Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Psicologo informacao
versão impressa ISSN 1415-8809
Psicol inf. vol.14 no.14 São Paulo out. 2010
Artigo
Inteligência emocional de estudantes universitários
Emotional Intelligence and University students
Rodrigo Azevedo Gomes*; Mirlene Maria Matias Siqueira**
* Graduando em psicologia pela Universidade Metodista de São Paulo. Bolsista Iniciação Científica CNPq.
**Doutora em psicologia pela UNB; docente do Programa de Mestrado em Psicologia da Saúde – Universidade Metodista de São Paulo. Bolsista produtividade CNPq.
O presente estudo descreveu e analisou as relações entre as cinco habilidades de inteligência emocional (autoconsciência, automotivação, autocontrole, empatia e sociabilidade) em estudantes universitários. Mais especificamente, procurou-se analisar as diferenças dos escores fatoriais dos itens nas cinco habilidades da inteligência emocional e discutir as correlações entre as referidas habilidades. Participaram desta pesquisa 82 estudantes universitários do curso de psicologia, com idades entre 18 e 53 anos, dos gêneros masculino e feminino, escolhidos por conveniência em uma instituição de ensino superior de São Bernardo do Campo, estado de São Paulo. Os dados foram coletados em salas de aula por um questionário de autopreenchimento contendo uma escala de medida da inteligência emocional. Os dados obtidos foram manipulados sob total sigilo, preservando-se a identidade dos participantes. Os resultados indicaram as capacidades de autoconsciência e automotivação como habilidades da inteligência emocional melhor desenvolvidas, e sociabilidade em desenvolvimento inferior em relação às demais habilidades. E, entre as cinco habilidades da inteligência emocional, houve apenas quatro coeficientes de correlação significativos.
Palavras-chave: inteligência emocional; emoções; estudantes de Psicologia.
ABSTRACT
This study describes and compares five abilities related to emotional intelligence: self-awareness, self-motivation, self-control, empathy and sociability, of university students. It aimed specifically to analyze differences in the factorial scores of the items and their correlation. The participants of this study were 82 male and female students of Psychology of a university of São Bernardo do Campo in the metropolitan area of São Paulo, age between 18 and 53, chosen by convenience. They answered a self administrated scale of emotional intelligence. Among them, self-awareness and self-motivation are the most developed emotional abilities and sociability is the less developed.
Key-words: emotional intelligence; personal abilities, students of Psychology.
Introdução
Mesmo nos dias atuais, emoção e inteligência têm sido muitas vezes compreendidas como contrapontos adversários, em que as emoções são tidas como aspecto substancialmente irracional e instância perturbadora do pensamento. Essa concepção percebe a mente humana e sua inteligência por um prisma unidimensional, que valoriza apenas o fator racional da inteligência e o coloca em primeiro plano (GARDNER, 1995; MAYER; SALOVEY, 1997).Também é possível entender emoção como alteração fisiológica desencadeada por estímulos externos e que surge em resposta a tais eventos externos perturbadores (ATKINSON; SMITH; BEM; HOEKSEMA, 2002). Uma das teorias científicas clássicas das emoções, como são os pressupostos de Willian James, identifica emoção como uma sensação física. Isto é, um sujeito, após perceber um estímulo que, de alguma maneira o afeta, sofre alterações fisiológicas importantes, como angústia, falta de ar, palpitações etc. E é precisamente o reconhecimento desses sinais (pelo cérebro) que gera a emoção (DAMÁSIO, 1996).
Esse mesmo autor explica que são as emoções e os sentimentos juntamente, e através da fisiologia humana, que permitem aos indivíduos realizar previsões frente a um futuro incerto e planejar ações que os permitam alcançar seus objetivos com base em suas previsões iniciais. A emoção é instrumento básico do qual um indivíduo é dotado e está associada ao funcionamento biológico responsável pela sobrevivência do organismo. Também é a emoção que está implicada na excelência de desempenho da razão – tomada de decisão, adequação do comportamento social e capacidade criadora.
Para se compreender melhor o aparecimento das emoções no organismo, faz-se necessário descrever brevemente suas bases fisiológicas. Conforme Damásio (1996), a ocorrência de emoções do ponto de vista fisiológico dá-se da seguinte forma: depois de um estímulo ter ativado a amígdala cerebral, seguem-se várias respostas internas, musculares, viscerais, bem como para os núcleos neurotransmissores e hipotálamo. O hipotálamo dá origem às respostas endócrinas e outras de origem química que usam a corrente sanguínea. Nesse sentido, as emoções são mudanças na fisiologia do organismo quando ativado por algum estímulo. É impossível imaginar uma determinada emoção sem ver as mudanças por ela acarretadas no organismo (como o medo, em que se dá aceleração do batimento cardíaco, respiração suspensa, tremura dos lábios, pernas enfraquecidas, pele arrepiada e aperto no estômago; já com a raiva, observam-se narinas dilatadas, dentes cerrados e o impulso para a ação vigorosa).
Ainda segundo Damásio (1996), é de grande relevância se "escutar" as emoções, pois a redução da capacidade de sentir ou tomar consciência sobre as próprias emoções pode se relacionar com a deficiência na tomada de decisões ou diminuição concomitante da razão – fenômenos esses considerados como resultados igualmente indicadores de comportamento irracional.
Todavia, as pesquisas continuam em andamento (GOLEMAN, 1996) para conhecer se há e quais são as emoções consideradas primárias, embora alguns teóricos acreditem que há famílias básicas de emoções, como: ira, tristeza, medo, prazer; amor; surpresa, nojo e vergonha.
Sem dúvida, além dessas emoções fundamentais há os diferentes matizes e composições, como, por exemplo, a combinação de tristeza e medo. E, ainda segundo Goleman (1996), atualmente teóricos afirmam que as quatro emoções básicas (medo, ira, tristeza e alegria), quando vivenciadas por um sujeito, são impressas nas expressões faciais. Diante disso, tais emoções são percebidas e identificadas por povos de culturas do mundo todo, através da observação, e isso indica sua universalidade.
Devido à capacidade emocional humana de se acionar conteúdos na memória, é que se pode entender que diante de uma situação emocional há uma leitura seletiva dos sinais com base no repertório acumulado; aspecto que permite ao corpo, imediatamente, emitir uma emoção específica (GOLEMAN, 1996).
Com relação à especificidade da inteligência emocional, Mayer e Salovey (1997, p. 15) descreveram o seguinte:
A inteligência emocional envolve a capacidade de perceber acuradamente, de avaliar e de expressar emoções; a capacidade de perceber e/ou gerar sentimentos quando eles facilitam o pensamento; a capacidade de compreender a emoção e o conhecimento emocional; e a capacidade de controlar emoções para promover o crescimento emocional e intelectual.
A partir do entendimento de que há um repertório de habilidades cognitivas em torno do processamento de informações carregadas de afeto, inteligência emocional passou a ser descrita como detentora das seguintes habilidades básicas e interdependentes: a) autoconsciência: possibilita ao indivíduo perceber, observar, discriminar e nomear seus próprios sentimentos. Essa habilidade é a mais relevante, pois dela originam-se e ramificam-se as demais habilidades; b) automotivação: referente à competência de criar metas para si mesmo, mantendo-se entusiasmado com os objetivos pessoais. Habilidade responsável pelo alto grau de confiança, otimismo e de esperança de um sujeito, mesmo em meio a adversidades; c) autocontrole: corresponde à capacidade de desenvolver competências pessoais e administrar sentimentos com intuito de alcançar metas anteriormente estipuladas; possibilita o adiamento de um benefício momentâneo em prol de planos futuros; d) empatia: através da leitura e compreensão de expressões não verbais (postura corporal, tom de voz e expressões faciais), o sujeito empático percebe de forma acurada os sentimentos dos outros; possibilita leitura das intenções e desejos das pessoas que o cercam; e) sociabilidade: refere-se à capacidade de iniciar, manter e aprofundar relações sociais; de substituir sentimentos negativos por outros positivos em relação àqueles que o cercam, fazendo com que os relacionamentos tornem se mais verdadeiros, profundos e extensos. (MAYER; SALOVEY, 1997; SIQUEIRA; BARBOSA; ALVES, 1999).
Dessas habilidades, as três primeiras – autoconsciência, automotivação e autocontrole – são responsáveis pelas bases da natureza psicológica, fundamentais para o fortalecimento das estruturas internas do indivíduo, já as outras duas – empatia e sociabilidade – referem-se aos componentes psicossociais que preservam sua competência no espaço social (SIQUEIRA; BARBOSA; ALVES, 1999).
Neste contexto, o objetivo da presente pesquisa foi o de avaliar traços de personalidade de estudantes de psicologiaAo que se sabe, a inteligência emocional é um conjunto de habilidades que, majoritariamente, é aprendido. Por isso, pode continuar a se desenvolver ao longo da vida, por direções determinadas pelas experiências adquiridas (GOLEMAN, 1996).
No Brasil, estudos sobre inteligência emocional procuram avaliá-la pelo instrumento de Medida de Inteligência Emocional (MIE). Entre esses, pode-se destacar os trabalhos de Diório (2001), que avaliou a competência emocional de gestores; Nascimento (2006), que investigou as relações entre inteligência emocional e bem-estar no trabalho e Marcondes (2008), que buscou conhecer as relações entre inteligência emocional e bem-estar no trabalho de funcionários públicos. Desse modo, pode-se perceber que o conhecimento sobre inteligência emocional tem sido aplicado na compreensão de diversas áreas e contextos. Sendo assim, esse estudo tem como interesse ampliar ainda mais a compreensão científica de inteligência emocional. Mais especificamente, contribuir com a comunidade científica em seu conhecimento sobre a manifestação da inteligência emocional em estudantes universitários do curso de psicologia.
Diante do exposto, o presente estudo apresenta como objetivos: a) descrever e analisar as relações entre as cinco habilidades de inteligência emocional (autoconsciência, automotivação, autocontrole, empatia e sociabilidade) em estudantes universitários; b) verificar as diferenças dos escores fatoriais dos itens nas cinco habilidades da inteligência emocional; c) correlacionar as cinco habilidades da inteligência emocional entre si.
Método
Participantes
Foram 82 estudantes universitários do curso de psicologia, escolhidos por conveniência, sendo 22% do sexo masculino e 78% do sexo feminino. A média de idade dos estudantes foi de 21 anos (DP = 9,49), variando de 18 a 53 anos. Quanto ao estado civil, 68,3% dos estudantes declararam-se solteiros, 23,2% casados e 8,5% outros. Dentre os participantes, 20,7% já haviam concluído algum curso de graduação e especialização.
Instrumentos
Foi utilizado um questionário de autopreenchimento, composto por uma escala de medida da variável do estudo, referente à inteligência emocional – Medida de Inteligência Emocional (MIE), criada e validada por Siqueira, Barbosa e Alves (1999) e que avalia cinco habilidades da inteligência emocional através de 59 itens: autoconsciência – 10 itens, a = 0,74; automotivação – 12 itens, a = 0,82; autocontrole – 10 itens, a = 0,84; empatia – 14 itens, a = 0,87; sociabilidade – 13 itens, a = 0,82. Além dos itens da escala, foram acrescidas ao questionário, questões para a caracterização da amostra, tais como: sexo, idade, estado civil e nível de titulação.
Local/ambiente – salas de aula de uma instituição de ensino superior localizada na cidade de São Bernardo do Campo, estado de São Paulo, onde os questionários foram aplicados.
Procedimento - em salas e período de aula, com a autorização do respectivo professor responsável, foi feita a apresentação dos objetivos desse estudo e o seu caráter acadêmico. Consentida a participação, foi entregue o questionário, juntamente com o "termo de consentimento livre e esclarecido" (TCLE). Foi cedido um tempo de aproximadamente 15 minutos para que os estudantes respondessem. Passado esse tempo, os questionários e os termos de consentimento livre e esclarecido retornaram respondidos ao pesquisador, que os depositou em envelopes separados. Os dados, todos de natureza numérica foram tratados eletronicamente por meio de sub-programas do SPSS, versão 17.0 para Windows. Foram calculadas as médias, desvio-padrão e índices de correlação (r de Pearson). Os índices de correlação foram interpretados segundo indicadores propostos por Bisquerra, Martinez e Sarriera (2004).
Por se tratar de uma investigação científica, a presente atendeu aos requisitos descritos na resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que trata de pesquisas que envolvem seres humanos (BRASIL, 1996). Assim, todos os dados foram manipulados com total sigilo sobre as respostas contidas nos questionários, preservando-se a identidade e privacidade dos participantes desse estudo.
Resultados e discussão
Nesta seção serão apresentados os resultados obtidos, a sua interpretação e a discussão com a literatura.
A Tabela 1 contém informações descritivas sobre as cinco habilidades de inteligência emocional em 82 participantes desse estudo.
Conforme observa-se na Tabela 1, as cinco habilidades de inteligência emocional – empatia, sociabilidade, automotivação, autocontrole e autoconsciência – são descritas conforme as médias e desvios-padrão dos 82 participantes, as quais apresentaram os seguintes escores: empatia, média de 2,96 (DP = 0,32); sociabilidade, média de 2,81 (DP = 0,44); automotivação, média de 3,02 (DP = 0,45); autocontrole, média de 2,85 (DP = 0,55); autoconsciência, média de 3,16 (DP = 0,39). Evidencia-se que todos os desvios-padrão são inferiores às médias.
Numa análise simples dos valores dos escores, parece que a habilidade que se apresenta melhor desenvolvida nos estudantes universitários é a autoconsciência. Isto é, estes participantes, com maior frequência, avaliam seus sentimentos para compreender o que estão sentindo; percebem seus sentimentos; possuem capacidade de nominar sentimentos intensos em determinada ocasião de suas vidas; procuram analisar o que estão sentindo; dialogam consigo mesmos a respeito de seus sentimentos; conseguem identificar quais os sentimentos vivenciados; preocupam-se com o que sentem; com grande facilidade reconhecem seus sentimentos até mesmo os contraditórios e mantêm postura reflexiva sobre os seus sentimentos (MAYER; SALOVEY, 1997; GOLEMAN, 1996; SIQUEIRA; BARBOSA; ALVES, 1999).
Em seguida, a habilidade que se apresentou mais desenvolvida nos estudantes universitários foi a automotivação. Assim, com base nas contribuições de Siqueira, Barbosa e Alves (1999), pode-se dizer que esses participantes, com maior facilidade, são otimistas em relação aos seus projetos, procuram realizar projetos importantes para suas vidas; além disso, dirigem seus sentimentos na tentativa de agirem com sabedoria; acreditam na realização de suas metas futuras; com entusiasmo, criam um projeto para suas vidas; alcançam os objetivos que estipulam; enfrentam adversidades e mesmo assim permanecem com suas metas para a conquista do que desejam; dirigem a atenção com foco nos planos pessoais selecionados; praticam ações no presente que os levarão a alcançar os planos que projetaram para o futuro; planejam situações para a concretização de seus objetivos e possuem entusiasmo diante de suas vidas.
Dentre as habilidades da inteligência emocional mais desenvolvidas, a empatia aparece como a terceira. Essa habilidade, conforme Siqueira, Barbosa e Alves (1999), é responsável pela maior frequência em que esses participantes conseguem nomear os sentimentos das pessoas mais próximas; identificam os interesses das pessoas com quem convivem; captam as intenções de uma pessoa pela forma como ela age; entendem o que uma pessoa está querendo mesmo que ela não se manifeste verbalmente; reconhecem quando uma pessoa está com problemas; identificam com facilidade os sentimentos das pessoas; identificam as intenções de uma pessoa logo que iniciam um contato mais próximo; identificam quando um conhecido está com problemas; sabem quando um amigo precisa de sua ajuda; reconhecem como um amigo se sente através de seus gestos não verbais; através do modo como uma pessoa se comunica, captam seus sentimentos; discernem com facilidade o que um amigo está sentindo; descobrem o estado de uma pessoa pelo seu tom de voz.
Das habilidades menos desenvolvidas, encontra-se o autocontrole, que representa a dificuldade ou inabilidade com que esses participantes encontram em reagir de modo diferente a injúrias recebidas por terceiros; dar um tempo maior e refletir antes da emissão de respostas a uma ofensa; controlar seus sentimentos perturbadores; refletir e ponderar antes de manifestar o que estão pensando; amenizar seus impulsos em uma situação de conflito; reagir somente após os sentimentos de uma agressão recebida terem sido aliviados; tomar decisões após refletirem, não deixando-se levar pelos impulsos; não reagir de imediato a uma agressão (SIQUEIRA; BARBOSA; ALVES, 1999).
Por fim, os participantes deste estudo apresentam como habilidade menos desenvolvida a capacidade de sociabilidade. Essa habilidade indica que esses participantes possuem dificuldade em: aumentar o número de pessoas de seus ciclos de amizade; conseguir animar tipos variados de ambientes; conversar de modo animado com um desconhecido; deixar as pessoas à vontade perto de si; encontrar alguém conhecido na maioria dos lugares por onde vão; sentir-se bem próximos de pessoas recém conhecidas. Ao contrário, pode-se dizer que eles preferem: ter poucos amigos; trabalhar sozinhos; ficar calados frente pessoas desconhecidas. E, possuem poucos amigos e relacionamentos insatisfatórios com maior frequência; sentem desconforto diante de alguém recém-conhecido (SIQUEIRA; BARBOSA; ALVES, 1999; MAYER; SALOVEY, 1997; GOLEMAN, 1996).
É importante observar que os estudos de Diório (2001) e de Marcondes (2008), a respeito de inteligência emocional de trabalhadores, utilizaram os mesmos instrumentos que o empregado no presente estudo. O trabalho de Diório (2001) obteve os seguintes escores nos itens das cinco habilidades da inteligência emocional: autoconsciência (média de 2,93 e 0,4 de desvio-padrão); sociabilidade (média de 3,03 e 0,37 de DP); automotivação (média de 3,30 e 0,36 de DP); autocontrole (média de 3,03 e 0,37 de DP) e empatias (média de 3,31 e 0,35 de DP). Já no estudo de Marcondes (2008), os escores nos itens das cinco habilidades foram: autoconsciência (média de 2,83 e 0,37 de DP); sociabilidade (média de 2,78 e 0,46 de DP); automotivação (média de 3,06 e 0,45 de DP); autocontrole (média de 2,92 e 0,53 de DP) e empatia (média de 3,14 e 0,42 de DP). Assim, o que se evidencia nos escores médios dos estudos apresentados, é que o que apresentou maiores índices foi a amostra do estudo de Diório (2001); em seguida, há os resultados do presente estudo; por último, com menores índices, encontra-se o estudo de Marcondes (2008). Já com relação ao presente estudo, os escores médios que mais se aproximam são os do estudo de Marcondes (2008).
As discrepâncias entre os dados desses estudos podem estar relacionadas às variações entre as amostras. Tanto Diório (2001) como Marcondes (2008) estudaram inteligência emocional em trabalhadores. O estudo de Diório (2001) em que os participantes foram gestores empresariais, com ensino superior completo e idades entre 24 e 40 anos, as habilidades que se apresentam melhor desenvolvidas são autoconsciência, automotivação, autocontrole e sociabilidade (autocontrole e sociabilidade apresentam os mesmos escores). No estudo de Marcondes (2008) em que a amostra foi composta por funcionários públicos, ocupantes de cargos administrativos, com ensino superior completo e idades entre 40 e 59 anos, as habilidades que se evidenciam melhor desenvolvidas foram autoconsciência, automotivação e autocontrole. Enquanto que, no presente estudo, a mesma variável em estudantes universitários obteve como resultado a autoconsciência e a automotivação como habilidades melhor desenvolvidas. Lembrando que nesse estudo, embora a média de idade dos participantes seja de 21 anos e a faixa etária de 18 a 53 anos, a maior parte dos estudantes (69,5%) tem idades de 18 a 25 anos.
Pode-se observar que as habilidades de autoconsciência e automotivação, neste estudo – que, segundo Siqueira, Barbosa e Alves (1999), representam as bases da natureza psicológica, fundamentais para o fortalecimento das estruturas internas do indivíduo, assim como nos estudos de Diório (2001) e de Marcondes (2008) –, apresentam- se melhor desenvolvidas em relação às habilidades empatia e sociabilidade, constituintes dos componentes psicossociais que indicam competência no mundo social.
Correlações
Para melhor compreender e interpretar os coeficientes de correlação entre os escores médios das cinco habilidades da inteligência emocional, foram utilizados os atributos definidos por Bisquerra, Martinez e Sarriera (2004, p. 147), representados pela Tabela 2:
Abaixo, a Tabela 3 contém os coeficientes de correlação entre os escores médios das cinco habilidades da inteligência emocional em 82 participantes deste estudo. São elas: autoconsciência, automotivação, empatia, autocontrole e sociabilidade.
Na Tabela 3, há os coeficientes de correlação entre as cinco habilidades da inteligência emocional, podendo-se observar apenas quatro coeficientes significativos. Desses, três demonstram baixa correlação: autoconsciência versus empatia (r = 0,22; p < 0,01); autocontrole versus sociabilidade (r = 0,22; p < 0,01); autoconsciência versus automotivação (r=0,25; p < 0,01); e automotivação versus sociabilidade (r = 0,53; p < 0,01) apresenta correlação moderada. As demais correlações não são significativas.
Conforme os resultados, pôde-se verificar, dentre as habilidades que demonstram correlação significativa, que, na medida em que os estudantes universitários demonstraram elevada a habilidade de perceber, discriminar e nomear seus próprios sentimentos (autoconsciência), também mantiveram elevada a capacidade de perceber e identificar as intenções e desejos (empatia); isso através da leitura de comportamentos não verbais dos outros. Ao possuírem alta habilidade em criar metas para si mesmos e se manterem entusiasmados por elas (automotivação), esses participantes mostraram elevada capacidade de iniciar, manter e aprofundar relações sociais (sociabilidade). Na mesma medida em que, quando elevada, a habilidade de desenvolver competências pessoais e administrar sentimentos com intuito de alcançar metas anteriormente estipuladas e de adiar benefícios momentâneos com vistas a objetivos futuros se mantêm elevada (autocontrole), eleva-se a capacidade de iniciar e seguir relacionamentos interpessoais de modo satisfatório (sociabilidade). E, por fim, ao terem elevada a capacidade de observar e perceber seus próprios sentimentos (autoconsciência), a habilidade de criar objetivos e se manterem animados por eles demonstra-se elevada (automotivação). (SIQUEIRA; BARBOSA; ALVES, 1999; MAYER; SALOVEY, 1997; GOLEMAN, 1996).
Em contraponto, dentre as habilidades que não demonstram correlações significativas, percebe-se nesses participantes que a autoconsciência não se correlaciona com as capacidades de sociabilidade e autocontrole. Do mesmo modo, a habilidade de autocontrole não possui correlação significativa com a automotivação. Como também, a habilidade empatia não possui correlação significativa com as habilidades automotivação, autocontrole e sociabilidade.
Ainda na Tabela 3, verifica-se que existem cinco coeficientes de correlação não significativos. Estes resultados apontam independência entre as habilidades de empatia versus sociabilidade, automotivação e autocontrole. Do mesmo modo, inexiste associação significativa entre sociabilidade versus autoconsciência, automotivação e autocontrole. Isto é, a presença de uma dessas habilidades da inteligência emocional não se associa fortemente à existência de outra habilidade dessas mencionadas.
Considerações finais
Neste estudo, conforme proposto em seu objetivo, pôde-se perceber, através do autopreenchimento de um questionário por parte dos estudantes universitários do curso de psicologia, a manifestação da inteligência emocional e a relação entre suas habilidades (autoconsciência, automotivação, autocontrole, empatia e sociabilidade).
Foi interessante notar nos participantes deste estudo que as habilidades empatia e sociabilidade demonstraram desenvolvimento inferior em relação às demais habilidades (autoconsciência, automotivação e autocontrole). Dentre essas duas habilidades, a empatia é uma habilidade esperada, necessária e que, possivelmente, quando elevada, facilitaria a ótima compreensão dos pressupostos da psicologia e a evolução profissional satisfatória nessa área. Em contraponto, autoconsciência e automotivação são as habilidades que se apresentam melhor desenvolvidas. Isto é um bom indicador, já que uma alta capacidade de autoconsciência propiciaria a esses estudantes de psicologia o autoconhecimento e assim o trabalho pessoal no sentido do desenvolvimento satisfatório das demais habilidades da inteligência emocional, percebidas em potencial para serem trabalhadas. Nesse ponto, pode-se pensar que é de alta relevância que os cursos de formação em psicologia, além de propiciar o treinamento e desenvolvimento das capacidades intelectuais cognitivas de seus estudantes, de modo paralelo, poderiam criar condições para o desenvolvimento das habilidades da inteligência emocional, necessárias para o satisfatório exercício e prática profissional em psicologia.
Sobre inteligência emocional, pode-se dizer que, para se verificar e compreender a respeito desse tema com profundidade e amplitude, faz-se necessário ir além deste estudo. Este estudo, com fins a atingir seus objetivos, se ateve a um recorte do que vem a ser inteligência emocional, de forma que, sobre o assunto, há uma literatura diversificada.
Desse modo, pode-se concluir, levantando como sugestão, para futuros estudos a respeito de inteligência emocional, a elaboração de uma pesquisa longitudinal, que procure acompanhar a evolução dos estudantes universitários ao longo dos semestres do curso de psicologia e a evolução no desenvolvimento das habilidades da inteligência emocional. Assim como, investigar em outras áreas de formação quais seriam as habilidades que se apresentariam nos participantes como melhor desenvolvidas e também as relações entre as habilidades da inteligência emocional (autoconsciência, automotivação, autocontrole, empatia e sociabilidade).
Referências
ATKINSON, R. L. SMITH, E. E.; BEM, D. J.; HOEKSEMA, S. N. Introdução à Psicologia de Hilgard. 13. ed. Tradução Daniel Bueno. Porto Alegre: Artmed, 2002. [ Links ]
BISQUERRA, R.; MARTÍNEZ, F.; SARRIERA, J. C. Introdução à estatística: enfoque informático com o pacote estatístico SPSS. Porto Alegre: Artmed, 2004. [ Links ]
BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução Nº 196, de 10 de outubro de 1996. Brasília, DF, 1996. Disponível em: <http//www.conselho. saude.gov.Br/resolucoes/reso_96.htmhttp://conselho.saude.gov.br/resolucoes/reso_96.htm>. Acesso em: 20 nov. 2009.
DAMÁSIO, A. R. O erro de Decartes: emoção, razão e o cérebro humano. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. [ Links ]
DIÓRIO, S. Competência emocional de gestores. 2001. 92? f. Dissertação (Mestrado em Administração) – Faculdade de Administração, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2001.
FERREIRA, A. B. H. Dicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. [ Links ]
GARDNER, H. Inteligências múltiplas: a teoria na prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. [ Links ]
GOLEMAN, D. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1996. [ Links ]
MARCONDES, L. F. B. B. Inteligência emocional e Bem-estar no trabalho de funcionários públicos. 2008. 54f. Trabalho de Iniciação Científica – Faculdade de Psicologia e Fonoaudiologia, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2008.
MAYER, J. D.; SALOVEY, P. What is emocional intelligence? In: SALOVEY, P.; D. J. SLUYTER (Org.). Emotional development and emocional intelligence: Educational implications. New York: Basic Books, 1997. p. 3-31.
NASCIMENTO, S. H. As relações entre Inteligência emocional e Bem-estar no trabalho. 2006. 95f. Dissertação (Mestrado em Psicologia da Saúde) – Faculdade de Psicologia e Fonoaudiologia, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2006.
SIQUEIRA, M. M.; BARBOSA, N. C.; ALVES, M. T. Construção e Validação Fatorial de uma Medida de Inteligência Emocional. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, DF, v. 15, n. 2, p. 143-152, maio/ago. 1999. [ Links ]
Recebido em: 10/07/2010
Aceito em: 15/09/2010