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Aletheia
versão impressa ISSN 1413-0394
Aletheia no.38-39 Canoas dez. 2012
RESENHA
Psicanálise e universidade: potencialidades teóricas no cenário da pesquisa
Mara Cristiane Von Muhlen; Aline Groff Vivian
Universidade Luterana do Brasil (ULBRA Canoas)
O livro Psicanálise e Universidade: potencialidades teóricas no cenário da pesquisa, organizado por Mônica Medeiros Kother Macedo e Bianca Susana Guevara Werlang propõe, de forma diversificada, reflexões a respeito do diálogo entre Psicanálise e Universidade, permitindo ampliar conceitos e compreensões clássicas, no contexto contemporâneo. A obra encontra-se dividida em 25 capítulos. O livro começa voltando seu olhar para a ambiguidade que há na natureza humana, no capítulo A Pulsão de Morte: desde Freud, a dualidade do humano, no qual forças contraditórias de amor (compaixão) e ódio (destrutividade) são investigadas a partir de um manancial teórico que parte do Antigo Testamento, viaja pela Grécia antiga, Roma, literatura russa e desembarca em Freud. Há um alerta para a necessidade de se dedicar uma atenção maior aos aspectos destrutivos do funcionamento psíquico. Sobre o processo de estruturação do psiquismo, o segundo estudo As defesas psíquicas no período da latência refere a importância dos momentos iniciais da vida. Perpassando teoricamente todas as fases, este texto detém-se em compreender as defesas psíquicas do período da latência. As autoras referem que esse período ficou à margem dos estudos psicanalíticos pela associação feita, até então, de que latência seria uma pausa no desenvolvimento psicossexual. Entretanto, a latência é um processo ativo do ego em suas funções, um período em que as defesas psíquicas se organizam. Assim, um consequente equilíbrio entre tensões e defesas demonstra o sucesso da evolução dos mecanismos defensivos.
O livro segue apresentando textos sobre o funcionamento psíquico com questões culturais das quais se percebe o poder de influência no terceiro capítulo Autoestima de mulheres vítimas de violência doméstica. A origem multicausal da violência doméstica fatores culturais, psicológicos, individuais, biológicos e no contexto familiar são abordados neste artigo que aponta o rebaixamento da autoestima como fator relevante no que tange às escolhas objetais feitas pela mulher, e na forma que ela lida com as questões do seu entorno. A forma como o sujeito enfrenta as situações cotidianas seguem sendo investigadas no quarto capítulo, intitulado Inquietações no cenário contemporâneo: reflexões psicanalíticas sobre a masculinidade. Nesse estudo são abordadas as consequências na subjetividade do homem diante das rápidas transformações sociais e culturais. A virilidade masculina, segundo as autoras, nunca está definitivamente adquirida, mas constantemente em processo de reconquista.
O quinto artigo buscou por meio dos textos de Freud e de Luiz Hanns realizar uma síntese do que se poderia chamar de Pulsão e seu percurso. Cada sujeito vive de modo singular conforme suas pulsões, o que vem apontar diferentes estruturas clínicas abordadas na Psicanálise: neurose, psicose e perversão. A perversão é a temática do sexto artigo, Perversão: analisabilidade de um destino em cena. Imbuída no desejo de investigar os padecimentos humanos, a autora buscou uma etiologia da perversão. O sétimo artigo Triagem Interventiva Psicanalítica: pesquisa-ação insere-se no universo da pesquisa acadêmica, apontando os impactos gerados por uma modalidade de triagem interventiva psicanalítica. Já o oitavo capítulo, Uma contribuição Psicanalítica sobre as vicissitudes nas relações amorosas – infidelidade conjugal, tem seu enfoque direcionado à sexualidade humana como constituinte do psiquismo, buscando compreender o papel da infidelidade conjugal nesse processo.
A busca da compreensão das diferenças e semelhanças entre os indivíduos tem sido uma constante no trabalho do psicólogo. Para tanto, entre outros instrumentos, utilizase de testes projetivo conforme aborda o nono trabalho, Instrumentos de avaliação psicológica infantil sob o enfoque projetivo, no qual as autoras postulam ser crucial ter-se à mão instrumentos eficazes na avaliação das potencialidades, dificuldades e conflitos da infância. Seguindo-se à infância, a adolescência é abordada no décimo capítulo, chamado Adolescência e manifestação em ato: cruzamentos entre psiquismo e cultura buscando compreender o que é inerente ao processo constitutivo do psiquismo do indivíduo e o que é parte do processo civilizatório. No décimo primeiro capítulo, intitulado Projeção: o conceito, o processo e os testes projetivos, a projeção é investigada por meio dos escritos de Freud e Melanie Klein, voltando-se aos testes projetivos apontados como vias de acesso à subjetividade humana. No décimo segundo capítulo, denominado Pesquisa em Psicanálise, para além do caso clínico, a autora analisa o lugar do método psicanalítico enquanto qualidade constitutiva na pesquisa em que a psicanálise serve de sustento. A trajetória do pesquisador psicanalítico é permeado por diversos desafios que são abordados no décimo terceiro artigo, intitulado Desafios ao percurso do pesquisador psicanalítico: reflexões a partir da pesquisa com o método Bick de observação de bebês.
Diante das constantes transformações cotidianas que remetem a situações de violência presentes nas diversas faixas etárias, o décimo quarto capítulo volta seu olhar à infância. Nessa investigação chamada Compreensão teórica da agressividade na infância, as autoras diferenciam agressividade de violência, buscando compreender o papel de ambas no processo de desenvolvimento infantil bem como suas diversas formas de expressão. O décimo quinto capítulo, Uma reflexão sobre o conceito de vínculo em Psicanálise, embasado na vertente psicanalítica da teoria do apego discute o conceito de vínculo e suas implicações para o campo da clínica e da pesquisa.
De modo geral, os estudos partem do pressuposto de um sujeito consciente de sua condição – considerado como inerente à gravidez –, porém, o contrário é possível e discutido no décimo sexto capítulo chamado de Negação não psicótica da gravidez – especificidades de um fenômeno, que aponta as especificidades deste fenômeno que contradiz a consciência da condição de grávida o que poderá acarretar importantes consequências na vida da mulher e do bebê. No décimo sétimo capítulo, O efeito da repetição na escolha conjugal: contribuições da Psicanálise, as autoras tentam compreender os fatores que influenciam a escolha conjugal e os efeitos psíquicos decorrentes da mesma naquilo que o sujeito projeta no outro e o que lhe serviu de modelo identificatório. O décimo oitavo capítulo, O Superego: enigmas metapsicológicos e desafios clínicos, problematiza três aspectos no estudo de um caso clínico: a relação do superego com a pulsão de morte e com as neuroses de destino, a diferenciação entre superego e ideal de ego e a figura do superego benevolente e suas relações com o ideal de ego e com a sublimação.
Trazendo à tona a toxicomania e o papel da psicanálise no sentido de construir possibilidades efetivas de enfrentamento em detrimento do seu enrijecimento e até mesmo aniquilamento, no décimo nono capítulo, O campo das adições: para pensar a subjetividade na toxicomania, as autoras referem que tais possibilidades podem ser construídas quando permitida a ruptura com um histórico de indiferença em relação a si mesmo. No vigésimo capítulo, O Complexo de Édipo e o uso de técnicas projetivas, o Complexo de Édipo é discutido em sua gênese, nas novas configurações familiares, enquanto organizador do aparelho psíquico e como se dá a sua investigação por meio de técnicas projetivas.
No vigésimo primeiro capítulo, Complexidades no cenário de inclusão laboral de pessoas com deficiência) é dada relevância à importância de considerar o impacto da deficiência na vida do sujeito indo-se além do diagnóstico e da limitação em si. Segundo as autoras, a imagem do deficiente funciona como um espelho perturbador, pois ela nos devolve a imagem da nossa experiência pessoal primitiva de corpo fragmentado. Seguindo, o vigésimo segundo capítulo, Vida laboral e vida psíquica: tessituras na construção histórica do sujeito e da cultura discute a dinâmica laboral, a função narcísica do trabalho, o narcisismo e sublimação com ênfase no valor do trabalho na atribuição de valor ao sujeito e as relações de trabalhos atuais num enfoque psicanalítico. No vigésimo terceiro capítulo, Adolescência e Lei: conflitivas singulares, a violência é trazida novamente à luz da compreensão psicanalítica, agora voltada à adolescência e o enfrentamento à autoridade. A abordagem da temática se dá por meio do diálogo com os mais diversos saberes. O vigésimo quarto capítulo, Relações objetais nas teorias e Sigmund Freud, Melanie Klein e William Donald Dodds Fairbairn examina as relações objetais sob o olhar daqueles autores, explanando a evolução da teoria psicanalítica com base em dois modelos de estruturação da personalidade: o Modelo Estrutural-Pulsional e o Modelo Estrutural-Relacional. E, por fim, no vigésimo quinto capítulo, Depressão – mal do século XXI, as autoras revisam teoricamente o entendimento a respeito da depressão, com enfoque psicanalítico, nas formas como essa patologia se apresenta e apontando alguns fatores que remetem do aumento da doença no presente século.
Assim, a presente obra reúne importantes contribuições atuais a alunos e professores que se interessam pela relação entre psicanálise e universidade, a partir dos sólidos trabalhos compilados nesse livro, que contou com a colaboração de autores de diferentes instituições psicanalíticas e acadêmicas. A pluralidade de estudos que vão desde os conceituais e teóricos até os empíricos e clínicos, corroboram a possibilidade de seguir se debatendo ideias de forma profunda e seria como se observou nesse livro.
Referências
Macedo, M. M. K., & Werlang, B. S. G. (Orgs). Psicanálise & Universidade: potencialidades teóricas no cenário da pesquisa. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2012, 448p. [ Links ]
Endereço para contato
E-mail: psicoulbra.mara@hotmail.com
Recebido em abril de 2013
Aceito em junho de 2013
Mara Cristiane Von Muhlen: Aluna do Curso de Graduação de Psicologia – Universidade Luterana do Brasil (ULBRA Canoas) e bolsista de iniciação científica (PROBIC/FAPERGS).
Aline Groff Vivian: Psicóloga, psicoterapeuta de orientação psicanalítica (IEPP), Mestre e Doutora em Psicologia (UFRGS), professora dos Cursos de Psicologia e Medicina (ULBRA Canoas).