apetite existencial”, a pouca disposição para os investimentos afetivos que podem tornar a vida mais vibrante e “encantada”, dão testemunho da mesma desconfiança básica. No caso, essa desconfiança se traduz em uma atitude acomodada e conservadora.

A desproporção entre excitação e continência se alastra, fazendo da desconfiança um dos ingredientes básicos do mal-estar contemporâneo e produzindo de forma direta ou indireta uma série de movimentos psíquicos: alguns serão as manifestações da própria desconfiança, enquanto outros figuram como defesas contra ela.

 

5. Os dispositivos culturais da cura na sociedade do risco e do acidente

Convém neste momento evitarmos o risco de embarcar ingenuamente nos discursos sobre riscos e seguros inseguros, seguros arriscados, tornando-nos “apocalípticos”, para adotar a expressão consagrada por Umberto Eco há muitos anos.

Para tanto, precisamos considerar as novas oportunidades de continência e de ligação que esse mesmo regime social engendra. Isso requer observação não-preconceituosa e pesquisa. Novas subjetividades e novas formas de existência social, novos dispositivos de estimulação e de continência– e não apenas “novas patologias”– precisam ser conhecidos e considerados. Aliás, lendo o que Balint e Ferenczi, entre outros, já escreviam na década de 30, cabe-nos refletir sobre o que se alardeia como “novas patologias”. O que parece mais faltar ainda são os estudos sobre as novas formas de existência como possibilidades positivas de vida e não apenas como modos deficitários, embora, decerto, condições e funções essenciais possam estar faltando ou sendo mal exercidas. Os reflexos disso no quesito “confiança” parecem de fato sugerir a existência de problemas.

No entanto, seria um erro fazer com que a clínica psicanalítica tentasse remar contra a maré, procurando reconstituir as antigas condições psicossociais para a instalação das “confianças” sem as quais a vida é um tormento infernal. Não se pratica psicanálise no vácuo cultural e histórico e muito menos contra as forças da história. A psicanálise não é uma seita, e, menos ainda, uma seita conservadora e reformista. É preciso apoiar-se nos fenômenos e processos da vida– da vida cotidiana– para operar com alguma eficácia. Nessa medida, o saber sociológico não deveria estar apenas corroborando o que a clínica sugere– o mal-estar da desconfiança primária, da insegurança ontológica–, mas deveria também nos ajudar a descortinar outros horizontes. Por exemplo: como as novas redes que se tornam disponíveis com as tecnologias de ponta podem contribuir não apenas para incrementar as excitações, mas, também, para oferecer sustentação, continência e possibilidades de transformação da experiência emocional? Que implicações tais dispositivos podem ter para o estabelecimento do setting analítico e para o manejo clínico?

Que a teoria, a ética e a técnica possam disso se beneficiar é, por enquanto, apenas um desejo, mas talvez se torne uma necessidade, se é que a psicanálise quer ter algum futuro.

 

Referências

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______ (1971). Playing and reality. London: Tavistock Publications.

 

 

Endereço para correspondência
Luís Claudio Figueiredo
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Tel.: +55 11 3086-4016 / 3083-3731
E-mail: lclaudio@netpoint.com.br

Recebido em 26.9.2006
Aceito em 28.5.2007

 

 

1 Psicanalista; professor da PUC-SP e da USP. Agradeço a Marion Minerbo pela leitura e pelas críticas incisivas e sugestões para o aprimoramento das primeiras versões deste texto. Aos demais colegas do grupo clínico Terceira Margem, bem como a Miriam Chnaiderman e Bernardo Tanis, agradeço também pela acolhida e pelas sugestões.
2 Ambos os textos – o de Ferenczi e o de Balint – foram apresentados em 1932 no XII Congresso Internacional de Psicanálise, em Wiesbaden. O de Ferenczi foi publicado no ano seguinte e o de Balint, apenas em 1939.
3 Agradeço a Mauro Meiches por esses esclarecimentos.
4 Mas muitas análises podem ser interrompidas ou estagnar nesse momento.
5 Na coletânea publicada em 1958 – Through paediatrics to psychoanalysis –, o índice remissivo nem inclui os termos reliability, confidence e trust. Tais termos abundam nos textos posteriores.
6 Sobre o uso do termo “crença”, voltaremos mais adiante.
7 O chamado “bom objeto” a ser internalizado como condição da saúde psíquica – de que tanto nos falam Melanie Klein e seguidores – é, portanto, um vazio, uma ausência, um campo de possibilidades de encontros, investimento e simbolização.
8 Como sabemos desde Melanie Klein, a ausência do bom objeto ou a ausência da “bondade” de um objeto converte-se imediatamente em “objeto mau e perseguidor” quando a mente está operando na posição esquizo- paranóide.

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